domingo, 13 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10936: Efemérides (115): Nhabijões, 13 de Janeiro de 1971, morte na picada (Luís Rodrigues Moreira)

1. Mensagem do nosso camarada Luís Rodrigues Moreira (ex-Alf Mil Sapador da CCS/BCAÇ 2917 e BENG 447, Bambadinca e Bissau, 1970/72), com data de hoje, 13 de Janeiro de 2013, lembrando este mesmo dia de 1971, quando o Unimog em que seguia fez accionar uma mina anticarro, provocando a morte do seu condutor e ferimentos graves nos restantes ocupantes.


NHABIJÕES, 13 DE JANEIRO DE 1971

RECORDAR, PORQUE ESTAMOS VIVOS

Passam hoje quarenta e dois anos sobre aquele fatídico dia em que, no destacamento dos Nhabijões bem no centro da Guiné-Bissau e cerca das 11,25 horas, faleceu um jovem pai de seu nome Soares, condutor auto da CCAÇ 12, destacado naquele reordenamento juntamente com outros camaradas da mesma companhia e ainda alguns camaradas sapadores da CCS do BART 2917 e eu Alf. Mil. Sapador do mesmo Batalhão que comandava aquela força há pouco menos de um mês, vítima de uma mina anticarro quando nos conduzia, a mim, ao Furriel Fernandes da CCAÇ 12 e ainda a um jovem africano com menos de 10 anos de idade e não me recordo se mais alguém, à sede do Batalhão em Bambadinca onde eu iria almoçar e presumo que o mesmo iria fazer o Fernandes, regressando depois o Soares com o Unimog 411 que lhe estava distribuído e o almoço para os restantes camaradas que aguardavam no destacamento.

Não tenho nenhuma memória dos factos que se sucederam exceto daqueles que me contaram os camaradas que nos socorreram e, saiba-se lá porquê, das últimas palavras que o Soares proferiu: vamos fazer gincana, meu alferes.

E explico a razão das suas palavras. A estrada por onde circulávamos era de terra batida como a maioria das estradas da Guiné naquele tempo. No lado esquerdo da estrada e no sentido em que seguíamos, portanto em contramão para nós, havia um enorme buraco, em diâmetro, não muito fundo mas que todas as viaturas que por ali passavam evitavam até porque a maioria delas passava carregada de bidões de água que iam buscar à Ponte do Rio Udunduma, a alguns quilómetros de distância, e não convinha partir alguma peça da viatura ou perder alguma da água com os solavancos. Ao dizer estas palavras o Soares desviou a viatura do trajeto normal para descer e subir aquele obstáculo.

Foram as suas últimas palavras já que dentro do buraco estava dissimulada uma mina anticarro que rebentou sob o rodado do lado do condutor, deixando o Unimog 411 reduzido a um monte de escombros como se pode ver na foto que foi publicada neste Blogue.


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1971 > CCS/BART 2917 (1970/72) > Cemitério de viaturas militares > Em primeiro plano, pode ver-se o estado em que ficou o burrinho, o Unimog 411, depois de accionar uma mina anticarro à saída do reordenamento de Nhabijões, em 13 de Janeiro de 1971, por volta das 11h25. Duas horas depois, era accionada outra mina A/C por uma GMC (parecida com a que está visível ao fundo, na imagem, mas com um maior grau de destruição). (Legenda: Luís Graça)

Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados


Eu seguia ao lado do condutor Soares no local onde, na foto, está um dos pneus da viatura e os restantes ocupantes nos bancos da caixa da viatura. A partir desse instante não tenho memória dos factos até ao momento em que, no dia seguinte, fui abordado pelo General Spínola no SO do Hospital Militar 241 em Bissau onde estava internado.

Mas antes de ser evacuado para o hospital e ainda em Bambadinca soube que os camaradas que nos tinham ido socorrer tinham sofrido novo acidente com o rebentamento de uma segunda mina anticarro quase no mesmo local, que fez vários feridos ficando o hoje meu grande amigo Fernando Marques em estado muito grave. Vi-o alguns dias depois numa maca num corredor do hospital e dirigi-me a ele, mas um enfermeiro acabou por me dizer que não estava em estado de me ver ou ouvir sequer e que iria ser evacuado nesse dia para o hospital militar em Lisboa. Não mais soube dele durante décadas até ao momento em que ouvi chamar pelo meu nome em frente à Basílica da Estrela no dia em que os Deficientes Militares organizaram uma manifestação daí até à Assembleia da República para defesa dos seus direitos.


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Destacamento e reordenamento de Nhabijões > Finais de 1970 > O Alf Mil Moreira, sapador, pertencente à CCS / BART 2917, destacado no reordenamento de Nhabijões, aqui fotografado junto a uma velha GMG . Evacuado para o HM 241, em Bissau, por ferimentos graves em 13 de Janeiro de 1971, passaria depois aos serviços auxiliares e terminaria o resto da comisão - os 15 a 16 meses que lhe faltavam! - no BENG (Batalhão de Engenharia) 447. (Legenda: Luís Graça)

Foto: © Luís Moreira (2006). Direitos reservados

Aí estava ele são e salvo e com o seu ar jovial de sempre acompanhado pelo Gabriel Gonçalves que foi quem me reconheceu e chamou. É indescritível a sensação e a alegria que tive naquele momento ao vê-lo ali e ao saber que foi um lutador incansável ao longo de vários anos para recuperar a sua vida normal.

Telefonou-me hoje a recordar esta data que a minha memória teima em olvidar. Obrigado caro Fernando. Hoje infelizmente não deu para almoçarmos juntos mas fica a promessa de no próximo ano o fazermos, talvez juntando ao grupo dois dos sobreviventes destes dois acidentes, o Luís Graça e o Fernandes.


Oeiras > Livraria-Galeria Municipal Verney / Colecção Neves e Sousa > 19 de Janeiro de 2010 > 4.º Encontro do 2.º Ciclo de Colóquios-debates Fim do Império - Olhares Civis > Os dois antigos camaradas da CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71), caídos numa mina anti-carro, em 13 de Janeiro de 1971, à saída do destacamento e reordenamento de Nhabijões, Sector L1 (Bambadinca), zona leste... (Legenda: Luís Graça)

Foto: © JERO (2010). Direitos reservados

Os factos aqui descritos estão muito melhor documentados e retratados pelo autor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné no poste P5717* de 28 de Janeiro de 2010 em que homenageia o Fernando Marques.

Hoje apenas tive a intenção de os recordar e mais uma vez fortalecer os laços de amizade e camaradagem que me unem a estes camaradas de infortúnio bem como a muitos outros que combateram numa guerra em que não queriam estar e que hoje se revêm em múltiplos encontros que se desenrolam ao longo do ano por este País fora.

Um grande Bem Haja a todos vós por fazerem parte do meu círculo de CAMARIGOS.
Luís Moreira
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 28 DE JANEIRO DE 2010 > Guiné 63/74 - P5717: Blogpoesia (64): À uma e meia da tarde... Em homenagem ao António Marques, que sobreviveu, dois anos depois, à explosão de um vulcão (Luís Graça)

Vd. último poste da série de 25 DE DEZEMBRO DE 2012 > Guiné 63/74 - P10864: Efemérides (114): 22 de dezembro de 1971, partida para o CTIG do BART 3873, no N/M Niassa (António Bonito)

Guiné 63/74 - P10935: Tabanca Grande (381): Abílio Magro, ex-Fur Mil Amanuense do CSJD/QG/CTIG (1973/74), 600.º tabanqueiro desta tertúlia

1. Mensagem do nosso camarada e novo tertuliano Abílio Magro*, ex-Fur Mil Amanuense (CSJD/QG/CTIG, 1973/74), com data de 9 de Janeiro de 2013:

Camarigo Luís Graça:
Desde já um abraço com muito "ronco" pela tua Tabanca Grande.

Tenho seguido com alguma assiduidade os posts publicados na tua /nossa Tabanca, mas só hoje me dei ao "trabalho" de lá publicar um comentário ao tópico "O cruzeiro das nossas vidas", comentário esse que é mais um post, mas que não sei como publicá-lo como tal.
Acontece que possuo algum material que poderá enriquecer um pouco aquela Tabanca, já que pertenço a uma grande família de "combatentes" pois, de 8 irmãos (6 rapazes e 2 raparigas) todos os "machos" foram dar com os "costados" nos vários TO's (Angola, Moçambique e Guiné), chegando a estar 5 irmãos (todos milicianos) ao mesmo tempo, a cumprir serviço militar, dos quais 4 no Ultramar.

Dos 8 irmãos eu sou o mais novo e regressei da Guiné em Setembro de 1974, com a Guiné já independente e com guerrilheiros do PAIGC a fazerem patrulhas em Bissau, em conjunto com a nossa PM.

Desde 1967 houve, portanto, sempre a presença de, pelo menos, um irmão a "combater" em África, até ao fim da guerra. Muito pouca gente acredita, mas é realmente verdade e passo a explicar:

- O primeiro a embarcar foi o meu irmão Rogério que nasceu em 1944 e esteve em Angola entre 1967 e 1969 como Fur. Milº Atirador de Infantaria.
- O segundo foi o Dálio que nasceu em 1946 e esteve em Moçambique entre 1970/1972 como Alf. Milº de Engenharia.

- Também entre 1970/1972 prestou serviço em Angola o meu irmão Carlos, como cabo especialista da FAP (6 anos de serviço) e que se tinha oferecido como voluntário.

- Ainda entre 1970/1972, prestou serviço na Guiné o meu irmão mais velho Fernando, como Cap. Milº de Artilharia que, tendo nascido em 1936, já tinha prestado serviço militar obrigatório antes da guerra se iniciar em África.

- Ainda na Guiné, prestou serviço como 1º Cabo Enfermeiro o meu irmão Álvaro, que nascido em 1950, tinha mais um ano e meio de idade do que eu.

- Finalmente, eu (Abílio) o caçula, inicio o CSM no RI 5, Caldas da Rainha, em Abril de 1972, encontrando-se, nessa altura, a Companhia Magro assim distribuída:

- Rogério Magro - Na disponibilidade
- Dálio Magro - Moçambique
- Carlos Magro - Angola
- Fernando e Álvaro Magro - Guiné
- Abílio Magro - RI 5, Caldas da Rainha

Entretanto, em Março de 1973, lá fui parar à Guiné onde fui recebido pelo meu irmão Álvaro, pois o Fernando, o mais velho, já tinha regressado à Metrópole.

Penso possuir, portanto, algum "material" de interesse para a tua/nossa Tabanca.

Abraço camarigo
Abílio Magro


2. Nova mensagem, de 10 de Janeiro, de Abílio Magro, desta vez para desfazer uma troca de identidades, sem gravidade, que entretanto tinha sido esclarecida:

Camarada Vinhal
Já providenciei para que aquele "caramelo" do romeiro nunca te responda "ninguém", e te responda:
- És um homem grande, chefe de Tabanca e esquece o Magricelas que anda apanhado da caçoleta por causa da Troika e outros cacimbos do género".  Djubi, mi ca cunhe bem blogue de bó. Mi ca miste pôr bó num pusiçom inferior. Mi segue informaçom dos blogue. Os blogue fala pa mandá dos preferença pros mail do Luis. Mi disculpa esfuriel, tá? 

Por falar em humor, a minha passagem pela Guiné teve vários episódios burlescos que pretendo ir relatando na Tabanca Grande, assim os grã-tabanqueiros o permitam.
Não esperem relatos de grandes feitos, que não os houve, pois a minha prestação, enquanto militar, foi aquilo a que normalmente se chama de "ganda baldas!".
Já estou a tratar da digitalização das fotos do guerreiro e do reformado, que enviarei brevemente, conjuntamente com um pequeno texto sobre os meus primeiros dias de "guerra".

Abraço
Abílio Magro


3. Em mensagem do dia 11, o nosso camarada Magro enviou as fotos da praxe, assim como o primeiro texto para a uma série a começar a ser publicada brevemente: 

Camaradas Luís Graça e Carlos Vinhal
Conforme o solicitado, seguem em anexo 2 fotos.
A primeira foi tirada na Guiné e alguns dar-lhe-ão o título de "O Bravo do Pelotão", e outros o de "O Magro como um cão".
À segunda ficar-lhe-à bem o título de "Um reformado com estilo", digo eu.

Envio também um pequeno texto de início de "hostilidades", ficando ao v/inteiro critério dar-lhe o destino que muito bem entenderem.
Caso achem poder haver algum interesse no relato dos episódios que se seguem, que incluem umas mini-férias na praia fluvial de Cacine, superiormente gerida pela CCaç 3520, numa altura em que havia grande arraial e fogo de artifício na aldeia vizinha (Gadamael), terei todo o gosto em efectuar os respectivos relatos, não prometendo grande qualidade literária, mas apenas alguns salpicos pseudo-humorístcos.

Abraços
Abílio Magro


4. Comentário de CV:

Caro camarada Abílio Magro, bem-aparecido na nossa Tabanca Grande.
Começo por te dizer que não conheço caso idêntico ao da tua família, de ter permanentemente um membro (pelo menos) desde 1967 até 1974, na guerra. Imagino que seria uma casa de sobressalto com uns pais permanentemente em sofrimento.

Por que nada referes, supõe-se que, felizmente, regressaram todos sãos e salvos.

No primeiro poste da tua série a sair em breve voltaremos ao assunto com mais pormenor.

Quanto a ti, sabemos teres sido Fur Mil Amanuense e prestado serviço na Chefia do Serviço de Justiça e Disciplina no Quartel General do CTIG. Felizmente que a tua comissão de serviço foi mais curta pelos motivos que todos sabemos. Embora em termos operacionais não tivesses algum problema, só o estar tão longe da família era já castigo bastante.

Prometo em breve começar a publicar a tua série, mas ficas obrigado a alimentá-la de modo a não ficar a saber a pouco. Se houver por aí umas fotos de Bissau, manda também.

Para que os nossos leitores possam confirmar os teus dotes de informático, aconselho uma visita às tuas páginas Abílio Magro - Genealogia em: www.amagro.net e www.genealmagro.blogspot.pt
A propósito, não queres ser nosso consultor técnico?

Para evitar dúvidas, a tua correspondência deverá ser sempre enviada, por uma questão de segurança, para dois destes três endereços: Luís Graça, sempre, e Carlos Vinhal ou Eduardo Magalhães, à escolha.

Caso não tenhas reparado, és o 600.º elemento da tertúlia, agora escolhe seres o seiscentésimo ou o sexcentésimo.

Com este apontamento de profundos conhecimentos de português (ou resultado de busca na net) deixo-te um abraço em nome da tertúlia e dos editores.

Em nome desta gente toda
Carlos Vinhal
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 9 de Janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10915: O cruzeiro das nossas vidas (18): O meu batismo de voo, em 28 de março de 1973, num DC 6 da FAP (Abílio Magro)

Vd. último poste da série de 13 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10934: Tabanca Grande (380): João Nunes, açoriano, grã-tabanqueiro nº 599, ex-fur mil, CCAÇ 4544 (Cafal Balanta e Bolama, 1973/74)

Guiné 63/74 - P10934: Tabanca Grande (380): João Nunes, açoriano, grã-tabanqueiro nº 599, ex-fur mil, CCAÇ 4544 (Cafal Balanta e Bolama, 1973/74)

1. Mensagem,  de ontem, do nosso novo membro da Tabanca Grande, nº 599, João Nunes, que nos escreve de Angra do Heroísmo (*):

Data: 12 de Janeiro de 2013 à59 16:54
Assunto: foto atual

Camarada Luís Graça,  foi com satisfação que vi publicadas as fotos que lhe enviei, sim são todas de Cafal Balanta.

Na altura em que lá estive, já havia as tabancas feitas pela companhia anterior, a primeira a ocupar esse espaço.

Junto envio a foto identificada com alguns nomes de camaradas que me recordo, pois passaram-se 40 anos, não me lembro de todos. Sei que o cão se chamava "Cigano".

Sim,  esta era a minha secção do 3º grupo de combate,  comandado pelo alferes Moura, natural do Porto.

Claro que aceito ser membro da Tabanca Grande. 


Despeço-me com um grande abraço, sempre ao vosso dispor.
João Nunes
Ex-furriel, CCAÇ 4544,
Cafal Balanta, 1973/74.



Guiné > Região de Tombali > Cafal Balanta > CCAÇ 4544 (Cafal Balanta, 1973/74) > Foto do álbum do João Nunes, de Angra do Heroísmo.  Trata-se da  secção do João Nunes,  3º grupo de combate (que era comandado pelo alf mil Moura, natural do Porto). O João foi capaz de identificar, 40 anos depois, a maioria dos seus camaradas de secção.

 Fotos: © João Nunes (2013). Todos os direitos reservados


2. Comentário de L.G.:

João, obrigado pela tua rápida resposta. Ficas apresentado à Tabanca Grande (**), de que passas a ser o membro nº 599. A seguir ao Carlos Prata e ao António Agreira, és o terceiro representante dos bravos da CCAÇ 4544 que hastearam a bandeira verde-rubra em Cafal Balanta. Fico duplamente feliz pela tua entrada na Tabanca Grande, pelo facto de seres um lídimo representante da liberalíssima e bela Angra do Heroísmo e, ao mesmo tempo, irmão do meu antigo aluno e amigo de longa data, o dr. Jorge Nunes, ilustre médico especialista em saúde pública, autoridade de saúde do concelho das Caldas da Rainha.

João, mandam as nossas regras tabancais que nos tratemos por tu. Aqui somos todos iguais e não há mais alguns mais iguais do que outros. A princípio não dá jeito, a gente estranha, mas depois... a coisa - o tu cá, tu lá - entranha-se. Dá cumprimentos ao mano e conta-nos mais coisas do teu tempo de Cafal Balanta e de Bolama. Foram tempos duros, mas todos fizemos o nosso melhor. Espero que tragas mais camaradas açorianos até ao nosso blogue. LG

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 9 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10917: O nosso livro de visitas (156): João Nunes, Angra do Heroísmo, Ilha Terceira, Açores, ex-fur mil, CCAÇ 4544,/73 (Cafal Balanta e Bolama, 1973/74)

(**) Último poste da série > 9 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10914: Tabanca Grande (379): José Augusto Miranda Ribeiro, ex-Fur Mil da CART 566 (Cabo Verde e Guiné, 1963/65)

Guiné 63/74 - P10933: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (22): 23.º episódio: Memórias avulsas (4): "O nosso Furié"

K3 (Saliquinhedim) > Chegada de uma operação. Em primeiro plano, Veríssimo Ferreira
Foto: Veríssimo Ferreira


1. O nosso camarada Veríssimo Ferreira (ex-Fur Mil, CCAÇ 1422 / BCAÇ 1858, Farim, Mansabá, K3, 1965/67), em mensagem do dia 8 de Janeiro de 2013, enviou-nos mais uma história para publicar na sua série "Os melhores 40 meses da minha vida".


OS MELHORES 40 MESES DA MINHA VIDA (23)

GUINÉ 65/67 - MEMÓRIAS AVULSAS (4)

O NÔSSO FURIÉ

Chegara o correio e recebi uma desagradável notícia e, mesmo sem querer, deixei transparecer o estado d'alma com que ficara.
Repararam os 3 elementos felupes que agora faziam parte da minha Secção, em substituição de igual número de metropolitanos hospitalizados.

Um deles, o 44, nome pelo qual insistia ser chamado, vivia em Farim, numa morança colada à cidade, mas passava a maior parte do tempo no aquartelamento.
Guia e militar dos bons, tinha seis mulheres e pela última dera duas vacas leiteiras e 1.500 pesos.

Cinco trabalhavam nas hortazinhas improvisadas, ali junto ao aeroporto com quem confinavam, e a mais nova tomava conta da criançada.
A exígua produção, quer de hortaliças quer de tomates bem como de laranjas verdes, estava previamente vendida aos comerciantes libaneses da terra e com os magros pesos conseguidos adquiriam panos e alguns pequenos roncos para as crianças, 10 até então.

Eu, fora apresentado à família toda e com o tempo senti o que era ser estimado o que retribui como sabia.

Fátima se chamava a mais nova esposa e era moçoila bem formosa. Lavava a roupa do "nôsso furié" (assim me tratavam) e também a da prole, mas a confecção era do pai, estilista, que tinha uma "Singer" com a qual cosinhava lá no K3, nos momentos vagos, chegando até a fazer-me uma camisa por medida e bivaques, no que era especialista.

Ofereceu-me também um fato d'Homem Grande que uso ainda duas ou três vezes por ano para mostrar que quem manda cá na minha Tabanca sou eu, o que não seria necessário pois que sou "macho" e nem seria preciso "marcar" o terreno, digo eu mas ninguém me liga.

Visitava-os mais ou menos de 15 em 15 dias, embora com um olho no burro e outro no cigano, não fosse o diabo tecê-las, levava-lhes algumas medicinas, doces e guloseimas e em troca mimavam-me obrigando a que aceitasse laranjas, galinhas, ovos e nozes da cola.

Como descrito portanto, a relação entre aquela família e cá o rapaz era psico-socialmente do melhor e tal modo de vida foi mais tarde implementado por todas as tropas em presença.

Ainda sobre o facto das 6 mulheres, deixem que vos diga que chegado à Metrópole, tentei seguir por esse caminho mas a religião única nessa altura, não o permitia, apesar de eu ter o dinheiro e as vacas para a troca. Todavia e porque as não queria a trabalhar para mim e chulice já era uma profissão muito na moda e hoje mais ainda, acabei por ter 5 e não 6, para não faltar à verdade, e até o meu confessor não achou mal porque as não explorava e dizia-me sempre:
-Vai em paz, ajuda-as e fá-las felizes.

E eu "fízeas".

Como ia a dizer... ao verem-me arruvecido diz o 44:
- Furriel está triste... Furriel vai lá à Maria... vai qu'ela hoje espera pelo "minino".

Convém acrescentar que a Maria era uma sua cunhada, boa com'ó milho daquele com que fazem as pipocas, criada de servir numa casa importante e de quem se sabia ser uma daquelas mulheres, como se diz? - não se m'alembra nem interessa.... menos sérias pronto.

O nôsso furrié conhecia o caso, já a tentara mas ela havia respondido:
- "Só si foras tinente".

Como vêm eu distraído não andava, antes pelo contrario, (o mesmo não se pode dizer agora, que nestas questões estou meio zarolho) mas levara c'os "feet".

O meu agradecimento foi:
- O quê pá? Ah ganda malandro qu'até me fizeste esquecer, porque estava melancólico...

E lá fui com passaporte assinado e tudo, apanhar o cacilheiro.

Travesssia do Rio Cacheu em frente a Farim
Foto ©: Carlos Silva (2008). Direitos Reservados

(continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 6 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10903: Os melhores 40 meses da minha vida (Veríssimo Ferreira) (21): 22.º episódio: Memórias avulsas (3): The Python Sebae

Guiné 63/74 - P10932: Parabéns a você (522): Maria Ivone Reis, ex-Cap Enf.ª Paraquedista

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 9 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10913: Parabéns a você (521): Manuel Vaz, ex-Alf Mil da CCAÇ 798 (Guiné, 1965/67)

sábado, 12 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10931: Recortes de imprensa (63): Homenagem, em maio de 2008, ao tenente capelão Joaquim Ferreira da Silva, jesuíta, natural de Santo Tirso, que pela sua coragem e lucidez terá evitado um banho de sangue no campo de prisioneiros de Pondá, Goa, em 19 de março de 1962 (JN- Jornal de Notícias, 12/5/2008)

1. Ainda a propósito da exposição "Álbum de Memórias: India Portuguesa, 1954-1962", que est+a a terminar (Lisboa, Padrão dos Descobrimentos: imagem do cartaz  à esquerda), reproduz-se aqui, com a devida vénia, a notícia da homenagem,  prestada em maio de 2008, por um grupo de ex-prisioneiros de guerra, ao tenente capelão Joaquim Ferreira da Silva,  cujo comportamento corajoso e lúcido no campo de prisioneiros de Pondá, em Goa, no dia 19 de março de 1962 poderá ter evitado um banho de sangue. (LG)

Goa recordada por prisioneiros

Ana Trocado Marques
JN- Jornal de Notícias, 12/5/2008

É o dia 19 de Março de 1962, pelas 18.30 horas. Campo de prisioneiros de Pondá, Goa, Índia. Três prisioneiros tentaram a fuga. Denunciada por um furriel português, a ousada manobra falhou e o acto de indisciplina iria ser pago com o fuzilamento dos 1750 militares portugueses, prisioneiros, em Pondá, desde 17 de Dezembro de 1961. A coragem e a diplomacia do tenente-capelão Ferreira da Silva haveria de evitar o banho de sangue.

Quarenta e seis anos depois, Fausto Diabinho [, foto à direita, há 50 anos atrás,] ainda não consegue conter as lágrimas ao recordar o fatídico 19 de Março. Viu a morte à frente. Lembra os companheiros a desmaiar, as metralhadoras apontadas, o pelotão de fuzilamento e a voz que gritava "Quem se mexer será abatido". Lembra, sobretudo, o tenente-capelão que, num acto heróico, sai da formatura, arriscando a vida, e consegue negociar com o brigadeiro indiano o perdão dos portugueses, evitando o massacre.

(...) Quarenta e seis anos depois, o Ministério da Defesa reconhece, finalmente, o acto heróico de Joaquim Ferreira da Silva, a quem atribui, a 7 Dezembro do ano passado, a título póstumo, a Medalha Militar de Serviços Distintos, grau ouro.

"Se hoje estamos aqui, devemos-lhe a ele", garante o vice-presidente da Associação Nacional dos Prisioneiros de Guerra (ANPG), que, anteontem, prestou, na Póvoa de Varzim, homenagem a Ferreira da Silva."Se fosse vivo, faria 92 anos", recordou Fausto Diabinho, explicando a escolha do dia para homenagear o tenente-capelão, sepultado no cemitério poveiro.

Foi igualmente em Maio, em 2003, continuou a explicar, que o Governo reconheceu a condição de prisioneiros de guerra, condecorando todos os ex-militares presos na Índia, Timor, Angola, Moçambique e Guiné. Finalmente, foi também em Maio de 1962 que os mais de três mil portugueses presos na Índia começaram a ser libertados.

"O ministro da Defesa, na altura Castro Caldas, teve a ousadia de dizer que não houve prisioneiros de guerra na Índia porque simplesmente estavam à espera de transporte", lembrou Fausto Diabinho, que recorda, com tristeza, os mais de 40 anos necessários para que Portugal reconhecesse que, a defender a pátria, três mil militares portugueses foram feitos prisioneiros, durante seis meses, e 29 perderam a vida. Agora, os ex-prisioneiros na Índia festejam, finalmente, o reconhecimento justo de quem "serviu a pátria e perdeu a vida" em defesa dos territórios portugueses de Goa, Damão e Diu.

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Nota do editor:

Último poste da série > 24 de dezembro de 2012 > Guiné 67/74 - P10854: Recortes de imprensa (62): Um caso de sucesso: a proteção dos hipopótamos de água salgada da ilha de Orango, nos Bijagós (RTP África, 10/12/2012)

Guiné 63/74 - P10930: Os nossos seres, saberes e lazeres (50): A caminho de Auroville, a "cidade do amanhecer", no sul da Índia... Mas se pudesse escolher, era já para Iemberém que eu queria voar (Anabela Pires)


1. Mensagem de 8 do corrente, da nossa amiga, grã-tabanqueira,  nº 536, Anabela Pires [, foto à direita, em  Catesse, Cantanhez, Guiné-Bissau, janeiro de 2012,]:

Assunto: A caminho de Auroville, na Índia

Olá, família, amigos, amigas, ex-colegas e ex-vizinhos!

Como sabem,  passei os últimos tempos entre Alcobaça e Coimbra e fiz uma mini-horta em casa de uns amigos da minha irmã (mando umas fotos para verem!). [vd. uma das fotos, abaixo,

Durante este tempo procurei também, em vão, quintas com horta biológica e condições mínimas de habitabilidade (que está frioooo!) para aprender mais e oportunidades internacionais de voluntariado. Em Portugal tudo parece tão difícil!

Assim, acabei por decidir ir para Auroville, na Índia (quem tiver curiosidade pode ir a www.auroville.org ou (informação mais ligeira) a www.en.wikipedia.org/wiki/Auroville .

Vou voar de hoje a oito dias na companhia aérea dos Emirados Árabes - Lisboa- Dubai - Chennai. Dia 16 ficarei a dormir em Chennai e dia 17 irei então para Auroville num táxi da sua companhia de táxis. Chegarei no mesmo dia em que o ano passado cheguei a Iemberém. E se pudesse escolher era para Iemberém que voaria também este ano.

Penso passar a 1ª quinzena a conhecer Auroville e a integrar-me. Depois ou opto por uma participação ativa, ajudando onde for preciso - penso que vou privilegiar as quintas para continuar a aprender a cultivar - ou opto por um projeto de voluntariado. Tudo vai depender dos projetos de voluntariado que houver. Tenho como limitação a língua mas pelo menos espero regressar a falar inglês mais fluentemente.

Penso regressar/chegar a Portugal dia 3 de Julho.

Não sei se irei ou não escrever um Diário como fiz na Guiné mas se o fizer gostava de saber quem tem curiosidade, tempo, disponibilidade e o quer ler. Posso enviar notícias curtas ou longas ou nem enviar nenhumas. A opção é vossa, é só dizerem o que preferem.

Não terei acesso diário à Internet e por isso peço o favor de não me encaminharem e-mails que não sejam de carácter pessoal.

Sobre Portugal só quero saber das boas notícias [...]. Bom, desejo a todos muita saúde e muito humor para aguentarem isto por cá.

Um enorme abraço,
Anabela




Página de rosto do sítio Auroville.org. "Auroville, também conhecida como 'A Cidade do Amanhecer', é uma povoação internacional perto de Pondicherry, no sul da Índia, construída com o propósito de realizar a unidade humana na diversidade. Conta atualmente com cerca de 2 mil pessoas, um terço das quais indianas e as demais originárias de 35 países do mundo todo, inclusive do Brasil. Foi fundada dentro dos princípios da ioga integral, desenvolvida por Sri Aurobindo" (Fonte: Wikipedia > Auroville).


2. Comentário de L.G.:

Tenho pena que os teus projetos de desenvolvimento pessoal e comunitário no campo da agricultura biológica não se tenham podido concretizar aqui, nesta tua segunda terra... É verdade, às vezes, em Portugal tudo parece tão difícil!...E mais pena ainda de o teu regresso a Iemberém não se poder concretizar tão cedo...

Prossigamos, então,  a busca da utopia,  mesmo que o lugar perfeito não exista, nunca tenha existido, nem nunca venha a existir. Do grego antigo, οὐ (não) + τόπος (lugar), não-lugar.

Dito isto, bons ventos te levem até à Índia eterna e misteriosa, e melhores monções ainda te tragam até ao Puto, em julho próximo. És uma verdadeira tuga e cidadã do mundo. Tenho a certeza que vais sentir-te bem, aprendendo, ensinando, ajudando e cooperando que é  o teu modo de ser e estar na vida. Para nós, manda notícias breves e tranquilizadores. No final, podes fazer o balanço para o Tabancal. Se houver notícias desta ponta da Europa, fica descansada que a gente mandas-ta, em correio expresso, se forem mesmo maravilhosas. Um Alfa Bravo dos teus vizinhos de poilão, grã-tabanqueiros, que cá ficam a tomar conta das moranças da nossa utopia.

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Nota do editor:

Último poste da série > 25 de outubro de 2012 > Guiné 63/74 - P10572: Os nossos seres, saberes e lazeres (49): Mário Beja Santos, passa à situação de aposentado a partir de 31 de Outubro

Guiné 63/74 - P10929: Agenda cultural (247): Termina a 27 deste mês a exposição Álbum de Memórias: Índia Portuguesa. 1954-62, Lisboa, Padrão dos Descobrimentos


O major general  Gespal (Sikh), primeiro comandante do campo de prisioneiros de Pondá, Goa, tendo à sua esquerda o capitão de fragata José Pinto da Cruz, imediato do avio "Afonso Albuquerque", e comandante dos prisioneiros.



Goa > Campo de prisioneiros do Forte de Aguada > O famigerado  bidão da sopa. Um dos cozinheiros deste ou campo de Pandá  era o meu primo Luís Maçarico, de Ribamar, Lourinhã. (Estava colocado no Hospital Militar de Pangim, aquando da invasão).




Goa > Vasco da Gama >  Campo de prisioneiros de Alparqueiros >  1962 > "Quem passar daqui será alvejado a tiro": título de letreiro afixado, ao fundo... Em  11 de janeiro, tinha havido uma tentativa de fuga de 11 prisioneiros, que procuraram refúgio num navio ancorado no porto, e prontamente denunciados pelo respetivo capitão. 

A 19 de março, no campo de prisioneiros de Pondá, Goa, haverá outra tentativa de fuga: 3 prisioneiros tenta5m esconder-se na camioneta da recolha do lixo, mas são denunciados pelo furriel que os comandava.  Este incidente acabou por dar origem a uma revolta coletiva que, embora prontamente doiminada pelos oficiais e sargentos portugueses, levou à intervenção do brigadeiro indiano, comandante geral dos campos de Goa, que ameaçou fuzilar todos os que persistissem em castigar o furriel... O tenente capelão Joaquim Ferreira da Silva, jesuita, natural de Santo Tirso, teve então um gesto heróico, conseguindo apaziguar os ânimos de um lado e do outro. O capitão Roberto Durão escreveuino seu diário: "Hoje foi o dia do Pai [, 19 de março,], podíamos ter deixado muitos órfãos em Portugal, pois a nossa vida estave por um fio".



Goa > Campo de prisioneiros de Alparqueiros > 1962 > Na hora da despedida, ao fim de 5 meses e meio de cativeiro.



N/T Pátria > 1962 > Repatriamento dos prisioneiros de guerra... Um operação discreta, um regresso humilhante, um momento doloroso da nossa história, um esquecimento coletivo de meio século...






Pequena amostra da exposição Álbum de Memórias: Índia Portuguesa, 1954-62, que tem estado aberta ao público, desde setembro de 2012, em  Lisboa, Padrão dos Descobrimentos. Encerra em  27 de janeiro de 2013. [Imagens e legendas  de L.G,]

A exposição, criado a partir de fotografias, documentação e recordações dos militares portugueses, espólio recolhido por Fernanda Paraíso, com o apoio da Associação Nacional de Prisioneiros de Guerra (ANPG), "retrata a vida dos militares, prisioneiros de guerra na sequência da ocupação indiana dos territórios portugueses na Índia, em  Dezembro de 1961, até ao momento do seu repatriamentO". Tem também o contributo do Observatório Político que "introduz o enquadramento complementar para a compreensão do quadro histórico e político de meados do século XX, no qual se inscrevem os acontecimentos narrados."

Com a presente expsição, a EGEAC (, a empresa do Município de Lisboa, responsável pela Gestão de Equipamentos e Animação Cultura,) assinala os 50 anos do regresso, em 1992,  do último contingente militar da Índia Portuguesa. (**)

Visitas guiadas a 20 (11h00) e 27 (15h30) de janeiro de 2013. Clicar aqui para aceder ao sítio do Padrão dos Descobrimentos



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Notas do editor:

(*) Vd. postes anteriores:

 23 de dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10847: Agenda cultural (242): Últimos dias da exposição Álbum de Memórias: Índia Portuguesa, 1954-62... Lisboa, Padrão dos Descobrimentos: agora até 27 de janeiro de 2013

16 de dezembro de 2012 > Guiné 63/74 - P10808: Agenda cultural (241): Últimos dias da exposição Álbum de Memórias: Índia Portuguesa, 1954-62... Lisboa, Padrão dos Descobrimentos: até 30/12/2012

(**) Último poste da série > 4 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10897: Agenda cultural (246): Exposição, em Odivelas, na biblioteca municipal D. Dinis, de 4 a 20 de janeiro de 2013, " Regimento de Engenharia nº 1 - 200 anos a servir Portugal" (José Martins)

Guiné 63/74 - P10928: Tabanca Grande (380): Joaquim Ruivo, grã-tabanqueiro n.º 598, alentejano, ex-1.º cabo mec , obus 8.8, BAC 1 (Santa Luzia, Bissau, out 61 / fev 64)



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > "O porto de Mindelo, quando da minha passagem em 1961 a caminho da Guiné... Aqui, na cidade de Mindelo, na Casa Leão, era onde se compravam os rádios Hitachi mais baratos."


Guiné > Bissau > 1961 > "Navio Alfredo da Silva a atracar no porto de Bissau"


Guiné > Bissau > "Poilão que existia dentro do quartel em Bissau, onde estive colocado e onde foi colocado um posto de observação. Os degraus em ferro que se vêm foram feitos por mim".


Guiné > Bissau > BAC > Guião da unidade. Divisa: "Os olhos na Pátria e a Pátria no coração"




Guiné > Bissau "Chegada ao quartel de Santa Luzia dos recrutas de 62".


Guiné > Bissau > 1962 > "Quartel em Santa Luzia, em dia do Juramento de Bandeira"


Guiné > Bissau > "Pessoal da BAC, confraternizando no dia da Artilharia"

Guiné > Bissau > BAC > "Todos os obuses existentes na Guiné, em 1963"


Guiné > Bissau > "Ninho de térmitas"


Guiné > Bissau > "Capela de Santa Luzia em Bissau. Nesta Capela esteve em câmara ardente, uma das primeiras vitimas da guerra: um capitão de Cavalaria, bem conhecido em Bissau por ser um grande desportista".



Guiné > Bissau > "Antigo Aeródromo de Brá (em 1962 só existia este monumento e dois hangares em ruínas)".



Guiné > Região do Oio > Lavadeiras junto à ponte de Mansoa.


Guiné > Bissau > da esquerda para a direita: Joaquim Ruivo, Marmelo e Nuno

Fotos (e legendas): © Joaquim Ruivo (2013). Todos os direitos reservados


1. Mensagem do Joaquim Ruivo, publicada na nossa página do Facebook, em 5 de janeiro de 2013:

Olá, amigos tabanqueiros.... Vou apresentar-me: o meu nome é Joaquim Ruivo, fui para a Guiné como 1º cabo mecânico de armas pesadas e fui colocado numa unidade de artilharia (obus 8,8),  formada por naturais da Guiné. Fui em Outubro de 61 e vim em Fevereiro de 64. Por isso tenho mais tempo de paz que de guerra.

A minha participação directa na guerra foi em Catió a preparar os obuses par participarem na operação Tridente.

Sinto-me lisonjeado por passar a pertencer à Tabanca Grande.

2. Comentário de L.G.:

O nosso camarada Joaquim Ruivo é natural de  Brotas, Evora. Nasceu a 3 de Agosto de 1939. Vive em Vendas Novas. Tem página no Facebook. É um dos camaradas do tempo da mauser e do caqui amarelo. Ainda conheceu  a Guiné em paz, relativa. Cumpriu dois anos e cinco meses de comissão de serviço, o que foi obra!...

Através de uma seleção das suas fotos no Facebook, tentámos fazer uma reconstituição do seu percurso na Guiné, desde a sua viagem em outubro de 1961 (passando pelo Mindelo, São Vicente), até à sua colocação na BAC (Bateria de Artilharia de Campanha), em Santa Luzia, com passagem por Mansoa e Catió, e finalmente o regresso a casa, em fevereiro de 64. Ficamos a saber, por exemplo, que era fraca a presença da artilharia de campanha, que as guarnições do obus 8.8 eram constituídas por pessoal do recrutamento local e que chegou a haver um aeródromo em Brá, antes da BA 12, em Bissalanca.

Joaquim, como eu te tinha prometido, estás apresentado à Tabanca Grande. És o grã-tabanqueiro nº 598. Como sabes,aqui  tratamo-nos por tu, como camaradas de armas que fomos. Isto facilita a comunicação entre nós. Não importam as diferenças do passado nem sequer as de hoje.

Obrigado pelas tuas fotos e respetivas legendas. Fico à espera que me mandes uma pequena história do teu tempo, de que te lembres. Terei muito gosto em publicá-la. Vejo também que és um avô babado e amigo do teu amigo. Senta-te aqui ao pé da gente, debaixo do poilão da nossa Tabanca Grande, e deixa fluir a tua memória.  Gostávamos, por exemplo,  em que data é que te apercebeste de que havia guerra na Guiné. Tudo começou em 23 de janeiro de 1963 (como dizem as crónicas oficiais do PAIGC), com o ataque a Tite, ou já havia escaramuças antes ?

Um abraço de todos os nossos editores. Tens aqui o nosso endereço de email: 
luisgracaecaamaradasdaguine@gmail.com. Precisamos agora de saber o teu.
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Nota do editor:

Último poste da série > 9 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10914: Tabanca Grande (379): José Augusto Miranda Ribeiro, ex-Fur Mil da CART 566 (Cabo Verde e Guiné, 1963/65)

Guiné 63/74 - P10927: Do Ninho D'Águia até África (43): Lodo e tarrafo (Tony Borié)

1. Quadragésimo terceiro episódio da série "Do Ninho de D'Águia até África", de autoria do nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66), iniciada no Poste P10177, chegado até nós em mensagem do dia 8 de Janeiro de 2013:


DO NINHO D'ÁGUIA ATÉ ÁFRICA (43)




A manhã não estava muito quente, regressavam de tomar banho nos três furos de água que havia a sul do aquartelamento, de onde vinha uma água quente, mesmo muito quente, a cheirar a enxofre ou coisa parecida. Traziam já o cigarro “três vintes” na boca, e o Curvas, alto e refilão, dizia ao Cifra:
- Tu não sabes o que é guerra, cala-te, tu és “tropa fandanga, tropa manhosa”, gostava de te ver a atravessar uma zona de lodo e tarrafo, sempre com o coração nas mãos, à espera de uma emboscada!

O Cifra ouvia e nada dizia, pois sabia que era verdade.

O Setúbal, acrescenta:
- Tenho mais medo de caminhar no lodo do que, às vezes, enfrentar uma emboscada, tens que caminhar, direito e sempre com todos os sentidos de alerta e equilíbrio, pois se cais, e não vai mais do que um companheiro a teu lado, é um grande problema para saíres, quanto mais força fazes, mais te enterras, e o companheiro que vem até a ti para te ajudar, se também se enterra, então é um desastre, tem que ser alguém a estender-te algo a que te possas agarrar para que aos poucos te vás safando. Então, nossa querida G-3, mais todo o equipamento que carregamos, fica com o dobro do peso. Quando se tem o azar de cair, é melhor não haver contacto físico, a maldita lama parece que tem cola, quando colocas o pé e o enterras na lama, ao tirá-lo, faz vácuo e quando se tenta mover os pés, fazemos muito mais esforço do que o normal, daí um substancial cansaço, e se não se tem os cinco sentidos apurados, entramos em pânico.


O Cifra continuava a ouvir, e compreendia que aquilo era verdade. E o Curvas, tirando o cigarro da boca, continuava:
- E não te quero dizer nada do que sucederia se ficasses enterrado na lama e a maré começasse a encher, depois logo a seguir à lama vem o maldito tarrafo, que é toda aquela vegetação, seca por baixo e verdejante por cima, que quando a maré está cheia, vista de longe é muito linda, mas quando não há água, até mete medo. Vem logo a seguir à lama, e temos que ter força para o atravessarmos, sempre arredando para o lado aquela vegetação tinhosa, cheia de mosquitos, e dizem que é lá que se metem os crocodilos.

E logo o Setúbal, fala mais alto, e diz:
- Também não exageres, pois eu nunca vi nenhum, mas depois a maldita lama entranhada no camuflado, com as minhas botas rotas, onde entra água e toda a porcaria, é um sacrifício caminhar. Quando vai o alferes da companhia de intervenção, e não quer parar, sempre com aquela voz fininha: “vamos, vamos, que se faz noite”, parece tal e qual as gajas que à sexta-feira apareciam na minha aldeia para fazerem “uma geral”.


O Cifa continuava a ouvir, e ia dizer que era verdade, mas o Curvas, alto e refilão, logo lhe dizia:
- Cala-te, essas mãos e essas unhas nunca sentiram uma G-3 com o cano em brasa e tu desesperado para dares mais fogo, não teres mais balas, portanto és “tropa rafeira, tropa fandanga, tropa manhosa”.

Entretanto chegaram ao dormitório, atiraram o resto cigarro para o chão, entraram ouviram o Trinta e Seis, baixo e forte na estatura, gritar para o Curvas, alto e refilão:
- Porra, estava à vossa espera para ir-mos ao café, pois já sabes, se chegas tarde, o Arroz com Pão, que era o cabo do rancho, fica pior que estragado, e ficas sem comer até ao meio dia.

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 8 DE JANEIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P10911: Do Ninho D'Águia até África (42): O Cifra encontra um inimigo (Tony Borié)

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Guiné 63/74 - P10926: (Ex)citações (205): Ainda eu, o comandante Alpoim Calvão e a Operação Nebulosa (Jorge Félix, ex-alf mil pil, AL III, Esq 122, BA 12, Bissalanca, 1968/70)


Guiné > Teixeira Pinto > 1969 >  "Rebordão de Brito, Fernando Giesteira, e eu" (JF) [Ou não será antes, da esquerda para a direita, Fernando Giesteira, Rebordão de Brito e Jorge Félix ?]

Foto: © Jorge Félix (2013). Todos os direitos reservados 


1. Mensagem do Jorge Félix [, foto à direita, ex-alf mil pil, AL III, Esq 122, BA 12, Bissalanca, 1968/70]

Data: 9 de Janeiro de 2013 17:22

Assunto: Comentário a comentário(s) ao poste P10891 (*)

Meu Caro Luís Graça,

Vou novamente pedir a tua paciência, para dares seguimento a este mail.

...Não consegui fazer-me entender, culpa minha, desde já as minhas desculpas .

Retribuo os meus sinceros cumprimentos aos autores do livro e a ao Senhor Comandante Alpoim Calvão.

(Junto uma foto de 69 em Teixeira Pinto onde consta Rebordão de Brito, Fernando Giesteira, e eu).
Sem mais.

Abraço do tamanho do Geba

Jorge Félix
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Nota do editor:

(*) vd. poste de 3 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P10891: (Ex)citações (204): Alpoim Calvão e a Operação Nebulosa: revelações de Jorge Félix, ex-alf mil pil av heli AL III, e comentário de João Meneses, 2º ten fze, RN, DFE 21, 1972

(...) JCAS deixou um novo comentário na sua mensagem "Guiné 63/74 - P10891: (Ex)citações (204): Alpoim ...":

... no intuito de concluir o m/comentário supra (o qual pouco depois, em conjunto aos conteúdos dos vossos p10877 e p10891, fiz chegar a conhecimento do biografado), reproduzo, para benefício de todos os membros deste blogue e seus leitores, um recente email:

---«quote»---

de: guilherme alpoim calvao
para: Abreu dos Santos (senior)
data: 06Jan2013 19:43
assunto: Re: "Alpoim Calvão e a Operação Nebulosa: revelações de Jorge Félix"

Prezado Amigo, boa noite.

Sobre o comentário do Jorge Félix, tenho a dizer-lhe:

Parece que as pessoas andam com as sensibilidades exacerbadas. Não há ninguém, nos fuzileiros e na Marinha, que não teça os maiores elogios à actuação da FAP no teatro-de-operações da Guiné, incluindo dois dos autores, oficiais do quadro de fuzileiros e combatentes na Guiné!

A apresentação do episódio da Nebulosa, resume-se ao seguinte:

Necessidades operacionais obrigavam-me a estar em Bissau a uma certa hora, impossível de cumprir com o meio naval em que estava embarcado. Tomei pois a decisão de enviar msg para o CDMG pedindo que fosse contactada a FAP, para me ir pescar num banco de areia que, com o subir da maré, ficava completamente submerso e onde a Marinha tinha colocado recentemente uma marca com reflector para radar. Desembarquei imediatamente, sem esperar resposta para não perder as condições da altura da água. Entretanto a msg foi cifrada, telegrafada, recebida no CDMG, decifrada e o Comodoro entrou em contacto com o Cor. Diogo Neto, que sabia o porquê do pedido e que, pelos vistos, deu uma ordem ao Jorge Félix para me ir buscar. Como a marca não estava assinalada na carta geográfica – utilizei uma carta hidrográfica –, enquanto esperava pensei que era mais uma dificuldade para o piloto. Mas tinha a certeza que me iriam encontrar.

Agora veja os tempos: desde o meu desembarque até o pedido chegar ao Cor. Manuel Diogo Neto, 90 minutos, mais o tempo de voo e de busca, com a maré a encher, senti que tinha passado um século!!!

Quando me aproximei da marca para evitar um banho forçado, vi que já lá estava um náufrago – em crioulo, "irã ceco" –, que vulgarmente chamávamos de jibóia. Como não sou herpetólogo, provavelmente classifiquei mal o bicho, que tinha entre três ou quatro metros e, dado ser uma constritora, não me apetecia mesmo nada disputar terreno com ela! Pouco depois chegou o heli, que me pescou finalmente, como era esperado.

Saliento que estava desarmado, sem meios de comunicação, isolado, mas tinha tanta confiança na FAP que não pensei duas vezes. Sabia que haviam de me encontrar!

Tirei o 'brevet' na Guiné, tendo por instrutores o então Major Lino Miguel, por vezes o Cor. Neto ou o Orlando Amaral.

Já agora, agradeço ao Jorge Félix a boleia do passado e esteja certo da nossa maior consideração pela FAP, que foi o anjo guardião, dos céus dos nossos teatros-de- operações.

Melhores cumprimentos e um Abraço

G. Alpoim Calvão

---«unquote»---
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