quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 – P7452: FAP (57): Será que a cúpula do PAIGC queria ganhar a guerra? (António Martins de Matos)


1. O nosso Camarada António Martins de Matos (ex-Ten Pilav, BA12, Bissalanca, 1972/74, hoje Ten Gen Pilav Res), enviou-nos hoje, dia 16 de Dezembro, a seguinte mensagem:

Camaradas,

Aproveito para desejar a todos os camarigos um bom Natal.

Será que a cúpula do PAIGC queria ganhar a guerra?"

Isto de escrever para o blogue tem que se lhe diga, aos poucos vamos criando os nossos hábitos e raízes, por outro lado os camarigos também nos vão catalogando conforme as nossas ideias e a nossa maneira de escrever, bom, mau, rambo, realista, esquerdista, salazarista, desbocado...

Pela minha parte tenho feito os possíveis por me manter fiel ao que vivi na Guiné, contando factos e tentando justificar as minhas opiniões com coerência e sem grandes floreados ou divagações.

O que não impede de por vezes me caírem em cima, não pelo cerne da questão mas por pequenas ninharias, se disser que “quatro é igual a dois mais dois”, alguém refila, que não senhor, que a minha visão está deturpada, a verdade verdadeira é que “quatro é igual a cinco menos um”. Feitios.

Mas tenho que reconhecer que às vezes também é bom dizer umas m... sair das baias do dia-a-dia, entrar no disparate, gritar umas inconveniências, partir a louça, que a vida são dois dias e de tristezas já está o mundo cheio.

E para defender este meu ponto de vista, já lá dizia um português dos imortais que “mais vale experimentá-lo que julgá-lo”, não vos estou a dar nenhuma novidade, mesmo que nunca tenham lido o Camões já todos certamente “o experimentaram”.

Até porque tudo isto também é importante para a satisfação do nosso ego, anda por aí um alemão a ver se nos cala (o Alzheimer), qualquer dia já nem nos lembramos de como se atam os sapatos.

Tinha que dar esta introdução, um pouco longa, porque hoje resolvi pôr em cheque a minha pequenina reputação e avançar para o desconhecido... nada de factos devidamente comprovados... só suposições, bocarras de fazer tremer as paredes, só teorias disparatadas e ideias malucas.

Nesta ordem de ideias o tema que hoje proponho vai-vos dar cabo da cabeça, é um desafio ao pessoal da Tabanca, os mais nervosos que fiquem a ver a telenovela.

Dos que quiserem afrontar a coisa depois que ninguém se corte, que aqui não há pegas de cernelha, todos entram de caras, os comentadores de serviço, os ideólogos e pensadores, os estrategas, passando igualmente pelos historiadores, pelos rambos, pelos normais e anormais, os que sabem tudo e os que só sabem que nada sabem, enfim, os que passaram por terras da Guiné e que ainda gostam de pensar com as suas cabeças.

Se já estão bem instalados frente ao computador, limpem os óculos, apaguem o cigarro antes que engulam a cinza, ponham a mulher, filhos e eventuais netos com destino e preparem-se para o embate.

E a pergunta que faço é a seguinte:

Será que os políticos do PAIGC queriam ganhar a guerra?

OK, já estou a ver a vossa cara de espanto, semblante carregado e testa enrugada, surpresos, “o gajo passou-se”, “foram os cortes do Sócrates”, “ o FMI”, “ o Sporting que só lhe dá desgostos”... e por aí fora.

Tenham calma, não me julguem antes que as minhas ideias possam ser passadas ao papel e devidamente lidas e interpretadas pelas vossas mentes iluminadas.

Deixem-me explicar as minhas teorias, se no fim chegarem à conclusão que me fartei de dizer asneiras, atirem-me com um cartão vermelho directo, cartões amarelos já não me causam mossa, passei a vida a coleccioná-los.

Estão prontos? Cá vai:

O PAIGC, Partido para a Independência da Guiné e Cabo Verde tinha duas correntes de funcionamento, os guinéus a vergar a mola, de bolanha em bolanha, umas vezes emboscando, outras vezes emboscados, vida difícil…

A outra corrente, os cabo-verdianos a angariar apoios, Nova Iorque, Estocolmo, Moscovo, até foram a Roma visitar o Papa... vida difícil...

E todos eles sabiam (uns e outros) que no final, quando os portugueses se cansassem da guerra e abandonassem a Guiné, uma “outra guerra” iria começar, a luta interna pelo poder e pelas suas mordomias (parece que passados estes 36 anos ainda não acabou)!!!

Os guerrilheiros do mato, essencialmente balantas, manjacos e mandingas estariam mais que desejosos de ver o fim da guerra, eram sempre os mesmos, a fonte de recrutamento era bem escassa.

O dia-a-dia do PAIGC sempre foi incerto, por um lado conseguiam saber dos movimentos da nossa tropa quando esta saía dos quartéis, podendo assim avaliar as forças em presença e, num jogo de gato e rato, calcular se podiam ou não enfrentar-nos.

Por outro lado nunca conseguiam adivinhar para onde se dirigiam os aviões G-91 que todos os dias descolavam de Bissalanca a fim de largar uma série de bombas numa das chamadas “zonas libertadas”.

Ao contrário do normalmente apregoado, os guerrilheiros do PAIGC não podiam ser muito populares junto das populações.

Os comissários políticos iam falando de uma Guiné livre mas, para além de retórica, nada mais ofereciam, antes pelo contrário, “roubavam-lhes” os parcos víveres e levavam à força os jovens em idade de combater.

Do lado do opressor, o nosso, entre outros apoios respondíamos às suas questões através dos “Congressos do Povo”, dávamo-lhes armas para se defenderem e assistência médica H-24, por sinal bem superior à que tinham (e ainda hoje têm) os habitantes de Trás-os-Montes.

Sim, que eu deixei algumas vezes de almoçar para ir buscar uma parturiente ou um doente a Susana ou Cacine ou Buruntuma.

Que fique “clarinho clarinho” como costumam dizer os militares, a “Guiné Libertada” não passava de uma utopia, o pessoal do PAIGC tanto morria no meio da bolanha e em combate contra as tropas portuguesas como a descansar nas ditas “zonas libertadas” do Morés, Caboiana ou Cantanhês, só eram “libertadas” enquanto os portugueses não fizessem intenção de lá ir.

Como exemplo do que acabo de afirmar, o Cantanhês, dizia o PAIGC ser uma área totalmente controlada e onde até planeavam declarar a independência.

Quando em finais de 1972 Spínola resolveu reocupar aquele território e lá estabelecer 3 novos quartéis (Cafine, Cadique e Caboxanque), logo se acabou essa coisa de “zona libertada”, a população fugiu mas logo voltou, até gostou da mudança, os guerrilheiros é que tiveram que atravessar o rio Cacine em passo de corrida.

Igualmente em Setembro de 1973, quando o PAIGC declarou a independência supostamente nas terras libertadas de Medina do Bué, os intervenientes estavam num outro local, bem escondido e ao abrigo de um eventual ataque aéreo.

Certamente estariam para lá da fronteira, não podiam arriscar ser detectados e pôr em perigo a vida dos seus convidados, até porque já tinham tido essa má experiência.

No ano anterior e durante a visita de uma delegação da ONU, tinham passado as passas do Algarve para se safar da enrascada, com os pára-quedistas no seu encalço.

Por outro lado e ao contrário do que normalmente consta, o PAIGC não era bem recebido no Leste da Guiné, já que os fulas nutriam uma maior simpatia pelos portugueses.

No Bué e por mais que procurássemos naquelas terras desérticas nada encontrámos que pudesse indicar a preparação de uma cerimónia.

Comparando as fotos tiradas na altura com as de tempos anteriores tudo continuava igual, sem o mais pequeno vestígio de qualquer movimentação.

Não contentes com as fotos, os nossos amigos Páras ainda tinham ido ao local, dar uma mirada, não enxergaram nem vivalma, tudo continuava como havíamos deixado.

Na eventualidade de ainda aparecer alguém por aquelas paragens, acabámos por lá deixar uma prenda, uma daquelas louças típicas das Caldas (não é gozo, é a mais pura das verdades, há fotos a comprovar).

Não sei se os camarigos sabem mas nós dispúnhamos de cobertura fotográfica de toda a Guiné, renovando-a periodicamente e assim descobrindo as diferenças existentes entre fotos tiradas no mesmo local mas em tempo diferente, trilhos, tabancas, machambas, cambanças...

Este reconhecimento fotográfico era maioritariamente feito pelo avião Dakota e posteriormente interpretado por uma equipa especializada da Base.

Os voos do Dakota até acabaram por ficar registados em filme, conforme aparece na série “ A Guerra” do jornalista Joaquim Furtado, na área do Morés vê-se de súbito a população da dita “área libertada” a refugiar-se por causa da aviação.

E por entre a folhagem das árvores lá se vê passar o pachorrento Dakota, nada de agressivo, tão só a fazer umas fotos.

Todo este palavreado para chegarmos à conclusão de que a Força Aérea seria a principal causa do desconforto do PAIGC.

Para se furtarem aos G-91, Heli-canhão, T-6 e até por vezes o DO-27 com foguetes nas asas (ideia bem parva de um qualquer iluminado), só para lá das fronteiras é que podiam garantir o estar em segurança e sem receio de serem bombardeados.

Passo seguinte, se a FAP era o calcanhar de Aquiles, como a neutralizar?

Lá chegamos aos STRELAs e aos MIGs.

Dos STRELAs já aqui se falou inúmeras vezes, asseguraram os comissários políticos à população que nunca mais seriam bombardeados e, no entanto, nunca e em tão curto espaço de tempo tantas bombas caíram sobre as suas cabeças.

Algumas dessas equipas de mísseis fora mesmo pulverizadas pois, ao dispararem da orla da mata, acabaram por permitir o referenciar das suas posições.

Constou-nos igualmente que algumas das equipas dos STRELAs acabaram por ser averbadas pela própria população, descontentes com as promessas entretanto feitas e não cumpridas.

Com os MIGs foi uma outra história, agora é que ia ser... ia do verbo ir... nunca ninguém os viu e nunca nada aconteceu!!!

E pronto, não conseguiram descortinar mais nada, soluções esgotadas.

É neste ponto que chegamos ao vértice da questão.

Então não havia outras maneiras de tentar aniquilar a FAP?

Deixem-me por momentos envergar a camisola do PAIGC e planear medidas contra os Tugas:

MEDIDA 1

Todos os dias e sempre à mesma hora (19:00), um autocarro Mercedes tipo TP21 saía da Base de Bissalanca em direcção a Bissau, transportando os pilotos que quisessem ir jantar ao Pelicano ou Solar do Dez, ou às ostras...

Quantos pilotos seguiam no autocarro?

Umas vezes 8, ou 13, ou 17, dependia da qualidade do jantar na base, carne ainda a coisa aguentava, se fosse peixe dava um autocarro cheio.

E todos os dias à mesma hora (21:00) o autocarro regressava à Bissalanca.

O local para um possível encontro, a estrada entre a Base da Bissalanca e o quartel mais próximo, uma recta de uns bons dois quilómetros de completa escuridão, tabancas de um lado e do outro.

Agora imaginem 3 guerrilheiros devidamente fardados de paisanos e uma bazuca, um deles a ver se o autocarro vinha cheio, caso contrário adiava-se a coisa para o dia seguinte, outro a municiar e outro a apontar e disparar.

E no fim até podiam deixar a bazuca de prenda e ir comemorar o resto da noite ali ao Pilão, era bem perto.

Já perceberam porque razão comprei uma moto?

MEDIDA 2

Eu e a maioria dos pilotos de G-91 morávamos em Bissau.

Por vezes acontecia que, já noite cerrada, alguém me batia à porta.

Abria-a com a mesma ligeireza com que abro a porta da Pensão Montanha quando vou ao cozido da Dona Preciosa.

Uma das vezes apareceu-me um jovem africano a pedir dinheiro para livros de francês, disse ele “quando vocês forem embora o francês passa a ser mais importante que o inglês”, o rapazito até sabia de política internacional.

Imaginem, se em vez do estudante aparecesse o...

MEDIDA 3

Que raio de ideia quererem MIGs, isso era material demasiado caro.

Receita bem mais económica, uma avioneta das mais vulgares, daquelas que não custavam mais que o Mercedes do delegado do PAIGC em Nova Iorque, um piloto (dos mercenários do Nigéria/Biafra, não eram caros), um voluntário para fazer de ajudante e uma caixa de granadas.

Descolagem ao entardecer, de Ziguinchor ou de Boké, navegação calma e suave com o apoio das luzes dos quartéis dos tugas, evitar a Base Aérea que tem antiaéreas, chegada a Bissau já de noite, largada da carga uma a uma, alvos preferenciais, os depósitos de combustível da SACOR, o CG, o Palácio, o Solar do Dez... o granel na cidade.

E se não tivessem granadas, podiam largar tijolos que o efeito seria muito semelhante, os voos da TAP para Lisboa esgotavam-se nos meses seguintes.

Sem me querer alargar mais, qualquer destas três medidas podia acabar rapidamente com a guerra.

Tudo o que acabo de dizer tem um denominador comum que dá pelo nome de “Terrorismo Urbano”, utilizado no Vietname, Argélia, Cuba, País Basco... enfim, em todos os locais onde a vontade da população em correr com o opressor é grande.

Por que razão nunca aconteceu na Guiné?

Alguém sabe?

Será que os guinéus em Bissau se sentiam bem com os portugueses ou, pelo contrário, queriam ver-nos pelas costas?

E as populações do mato?

E a população de uma tabanca da qual já não me lembro o nome, onde fui buscar um jovem a quem os curandeiros da aldeia já nada sabiam o que fazer para o salvar, e que, duas semanas depois, tive o privilégio de voltar a devolver à tabanca, fresco que nem uma alface e já sem o apêndice.

Alguém acredita que aquela população nos queria ver pelas costas?

E havendo tantos cabo-verdianos no PAIGC por que razão não havia terrorismo em Cabo Verde? E nos Bijagós?

Vão-me responder que era por serem ilhas? Bah, que falta de imaginação!!!

Então os pensamentos e vontades do PAIGC eram alimentados pelo povo local ou tinha a ver com coisa importada?

Terá sido por isso que já depois do 25 de Abril e nas cerimónias de entrega de vários quartéis, grande parte dos guerrilheiros só falava francês?

E todos estes nossos camarigos que nos dias de hoje vão à Guiné e são recebidos de sorrisos abertos, será que ainda não perceberam que eles sempre gostaram de nós?

Estas e outras questões seriam interessantes para conversar com os nossos amigos, os antigos membros do PAIGC.

Perguntas que provavelmente ficariam sem respostas pois que, passados todos estes anos e apesar de um franco diálogo (dizem), continuamos sem conseguir saber como foram os acontecimentos vistos do seu lado.

Como resultado da democracia por lá instalada, os nossos amigos afectos ao PAIGC leram todos pela mesma cartilha, a versão oficial diz que para eles só houve vitórias sobre vitórias, esquecendo algo importante, que as derrotas também podem ajudar a unir um povo.

E se alguém duvida destes comportamentos, basta ler as últimas páginas do livro do Cor Calheiros “a Última Missão”, contêm um depoimento do Comandante Manuel dos Santos, “Manecas”, Comissário Político da Zona Norte.

Neste texto e a propósito da operação dos Comandos Africanos a Cumbamori, afirma que o que é relatado pelos nossos militares, o armamento e os paióis destruídos, as baixas sofridas, tudo isso não passou de pura fantasia e que a operação Ametista Real em nada os afectou.

Nós reconhecemos termos tido inúmeras baixas, eles zero, nicles, null, népia...

Enfim, opiniões!

Em resumo, andámos nós e eles (os militares) a peneirar anos e anos pelos buracos da Guiné enquanto que nós e eles (os políticos) andaram a sofrer as agruras da guerra pelas salas de conferência dos Hotéis de 5 estrelas.

O 25 de Abril acabou por mudar as variáveis.

Para os militares (os portugueses e os balantas, manjacos e mandingas) significou o fim dos combates, nós fartos, rodávamos a tropa de dois em dois anos, eles bem pior, eram sempre os mesmos.

Para os políticos foi o fim de muita coisa.

Do nosso lado uns partiram para um exílio dourado, enquanto outros regressaram de um exílio dourado.

Para os nossos políticos o trabalho seguinte foi fácil, independência para todos já, quer queiram quer não queiram.

E foi o que se viu, até os que não queriam ser independentes (S. Tomé) tiveram que se chegar à frente.

Aos políticos do PAIGC a transição foi bem mais difícil.

A partir desse dia tiveram que regressar à Guiné, deixaram o papel de “Executivos” e passaram verdadeiramente a arriscar a vida, tentando passar por entre as gotas da chuva, sobreviver aos vários “ajustes de contas”, aos golpes e contragolpes, até só sobrarem os “Eleitos”.

Passada essa fase má (já passou?) o democrata Nino Vieira lá acabou por correr com os políticos cabo-verdianos do PAIGC e, de golpe em golpe, a Guiné lá se tem conseguido transformar em país charneira para o tráfico de droga.

E os políticos que sobreviveram a tudo isto, devem andar a pensar:

“Estávamos tão bem sem termos que ganhar a guerra...”

Um abraço,

António Martins de Matos

Ten Pilav da BA12

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Nota de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

1 de Dezembro de 2010 >

Guiné 63/74 – P7366: FAP (56): MIGs, MIRAGEs e miragens (António Martins de Matos)

Guiné 63/74 - P7451: O Nosso Livro de Visitas (104): Camaradas da Guiné (Domingos Santos)


1. O nosso Camarada-de-armas Domingos Santos, da CCAÇ 1684 do BCAÇ 1912 - Susana e Varela -, MAI67 a MAI69, enviou ao nosso Camarada Luís Graça, em 15 de Dezembro de 2010, a seguinte mensagem.
Camaradas da Guiné
É com enorme alegria que ao ver camaradas da Tabanca Grande a relatar episódios passados na Guiné, e em especial em Susana e Varela que foi onde estive, já lá vão uns bons quarenta e três anos, pois estou a falar nos anos de 67-69.
Como ao longo destes últimos anos não tive grande tempo para aprender esta nova tecnologia dos computadores, agora como reformado arranjei esse tempo para aprender e assim pesquisar coisas bastante interessantes.
Vi aqui também que o camarada Pepito também passou por Susana e Varela, pois vi fotos do quartel lá de Susana enviadas penso eu por ele e também artigos onde fala dos Felupes e seus costumes.
É sempre bom haver alguém que fale destes acontecimentos, para que fique para os nossos netos relatos do que nós passamos na guerra de África.
Também tenho imensos casos passados na minha permanência na Guiné, que um dia relatarei, mas só quando dominar melhor esta tecnologia.
Um grande abraço para todos os camaradas, em especial os que passaram por Guiné.
Do Camarada Combatente
Domingos Santos
2. Gostávamos de transmitir ao Domingos Santos que já mandaram mensagens para o blogue os seguintes Camaradas e familiares de Camaradas nossos do BCAÇ 1912:

- O nosso camarada Júlio César Ferreira (ex-1º Cabo, CCAÇ 2659/BCAÇ 2905, Guiné 1970/71), em 9 de Março de 2010, procurou saber notícias do ex-1º Cabo Manuel Silva Ferreira da CCAÇ 1684;
- A amiga Lídia Gonçalves (filha de José Manuel Costa Gonçalves. Ex-1º Cabo Mecânico Auto Rodas da CCAÇ 1685 - Os insaciáveis), procurou notícias de seu pai falecido em 12 de Agosto de 2009;
- O nosso Camarada Aires Ferreira (ex-Alf Mil da CCAÇ 1686);
- O nosso Camarada Mário de Oliveira (que foi Alf Mil Capelão) e é conhecido como o Padre Mário da Lixa;
- O amigo Sérgio Nunes Rodrigues de Oliveira, filho do nosso Camarada Reinaldo de Oliveira Pereira (ex-Sold Condutor da CCAÇ 1686), em busca de Camaradas de seu pai.
3. Resta-nos, em nome do nosso Camarada Luís Graça, Editores e demais tertulianos desta Tabanca Grande, enviar ao Domingos Santos o habitual convite para se juntar às nossas fileiras, enviando-nos pelo menos um texto contando-nos um episódio e fotos do seu tempo de comissão.
Emblemas de colecção: © Carlos Coutinho (2010). Todos os direitos reservados

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Guiné 63/74 - P7450: Em busca de... (151): Augusto Pereira, hoje professor, natural de Bissorã, djubi no tempo da CART 1746, 1967/69 (Manuel Moreira)


1. Mensagem de Manuel Vieira Moreira** (ex-1.º Cabo Mec Auto da CART 1746, Bissorã, Ponta do Inglês e Xime, 1967/69), com data de 15 de Dezembro de 2010:

Amigo Carlos Vinhal,
Gostaria que publicasses esta história no nosso Blog se assim o entenderes.

Um Abraço
Manuel Moreira


Quando a CART 1746 esteve em Bissorã, a Secção Auto estava deslocada da Companhia, pois funcionava num Barracão/Oficina junto à saída para a mata. Aí, os Mecânicos ocupavam uma dependência ao fundo que servia de quarto habitacional. Vários miúdos,  djubis, vieram oferecer os seus préstimos para nos ajudar nas nossas tarefas, como sendo: chegar ferramenta, lavar peças e, consequentemente, tratar da limpeza das instalações.

Dos vários que se apresentaram, a escolha foi para um que, pela sua inteligência e capacidade demonstrada, nos satisfez.

Esse miúdo, que na altura tinha talvez 7 ou 8 anos, chama-se Augusto Pereira.

A CART 1746 esteve em Bissorã de finais de Julho de 67 a início de Janeiro de 68, por isso, pouco tempo mas o suficiente para ver o Augusto chorar profundamente com a nossa saída.

Em 1983, por altura das férias escolares, se não estou em erro, fui numa noite a casa do meu Amigo Lúcio, também ex-combatente na Guiné, que toca viola e me acompanha quando canto,  para cantar uns fados e beber uns copos e, quando chego ao Bar onde já se encontravam algumas pessoas, vejo, de viola nas mãos, um rapagão de cor negra que me fez estremecer.

Volto para trás para perguntar ao Lúcio quem era. Respondeu-me que era um aluno que estudava em Aveiro com a irmã e que o trouxe para trabalhar numa Cerâmica e ganhar algum dinheiro.

Regresso ao Bar, dirijo-me a ele e pergunto-lhe de onde é ao que me responde, Guiné. Qual a localidade, ao que me disse, Bissorã.

Eu não estava a acreditar e perguntei-lhe o nome e a resposta foi:
- Sou o Augusto,  nosso Cabo Moreira.

Matámos saudades.

Passados alguns dias levei-o a jantar em minha casa, numa noite chuvosa e escura pois o temporal havia derrubado árvores para cima das linhas eléctricas o que nos deixou sem luz várias noites em Aguada de Cima e fomos obrigados a usar os arrumados candeeiros a petróleo.

Fi-lo sentar à mesa entre a minha filha e o meu filho, já crescidos, e não se dava pela sua presença devido à pouca luz, apenas se viam os olhos e os dentes a reluzir.

O Augusto andava a estudar para alcançar objectivos. O Augusto é Professor. Em 1984 trabalhou em Bula e foi transferido para Bissau, para o Departamento de Formação e Superação de Professores do Ministério da Educação e Desporto.

Já passaram alguns anos sem saber do Augusto. Se o Augusto tiver acesso a esta história, gostaria que entrasse em contacto comigo.

Manuel Moreira

Secção Auto > Eu sentado no guarda lamas esquerdo e, não tenho certeza, o Augusto.

Saída de Bissorã > Eu de pé na primeira viatura com a mão no ombro

Desfile em Bissorã > Eu à frente, ao centro
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 18 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6179: Convívios (132): 7º Convívio da CART 1746 (Manuel Vieira Moreira)

Vd. último poste da série de 15 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7443: Em busca de... (150): Pessoal do BENG, Bissau, 1966/68 (Jorge Picado / José Manuel Bastos Cachim)

Guiné 63/74 - P7449: O Mural do Pai Natal da Tabanca Grande 2010 (3): Que ricas prendas, Giselda & Miguel...



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Nota de L.G.:


Guiné 63/74 - P7448: O Mural do Pai Natal da Tabanca Grande (2010) (2): Mensagem de Natal (Felismina Costa)

1. Mensagem da nossa amiga tertuliana Felismina Costa* com data de 15 de Dezembro de 2010:

Mensagem de Natal

Caro Professor Luís Graça
Editor e amigo Carlos Vinhal
Editor Magalhães Ribeiro
Editor Virgínio Briote
Humberto Reis (cartógrafo-mor)
Caros Tertulianos e amigos deste imenso Blogue.

Há cerca de dez meses que aportei ao blogue de “Luís Graça e Camaradas da Guiné” na sequência da minha autobiografia, que escrevia na altura. Pretendendo falar de acontecimentos relevantes da minha juventude, referi entre outros a guerra do Ultramar, e, muito naturalmente escrevi no Google, Guerra da Guiné, na procura de informações precisas. Perante os meus olhos surgiu este blogue ao qual me dirigi, perguntando a medo, se alguns dos senhores conheceria por acaso, um senhor de nome Hélder Martins de Matos de quem eu tinha sido madrinha de guerra entre 63/64.

O Carlos Vinhal respondeu-me prontamente, e o José Marcelino Martins, sempre disponível, foi inexcedível na procura de informação, através da qual consegui o contacto do referido senhor (que ainda não conheço).
Por Convite fiquei, e permaneço encantada.

Quero dizer-vos que, ao longo destes meses, tenho procurado absorver informação desse tempo que motiva a existência deste blogue, e que sempre me interessou, por ser um acontecimento que marcou a minha geração/a nossa geração, da forma que aqui é retratado.

Quero agradecer a todos quantos participam e me dão o prazer de ler coisas espantosas de amizade, de solidariedade, de descrição do Teatro de Guerra, de reencontros, de conhecimentos e da vossa cultura, que muitas vezes me deixam verdadeiramente encantada.

Cresci rodeada de homens: avô, pai, tios, irmãos, depois namorado, marido, filhos e neto. Fui sempre acarinhada por todos. Isto, para vos dizer, que é um prazer estar entre vós.
Sinto por todos um carinho muito especial, como se fossem todos meus irmãos.
Alguns destacaram-se mais pela proximidade da origem, quase conterrâneos, e fazem o favor de me tratarem por amiga. Sou concerteza, uma amiga incondicional, agradecida e orgulhosa.

O tempo foi passando e estamos a viver mais uma quadra Natalícia.
Quero desejar a todos, independentemente da religião de cada um,
Um tempo de Paz, de união, de tolerância e de fraternidade, de que tantos de vós, deram e continuam a dar provas.
Quero dizer, que vos admiro, que partilho as vossas alegrias e tristezas, que vos desejo e às vossas famílias, as maiores felicidades.
A Quadra para mim sempre primou pela reunião das famílias, que com o decorrer dos anos se vão muitas vezes perdendo ou dividindo, mas, na nossa lembrança vão ficando os momentos vividos.
Cada ano que passa, trás e leva boas e más recordações.
Momentos de alegria que perdura.
Saudade do passado.
Tristezas que queremos esquecer.
Projectos que queremos ver concretizados.
E, é nesta miscelânea de sentimentos e desejos, que a vida acontece.
Obrigada por terdes partilhado comigo este ultimo ano.

Permito-me enviar um poema que ofereci aos meus no Natal de 68.

É Natal!

Ponho a mesa só para três
Como se a ela se sentassem todos!
Como se à volta desta mesa estivessem…
Os que já não voltam…
E os presentes, que se ausentam temporariamente:
Estão comigo todos!
E, num prazer que descrevo
Transformo a ausência em presença que fica.
Que fica comigo,
Em rostos, palavras, lágrimas e risos…
Em gestos que não olvidei
Em palavras que jamais esqueci
Em lágrimas de alegria que chorei
Em risos felizes, puros, sentidos
Em rostos ausentes, presentes e fixos
Na minha memória
Aonde estão vivos.
E, assim perpétuo o Natal da vida.
Da minha vida
Dos que já partiram
Dos que vamos estando!
E, num abraço grande
Onde cabem estórias, tempo, memórias
Eu reúno hoje… as recordações de 60 anos!
Com eles e convosco, as vivi e vivo.
E, quando eu partir
Sei que aqui deixo
Quem seja capaz
De continuar a contar as histórias
De que também fiz parte:
Efémera a vida, é para viver plena, alegre e sentida.
Mas, nessa alegria, cabe a emoção
E a comoção com que é vivida.

Felismina Costa
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(*) Vd. poste de 4 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7380: Blogpoesia (92): Sinfonia (Felismina Costa)

Vd. primeiro poste da série de 15 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7441: O Mural do Pai Natal da Tabanca Grande (2010) (1): Querido Pai Natal... (Albino Silva, CCS/BCAÇ 2845, Teixeira Pinto, 1968/70)

Guiné 63/74 - P7447: Blogpoesia (96): Contrato com o Exército (Manuel Maia)

1. Mensagem de Manuel Maia* (ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74), com data de  14 de Dezembro de 2010:

Caro Carlos,
Aqui vão umas fresquinhas.

abraço
manuelmaia


CONTRATO COM O EXÉRCITO

Marmita de alumínio reluzente,
que leva o mau "conduto" e sopa quente,
lavada é logo após a refeição...
Na guerra Cantanhez, com tudo errado,
senti-me figurante algo enganado,
num filme série B de mau guião...


Contrato então firmado (ai se era agora...)
p`lo Estado regulado, sem demora,
impunha vinte e quatro horas/serviço...
Dinheiro p`ra uns copitos e tabaco,
diária a trinta escudos, em buraco,
e fogachal do IN sem sumiço...

É certo que houve casos mais marcantes
que o nosso, meros bandos figurantes,
no bem-bom d`aramadas posições...
Que o diga AB, herói tão esforçado,
sujeito a falhas de ar condicionado,
aquando da investida a refeições...

Nos bolsos da camisa camuflada,
latinha "coração", bem arrolhada,
e pano de flanela/polimento...
Nas calças, palha d`aço e detergente,
repõem brilho bem resplandecente,
à lataria exposta "no evento"...

Contrato pela malta foi cumprido,
no tabaco e no álcool consumido,
o curto patacão, dito ordenado...
Dois anos média o tempo/comissão,
Falharam só chefias da Nação,
ao impedir ao tropa ser tratado...
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 11 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7421: Blogpoesia (95): Malefícios da água não potável (Manuel Maia)

Guiné 63/74 - P7446: Blogando e andando (José Eduardo Oliveira) (11): Os Pequenos Nadas da vida

1. Mensagem do nosso camarada José Eduardo Oliveira* (JERO) (ex-Fur Mil da CCAÇ 675, Binta, 1964/66), com data de 14 de Dezembro de 2010:

Meu Caro Amigo Luís

Com a aproximação do Natal queria dar-te uma prova de respeito e amizade. Ou vice-versa.

Voltar ao "Blogando e andando", que comecei no nosso blogue com o teu "alto patrocínio", é simbolicamente essa prova. É raro o dia em que não me surpreende a força e dinamismo do nosso blogue. É simplesmente notável.

Nos últimos tempos devido ao envolvimento pessoal que tenho no jornal da terra não tenho tido tempo para nada. Depois... estou metido em dois livros. Um está pronto - falta apenas inseriras imagens - e outro se seguirá.

Quando se chega aos "setenta" sentimos que o tempo nos pode faltar e alguma ansiedade nos assalta para "deixar" testemunhos... antes que seja tarde...
Estou nessa fase.

Alguma remorso me acompanha por não ter mais tempo para colaborar no nosso blogue mas espero que o Editor e seus colabores mais próximos me possam perdoar...

Entretanto é tempo de votos. Para ti e para os teus votos de um Feliz e Santo Natal.

Um abraço fraterno de Alcobaça,
JERO

PS-Segue um pequeno texto com o simbolismo dos "pequenos nadas" que fazem a diferença na vida.Digo eu.


BLOGANDO E ANDANDO (11)

OS ”PEQUENOS NADAS” DA VIDA…

O Pedro, um jovem de 13 anos, acompanhava habitualmente o pai nas idas à taberna da aldeia.

Vivia numa zona rural e depois da “escola” ajudava nas tarefas caseiras. Na fazenda, que circundava a casa dos seus pais e avós, pegava na sachola ou no ancinho dia sim, dia sim e ia aprendendo o que a vida custa. Os trabalhos agrícolas eram duros e as idas à taberna com o seu pai eram sempre momentos bem-vindos.

Fascinavam-no as conversas do seu pai com os mais velhos, nomeadamente, quando essas conversas evocavam recordações da guerra do Ultramar. Se tentava meter a sua “colherada” não lhe davam grande atenção. Era ouvir e calar. Quando o seu pai bebia o seu copo de vinho soltava um “ah” de satisfação, que parecia ficar a pairar algum tempo no ambiente acolhedor da taberna. “Ouvia-se” o silêncio entre conversas dos amigos de seu pai.

Aqueles “aaahh” de satisfação eram momentos “únicos”… Pareciam fazer parte de um ritual monástico, salvaguardadas as devidas proporções. Quando o pai esvaziava o copo e batia com ele, já vazio, no balcão o “aaahh”, já tantas vezes ouvido, surpreendia sempre o Pedro que seguia com olhar o momento de prazer do seu pai. Que bom devia ser beber um copo. Quando é que ele teria direito a um “aaahh”!?

O tempo ia passando e o Pedro um dia atreveu-se a pedir ao pai:

- Quando é que eu posso beber um “aaahh”?

O olhar que o seu pai lhe deitou antecipou a resposta que bem lhe custou a ouvir:

- Ainda és muito novo para um “aaahh”.

Passou o Verão, chegou o Outono e o Pedro pensou que já tinha acumulado “créditos” para mais um pedido. E num dia em que tudo tinha corrido especialmente bem nos trabalhos da escola e da fazenda arriscou:

- Oh pai, quando é que eu posso beber um “aaahh”?

Teve direito a mais resposta negativa mas, desta vez, pareceu-lhe que o Pai tinha feito um compasso de espera antes de proferir o “não”. Saiu chateado da taberna e voltou sozinho para casa.

No dia seguinte o Pedro fez mais uma tentativa.

- Oh Pai quando é que eu…

Para sua surpresa o pai disse para o taberneiro.

- Oh Grazina dá lá um copo ao rapaz.

Pareceu-lhe que tinha havido um piscar de olhos entre ambos mas… o seu copo finalmente “aterrou” no balcão.

O Pedro pegou-lhe com o coração a palpitar e com os olhos a brilhar preparou-se para soltar o seu primeiro “aaahh”.

Bebeu o primeiro golo e arrepiou-se todo. Soltou um “iiiihh” prolongado… Tentou um segundo golo e o seu “iiiiiiihhh” foi ainda mais prolongado. Olhou para o copo com asco… e sentiu a mão do pai nas suas costas.

- Como vês ainda não tens idade para um “aaahh”.

O Pedro teve que reconhecer que sim e saiu para a rua para apanhar ar. O pai ficou um pouco trás e, bem disposto, disse ao Grazina:

- Eh pá não poupaste no vinagre. Fico-te a dever uma.

Só muito mais tarde o Pedro soube da “marosca” e... percebeu como o seu Pai tinha sido sábio.

De facto o vinho não deve ser bebido por gente nova… e que há idade para tudo…

Esta história é verdadeira e passou-se numa freguesia perto de Alcobaça.

Infelizmente os pais dos miúdos da cidade nem sempre têm tempo para estar tão presentes nas vidas dos seus filhos. Nomeadamente nas suas saídas nocturnas, quando consomem “aaahh’s” antes de tempo…

Os tais “pequenos nadas” da vida que podem vir a fazer toda a diferença!

É ou não “eeehh”!?
JEROOO…
__________

Notas de CV:

(*) Vd. poste de 8 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7246: (Ex)citações (107): Mininus di praça e “O Fascínio” (José Eduardo Oliveira)

Vd. último poste da série de 26 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6899: Blogando e andando (José Eduardo Oliveira) (10): Revisitando o passado de Alcobaça, dos anos 40, na Tabanca de São Martinho do Porto

Guiné 63/74 - P7445: Operação Tangomau (Álbum fotográfico de Mário Beja Santos) (4): Dia 22 de Novembro de 2010

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Dezembro de 2010:


Meus queridos amigos,

Se bem que eu tivesse preparado para as emoções, foi um dia tumultuoso, ninguém regressa às origens sem um estremeção.

Falei com os professores de Bambadinca, visitei a escola da missão, encontrei gente que fez questão de se anunciar: “Chamo-me João Coré Baldé, do Pel Caç Nat 54". Quando acabei esta visita a Bambadinca, estava sem fala.

Da parte da tarde, foi tudo muito mais ameno, estive em Samba Juli e em Fá.
Depois eu vou contar.

Um abraço do
Mário  [, foto em cima, à direita, Bambadinca, 1970]


OPERAÇÃO TANGOMAU - ÁLBUM FOTOGRÁFICO (4)

DIA 22 DE NOVEMBRO DE 2010


Antes de pedir autorização para entrar no quartel a visita que o Tangomau efectuou na companhia do tenente-coronel Seco Mané, decidiu ir ver a rampa que dá acesso à tabanca de Bambadinca. Imprevistamente, desatou a chorar, a rampa da sua vida transformara-se numa inclinação de terra, com gretas que se aprofundam na época das chuvas.

A nova estrada que vem da Bantajã, que flanqueia a bolanha de Finete, alterou profundamente a relação espacial de Bambadinca e o Bambadincazinho. Agora a estrada alcatroada sobe em paralelo a esta rampa em vias de extinção, só frequentada pelas crianças que vão para a escola, junto ao rio, ou outros passantes que habitam perto, por exemplo junto da antiga casa do comerciante Rendeiro.

A rua principal de Bambadinca vai-se desmoronando, já caíram a loja do José Maria Tavares, os armazéns da Casa Gouveia e Ultramarina. Veremos noutra fotografia um outro interior de armazém em derrocada. Questiona-se, em todas as circunstâncias, o que é que leva um país paupérrimo a não reaproveitar edifícios que tinham solidez, que podiam ter sido aproveitados para habitação, por exemplo. O Tangomau subiu e desceu esta rampa vezes sem conta. Em sinal de penitência, desceu até ao edifico dos CTT que também fotografou, e a seguir dirigiu-se ao quartel. De facto, o Exército guineense tem aqui o seu quartel .


Trata-se de um local mágico para o Tangomau. Era aqui que se tentava falar para Lisboa. A porta e as janelas estavam sempre abertas. Atendia a D. Leontina, uma gentil senhora com quem se apalavrara o dia e a hora para telefonar para Lisboa. De todos os edifícios em derrocada, este é o que ainda está em melhor estado.


Aqui o Tangomau foi-se definitivamente abaixo, começou a uivar, primeiro um choro morno, umas lágrimas de fel e saudade. Há fotografias suas nesta sala, não havia luxos, havia o indispensável para se estar sentado, uns sofás com napa, cadeiras e bancos. Havia um balcão e bancos. O que se vê é o aviltamento.

O tenente-coronel Seco Mané pedia: “Não chora, não chora, senão eu também chora!”. O Tangomau justificou-se: “Deixe-me chorar, o meu choro chama-se melancolia, tristeza e aflição pela maneira como os senhores tratam o património. Nesta porta entrei em dias de tormento e aflição, por esta porta vi matar a fome e a sede. Este espaço é um lugar importante da minha vida. O que mais me dói é estar irreconhecível, aos meus olhos e aos seus olhos. Choro não pelo passado mas pelo presente, Sr. tenente-coronel”. E continuei a cirandar pela messe.


É o que resta da messe de oficiais. Oxalá tivesse sido um tornado, uma fúria da natureza que os homens não pudessem suster. Mas não, o que se avista é pura destruição, o abandono de equipamento que podia estar ao serviço daquela comunidade. Aqui se comia, se jogava às cartas, havia quem se sentasse a escrever e a conversar. Não se faz esta maldade a um aprazível espaço de convívio. E o Tangomau continuava a chorar e o Sr. tenente-coronel replicava: “Não chora, não chora, senão eu também chora!”.


Era aqui que o soldado Simões dava a última demão à comida, antes de a trazer para a sala de jantar. Aqui se faziam ovos estrelados e alguns acepipes. Aqui a Sr.ª D. Maria Alzira Pimentel Bastos frigiu rissóis, dando um pontapé na rotina da chamadas ementas da tropa. Resta este buraco, este abandono. O Tangomau só se interrogava para onde fora o equipamento de cozinha onde, outrora, se tinham operado milagres de improvisada culinária.


Na companhia do tenente-coronel Seco Mané, o Tangomau foi percorrendo o corredor do edifício dos oficiais, porta a porta: indicava o quarto do tenente da secretaria, do médico, dos oficiais de transmissões e das viaturas, ali era a casa de banho, logo a seguir o seu quarto. O que ia vendo era, pura e simplesmente, falta de manutenção, desleixo. Mas quando chegou à casa de banho foi-se abaixo…


Arrancaram os lavatórios e as sanitas, os duches estão imprestáveis. Isto não é uma casa de banho, é uma habitação assombrada, andou por aqui um demente com sanha destruidora. Esta casa de banho era funcional, tinha conforto e comodidade. O Tangomau voltou 40 anos atrás, reviu mentalmente tudo quanto ali existia, o descalabro actual, tal como ele o entendeu, era um insulto à civilização e não aos militares portugueses que usavam este espaço de higiene e asseio. A comoção maior sobreveio na visita seguinte, à messe de oficiais.


É o que resta da porta de armas virada para os dois itinerários principais, Xime à direita e Xitoli à esquerda. A pista de aviação desapareceu, foi ocupada com a extensão do Bambadincazinho. Neste ângulo, é como se nos dirigíssemos para o quartel, para a escola, para a casa do chefe de posto, para a mãe de água, para a capela. Ao fundo, mesmo ao fundo, desapareceu a porta de armas que dava acesso à rampa.


Uma boa parte das instalações militares estão ainda de pé. Quem jogou à bola pode recordar as instalações por detrás. Entretanto, o Bambadincazinho vai investindo, na mais perfeita anarquia.


As irmãs franciscanas recuperaram a capela. Aqui entrei, com o pulso acelerado. Foi quando vi a fotografia que o Humberto Reis tirou, há mais de 10 anos, que me decidi a voltar à Guiné, como aconteceu, escrevendo a história da minha comissão militar. Sempre que podia, vinha aqui à missa, aqui depositei os nossos mortos. Não se chegava nem se partia de Bambadinca sem olhar a capela, até mesmo em frente se formavam as colunas de abastecimento que iam até ao Xitole.


A antiga escola de Bambadinca, hoje inoperacional. Vim aqui visitar a professora, que me emprestava livros e documentos. Era muito agradável ouvir o gralhar das crianças no interior do quartel. Ali ao pé, a mãe de água apareceu. A casa do chefe de posto está recuperada, vive lá a autoridade política.


Outro local mítico para o Tangomau e a sua equipa. Havia aqui um cais tosco, duas canoas e um canoeiro muito amigo, Mufali Iafai. Do outro lado, o princípio ou o termo da bolanha de Finete. O Tangomau ficou especado a olhar para o tempo parado, removida a importância do lugar, a própria bolanha de Finete já não é o que era. Amanhã vai recomeçar o seu dia neste ponto, rever o porto que teve uma actividade febril, vai procurar os seus últimos vestígios. Foi tal a comoção do dia que até irá conversar com um pescador vindo do Mali quanto custa levá-lo de canoa até Mato de Cão. Discutiu-se o preço, mas a viagem não se fez. Só que a viagem nunca acaba – e o entusiasmo do viajante também não.

Fotos: © Mário Beja Santos (2010). Direitos reservados.


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Espectacular vista aérea do aquartelamento, tirada no sentido leste-oeste, ou seja, do lado da grande bolanha de Bambadinca (vd. mapa da região)

Reconstituição feita, de memória, por Humberto Reis, Luís Graça e Gabriel Gonçalves (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71):

(i) Do lado esquerdo da imagem, para sul, era a pista de aviação (1) e o cruzamento das estradas para Nhabijões (a oeste), o Xime (a sudoeste) e Mansambo e Xitole (a sudeste);

(ii) Vê-se ainda uma nesga do heliporto (2) e o campo de futebol (3);
(iii) A CCAÇ 12 começou também a construir um campo de futebol de salão (4), com cimento roubado à engenharia nas colunas logísticas para o Xitole;

(iv) De acordo com a fotografia, em frente, pode ver-se o conjunto de edifícios em U: constituía o complexo do comando do batalhão (5) e as instalações de oficiais (6) e sargentos (8), para além da messe e bar dos oficiais (8) e dos sargentos (9);

(v) Apesar do apartheid (leia-se: segregação sócio-espacial) que vigorava, não só na sede dos batalhões, como em muitas unidades de quadrícula, uns e outros, oficiais e sargentos, tinham uma cozinha comum (19);

(vi) Do lado direito, ao fundo, para norte, a menos de um quilómetro corria o Rio Geba, o chamado Geba Estreito, entre o Xime e Bafatá;

(vii) O aquartelamento de Bambadinca (e posto administrativo do concelho de Bafatá) situava-se numa pequena elevação de terreno, sobranceira a uma extensa bolanha (a leste); são visíveis as valas de protecção (22), abertas ao longo do perímetro do aquartelamento que era todo, ele, cercado de arame farpado e de holofotes (24); a luz eléctrica era produzida por gerador...

(viii) Junto ao arame farpado, ficavam vários abrigos (26), o espaldão de morteiro (23), o abrigo da metralhadora pesada Browning (25); em 1969/71, na altura em que lá estivemos, ainda não havia artilharia (obuses 14);

(ix) A caserna das praças da CCS/BCAÇ 2852 (11) ficava do lado oeste, junto ao campo de futebol (3);

(x) Julgava-se que o pessoal do pelotão de morteiros e/ou do pelotão Daimler ficava instalado no edifício (12), que ficava do outro lado da parada, em frente ao edifício em U;

(xi) Mais à direita, situava-se a capela (13) - que funcionava também como casa mortuária - e, ao lado, a secretaria da CCAÇ 12 (14);

(xii) Creio que por detrás ficava o refeitório das praças; em frente havia um complexo de edifícios de que é possível identificar o depósito de engenharia (15) e as oficinas auto (16); à esquerda da secretaria, eram as oficinas de rádio (17);

(xiii)  Do lado leste do aquartelamento, tínhamos o armazém de víveres (20), a parada e os memoriais (18), a escola primária antiga (19) e o depósito da água (de que se vê apenas uma nesga);

(xiv) Ainda mais para esquerda, o edifício dos correios, a casa do administrador de posto (que era um caboverdiano, na altura), e outras instalações que chegaram a ser utilizadas por camaradas nossos que trouxeram as esposas para Bambadinca (foi o caso, por exemplo, do Alf Mil Carlão, nosso camarada da CCAÇ 12);

(xv) Esta reconstituição foi feita pelo Humberto Reis (HR), completada por mim (LG) e, mais recentemente, pelo Gabriel Gonçalves (GG), que identificou novos sítios: cantina (27), posto de rádio (28), refeitório das praças (29) e centro cripto (no topo do edifício 5)...

Ficamos à espera de novos contributos, nomeademente por parte do pessoal das CCS do BCAÇ 2852 (1968/0) e do BART 2719 (1970/72) que privaram connosco, bem como as unidades adidas (Morteiros, Daimler, Intendência, Engenharia, Pelotões Caçadores Nativos...).

Foto: © Humberto Reis (2007) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine. Todos os direitos reservados.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 12 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7425: Operação Tangomau (Álbum fotográfico de Mário Beja Santos) (3): Dia 21 de Novembro de 2010

Guiné 63/74 - P7444: Parabéns a você (189): António Paiva, ex-Soldado Condutor, HM 241, 1968/70 (Tertúlia / Editores)


Hoje, 16 de Dezembro de 2010, está de parabéns, por festejar mais um ano de vida, o nosso camarigo Antonio Paiva*, ex-Soldado Condutor no HM 241 entre 1968 e 1970.

É nosso dever não deixar passar esta data sem vir testemunhar ao António o nosso regozijo pelo alegre acontecimento.

Caro António, recebe os nossos melhores votos para que tenhas uma longa vida, com saúde, junto dos teus familiares, na certeza de que estes amigos tertulianos estarão sempre por perto para festejar contigo em cada ano.


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Notas de CV:

- Postal de aniversário de Miguel Pessoa

(*) Vd. poste de 16 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5474: Parabéns a você (54): António Paiva, ex-Soldado Condutor do HM 241 de Bissau

Vd. último poste da série de 15 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7437: Parabéns a você (188): Francisco Santos, 68, Montijo; Sousa de Castro, 60, Viana do Castelo

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7443: Em busca de... (150): Pessoal do BENG 447, Bissau, 1966/68 (Jorge Picado / José Manuel Bastos Cachim)



Costa Nova > 25 de Agosto de 2010 > O nosso camarigo Jorge Picado mais o nosso camarada José Manuel Bastos Cachim que, espero, se torne em breve mais um dos camarigos da Tabanca Grande... Conhecia-o na casa do irmão do meu amigo Zé António Paradela, arquitecto, filhos de gente do mar, como bons ilhavenses que são... (O irmão do meu amigo é capitão da marinha mercante reformado, Tibério Paradela.)

Fotos: © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados
.


1. Comentário do Jorge Picado ao poste P7419, na sequência de um pedido meu ("A propósito, tenho que ir recuperar as fotos que te tirei, a ti e ao teu amigo, engenheiro, do BENG, na Costa Nova, no verão passado... Recorda-me como é que ele se chama... Tomei nota algures, mas também posso pedir ao nosso comum amigo Zé António Paradela")...


Quanto ao engenheiro do BENG, chama-se José Manuel Bastos CACHIM e esteve lá entre 1966/68. 

Se algum camarigo do BENG desta época que "frequente" o Blogue se lembrar, ele era o responsável pela Carpintaria e Mecânica Pesada (Caterpillar´s, etc)


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Nota de L.G.:

Último poste desta série > 25 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7331: Em busca de... (149): Pedido de informação sobre a naturalidade de Vitorino António Marques (José Sampaio/José Martins)

Guiné 63/74 - P7442: Agenda Cultural (95): Convite para sessão de defesa da dissertação Os militares portugueses na Guiné-Bissau: da contestação à descolonização, Lisboa, ISCTE, 6ª feira, 17

AGENDA CULTURAL - CONVITE


Convite para sessão de defesa da dissertação de mestrado,  “Os militares portugueses na Guiné-Bissau: da contestação à descolonização” (Rui F.B. Camacho Duarte)

Exmo.(a) Sr.(a),

Tenho a honra de convidar V. Exa. para a defesa de Dissertação de Mestrado em História Moderna e Contemporânea – Relações Internacionais, intitulada “Os militares portugueses na Guiné-Bissau: da contestação à descolonização”, a ter lugar no próximo dia 17 de Dezembro de 2010 (sexta-feira), pelas 15h30m, na sala 326, da Ala Autónoma do ISCTE - IUL (Piso 3 da Ala Autónoma - ISCTE-IUL), sito na Avenida das Forças Armadas, em Lisboa.

Com os meus melhores cumprimentos,
Rui Filipe de Brito Camacho Duarte

__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 12 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7423: Agenda Cultural (94): A exposição A Marinha na República, Museu da Marinha, em Lisboa, Belém, até ao dia 5 de Janeiro de 2011 (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P7441: O Mural do Pai Natal da Tabanca Grande (2010) (1): Querido Pai Natal... (Albino Silva, CCS/BCAÇ 2845, Teixeira Pinto, 1968/70)

1. Mensagem de Albino Silva* (ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845, Teixeira Pinto, 1968/70), com data de 4 de Dezembro de 2010:

Carlos Vinhal:
Nesta minha mensagem especial como não podia deixar de ser, quero desejar-te um Santo e Feliz Natal e Próspero Ano de 2011, aliás como acima o fiz, sem esquecer o Luís Graça, Magalhães Ribeiro, Humberto Reis e Virgínio Briote, transmitindo ainda a todos os Tertulianos que fazem parte ou frequentam a nossa Tabanca Grande, incluindo as Senhoras que nos vão dando conta de suas Histórias, e porque também elas viveram um passado deveras difícil, sabendo que outras há, e que decerto gostariam de escrever aqui na nossa Tabanca Grande, contando suas mágoas, e muitas tristeza pelo trauma vivido conjuntamente com seus maridos, porque conheço infelizmente alguns casos em que é por demais doloroso, ao ver sofrer mulheres e até filhos, quando camaradas nossos ainda gritam assustados daquele passado que nós tivemos naquela África sangrenta.

Vamos continuar com nossa Tabanca.
Eu estou já escrevendo mais umas coisinhas a meu jeito e que para 2011 enviarei à Tabanca Grande.

Um grande abraço a todos
BOAS FESTAS...


Para todos
BOAS FESTAS

Camaradas da Tertúlia,
para todos bem igual,
vos desejo tudo de bom,
um Santo e Feliz Natal...

Em especial saúde
e nunca nada de mau,
se possível neste Natal
comam muito bacalhau...

À nossa Tabanca Grande,
de gente boa e modesta,
desejo um Santo Natal
e Bom Ano Novo em festa...

Aos Régulos da nossa Tabanca
os quais eu sempre respeito,
Boas Festas e parabéns
por tudo quanto têm feito...

Termina o ano positivo
por tudo aquilo que eu vi,
das vezes que fui à Tabanca,
por tudo quanto eu lá li...

Estamos a chegar ao Natal,
por isso me lembro de ti,
de camaradas que já partiram
também esses não esqueci...

Sei que não estão entre nós
e sei que jamais os verei
e nesta quadra especial
eu por eles rezarei ...

Camaradas da Tabanca,
enquanto tiverdes memória,
pró Ano voltai a escrever,
contai sempre vossa História...

Estou pronto a ler tudo
e vejo sempre tudo tão bem
e para a Tabanca ser Grande
eu escrevo nela também ...

Dia a dia venho aqui,
e sei que fazes igual,
ver nossa Tabanca Grande
pois é este o meu jornal ...

Bom Natal ao Luís Graça,
da Tabanca fundador,
ao Humberto Reis, cartógrafo,
Carlos Vinhal, administrador...

Também ao Magalhães Ribeiro,
da Tabanca é seu editor,
igualmente um Bom Ano a todos,
e ao Virgínio Briote, administrador...

BOAS FESTAS para todos,
neste abraço puro e verdadeiro
deste que foi Soldado na Guiné,
Albino Silva, Maqueiro ...

Por:
Albino Silva
BCaç 2845
Guiné - Teixeira Pinto
(1968/70)


2. Comentário de C.V. /L.G.:

Com este Mural do Pai Natal 2010, vamos de dar início à nossa tradicional troca de postais, cartoons, mensagens, versos, imagens, fotos, histórias..., tudo o que for achado adequado à época festiva e à natureza nossa Tabanca Grande... Fazemos um apelo à criatividade e originalidade dos nossos camaradas, amigos e camarigos, bem como leitores, simpatizantes, críticos, adversários, detractores e até inimigos (se os tivermos)... O que importa é participar... Há rapaziada (e raparigada...) que não pega na caneta há um ror de tempo... ou seja, não anda com as quotas em dia. Participar não custa nada: está ao alcance de um clique...

Em anos anteriores já publicámos outras séries nesta quadra festiva tais como As Boas-Festas da nossa Tabanca Grande; O meu Natal no mato; Votos de Feliz Natal 2009 e Bom Ano Novo 2010...

Por outro lado, e sem qualquer preocupação em entrar para o Livro de Recordes do Guiness, temos a modestíssima ambição de ultrapassar os 1888 postes de 2009... Estamos, neste momento, com 1856, mas ainda faltam 2 semanas até ao fim do ano... A meta dos 2000, essa, é praticamente impossível de atingir, dada a "quadra festiva" em que a tendência é para baixar a produção e a produtividade dos editores e demais tabanqueiros...
Até lá, Festas Felizes, Quentes e Boas!
__________

Nota de CV:

(*) Vd. poste de 7 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6552: Convívios (163): Encontro do pessoal da CCAÇ 2368, ocorrido no dia 30 de Maio de 2010 (Albino Silva)

Guiné 63/74 - P7440: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (5): Do Bambadincazinho para Ponta Varela


Guiné > Zona Leste > Mapa do Xime (1955), 1/50000  > Detalhe: O Rio Geba, o Rio Corubal, à esquerda, Poindon, Ponta Varela, Madina Colhido, estrada Xime-Ponta do Inglês, Rio Geba Estreito,  Xime, estrada Xime-Bambadinca, Enxalé (em frente, na margem direita do Rio Geba), Samba Silate, Ponta Coli, Amedalai... Tudo lugares míticos, carregados de emoções para os camarigos que viveram e lutaram no Sector L1 (Bambadinca) ou que desembarcaram, numa LDG, a caminho de outras terras da vasta zona leste da Guiné, via Bambadinca-Xitole ou Bambadinca-Bafatá... (LG)


1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Dezembro de 2010:

A partir deste dia 21 de Novembro passei a andar às ordens do Fodé Dahaba. Procurei deixar tudo anotado e por ordem. Em vão. Na mesma folha onde escrevi o nome de Demba Embaló, o guarda-costas de Jorge Cabral, pus o nome de Aliu Baldé, Binta Seidi, e para baralhar mais as coisas escrevi os nomes dos comandantes do PAIGC em Madina e Belel: Santiago Mendes, Farazinho Pereira e Samper Mendes.
A partir daqui ainda vai ser pior. Felizmente que me posso guiar pela ordem, dia-a-dia, registada pela máquina fotográfica. Mas falei com tanta gente, perguntei por tanta gente, estou certo e seguro que vou cometer graves omissões.
Nem tudo o que queria ver e que pedi ao Fodé foi possível visitar: a estrada da Amedalai para Moricanhe estava praticamente intransitável, e só conheci muito tarde a solução salvadora, Lânsana Sori e a sua milagrosa motocicleta; chegar ao Buruntoni e ao Baio é muito difícil, e tem que ser a partir da Ponta do Inglês; a mesma coisa com a viagem da Ponta do Inglês até à mata de Fiofioli, onde se situa a tabanca de Tubácuta onde viveu o comandante Domingos Ramos.
O importante é que a viagem nunca acaba. E os sonhos do viandante permanecem.

Um abraço do
Mário
__________________

Operação Tangomau (5)

por Beja Santos

Do Bambadincazinho para Ponta Varela

1. A partir de Bambadinca, chega-se num ápice ao Bairro Joli, contíguo de Santa Helena. Por aqui andei no passado longínquo em missões pacíficas e em nomadizações hostis. Durante a guerra, comprava-se aqui gado,  muito útil para os problemas de intendência de Missirá, os dois cabritos que Jobo Baldé ali assou no Natal de 1968, daqui vieram, seguiram pela bolanha de Finete num Unimog 411 e finaram-se na véspera de Natal, para gáudio de quem combatia e vivia naquele ponto do Cuor. Estes caminhos do Bairro Joli eram espiolhados devido à incontestável conivência de alguma população com os inimigos de Madina/Belel. Era o drama das relações de sangue de quem tinha optado pela luta ou ficado à sombra da bandeira portuguesa.

Em Santa Helena, Fá Balanta e Mero viviam comunidades balantas onde se acoitavam, à sorrelfa, civis e militares do mato, que procuravam informações, compravam tabaco ou sal, abasteciam-se de gado, traziam esteiras e produtos das suas hortas. Atravessavam o Geba estreito entre as bolanhas de Finete e Ponta Nova. Aparecíamos ao amanhecer em missões pouco conciliatórias e às vezes com inquirições duras. A verdade é que a comunicação, mesmo com mortes e feridos de permeio, nunca se interrompeu completamente. Ora é acima de Ponta Nova que eu vou habitar. Aqui se devotou Inácio Semedo a construir casa, destilaria e horta. A casa, basta ver a fotografia, é bem semelhante àquelas que se podiam ver em Malandim, Saliquinhé ou São Belchior, até mesmo no Enxalé, ao tempo.

O panorama que se desfruta é, no mínimo, deslumbrante. O Tangomau vai desfrutar das vistas do amanhecer e do entardecer, são momentos mágicos. De manhã, antes das sete horas, Bambadinca aparece submersa pelo sereno, uma neblina que se evola com o primeiro calor da manhã, deixa ver, em toda a sua majestade, as bolanhas, os palmares e os meandros do Geba estreito. À tarde, é o cerimonial do pôr-do-sol, a bola de fogo tisna-se de todos os tons ígneos, até se esconder entre Mato de Cão e Chicri. Nesta casa onde me acolhera, há muito da traça portuguesa adaptada ao calor tropical, as varandas são indispensáveis, os telhados prolongam-se para dar sombra sobre os alpendres.

O Tangomau e comitiva são recebidos pela Dada e Fernando Semedo, Mio. Há duas crianças (Tuinho e Thierry), uma menina de nome Florinda, a empregada, depois vai aparecer um outro empregado, Alberto Djata. Mostram-lhe o quarto, a casa de banho, a sala onde irão ver os canais franceses mais alguns filmes em DVD.

O Tangomau logo regista a casa, teve mesmo a pretensão de captar as duas bolanhas em sequência, saiu imagem amassada, desbotada, paciência. Vamos agora ao que importa, mentaliza-se que se avizinham emoções muito poderosas, vai rever gente que muito estima, vão ser expostos problemas (para ele) insolúveis, ser-lhe-ão feitos pedidos que não poderá atender, é preciso estar de ânimo forte.

A casa no Bairro Joli, perto de Santa Helena,  onde estou a viver. Foi erguida por Inácio Semedo, que pertenceu ao PAIGC e que por isso obrigado a viver em Angola durante 7 anos. Um dos seus filhos, o Eng.º Fernando Semedo, procura pôr de pé o sonho do seu pai, dar vida ao projecto agro-industrial


2. Para se sentir preparado, veio cedo contemplar a bolanha de Ponta Nova, trouxe “As Palavras”, de Jean-Paul Sartre, uma narrativa autobiográfica muito dolorosa e corajosa, não é qualquer um que se acomete a escrever assim:“Uma manhã, em 1917, em La Rochelle, aguardava alguns colegas que deviam acompanhar-me ao liceu; estavam a demorar; sem já saber o que inventar para me distrair, resolvi pensar no Todo-Poderoso. Logo ele se precipitou no azul-celeste e se sumiu sem dar explicação: não existe!, disse eu a mim próprio com um espanto cortês, e julguei o assunto arrumado. De certa maneira estava, visto que nunca mais, desde aí, senti a menor sensação de o ressuscitar. Mas o Outro subsistia, o Invisível, o Espírito Santo, o que garantia o meu mandato e regia a minha vida por grandes forças anónimas e sagradas. Deste, senti bem maior dificuldade em me livrar, pois que se instalara atrás da minha cabeça, nas noções adulteradas que eu usava para me compreender, me situar e me justificar. Escrever foi durante muito tempo pedir à Morte, à Religião, sob uma máscara, que me arrancassem a minha vida ao acaso. Fui da Igreja. Militante, quis salvar-me pelas obras; místico, tentei desvendar o silêncio do ser por um sussurrar contrariado de palavras e, sobretudo, confundi as coisas com os seus nomes: isto é querer”.

Divago sobre esta capacidade de falar sobre a perda da fé quando se começa a ouvir o motor da Renault Express. Fodé apresenta cumprimentos, não há tempo a perder, os eventos sociais estão marcados. Há só uma curta paragem no mercado de Bambadinca, o Tangomau vai abastecer-se de bolacha Maria, banana-maçã e alguma goiaba. Primeiro, e de acordo com a lei Mandinga, receber cumprimentos dos homens grandes, aparecem capitaneados por Aliu Fuma, mais do que octogenário, trazido pela mão de um genro. Há saudações e depois orações, dá-se graças a Deus por este reencontro. A seguir a família, mulheres, gente mais jovem e as crianças. Sucedem-se as reverências mandingas, o Tangomau é saudado com o profundo respeito da amizade que merecem os velhos. Aliás, o Tangomau vai passar repetidamente a ouvir o cumprimento: “Olá, velho! Corpo?”.

É neste grupo que aparece Mamadu Baldé, filho de Queta Baldé, chegara expressamente de Amedalai apresentar cumprimentos. E temos o último cerimonial, o pessoal da casa, mulheres e filhos. É nisto que o Tangomau acorda para um drama, a terceira mulher do Fodé, a quem chamam a Louca, aparece, profere uma frases ininteligíveis e desaparece. É a mãe de Calilo, Iaguba, Braima, isto só para falar dos machos, é impossível fixar o nome daquele rol de fêmeas a que constantemente Fodé grita para pedir coisas ou dar ordens.

Não fosse o Tangomau um obscuro fotógrafo amador e teria conseguido capturar a deslumbrante extensão das bolanhas de Ponta Nova e Finete, com Mato de Cão lá ao fundo. É o que há, pede-se desculpa por não se ter capturado um panorama magnífico do Geba estreito.


3. Súbito, o Tangomau é avassalado por uma emoção, diante dele, de braços abertos e riso bom aparece-lhe Samba Gebo, sempre jovem, distinto, mal se apresentou e já começa a pedir livros, lápis e papel. No seu caderninho, o Tangomau notou: o Samba trouxe-me a juventude de Missirá, é o porta-voz daquela gente abnegada, leal, sempre pronta a seguir-me.

Chegou igualmente Madiu Colubali, tem a vista turva, desfaz-se em ademanes. Fodé grita, a família Fati, os Sanhá e os Dahaba têm uma recepção à nossa espera em Amedalai. O primeiro choque surge quando o Tangomau pede uma curta paragem na ponte de Udunduma, depois de uma ligeira discussão Fodé condescende. Tiram-se fotografias e o Tangomau precipita-se ladeira acima, à procura do local onde esteve instalado o destacamento mais infecto da Guiné.

Encontrou uma tabanca, foi muito bem acolhido, explicou ao que veio e apanhou um instantâneo e uma festa de mulheres, só fixou que se tratava de um corte de cabelo. Pouco depois, chegaram a Amedalai, a tabanca é enorme, talvez tenha mesmo duplicado ou triplicado. Os Fati, os Sanhá e os Dahaba são uma pequena multidão. Fodé discursa, um homem grande responde e o Tangomau, inexplicavelmente, pede a palavra e conta onde e como nasceu a profunda amizade que nutre por Fodé. Fala-se de Finete, de uma colaboração muito leal, e no fim conta-se aquele desastre brutal no amanhecer de 22 de Fevereiro de 1969. Mudara a vida do Fodé e aquele menino alferes descobria que às vezes uma ordem pode dar um sinistro despropositado, como fora o caso daquele.

O almani presente na cerimónia levanta-se e reza uma nova acção de graças. O Tangomau gagueja: “Deus Todo-Poderoso tem compaixão de nós, perdoa os nossos pecados e conduz-nos à vida eterna”. Procura-se a seguir Mamadu Djau, não está, aproximam-se os familiares e até um homem que se apresenta como primeiro-cabo da CCaç 12, dá pelo nome de José Carlos [Suleimane Baldé], exige ficar numa fotografia para que lá em Portugal saibam que está vivo. E parte-se para o Xime, o alcatroado tem resistido bem ao tempo, o Tangomau viu-o nascer, em 1970. Pelo caminho, despontam as tabancas que surgiram depois da guerra, Taliurá e Ponta Coli, são os manjacos que exploram estas ricas de bolanha.

Uma variante da fotografia que já saiu no álbum, publicada há dias: estamos em Amedalai e alguém que se apresenta como José Carlos Suleimane Balbé [ex-1º Cabo, CCA>Ç 12, 1969/74] , pede para ser fotografado. Ei-lo, ladeado por Samba Baldé (Samba Gebo) e Madiu Colubali. O fundo é dado por membros da família de Mamadu Djau.


4. Chegados ao Xime, a primeira curiosidade é de visitar o porto. Este já existe, está reduzido a miseras meia-dúzia de estacas. Até o capim brota do alcatrão, como se protestasse por tão indigno abandono. Numa elevação, ergue-se uma estrutura monumental, ao que parece um silo para a mancarra, trata-se de uma infra-estrutura que nunca teve uso, quando Luís Cabral caiu em desgraça Nino Vieira votou ao desprezo os projectos do seu antecessor. Há ainda uma visita a fazer a membros da família Fati, aparece a viúva de Mankuma Biai, um guia muito capaz que prestou um óptimo serviço ao Tangomau na operação “Rinoceronte Temível”, tendo mesmo sido louvado.

O Xime é uma mistura de instalações ao abandono e da nova tabanca. Fodé adverte que vamos para o último itinerário da viagem, Ponta Varela. Tomou-se à direita a estrada Xime-Ponta do Inglês, seguiu-se por um estradão mal tratado, ao fim de meia hora entrei num território que percorrera sempre à espera de contacto com o inimigo. O que o levara ali era conhecer o local onde, nesse passado remoto da guerra, as forças do PAIGC desfechavam bazucadas sobre as embarcações civis que, arrastadas pela corrente, se aproximavam do tarrafe, à entrada do Geba estreito.

Nas operações que se destinavam ao Poindom ou Ponta do Inglês flanqueava-se as bolanhas e os velhos trilhos, que o PAIGC minara. Eram viagens que se faziam com luz, temia-se uma sarrafusca nocturna, com a desvantagem do inimigo saber retirar e de novo golpear. O importante é que mal chegados à tabanca, e feitos os cumprimentos da praxe, o Tangomau pediu para ir até à margem do Geba.

Um jovem, de nome Mussá, ofereceu-se mas logo avisou que havia passeata para cerca de 3km, o que não incomodou o Tangomau, ele segue excitado por mangais, picadas, hortas e palmares. Irá guardar a imagem dos fios de luz, uma luz coada a ouro, se ir infiltrando pelos cajueiros, tudo dentro de uma grande serenidade, não há mais presença humana, o passeio não cansa, depois surge o Geba, o terreno amoleceu e Mussá mostra o local, aponta para um pilar de cimento, era dali, dentro dos cajueiros fechados que vinha o fogo mortífero.

Captam-se várias imagens, o que era segredo deixou de o ser. E regressa-se em passo estugado. Dos aspectos essenciais, o Tangomau tomou nota: dentro de dias irá conhecer M’Fon Na Bra, comandante do bigrupo que actuava em Ponta Varela; a memória, vacilante, recuou até ao mês de Março de 1969, foi no HM 241 que o Tangomau conheceu aqueles membros da família Fati que vivem agora no Xime; na nova tabanca de Udunduma gostou muito de ser questionado pelos jovens que pretendiam mais informação sobre o quartel. Ainda havia umas folhas soltas com observações registadas,  perderam-se. E assim findou o primeiro dia organizado pelo Fodé, Calilo vai depositá-lo no Bairro Joli.

Demba Embaló, guarda-costas de Jorge Cabral, do Pel Caç Nat 63. Atenda-se à naturalidade da pose, quando se vêem estas fotografias acorre ao espírito as pessoas naturalmente aristocráticas. O Demba coligiu a folha que já aqui foi publicada com os nomes dos soldados do Pel Caç Nat 63. O Demba vende cola e tabaco no mercado de Bambadinca. Garanti-lhe que uma das razões que me trouxera à Guiné era preparar a compra da casa do Jorge Cabral. O Demba tomou-me a sério: “Fica tão contente, tão contente!”

5. Deixou-se para o fim um pormenor essencial: Fodé vive no Bambadincazinho, não há que enganar. Mal se apercebeu dessa realidade, o Tangomau foi visitar a Missão do Sono, a escassas dezenas de metros. Aí voltará na manhã seguinte, na companhia de Mamadu Djau. Mas não se quer adiantar mais pormenores, amanhã será um dia dedicado a Bambadinca, haverá baba e ranho de todo o tamanho, desde o quartel ao porto, também ele desaparecido. Será aí que o Tangomau, especado, olhará para a bolanha de Finete, exactamente no local onde a canoa de Mufali Iafai o conduzia, perto do fim do dia. Mufali também desapareceu.

Ao longo deste dia perguntou-se por muita gente, foram explosões, umas atrás das outras. Serifo Candé, que o Tangomau tanto ansiava abraçar em Biana, perto de Fá, morreu. Na semana anterior morrera Mamadu Silá, o 108, um gigante de corpo com um fiozinho de voz. O Tangomau chega cabisbaixo, com aquela sensação paradoxal que satisfez a curiosidade de visitar lugares anteriormente interditos mas ter perdido camaradas inesquecíveis. Depois cumprimenta a família Semedo, já anoiteceu, conta o que viu e quem visitou, adormeceu cedo, desta vez não teme só os encontros com as pessoas, teme os lugares que vai rever e que tanto estimou, um afecto que guardará até ao fim dos tempos.

Outra variante da fotografia já publicada sobre Ponta Varela, exactamente no local onde as forças do PAIGC atacavam as embarcações civis. É pena não se ficar com a ideia de como, também neste local, nascera o Geba estreito, o leito do rio afunila, à esquerda, não muito longe daqui, passa o rio Corubal [. Vd. detalhe da carta do Xime, 1955, acima].

Fotos: © Mário Beja Santos (2010). Direitos reservados.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 10 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7417: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (4): 20 de Novembro, de Bambadinca para o Bairro Joli