1. Em mensagem do dia 9 de Fevereiro de 2014, o nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66), enviou-nos o 10.º e último episódio da sua viagem/aventura de férias, num percurso de 7000 milhas (sensivelmente 11.265 quilómetros) através dos Estados Unidos da América, na companhia de sua esposa.
Companheiros, esta é a parte final da viajem.
A intenção foi que viajassem comigo, que desfrutassem os momentos, que esquecessem a guerra que vivemos lá na Guiné, quando éramos jovens e andávamos naqueles Unimog’s, GMS’s, Berliete's, ou na avioneta do Honório, sem falar no “carro dos doentes”, que vinha todas as semanas para o Hospital, na capital, onde quase todos vinham com dores. E não quero ir mais
longe lembrando aquelas viagens “acagaçadas”, nas auto-metralhadoras que iam na frente das colunas de Mansoa para Bissorã ou Mansabá, e algumas até eram improvisadas! “Puta de vida”.
Vamos esquecer os tiros e tentar tirar algum benefício do tempo que nos sobra.
Portanto...
A manhã ia alta, não havia aquela humidade e os malditos mosquitos, como lá na Guiné, (lá estou outra vez lembrar a guerra, porra, não tenho emenda, agora é de vez, cá vai), tomámos o café da manhã em família, no principal compartimento da habitação, envidraçada, com o sol entrando por toda a casa. Abrimos a porta que dava para o terraço, e desfrutámos a bela paisagem sobre o lago Sacandaga, com o sol a despertar, do lado de lá das montanhas, a obrigar-nos a colocar a mão sobre os olhos para que melhor desfrutássemos da paisagem de sonho que aquele local privilegiado nos proporcionava.
Despedidas, abraços, algumas lágrimas e vieram guiar-nos até à estrada principal, já um pouco distante da aldeia de Northville,
pois o GPS não tinha sinal naquela zona remota, rumámos em direcção ao sul, tomando de novo a estrada número 90, que nos haveria de levar à estrada, número 87, depois à estrada número 84, onde seguimos até à fronteira de novo com o estado de Pennsylvania, que inicialmente foi colonizada por suecos e neerlandeses, que foram posteriormente excluídos da região pelos britânicos.
Foi na Pennsylvania, que a declaração de independência e a constituição americana foram criadas, tento-se tornado no segundo estado americano, após ter sido rectificada a Constituição Americana em 1787. Foi também a Pennsylvania o palco da batalha mais sangrenta da Guerra Civil Americana, a “Batalha de Gettysburg”.
Continuando na nossa rota, seguimos na estrada número 209, que acompanha o rio Delaware na direcção de norte para sul, passando por campos de milho, áreas com frondosas árvores, devidamente assinaladas, com retiros para piqueniques com mesas e bancos, alguns “trails”, também assinalados, que nos podiam levar até às montanhas de “Poconos”, estrada esta que nos havia de largar na cidade de Stroudsburg, no estado de Pennsylvania, para lá da ponte, sobre este mesmo rio Delaware, que nesta área se alarga, formando alguns lagos, pelo menos na época do verão, na região a que chamam, “Delaware Gap”, que fica entre duas grandes montanhas, que divide o estado de Pennsylvania com o estado de Nova Jersey.
Nas montanhas de Poconos, em companhia do nosso filho, sua amável esposa e nossos netos, permanecemos por 4 maravilhosos dias, brincando e passeando com os netos, uns dias com alguma chuva de montanha, outros dias com “sol de rachar”, visitámos algumas lojas utilitárias, comprando coisas do dia a dia, mudámos de novo o óleo do jeep, e andámos por lugares, alguns nossos conhecidos, outros que eram surpresa.
Num desses dias deslocámo-nos ao vizinho estado de Nova Jersey, para ver e confraternizar com a família amiga do coração, o Jorge e a “Tesse”, (o Jorge, é o “Zarco”, o tal paraquedista que foi nosso companheiro na Guiné, de quem já falámos por diversas vezes), que também têm residência na Flórida, do lado de lá, no Golfo do México, onde se deslocam periodicamente, e sempre que o fazem, nos dão a honra da sua visita, fazendo sempre uma paragem obrigatória em Palm Coast, no estado da Flórida, claro, onde sempre revivemos alguns momentos da guerra da Guiné.
Estando em New Jersey, tínhamos que visitar a “Ferry Street”, no bairro do Ironbound, naquele Newark, que já foi mais “Português”. Aí fizemos algumas compras de géneros alimentícios, importados de Portugal, pois aquela área é muito habitada por pessoas, que em outros tempos emigraram do nosso Portugal.
Uns dias depois, houve uma festa de anos de um nosso neto, num parque infantil, nas montanhas de Pennsylvania,
assistimos a essa festa, e já ia tarde, quando iniciámos a viagem de regresso à Flórida, seguindo na estrada número 476, que atravessa o estado de Pennsylvannia de norte para sul, onde chegando ao estado de Delaware, seguimos na estrada número 95, aquela que nós portugueses quando nela viajamos, dizemos na nossa linguagem, à nossa maneira sempre improvisada de nos fazermos compreender, naquele inglês/americano/português, vindo ou indo para a Flórida, conforme a direcção que tomamos:
- Não tem nada que enganar, é,
“Nainiefivenorte”!
Ou se viajam na direcção do sul, dizem:
- Sempre em frente, é,
“nainiefivesul”!
E quando lhe perguntam onde se encontram neste trajecto, dizem:
- Passámos no “Pedro”, às tantas horas.
Ou:
- Ainda não chegámos ao “Pedro”!
Para quem não sabe, no final do estado da Carolina do Sul e logo no início do estado da Carolina do Norte, existe uma pequena povoação a que dão o nome “South of the Border”, foi fundada em 1914, mas em 1949, durante a lei seca, como estava situada a sul do estado de Norte Carolina, abriu lá uma pequena taberna que vendia cerveja e alguns outros licores que eram proibidos a norte, claro todos passavam fronteira, e iam a sul comprar cerveja e outros licores, em pouco tempo tornou-se uma povoação famosa, e hoje é ponto de paragem e de referência tanto para as pessoas que viajam para norte, como para sul, onde existe uma enorme povoação com áreas de descanso, estações de serviço, restaurantes, hotéis, parque de diversões, grandes supermercados e outros tipos de comércio próprio de quem viaja.
A mais de 150 milhas de distância já se vêm anúncios na estrada, dizendo que no “South of the Border” está o “Pedro”,
que é um típico “bandido mexicano”, que era um “fora da lei”, tal como quando nasceu a povoação, também fora da lei, vendia cerveja e outros licores às pessoas do norte.
Continuando, depois do estado de Delaware, atravessámos o estado de Maryland, entrando no estado de Virginia, passando sobre a ponte, “Woodrow Wilson Bridge”, de onde se avista um pouco de Washington D.C., onde comemos e pernoitámos.
Seguindo viagem ao amanhecer, sempre rumo ao sul, passando pelos estados de Carolina do Norte, a tal povoação a que chamamos “Pedro”, entrando no estado da Carolina do Sul, onde parámos antes de entrar no estado da Geórgia, para retemperar forças, e caminhar um pouco, finalmente atravessámos
o estado da Geórgia, onde na berma da estrada existem cartazes anunciando a venda de “pêssegos frescos da quinta”, que no nosso entender, não são lá muito frescos, entrando finalmente no estado da Flórida, com alguma alegria, onde o termómetro do jeep marcava 102 graus de temperatura.
(Cerca de 39º Celsius).
Que maravilha, é esta a nossa Flórida, (calor como na Guiné, mas por enquanto sem guerra, peixe da bolanha com arroz, arame farpado, humidade e os inseparáveis mosquitos), pois para frio, chegou mais de trinta anos limpando neve no norte.
Aqui chegámos ao fim da tarde, com algumas saudades da nossa casa.
Este é o final da nossa viagem de férias de 2013, agora vamos cortar a relva, arrumar as ideias, ir à pesca, pensar no que há-de vir no futuro, como só nós portugueses sabemos dizer, pois na nossa idade, não existe nenhum futuro, a palavra futuro é agora, já, neste momento, portanto vamos bebendo uns copos, não água da bolanha, tal como lá na Guiné, talvez cerveja, vinho ou “Vat-69”, lembram-se, só que agora é nos intervalos da medicina.
Até qualquer dia, de novo em férias!
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Nota do editor
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