domingo, 23 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12891: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (24): Um longo percurso que começou em Vendas Novas, passando por Cascais, Torres Novas, Queluz, Lisboa, acabando em Mafra (Jorge Picado)

2. Mensagem do nosso camarada Jorge Picado (ex-Cap Mil na CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, na CART 2732, Mansabá e no CAOP 1, Teixeira Pinto, 1970/72), com data de 18 de Março de 2014:

Amigo Carlos

Um passarinho me segredou que andavas sem "trabalho". Ora isso não é bom para a saúde.

Pegando num escrito que tinha feito, do género "para memória pós-morte", os meus sucessores, que já são muitos (só netos já formam uma equipa de futebol mista) saberem o que eram aqueles tempos do antigamente, a que chamei " Pedaços de Vida - Quatro Anos e 159 dias Fardado de Militar", extraí uns parágrafos e arranjei uma composição que tavez possa ser enquadrada em "A Cidade ou Vila que eu mais amei ou odiei no meu tempo de Tropa".
Se não tens mais nada para fazer aí vai.

Grande abraço para Vós do
Jorge


A Cidade ou Vila que eu mais amei ou odiei no meu tempo de Tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG

Se bem que as terras ou cidades que detinham estabelecimentos militares, onde se cumpria o tempo obrigatório do serviço militar, não fossem as culpadas pelos “sofrimentos” que por ventura viessem a ocorrer, a verdade é que muitos os “descarregavam” sobre as localidades, chegando mesmo a criar aversão a tais terras.
Pela minha parte, tendo conhecido várias dessas localidades, algumas mais “pobres” e, outras até mais desenvolvidas e evoluídas, também ocorreu algo de semelhante como a tantos.

De Vendas Novas, onde assentei praça em pleno verão do tão longínquo ano de 1959, 31AGO, muito mais pequena e menos desenvolvida do que actualmente e mal servida de meios de comunicação, não guardo más recordações.

Não obstante as deficiências resultantes por exemplo: da falta de água em época de tanta canícula, obrigando-nos algumas vezes a dormir todos enfarruscados, após instruções noturnas, sem pinga de água nas canalizações para um banho na chegada ao quartel; ou a dificuldade em ligações de transporte para quem queria vir passar um fim de semana ao Norte; ou mesmo a relativa falta de meios de passatempo, sempre encarei a situação como provisória e fazendo parte duma etapa a que não me podia furtar.

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Foto 1 – No início do COM em Vendas Novas.


Foto 2 – Em OUT59 nas escadas para o “galho”. Onze mancebos do COM 1/59/A. 1- Emanuel Maranha das Neves; 2- Carvalho, do Porto; 3- Este escriba.


Foto 3 – Junto de uma “relíquia da 1.ª Guerra Mundial”, parece que estou chegando “fogo à peça”, que não é peça.


Foto 4 – Ensaios para o “Juramento de Bandeira”. 1- Belmiro de Azevedo; 2- Carvalho, do Porto; 3- Eu; 4- Maranha das Neves.


Foto 5 – Juramento de Bandeira. Com a seta verde Eu; 1- Maranha das Neves.


Seguidamente rumei a Cascais para a especialidade e aí, após a secura alentejana, sobreveio a água a mais, já que se seguiu um outono-inverno bem molhado.

No entanto havia a compensação de que os “ares” eram outros. Mais cosmopolitas, melhores “vistas”, cafés mais “acolhedores”, apesar da triste figura que por vezes nos obrigavam a fazer quando “tocavam a capotes” e lá tínhamos de sair com aqueles “sobretudos” feitos para outros corpos, nunca correspondentes ao nosso número. Mesmo assim, já se podia até ir a uma sessão de cinema.

E Lisboa ali tão perto para fins de semana, sempre com estadia garantida na morada onde sempre aquartelei durante a frequência, e não só, do ISA. Era uma casa particular com vários quartos e camas em maior número, “sui generis”, praticamente de Ilhavenses, homens do mar, onde eu destoava por ser “de terra” e quase o único que estudava. Como “imagem de marca”, mesmo para aqueles que já andavam embarcados, havia sempre lugar para dormida mesmo quando os navios chegavam a altas horas da madrugada. Quase “uma República Coimbrã”.

De Cascais portanto nada de mal a dizer e, quanto às tropas, sempre de vento em poupa, tudo na desportiva como é costume dizer-se e a caminho duma “Muito Boa” classificação, ao mesmo tempo que limpava a “cadeira de Hidráulica Agrícola” que tinha deixado para fazer em Dezembro.

No final da especialidade, 2.º classificado em AAA com 16,59, preparava-me para seguir rumo a Queluz, convencido que a Instituição Militar era o paradigma dos valores éticos que apregoava.


Foto 6 – Na última semana de JAN60 (se não erro) nos exercícios finais nas matas do Guincho. Fila para o “tacho” (comida, não para aquilo que os “boys” agora fazem). 1- Barroco (Algarvio e colega de curso no ISA); 2- Carvalho, do Porto; 3- Barreto (Moçambique, colega do ISA mas Silvicultura); 4- Julgo ser o que ficou em 1.º em AA; 5- Eu; 6- Gil.


Foto 7 – 2.ª Secção a efectuar “fogo de barragem” com a peça de 9,4 cm. Reparem nos “supositórios”. Depois do tiro, com o recuo, era cá cada salto que os apontadores davam nos assentos que se não apertassem bem os capacetes eles voavam. A 1.ª Secção, sob o meu (seta vermelha) comando estava “em descanso com o pessoal fora dos postos a ver”.


Foi então que surgiu a primeira de muitas decepções e aparece uma localidade que “comeu” por tabela com o “meu ódio”.

A malfadada Torres Novas onde se acolitava o GACA 2 (Grupo de Artilharia Contra Aeronaves 2).

De facto, no final do COM e antes de nos mandarem para “casa” a aguardar colocação, tivemos de preencher os “inquéritos” com a ordem de preferência na colocação. Em função da minha classificação, e de acordo com o que era normal, escolhi o RAAF – Queluz como 1.ª e única prioridade, pois permitia-me, como acontecia com todos os meus colegas de Agronomia, proximidade ao ISA e a realização ali de alguns trabalhos.

Deixei Cascais descansado, até porque sabia que o 1.º não ia para lá, mas antes tinha solicitado, como aconteceu, colocação no Serviço Cartográfico do Exército, já que ainda não tinha concluído o curso de Matemáticas, acabando por aí permanecer vários anos.

A desilusão não podia ser maior ao receber como prémio, poucos dias depois, a Nota de colocação naquele aquartelamento para onde eram remetidos, género de castigo, os últimos classificados do curso. Antes de levantar a guia de marcha apresentei um requerimento devidamente formulado e instruído, dirigido a SEXA o Ministro do Exército, reclamando de tal colocação. Porém, enquanto não fosse emitida a decisão de SEXA, tinha de seguir caminho e, nestas coisas de “cunhas”, “quem vai ao mar perde o lugar” como se diz na minha terra. E quem “o ganhou” por Queluz se repimpou.

Desde o “barrete” que os distintos Serviços Militares enfiaram a 2 ou 3, já não recordo quantos éramos, ingénuos Aspirantes, passando-nos guias de transporte de Caminho de Ferro de Lisboa para Torres Novas, que nos fizeram desembarcar de uma composição ronceira, recordo que estávamos em FEV60, no dito apeadeiro de Torres Novas, onde o respectivo Chefe, muito admirado nos avisou que o nosso destino ficava a não sei quantos quilómetros e dali não havia carreiras de camioneta! Até conseguirmos um carro de aluguer, requisitado via telefone a uma praça da dita Vila ou já seria Cidade (?), pago logicamente por nós e não pelo Exército, muitos nomes bonitos fomos endereçando a quem nos pregou tal partida. O trajecto correcto, viemos a saber por esse Chefe da CP, seria transporte da CP até Entroncamento e depois de Camioneta até Torres Novas, pois daí, sim, havia carreiras regulares.

Mais uma achega para o aumento do mau relacionamento com esta terra. Mas outras se seguiram.

O “inimigo” que arranjei, logo na apresentação oficial na Unidade. Sem qualquer diplomacia da minha parte, quando o Comandante admirado verifica o meu “currículo militar” e exclama para os restantes oficiais que finalmente eram premiados, julgando-me talvez um “militarão”, lhe respondi que estava enganado, já que o que acontecia era um tremendo erro, para não dizer outra coisa, uma vez que o meu lugar, por direito era no RAAF e, aguardava que tal erro fosse corrigido por quem de direito, após análise do recurso.

Isso é que era bom, julgava eu, pois não conhecia a “têmpera” e “o posicionamento político” desse Comandante. Mesmo depois da resposta afirmativa de SEXA de que o meu lugar era em Queluz para onde deveria voltar, tive de “gramar” com uma recruta naquela Unidade e com a “vigilância pidesca” do IN, que era exercida unicamente nos meus serviços à Unidade, que eram examinados a “pente fino”. Só de lá saí depois de terminada a recruta que ministrei, ocupando o lugar de direito no RAAF apenas em Setembro-Outubro. Torres Novas foi pois um lugar a esquecer.


Foto 8 – Em Torre Novas, com “atavios” cedidos.


Foto 9 – Almoço no GACA 2. Três Asp a Of [1- “O mais guapo”; 2- Trancas de Carvalho (colega do ISA); 3-Almada Negreiros] e Alf QP (4).


Foto 10 – O “meu Pelotão de instruendos”.


Foto 11 – Praia de S. Pedro de Muel, durante a semana de exercícios finais dos recrutas. 1- Cap Art QP Cmdt da Companhia de Instrução praticando tiro ao alvo com bazooka; 2- Eu que também fiz gosto ao dedo.

Seguir-se-ia Queluz por pouco tempo. Um ou dois meses, já que para “embolsarem umas massas”, mandavam de licença registada (?) quem quisesse, até terminar o tempo e antes da promoção a Alferes. Mas aqui eram só os serviços à Unidade e ver passar o tempo, muitas vezes com dispensas alegando “afazeres” no ISA, uma vez que tinha concluído as cadeiras, mas faltava o estágio obrigatório para a obtenção do “canudo”.

Esta era uma Unidade “chave” para os “astros” do Sporting e Benfica, pelo menos, que por ali “passavam” quais “Senhores”, apenas para “assinar o ponto” como se dizia. Pouco faltava para serem os Oficiais a fazerem-lhes continência e não o inverso!

Queluz, além de muito para ver, era quase Lisboa. Logo nada de mau.

Mais tarde, 30AGO61 voltei e, apesar de ser para Lisboa, Santa Apolónia, já não gostei.

A Capital não tinha culpa, mas a forma como fui apanhado e os transtornos que me causaram provocaram-me “azia”. Ainda para cúmulo o serviço podia traduzir-se em “encanar a perna à rã”. E eu com tanto que fazer para realizar o estágio!

Durou este “fadário” até 05FEV62, mas não chegou para mudar a minha opinião sobre Lisboa, que “habitava” desde OUT54.

Se não tinha gostado desta “pseudo brincadeira”, fiquei “pior que uma barata” por ter de voltar a Queluz e entrar novamente no RAAF, de 18AGO62 a 17OUT62, para ministrar nova recruta, sem se importarem pelos transtornos e prejuízos que profissionalmente me causaram.

Oeiras-Queluz e volta ainda que distância relativamente pequena, mas feita diariamente deixavam-me fulo. Valia-me possuir já meio auto próprio, mas já não havia encanto nas belezas de Queluz. Devo acrescentar que já tinha a primeira filha bébé e a minha mulher de férias até quase ao fim de Setembro, passava esses dias comigo em Oeiras e nos dias em que estava de Serviço na Unidade lá ia de camioneta e com a alcofa e o bébé fazer-me companhia durante as tardes.

Finalmente, não contando claro com todas aquelas localidades que conheci na Guiné, colocaram-me, não uma “cereja em cima do bolo”, formado pelas terras que me obrigaram a percorrer, mas um “limão” bem amargo.

Em 24AGO69 “desterram-me” para Mafra. Escusado será dizer que por tudo que essa convocatória significou, a Cidade berço da Escola Prática de Infantaria e aquele Convento de Mafra foi a pior Cidade por onde passei e da qual guardo as piores recordações.


Diploma de Curso.

JPicado
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Nota do editor

Último poste da série de 10 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12821: A cidade ou vila que eu mais amei ou odiei, no meu tempo de tropa, antes de ser mobilizado para o CTIG (24): Caldas da Rainha, com o meu amigo Zé Tito, para uma aventura que havia de ligar-nos por três anos, até Janeiro de 72, quando passámos à peluda (José Manuel M. Dinis)

Guiné 63/74 - P12890: Facebook...ando (35): Mais fotos do CISMI, Tavira... Salinas, Ilha de Tavira e depois, em outubro de 1972, BC 8, Elvas, como 1º cabo miliciano (António Alves da Cruz)


Foto nº 1 >  Tavira, CISMI >   Maio de 1972 >  O instruendo António Alves da  Cruz nas salinas de Tavira



Foto nº 2 >   Tavira, CISMI  > c. maio/junho de 1972 >  "Fim de semana cortado, ilha de Tavira com eles"...



Foto nº 3 >  Tavira, CISMI > c. maio / junho 1972 >  Ilha de Tavira > O instruendo António Alves da Cruz ao centro: "À minha direita, o MachadoL à esquerda, não me recordo o nome"...


Foto nº 4  >  Elvas , BC 8  >  Outubro de 1972 > Findo o 2º ciclo do CSM, o 1º cabo miliciano António Alves da Cruz foi dar instrução a recrutas... Em março de 1973,parte para a Guiné.

Fotos do António Alves da Cruz publicados na página do Facebook da Tabanaca Grande.


1. Continuamos sem saber a undidade a que o nosso camaradas pertenceu no CTIG... E aguardamos a sua resposta ao nosso convite para integrar, de pleno direito, o nosso blogue, embora ele já seja "nosso amigo" no Facebook... Sabemos que o nosso camarada António Alves da Cruz trabalha ana Autoeuropa.

Convirá esclarecer que ser "amigo no Facebook" não dá direito automático a ver o nome inscrito, como camarada da Guiné na lista, de A a Z, dos membros do blogue...As regras que continuam, aqui, em vigor, são: pedido de ingresso, com envio de 2 fotos tipo passe (um antiga e outra atual)  + 1 história...



Fotos (e legendas): © António Alves da Cruz (2014) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: LG]

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Nota do editor:

Último poste da série> 18 de março de 2014 > Guiné 63/74 - P12853: Facebok...ando (34): I want you, António Alves da Cruz!... Conta-nos a tua história, das salinas tavirenses (CISMI, 1972) às picadas de Buba-Aldeia Formosa (CTIG, 1973/74)...

Guiné 63/74 - P12889: Convívios (571): Encontro do pessoal da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, dia 26 de Abril de 2014, em Chaves

1. Mensagem do nosso camarada António Nobre (ex-Fur Mil da CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, Buba, Nhala e Binar, 1969/70), com data de 20 de Março de 2014:

Olá Carlos
Como habitualmente aqui vai o folheto que identifica mais um almoço da minha Companhia.
Peço, pois, insiras no nosso blogue.
Obrigado

Um abraço
António Nobre


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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12852: Convívios (570): CCAÇ 3549 (Fajonquito, 1972/74): 29 de março, Sezures, Penalva do Castelo... Notícias, boas, por outro lado, do Cherno Baldé, o "Chico de Fajonquito", que está a trabalhar, em Bissau, num projeto do PNUD - Programa das Nações Unidas Para o Desenvolvimento

Guiné 63/74 - P12888: Blogoterapia (251): O programa com um vírus que não consigo apagar, remover ou formatar (José Colaço)

1. Mensagem do nosso camarada José Colaço (ex-Soldado TRMS da CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65), com data de 19 de Março de 2014:


O programa com um vírus que não consigo apagar, remover ou formatar

Alguns dados sobre o tema em questão, ou é o povo, os amigos, a família, ou o sistema

Dois exemplos:

Começo pelo primeiro, dado como é do conhecimento público, a ponte sobre o Tejo já teve pelo menos dois nomes no seu registo: "Ponte Salazar" e "Ponte 25 de Abril", mas grande parte da população da minha geração que acompanhou o nascimento desta ponte foi e será a "Ponte sobre o Tejo".

"Ponte Marechal Óscar Carmona". Pergunta: Onde fica?
E uma grande percentagem das respostas é desconhecerem pura e simplesmente, mas o mais hilariante é que alguns, devido à sua vida profissional, a usam quase diariamente.
Mas se a pergunta for: "Ponte de Vila Franca", o nome com que o povo a baptizou, qualquer leigo responde acertadamente.

Guerra da Guiné.
A maioria das Companhias adoptou o seu nome de guerra, desde os Laças de Cufar aos Gringos ou Piratas de Guilege, etc.

Na Companhia de Caçadores 557 nenhum dos seus elementos teve a ideia de criar um nome para a Unidade, talvez por nenhum dos seus graduados ter pertencido ou ter instrução ranger, a não ser o Comandante. Além disso o 2.º Comandante de Companhia era, e é, um anti-guerra colonial.

Mas como referi no início desta narrativa, os amigos ou o povo, neste caso até pode ter sido o inimigo, encarregaram-se de cognominar ou baptizar a CCaç 557. Não é que quando saímos dos dez meses e uma semana do isolamento do Cachil, a 557 começou a ser, sem nós nos apercebermos, conhecida, respeitada, e porque não dizê-lo, temida, pela "Companhia do Como", o que para nós era motivo, me desculpem o termo, de uma certa “vaidade”.

Também aqui o nosso desconhecimento de quem terá sido o incógnito padrinho. Terminada a comissão, regresso a casa, penso que a julgar por mim a 557 diluiu-se e os seus elementos, na sua grande maioria, quiseram enterrar o machado de guerra e tentar esquecer aqueles dois anos de guerra, recomeçar as suas vidas que tinham interrompido.

Como eu e muitos outros ex-combatentes dizem, a guerra além de tudo o que tem de mau, tem uma coisa em que é superior e se distingue, cria e faz amizades que duram e perduram. Não é que passados vinte e dois anos do nosso regresso da guerra, o nosso ex-1.º Cabo João Casimiro Coelho tem a ideia brilhante de reunir na parada civil a 557?

Recorre a todos os seus conhecimentos e contactos, conseguindo reunir em Leiria parte da 557 num almoço de convívio, onde, se a palavra "Como" foi pronunciada, deve ter sido no sentido verbal da mesma, pois do Encontro faziam parte umas entradas, um fabuloso almoço, e a terminar, um óptimo lanche.

Foi dado o mote, e a partir daí, todos os anos a família da 557 se reúne em almoço de convívio, o próximo será o vigésimo sétimo.
Só uma coisa há a lamentar, os ex-combatentes da CCaç 557 são cada vez menos, mas aqui nada há a fazer, é o movimento da roda da vida que não pára.

Para terminar, devido às novas tecnologias e à minha participação no blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné, tenho conhecido nestes últimos anos vários camaradas (ou camarigos como dizemos no blogue) que andaram na guerra da Guiné em várias Companhias. Não é que quando um camarigo me quer apresentar a outro diz: tens aqui o homem da companhia do Como.
Por este motivo o titulo desta crónica: o vírus ou a doença crónica que não há antivírus que o proteja, ou formato que o remova.

OBS:
Camarigo - Contracção das palavras camarada e amigo.

Um abraço
Colaço
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Nota do editor

Último poste da série de 6 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12800: Blogoterapia (250): Assim, com muita honra, sou um "tabanqueiro", e só tenho pena de a falta de tempo me impedir de participar com mais assiduidade (Adriano Lima, Cor Inf Ref)

Guiné 63/74 - P12887: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (17): O Asdrúbal do Cu da Serra e os seus amores tardios

1. Em mensagem do dia 17 de Março de 2014, o nosso camarada José Ferreira da Silva (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), reaparece com mais uma das suas ficções, quem sabe, baseadas em factos reais, para a sua série Ouras memórias da minha guerra:


Outras memórias da minha guerra

17 - O Asdrúbal do Cu da Serra e os seus amores tardios

Na tropa dizia que era do Porto. E como o apanharam em falso, garantia que era de Ermesinde. Porém, quando um “conterrâneo” lhe perguntou de que lugar ou rua, ele começou a gaguejar e jamais alguém acreditou na sua aludida naturalidade. Por isso, por sugestão do Massarelos, ficou baptizado como o Asdrúbal do Cu da Serra. Efectivamente, ele esteve em Ermesinde, no Seminário, uns quatro ou cinco anos, de onde saiu, por “aconselhamento” do guia espiritual, que não via nele a vocação que tanto prometera. A sua franqueza no confessionário terá causado a decisão do padre superior...

Serra de Valongo

Cada vez que o Asdrúbal ia a casa regressava com o saco cheio de pecados contra a castidade e causados por... maus pensamentos. Na origem estava uma bela rapariga, vizinha, que expunha facilmente as suas apetitosas carnes e os seus contagiantes calores. Tinham brincado juntos em crianças, mas, ela, mais velha uns dois anitos, desenvolveu-se rapidamente quer fisicamente quer em experiências amorosas. Aliás, com esses predicados mor(t)ais e liberta muito cedo dos estudos e de quaisquer compromissos, a “Toura”, como viria a ser conhecida, não demorou muito a iniciar uma grande carreira no negócio das carnes. Desadaptado do seu ambiente juvenil, decepcionado e desgostoso com esta paixoneta, o Asdrúbal ansiava a chegada dos 18 anos para incorporar, voluntariamente, uma unidade militar. Esteve na guerra no norte de Angola.

- Ora viva! Já lá vão uns anitos que não nos encontrávamos – disse o Alfredo, à saída do IPO do Porto.
- Sim, desde o funeral do nosso camarada de armas, o saudoso Zé Nogueira – respondeu o Asdrúbal, que acrescentou: - Que andas por aqui a fazer?
- Tive um cancro na bexiga e, como consegui curar-me, resolvi dedicar-me voluntariamente no apoio aos doentes deste hospital. - Respondeu o Alfredo, que continuou: - Enviuvei aqui, onde a minha mulher faleceu com 52 anos. Além dos conhecimentos que eu tinha na área da bioquímica, procurei e pesquisei tudo o que pude para resolver o meu problema e agora sinto-me na obrigação de transmitir o que sei e, ao mesmo tempo, pagar esta promessa até ao fim dos meus dias.
- Tiveste sorte, dá graças a Deus. Pois eu ando para aqui a correr, para fazer companhia à minha mulher que conseguiu juntar três cancros. Durmo cá todas as noites. Vou agora para casa fazer umas coisas e descansar um bocado. A minha filha foi lá para Lisboa, apaixonou-se por um mouro e quase não quer saber de nós. Isto não é vida, mas que hei-de fazer? – Observou o Asdrúbal.


O tempo ia correndo e nada se alterava. Apenas a colaboração do Alfredo se foi salientando, quer no apoio à doente, quer na moralização do camarada Asdrúbal.

Entretanto, o Alfredo foi falando da sua intensa actividade solidária, também através de um grupo de ex-combatentes. O Asdrúbal sentiu-se atraído por esse grupo bastante activo nas redes sociais, especialmente através do Facebook. Pouco depois já vinha matando o tempo nesse e noutros grupos similares que proliferam pela internete.

Grande parte dos facebookianos mostram, apenas, as fotos que mais os favorecem, o que é natural. Porém, entre os ex-combatentes (já sexagenários), abundam as fotos do tempo em que serviam a Pátria, nos seus quadros de guerra. Ora esses mocetões de peitos salientes e peludos, mesmo fardados, são uma atracção para as mulheres mais maduras. Viúvas, divorciadas, solteironas e mal-casadas aparecem a colar e a mostrar também as suas imagens mais favorecidas. Talvez seja por isso que existem tantos relacionamentos amistosos, mesmo que a maior parte das vezes, se considerem, essencialmente, virtuais. Desta forma, o amor paira no ar através do monitor do computador, quer no relacionamento via teclado, quer no contacto falado e visual através do Skype. E, daqui a umas sessões privadas de striptease (via monitor), é um pequeno passo.

É neste contexto social que vêm aparecendo casos e mais casos de uniões matrimoniais e de facto, merecedoras das mais belas páginas de amor.

O Asdrúbal foi sempre um homem avantajado. Já desde o tempo em que saiu do seminário ostenta um corpanzil de mais de 1,80m. Outrora bastante magricela, mas, agora, revestido com mais de 100Kgs. Visto de frente, sem que a sua exuberante barriga seja perceptível e vestido de tropa especial, carregado de insígnias e outros adornos militares, ele parece um General dos Marine dos USA. Por outro lado, o seu aspecto triste que, para nós, não é nada agradável, talvez esteja na origem de uma melosa paixão vinda do outro lado do Atlântico. Ela, a Donaida (Naidinha), uma brasa carioca de 42 anos, logo que soube da viuvez do Asdrúbal, arriscou tudo para vir consumar essa grande paixão.
Entusiasmado e crente, o Asdrúbal nem parecia o mesmo. Os últimos três anos de sofrimento junto da mulher hospitalizada e condenada, acentuaram o seu aspecto melancólico. Todavia, em pouco tempo, revitalizou-se milagrosamente.

Num dos convívios de ex-combatentes, o Asdrúbal falou-nos da sua felicidade e da sua determinação em mandar vir a sua Naidinha. O Silva, sempre na borga, pôs-lhe a mão nos cantos da testa, esfregou e perguntou:
- Ó morcão, tu queres mesmo ser corno, aos 70 anos? Vê lá no que te vais meter.
- Lá estás tu com as tuas brincadeiras. Olha que isto é mesmo sério – respondeu o Asdrúbal, perante a gargalhada geral.

De seguida, querendo justificar-se, acrescentou:
- A minha reforma é baixa. Não tenho nada a perder. Ela é muito independente. É especialista em massagens e depilações. Até tem uma sociedade com uma amiga. É muito conhecida na sua cidade, onde foi candidata a Deputada pelo partido do Piririca.

Então o Silva colocou-se a seu lado e pediu ao Maia que lhes tirasse uma foto “antes de…”.

O certo é que uns dias depois, o Asdrúbal confidenciava com o Alfredo:
- A Naidinha vem brevemente e eu ando preocupado porque já não desenferrujo o prego há mais de 3 anos. Nem sei se terei tesão para ela.

O Alfredo animou-o e disse:
- Como ela é boa e bastante experiente, não vais ter dificuldade nessa matéria. E continuou: - Olha, eu é que estive bastante mal nesse aspecto. Parei de f...r e como fiz medicação muito forte contra o cancro da bexiga, tive dificuldades em recuperar. Até a p… encolheu. O que me valeu foi um tratamento especial, feito na Clínica, onde duas enfermeiras me esticavam o material por processo mecânico e por massagens locais. Chegou uma altura em que a p… crescia só a pensar nessas massagens. Quando chegava à Clinica já ia armado. Elas aconselharam-me a iniciar os treinos junto de uma amiga. Hoje ainda tenho essa relação que me recuperou imenso.
- Oh lá, lá! Voici le padrecô da Fonte Velha! – observou uma senhora, dentro do Supermercado, apontando para o Asdrúbal.

Bastante surpreendido, até corou com as palavras da sua Belinha, outrora conhecida pela Toura da Ponte Nova. Como ficou embasbacado com a investida, ela acrescentou, num esforçado português destreinado e meio afrancesado:
- Talvez tu já ne me conais pas. Eu estou en France depois longos tempos. Casei e maintenant sou viúva mais de trois ans. Há muito tempo eu gostar de falar com o Asdrúbal. Lembrar tempo crianças. Sempre lembro tu a regarder moi, espreitar-me no campo. Eu rapidement dire que tu padre jamais.
- Belos tempos. Era novito e nem sabia o que fazer. Hoje reconheço que fui um morcom. Quando vou lá à aldeia recordo sempre a nossa meninice.
Agora mais à vontade, acrescentou:
- Vim às compras porque vivo sozinho. Também fiquei viúvo há cerca de meio ano. A minha mulher era muito doente. A vida não foi nada fácil.

À saída, a Senhora Isabel ofereceu-se para o levar na sua potente viatura BMW, ao que o Asdrúbal não se escusou. Durante esta curta viagem em que lhe correu um grande filme, ainda teve tempo para analisar as potencialidades da Toura colaborar num treino sexual, caso lhe sentisse alguma abertura. Mandou parar o carro e disse:
- É aqui que eu vivo. Hoje já não saio. Vou fazer umas coisitas e mais tarde vou fritar os jaquinzinhos. Vai ser uma barrigada.
-Moi ne sais pas que fazer. Mais o que gostava même era de manger jaquinzinhos. Tu donne-moi alguns? – Perguntou a Belinha. - Se quiseres, até os podes vir cá comer. – convidou o Asdrúbal.

Mal a Belinha seguiu, o Asdrúbal preocupou-se em ir procurar comprimidos azuis (ou brancos) para não ficar mal nos possíveis e desejados treinos.
A Belinha já acusa o peso dos seus 72 anos e o cansaço de quem sofreu muito na estrada da vida. Porém, a forma como se prepara, salientando as partes que julga serem-lhe mais favoráveis: olhos escuros, lábios carnudos, peitos salientes, traseiro arredondado e pernas torneadas, fazem dela um petisco ainda “comestível”.

Enquanto ultimavam a mesa com alguns aperitivos e os respectivos jaquinzinhos, eles iam falando das suas vidas, com especial destaque, no facto do falecido Pierre ter deixado bem a Madame Izabel Duval. Dizia ela:
- O Pierre era um cavalheiro. Toujours il me amou e respeitou. Tinha 82 anos quando morreu souvent. Senti beaucoup a sua falta. Foi para mim um pai e um marido sérieux. Il m’a fait sentir uma madame “à maneira”. Se hoje sou uma senhora, devo-o a ele. De resto, les autres hommes que j’ai connu seullement queriam este meu corpinho que Deus me deu e plus rien.
- Eu compreendo-te perfeitamente, dizia o Asdrúbal, que concluiu: - Não é para admirar, porque mandaste sempre um cabedal de primeira.

Conversados, bem comidos e bebidos, a Belinha pediu para ficar a ver a telenovela portuguesa que, na sua opinião:
- Aquilo é só putedo e paneleiragem. Copiaram dos brasileiros. Mas eu até acho engraçado ces histoires.

Logo que o Asdrúbal se apercebeu de que a Belinha estaria disposta a outro tipo de peixe, foi tomar meio comprimido de viagra. Quando acabou a telenovela, já estavam encostados um ao outro, sentados no sofá. Ele como não sentia o efeito do viagra, levantou-se e foi tomar um comprimido inteiro. Não queria perder esta oportunidade. Quando regressou, ela, abanando com as mãos a blusa desabotoada, atirou-lhe:
- Ui, que chaleur! Não sei se foi do vinho. Agora que te vejo a olhar para moi, fazes-me lembrar a cara de esfomeado, quando ias para o quintal caçar grilos.
- Podia não caçar muitos grilos mas não era por falta de gaiolas – respondeu-lhe.

De repente criou-se uma empatia tal em que o Asdrúbal assumiu o papel do engatatão que, em tempos, tanto lhe faltara.

Sobrado - Valongo

Três dias depois, no “Encontro de ex-combatentes”, o Asdrúbal respirava confiança e satisfação. Nem parecia o mesmo. O Alfredo interrogou-o logo mesmo na frente do Silva:
- Então, já fizeste os treinos? Sempre vais mandar vir a brasileira?
- Digo-vos uma coisa: não sei se foi da dose do viagra e meio que tomei ou se foi da limpeza dos tubos enferrujados. Só sei que tive uma noite de trabalho intenso e nem deixei a Toura dormir. Aquilo foi sempre a aviar. Andava a sonhar com ela pr’aí há sessenta anos! Tantas f...s que perdemos!

O Asdrúbal contou a coincidência do encontro que deu azo a ter-se saciado com a mulher que mais desejou em toda a sua vida.
- E ela aguentou? - Perguntou o Silva.

Ao que ele respondeu:
- Claro. É muito sabidona. Sabiam que aquela era a tal gaja da minha infância? Quando regressava ao Seminário via-a em todo o lado, até dentro da capela. Deu em puta selecta. Ela disse-me agora que o culpado foi um tio que lhe tirou os três aos quinze anos. Hoje é uma senhora viúva de um francês que já lerpou. O velho deixou-lhe umas massas e ela veio cá passar uns dias. Ficou apaixonada por mim e quer que eu vá para França. E logo agora que vou receber a minha boneca.
E continuou:
- Estais a rir de quê? Olhai que ela já nem queria ir para casa. E sabem o que ela me disse? - Já comi muitos quilómetros de p… mas nunca fiquei tão satisfeita!
- Já mandei vir a Donaida, Chega no dia 10. Vou buscá-la a Lisboa.

O Alfredo alertou-o:
- Tem cuidado com isso. Olha que o Zé Ribatejano contou que um amigo dele, que tinha uma reforma de luxo, entrou-lhe pelo Banco dentro a chorar e desorientado porque não sabia o que fazer. Andava todo entusiasmado com uma brasileira que lhe chupou tudo, ficou hipotecado sem saber e acabou por descobrir que ela trouxera do Brasil um gajo que estava hospedado em Santarém, de onde a ia orientando.
- Mas eu conheço o caso do Fonseca de Penafiel que leva uma vida feliz com a brasileira que arranjou. A minha Naidinha parece porreira e gosto dela – respondeu o Asdrúbal.
- Se assim é, não quero travar a mínima coisa – justificou o Silva, que continuou: - Em questões do amor, não quero interferir em nada porque já tive experiências muito desagradáveis. Se isto é realmente uma questão de amor, embora mantenha as minhas reservas, podes contar com todo o meu apoio. Aliás, deixarei de brincar com o assunto.

Foram quinze dias de lua-de-mel. Todos os contactos do Asdrúbal irradiavam felicidade. Ao mesmo tempo ia informando que era relacionamento sério e que era para casar. Aliás, a Naidinha não aceitava outro tipo de relacionamento.
- Meu bem, gostaria de ir Domingo a Guimarães, visitar minha prima Tété e passarmos pela Trofa, para levar connosco a sua filha Dédé – pediu a Naidinha.
- Tudo bem, meu amor, mas olha que temos gasto muito dinheiro e eu não tenho possibilidades para mais – respondeu o Asdrúbal, assumindo a posição de chefe de família bem controlada.

Em Guimarães, durante o almoço com as primas, onde se juntou o Julinho e a Nair, o Asdrúbal afastou-se, para ir dar uma mija. Como o WC era próximo, elas não se apercebiam de que, com o entusiasmo que estavam, dava para ouvir a sua conversa:
- Nós estamos a ganhar bem; eu por aqui e a minha Dédé lá nos arredores do Porto. Você vai ver que, com o corpinho que tem, não vão faltar clientes. Tem que casar rapidamente com o velho para poder ficar em Portugal, porque da outra forma, pelo turismo, não há possibilidades.

O Julinho também encheu de elogios a Naidinha, encorajando-a a integrar o “grupo de trabalho”.

Durante o regresso, o Asdrúbal nem sabia o que dizer. Limitou-se a pensar e repensar que, afinal, estava mesmo metido com putedo de primeira. Antes pensava muito nas carícias e nas palavras amorosas da Naidinha mas, agora, até lhe vinha à cabeça a sua recusa em fazer sexo oral e anal. No primeiro caso, ela alegava falta de ar e no segundo porque prometera à Santa do Caravágio manter a virgindade na bunda até ao casamento católico.

Já só via uma saída: mandá-la de regresso para o Brasil e, entretanto, aproveitar para lhe dar mais umas f…. valentes, como pagamento parcial do seu oneroso investimento.
Durante a noite, ele tentou cobrar o máximo mas, além de não sentir a potência necessária, a Donaida desculpou-se com o cansaço do dia agitado. Foi para o sofá, onde passou a noite.

Logo de manhã, passou pela Agência de Viagens, tratou da passagem de regresso da Naidinha, que encontrou ainda na cama.
- Naidinha, por favor vem sentar aqui no sofá, porque precisamos falar.
- Meu bem, que se passa, gosto não di vê você assim tão sério?
- Depois da viagem de ontem, verifiquei que tu pertences a outro mundo e eu não gosto dele. Não gostei nada de te ver amiga daquela gente.
- Mas, meu bem, elas são minhas primas. Você não vai condená-las por serem profissionais do sexo e ao Julinho que é o seu protetor. São todos boa gentche. Tchjura.

E acrescentou:
Nois não temos nada com isso, vamos casá e levá uma vida diferentche. Uma vida de amorrr e de paíssz.
- Já aqui tens a passagem. Podes estar comigo estes dias sem qualquer problema. Ficas à vontade, tenho aí outro quarto.

A Naidinha nem queria acreditar no que se estava a passar. Agarrou-se a ele, fez-lhe juras de amor e de fidelidade.
- Meu bem, eu amo você, nasci pra você e quero vivê só com você, toda sua vida. Eu lhe vou fazê uma massage para você relaxá e afastá o mau astral.

Acariciou-o tanto que ele começou a sentir-se arrependido pela decisão que havia tomado.
- Ok, então vais lá tratar dos assuntos que deixaste pendentes e voltas.

Logo no início da tarde, o Asdrúbal foi procurar reabastecer-se de material excitante e contactou o Zé Maia, que lhe arranjou “um verniz especial para endurecer madeira”.

Dois meses depois, o Asdrúbal queixava-se de que já lhe havia enviado dinheiro três vezes e ela ainda não via oportunidade de voltar. Precisava sempre de mais dinheiro. No entanto, ela não parava de lhe telefonar, mantendo-o amorosamente preso pelo beicinho.
- Ouve lá, ó morcom - interpelava-o o Silva no “Encontro” de Janeiro:
- Como é possível continuares a acreditar nessa mulher?

Ele respondeu:
- Tens razão, ela é uma putéfia de primeira, mas eu gostava muito dela. Ela era tão doce, tão meiga e tão boa que eu até me passava. Agora que vejo que vai ser difícil ela voltar, confesso-te uma coisa: - Com uma bunda daquelas, tenho pena de não a ter enrabado. É que ela era mesmo virgem e não parava de me falar no seu juramento à Santa do treinador Scolari. E continuou: - Estás a rir de quê? Disso percebo eu. Desde pequenino.

(Nota final: Há mais de quinze dias que o Asdrúbal não dá sinais de vida.
A última informação colhida foi que “estava a pensar emigrar para França”).

Silva da Cart 1689
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Nota do editor

Último poste da série de 18 DE MARÇO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11273: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (16): É guerra é guerra... (será?)

Guiné 63/74 - P12886: Memórias de um Lacrau (Valdemar Queiroz, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70) (Parte X): Quando a corte dos Lacraus chegou a Canquelifá...



Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Nova Lamego > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > O Valdemar Queiroz, a fumar, com o filho de um soldado da companhia
 


Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Nova  Lamego > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > O Valdemar Queiroz,  de sargento de dia (1)



Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Nova lamego > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > O Valdemar Queiroz,  de sargento de dia (2).. [Meados de 1969, tempo das chuvas. LG]

Fotos (e legendas): © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados. [Edição. L.G.]



1. Mensagem, de hoje, 1h50, do Valdemar Queiroz:

Boa noite, Luís Graça;

Chego atrasado, no Dia Mundial da Poesia... E tenho pena de não saber de cor o poema "D. João VI e a mulat", completo...

Quando a corte de D. João VI
Chegou a Paquetá,
Tudo servia de pretexto
P’ra censurar, p’ra criticar
Certa mulata que havia lá!...


Quem sabe esta pérola completa, que mete perninhas de frango nos bolsos de D. João VI, é o ex-fur mil Aurélio Duarte, da nossa CART 11, que é de Coimbra, e que, depois de uns estrondosos, eferreás, declamava esta poesia em que o D. João VI respondia aos inimigos da mulata nestes termos:

Já lhes disse que aqui em Paquetá
Eu sigo a lei da corte de Lisboa
E não me digam que a mulata é má
Porque eu decreto que a mulata é boa...


Hoje faz 44 anos que estvémos juntos em Canquelifá!...

Tivemos um desentendimento a jogar matraquilhso na rua.principal, num fim de tarde. Já bem bebidos, resolvemos jogar matraquilhos, mas de cócoras, sem ver o recinto de jogo  (Ganda bezana!)... As bolas entravam de um lado e do outro e o Aurélio perdeu.

Ele não gostou e embrulhámos os dois à tareia, sozinhos, sem ninguém para nos separar. O Duarte com o seu metro e oitenta e  e eu com o meu metro e sessenta e sete... . Eu, com mais agilidade, deixei-me cair e o Duarte foi projetado, estatelando-se. Partiu um braço e, assim, andou, num grande sofrimento uns meses.

Ainda hoje ele me diz. "Ò Queiroz, aquele teu golpe de judo em Canquelifá!"...

Um abraço, Queiroz.


Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Canquelifá > CART 2479 / CART 11 (1969/70) > Bajudas <


Foto. : © Valdemar Queiroz (2014). Todos os direitos reservados. [Edição. L.G.]

2. Comentário de L.G.:

Em tua homenagem e ao teu amigo e camarada Aurélio Duarte, e aos demais Lacraus,  recordando os bons velhos tempos de Paquetá, quero eu dizer, Canquelifá, ai vai a letra completa, recuperada da Net... Um alfabravo. Luis
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“D. João VI e a mulata”

Música; Armando Rodrigues
Letra: R Calado
Disponível no You Tube
Cortesia de Manuel Casimiro de Lopes Lopes

Canto de Villaret da Côrte de D. João VI e a Mulata de Paquetá,
gravado no Teatro Boa Vista,
em Lisboa no ano de 1954.

Quando a corte de D. João VI
Chegou a Paquetá,
Tudo servia de pretexto
P’ra censurar, p’ra criticar
Certa mulata que havia lá.

Diziam que ela era um perigo,
Que ela era uma tentação,
E que um marquês de nome antigo
Desdenhava o rei, não cumpria a lei,
P’ra ser só dela o cortesão.

Mas, quando alguém o censurasse,
Pedindo ao rei que a exilasse
Pelo mal que fazia,
D. João VI trincava uma coxinha,
De frango ou de galinha,
E sempre respondia:
–  Já lhes disse que, aqui em Paquetá,
Eu sigo a lei da corte de Lisboa
E não me digam que a mulata é má,
Porque eu decreto que a mulata é boa.

Certa noite muito escura,
A moça se assustou,
Vendo surgir uma figura,
Gorda, a ofegar,
Que, sem falar,
Nos gordos braços logo a apertou,
Ela sentiu-se muito aflita,
Como a dizer que não,
Até na treva era bonita,
E lá fez de conta, que ficava tonta,
Sem saber que era o seu D. João.

Mas,  quando alguém o censurasse,
Pedindo ao rei que a exilasse
Pelo mal que fazia,
D. João VI trincava uma coxinha,
De frango ou de galinha,
E sempre respondia:
Já lhes disse que aqui em Paquetá
Eu sigo a lei da corte de Lisboa, 
E não me digam que a mulata é má
Porque eu já sei como a mulata é boa.

[Letra disponível aqui... Por Linhas  Tortas > 17 de março de 2008 > D. João VI...Reproduzida com a  a devida vénia] [Revisão / fixação de texto: LG]

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Guiné 63/74 - P12885: Brochura, "Deveres Militares", SPEME, 2ª ed, 1969 (Fernando Hipólito): Parte III: Será que a lerpa, jogada no CTIG, nas longas noites de insónia, violava o nº 21º do art. 4º do RDM - Regulamento de Disciplina Militar, então em vigor ? Ou as bebedeiras de caixão à cova... não caíam sob a alçada do nº 24 º ?











Continuação da reprodução da brochuira "Deveres Militares", onde naturalmente não se fala... de direitos... A lista dos deveres de um miliatar é (ou era) longa...Publicamos os restantes 5... Ou haver mais  ? Ao todo parece que são ou eram 25 (*)... No atual RDM - Regulamento de Disciplina Militar, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 142/77, de 09ABR, com diversas alterações, a lista dos deveres é o dobro, chegando ao nº 55.... (Entro em vigor em 10 de abril de 1977, e foi promulgado pelo então Presidente da República António Ramnalho Eanes)


Fonte: "Deveres Militares", 2ª edição, SPEME, 1969. A 1ª edição é de 1963. E há uma 4ª edição de 1973. (*)

1. O documento chegou-nos, digitalizado, por intermédio do Fernando Hipólito e César Dias.  

O Fernando Hipólito [, foto atual à esquerda, ] é o nosso novo grã-tabanqueiro, com o nº 650...  Passou pelo CISMI, Quartel da Atalaia, Tavira, 3º turno, 1968. Foi fur mil, CCAÇ 2544, Angola, 1969/71. Esteve a maior parte do tempo no leste, em Lumege.

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Nota do editor:

Postes anteriores da série:

sábado, 22 de março de 2014

Guiné 63/74 - P12884: Bom ou mau tempo na bolanha (49): Tira-me o retrato (Tony Borié)

Quadragésimo nono episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGRU 16, Mansoa, 1964/66.



Para quem visitou grandes cidades, grandes metrópoles, como Nova Iorque, São Francisco, Denver, Phoenix, São Louis, Los Angeles, Miami, Londres, Atalanta, Washington, Orlando, Las Vegas, Tóquio, Houston, Hamburgo, Paris, Rio de Janeiro, São Paulo, Roma, Milão, Bruxelas, Frankfurt, Amesterdão, Madrid, Porto, Lisboa, Chicago, Toronto ou até Montereal, sabe que em quase todas essas grandes cidades, as suas principais atracções se resumem ao Aeroporto, cheio de lojas a tentar as pessoas, ao seu qualquer grande museu, que sempre dizem que é único no mundo, a um parque, às vezes mal tratado, com alguns bancos, passadeiras em cimento, talvez um pequeno lago e algumas árvores que, ou são centenárias e vão resistindo ao “cimento armado”, ou são “rafeiras”, quase a morrer. Toda a gente lhe rouba uma folha, lhe encosta uma bicicleta, os animais abusam delas e, o “cimento armado”, a espreitá-las, esperando a oportunidade para avançar!.


Também têm um qualquer complexo de desportivo, representando o clube lá do sítio, que também dizem que é o melhor do mundo, o complexo da Universidade, que quando é um edifício antigo, até vale a pena ver, e todas, mesmo todas, têm a “Main Street”, que é uma rua, normalmente na parte baixa da cidade, fechada ao trânsito automóvel, com todas aquelas lojas que vendem “produtos de marca”, restaurantes “temáticos”, com mesas e cadeiras na passadeira, que servem uns pratos com muito pouca comida e muita cerveja, a um preço, que nós que somos “daquele tempo”, consideramos um roubo!

Se a cidade tem mar, rio ou um grande lago, normalmente, existe uma ou mais pontes, diferentes, umas mais bonitas e elegantes do que as outras, mas menos funcionais, uma zona a que chamam “marina”, ou “zona do porto”, onde talvez exista um aquário, onde tornam a dizer que tem umas “espécies muito raras”, talvez do outro mundo, onde se repete o cenário, lojas de recordações, onde se compra algo, que não mais se usa, restaurantes “temáticos”, com pouca comida, muita bebida, um preço louco, uma vista bonita, que talvez seja paga na bebida.


O resto é cimento, cimento e cimento, e as zonas periféricas, de onde talvez se possa avistar o tal cenário bonito da cidade, mas quando nos preparamos para avistar ao longe, se repararmos ao perto, vemos as casas em muito mau estado, as estradas congestionadas, as pessoas apressadas, às vezes empurrando-se, onde ninguém, ou quase ninguém se conhece. Posso estar a exagerar, mas no fundo é isto.

Ora companheiros, depois de falar de todo este “cimento armado”, cada vez tenho mais saudades da vila de Mansoa, sim de Mansoa, tal como muitos companheiros, pelo menos nos últimos postes têm falado da vila de Bafatá, Mansabá, Bissorã, não de Olossato, onde para mal daqueles martirizados militares que lá se encontravam, pouco mais havia do que as instalações do aquartelamento, pelo menos naquele tempo, mas em Mansoa, que já mais de uma vez eu disse que considerava a vila, o tal “Posto Avançado de Fronteira”, pois naquele tempo, era a partir daqui que começava a verdadeira guerra.


Lá também havia a “Main Street”, onde existiam alguns canteiros com flores, pintados de branco tal como o tronco das árvores, a loja do Libanês, onde no lugar de roupas de marca, se podia comprar desde o sabonete “Lifebuoy”, uma agulha e alguns botões ou uma camisa de tecido fino e branco, de manga curta, que tinham vindo de Macau e eram muito populares entre os militares, quando “trajavam à civil”, e creio que só havia duas medidas, (grande ou pequena), que nós emprestávamos uns aos outros, o edifício dos correios, mais um pouco abaixo o “Clube dos Balantas”, o mercado, a Igreja, e as bolanhas nos arrabaldes da vila, eram como se fossem “espelhos de água”, que as grandes cidades gastam fortunas para manter a água limpa, o rio, a ponte, também havia a “zona do porto”, claro, cheia de lama, onde as canoas do Iafane estavam ancoradas, a taberna da “Cabo-verdiana”, que servia, só às vezes, comida com muita fartura, a um preço que nem pagava a lavagem da louça, e a cerveja, tal como o pão, umas vezes roubados no quartel, outras vezes desviados, antes de chegar ao quartel, pelo menos a cerveja, quando vinha da capital.




Tal como em Nova Iorque as pessoas gostam de fotografar a Estátua da Liberdade, o Empire State Building, o Rádio City ou a ponte de Brooklyn, lá em Mansoa, os pontos mais fotografados eram a ponte sobre o rio e uma placa de sinalização, que se encontrava logo à entrada da vila, logo depois da ponte, que dizia: Encheia, Nhacra, Bissau, Porto Gole, Enchalé, Bambadinca e Bafatá, e com uma seta a indicar a direcção, não vá algum descuidado meter-se pela mata dentro, ou mesmo atravessar uma bolanha, pois naquela altura, as estradas eram pouco mais que carreiros.


Quase todos os militares ali estacionados tiravam uma fotografia junto da placa de sinalização, a quem o Curvas, alto e refilão, chamava o “urinol”, pois muitas vezes se viam cães vadios, magros e cheios de insectos no corpo, de perna alçada, junto ao poste da placa, onde às vezes o Curvas, alto e refilão e não só, vindos da sede do clube de futebol, depois de terem bebido, também se encostavam à placa e urinavam.

Às vezes, quando regressávam da sede do clube de futebol, já um pouco tontos, depois de beber cerveja, vinho, ou qualquer outro licor, o Setúbal, quase sempre dizia:
- Chegas à placa... e viras á esquerda, sempre em frente... sem olhar para ninguém, e entras no quartel antigo..., depois é só atravessar o arame farpado e estás dentro do aquartelamento...

Não havia dúvida que era um bom sinal de orientação.


A ponte, que tinha um arco de cada lado, (foto onde está o Cifra com um companheiro, que oxalá ainda esteja vivo e a veja), onde se faziam apostas, cujo prémio, às vezes era um maço de cigarros, em quem era capaz de atravessar esse arco, caminhando e batendo palmas, ao mesmo tempo.

Havia alguns que com certa coragem começavam, mas quando chegavam ao meio do arco e este começava a descer, voltavam para trás, muitas das vezes de joelhos. Havia só um militar, que era o Marafado, que atravessava todo o arco, fazendo o pino, ou seja, caminhando com as mãos, mas a troco de uma cerveja ou de um maço de cigarros “Três Vintes”. Ele dizia que tinha trabalhado num circo.

Havia a ponte velha, esta a preferida do Cifra e de outros militares que queriam alguma paz, e onde se passavam horas, sentado, fumando, pensando na aldeia atrás da montanha em Portugal, apreciando a área alagadiça, quando da maré cheia, com alguns pelicanos descendo o rio, mergulhando o pescoço, na procura de algum peixe.

Tony Borie, Março de 2014.
P.S. - Algumas destas fotografias foram cedidas pelo companheiro César Dias.
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Nota do editor:

Último poste da série de 15 de Março de 2014 > Guiné 63/74 - P12842: Bom ou mau tempo na bolanha (48): Bolanhas em dois continentes (Tony Borié)

Guiné 63/74 - P12883: Blogpoesia (385): O Dia Mundial da Poesia, 21 de Março de 2014, na nossa Tabanca Grande (XVI): Écloga em tempo de guerra, de David Mourão Ferreira, com anotações de Joaquim Luís Fernandes (ex-Alf Mil da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1973 e Depósito de Adidos, Brá, 1974)

1. Mensagem, com data de ontem, do nosso camarada Joaquim Luís Fernandes (ex-Alf Mil da CCAÇ 3461/BCAÇ 3863, Teixeira Pinto, 1973 e Depósito de Adidos, Brá, 1974):

Caro amigo e camarada Luís Graça

Não sendo poeta mas gostando de poesia, não posso deixar de responder positivamente ao desafio que nos lanças.

Assim, valendo-me de um dos livros de poesia, dos que me acompanharam durante a minha comissão na Guiné e nos quais procurava afogar as minhas mágoas, escolhi um poema para partilhar com a Tertúlia, se assim o entenderes, que lia com frequência, como desabafo, protesto e consolo, chegando ao ponto de modificar algumas palavras para melhor se enquadrarem com a flora local e melhor o sentir.


O livro é: "A Arte de Amar, 1948/1962",  de David Mourão Ferreira. Lisboa Editoral Verbo 1973, 271 pp. O poema é: Écloga em Tempo de Guerra , que ele dedicou a Jos]e Regio

As palavras entre parenteses [, retos, em itálico], junto a outras similares dos versos, eram as que trocava, não alteravam o sentido nem a rima do poema e assentavam melhor na minha situação.

Em anexo envio o poema, com essas adulterações. Faz dele o que julgares melhor.

Um abraço

JLFernandes


2.  ÉCLOGA EM TEMPO DE GUERRA,

de David Mourão Ferrerira

A José Régio


Só grilos desafinados
povoam a solidão.
Pastor de almas de soldados,
sigo nos campos lavrados,
sem ouvir o coração.
Se o ouvisse, que ouviria?
Alegria?
Certo, não.

Sem palavras e sem gestos,
pisando estevas e trigo [capim],
nestes caminhos funestos
alimento-me dos restos
do passado que persigo [há em mim].
(E nem sequer receamos,
entre os ramos,
o inimigo.)

Sob céus de Primavera,
por entre olivais [palmeirais] de prata,
seguimos... e quem nos dera
que a nossa febre esquecera
quem de nós nos arrebata!
Não são ’stranhos que tememos.
Bem sabemos
quem nos mata.

Que destino tão errado,
o que haviam de me impor!
Pastor a soldo forçado
de um gado que não é gado,
nem precisa de pastor!
E vamos!, vidas marcadas
p’las espadas
do terror.

“Maldito seja quem faz
profissão da nossa morte!
Quem ordena, lá de trás,
em segurança, na paz
que injustamente o conforte!”
(Mudos embora, este grito
fica dito
desta sorte.)

E vamos, como ciganos,
mas sem nenhuma aventura.
Seguem, atrás, os garranos,
pacientes, quase humanos,
a moer a terra dura.
– E segredam-nos os ventos
que estes tempos
são loucura.

À sombra de um castanheiro [mangueiro],
eis que paramos, cansados,
para instalar um morteiro
que faça fogo certeiro
sobre outros, sobre outros gados
– inocentes como o nosso,
mas que um fosso
fez danados!

Nenhuma ordem nos chega.
Ainda bem! Inda bem!
– E, cegos, na noite cega,
cada corpo é uma entrega
à calma que lhe convém.
Até o vento, mais brando,
vem sonhando
com alguém...

... E sonha então cada qual
com as pastoras distantes...
Uma zagala, um zagal...
No recanto de um pinhal [palmeiral],
promessas exuberantes...
(Anda sempre a mesma história
na memória
dos amantes!)

Se o dia há-de ser de luta,
que a noite não tenha fim!
Ao menos, quem quer desfruta
a placidez impoluta
de um primitivo jardim.
E se mais nos não concedem,
se é esse o preço que pedem,
seja assim!

David Mourão Ferreira / [Adapt. de Joaquim Luís Fernandes]

3. Comentário de L.G.:

Joaquim, a fechar esta longa maratona em que quisemos, à nossa maneira, celebrar o Dia Mundial da Poesia (*), que foi ontem, 21, deixa-me discorrer sobre este estranho fenómeno: dizem que Portugal é um país de poetas, mas não de leitores de poesia... É provável que se publiquem mais do que um livro de poesia por dia, sendo muitas as edições de autor. Estamos a falar de 3% de todos os títulos em língua portuguesa que, em 2012, atingido um total de 9473 (dos quais 73% são originais e os restantes 27% são traduções (Fonte: Pordata - Base de Dados Portugal Contemporâneo). 

Estamos a falar de monografias, ficam de fora desta estatística as publicações periódicas...Mais de 5% do total de originais (N=6892) devem ser livros de poesia...

No entanto, quando falamos de poetas e de poesia, é preciso mostrar alguma cautela com a palavras (i) "poeta" é o que escreve poesia, mas também o "idealista", o "sonhador", o que "é dado a devaneios",  o "o que anda sempre nas núvens", o até o "pateta"... A palavra tem, às vezes, em certas bocas, conotações pejorativas.. Por exemplo, diz o povo: "De poeta, médico  e louco, todos nós  temos um pouco"...E da poesia diz que é "a música da alma",,,

Quem, de nós, na adolescência e na juventude, não escreveu pelo menos uma quadra, uns versos, uns poemas com ou sem rima, à sua amada ? E na Guiné, nas horas de solidão e lassidão, nos diários, nas cartas e nos aerogramas, escreveram-se versos...  Não importa a qualidade literária, são documentos de uma época e de uma geração... Muitos ter-se-ão perdido... Outros foram destruídos.. Outros ainda estarão esquecidos algures, numa gaveta, mala ou baú...

Joaquim, fechas com chave de ouro esta nossa iniciativa, que mobilizou cerca de duas dezenas de autores, incluindo 3 amigas nossas, a Regina Gouveia, a Joana Graça e a Filiomena Sampaio. E, contrariamente, à ideia feita de que a poesia não se lê, o nosso blogue teve, ontem,  6ª sexta-feira, o melhor desempenho da semana, com um nº de visitas superior a 2600. Bem hajam a todos e todas!

Já agora, que fostes desencantar  (e adaptar)  o conhecido poema de David Mourão Ferreira (1927-1996), "Écogla em tempo de guerra", deixa-me, Joaquim, dar aos nossos leitores só uma pequena dica, para melhor interpretação dos versos do  poeta...

Este poema tornou-se conhecido quando, em 1971, foi musicado, em França, por Luís Cília, Mas o David Mourão Ferreira tê-lo-á escrito muito antes, na altura em que cumpria o serviço militar, e por sinal em Portalegre, onde foi reencontrar (e fez amizade  com) o grande poeta e esritor José Régio (1901-1969), natural de Vila de Conde. (Régio viveu praticamente toda a sua vida naquela cidade do Alto Alentejo, onde foi professor de liceu, e onde tem um museu, que é visita obrigatória, a Casa-Museu José Régio).

Este poema deve datar de 1952 quando o poeta foi aspirante, miliciano, em Portalegre, no BCA nº 1, presumo, e onde deve ter dado instrução a recrutas:

"(...) Pastor de almas de soldados, / sigo nos campos lavrados, / sem ouvir o coração. / Se o ouvisse, que ouviria? / Alegria? Certo, não.( (...) Que destino tão errado,/ o que haviam de me impor! Pastor a soldo forçado / de um gado que não é gado, / nem precisa de pastor! / E vamos!, vidas marcadas /p’las espadas do terror." (...) "E vamos, como ciganos,mas sem nenhuma aventura. / Seguem, atrás, os garranos, /pacientes, quase humanos,/ a moer a terra dura." (...).

Essses tempos já longínquos de 1952 foram evocados por David Mourão Ferreira no número especial de "A Cidade – Revista Cultural de Portalegre" (4/5, nova série, 1990), "integralmente dedicado aos 20 anos da morte do poeta José Régio e do pintor D’Assumpção, duas personalidades marcantes das letras e das artes ligadas à capital do Norte Alentejano" (, cito a págína Largo dos Correios, de António Martinó de Azevedo Coutinho, uma personalidade marcante da vida cultural e social de Portalegre, onde nasceu em 1935).

 (...) "Disso mesmo [da complexa personalidade de José Régio]  tive sobejas provas ao longo dos cinco meses - de Março a Agosto de 1952 - em que diariamente privei com ele aqui em Portalegre, para onde me tinham arrastado, como aspirante-miliciano [, de cavalaria, a deduzir pelas botas do futuro escritor, professor universitário e figura mediática, com o seu inseparável cachimbo, na foto à esquerda, cortesia do sítio Largos Correios...], as irrevogáveis obrigações do meu serviço militar. 

"Daí data efectivamente o auge do nosso convívio. Já por mais de uma vez aludi a essa experiência e, muito em particular, numa longa entrevista que me foi feita, em Abril de 1982, pela excelente revista A Cidade, que nesta cidade se publica. Não desejo pois repetir-me. Mas não posso deixar de rapidamente reevocar aqui o que tais cinco meses para mim significaram na companhia quotidiana de José Régio e do pequeno mas extraordinário grupo de seguros e provados amigos com que nessa altura ele aqui contava: Feliciano Falcão, Arsénio da Ressureição, Lauro Corado, Firmino Crespo, João Tavares, Adelino Santos. Rara a tarde ou a noite em que pelo menos com alguns deles nos não reuníssemos no Café Central. Mais raro ainda o fim de tarde que eu não passasse com Régio no seu pequeno gabinete de trabalho desta ‘casa velha’ -’velha, grande, tosca e bela’- em que decorreram muito para cima de trinta anos da sua existência.

"E dávamos grandes passeios aos domingos… Ora a pé, pelo interior da cidade e pelos seus mais próximos arredores, ora no automóvel de Senhor Adelino Santos, que desempenhava, na ocasião, as funções de secretário-geral do Governo Civil. E eram então improvisadas excursões até Marvão, Castelo de Vide, os Olhos de Água…” [cit por Largo dos Correios > 17 de março de 2013 > David e José II].

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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 22 de março de  2014 >ãManuel Sampaio / Artur Conceição / Rui Vieira Coelho

Guiné 63/74 - P12882: O que é que a malta lia, nas horas vagas (27): Em Galomaro li "A Relíquia" e "O Primo Basílio" do Eça de Queirós, José Vilhena e outros autores, ouvi a Maria Turra e decifrei os escritos do 2.º CMDT do Batalhão (António Tavares)

1. Mensagem de António Tavares (ex-Fur Mil da CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72), com data de 16 de Março de 2014:

Caro Vinhal,
Junto envio um texto para publicação caso haja interesse.
Abraço de amizade.
António Tavares


O que lia em Galomaro? 

Livros e revistas que passavam de mão em mão. Recordo “A Relíquia” e “O Primo Basílio”, de Eça de Queirós; livros de José de Vilhena, escritor humorístico preso pela PIDE em 1962, 1964 e 1966, e outros autores cujos nomes esqueci.
Livros emprestados por um Furriel e por um Alferes. Milicianos politicamente mais progressistas que eu, diria sem comparação.

Recordo que transportei um saco de lona cheio de livros para o Comandante do Batalhão de Nova Lamego. Saco igual ao que nos davam para transportar os nossos haveres. O senhor Tenente-Coronel vivia no Porto e através da sua esposa e de uma família amiga que tínhamos em comum foi feito o pedido a que anuí.
Após um ou dois dias da minha chegada a Galomaro, aterra na pista de aviação um DO com um impedido do Ten-Cor para levantar a encomenda. Nunca vi o Ten-Cor e nunca me agradeceu o ter sido seu carregador. Sei que não fui o único caso em que éramos servidores e desprezados… Enfim… Coisas habituais na maioria dos tropas de carreira. Não conheciam a palavra: Obrigado.

De todas as leituras, aquela que me gastou horas e horas foi ter de decifrar os escritos do 2.º Comandante do meu Batalhão que tinha uma letra quase incompreensível. Depois de compreendida a letra dos documentos/rascunhos, estes tinham de ser ditados ao Cabo Escriturário para os dactilografar na máquina que vemos na foto.


Confesso que não foi dos piores serviços que fiz naqueles longínquos 692 dias passados nas matas do leste do Comando Territorial Independente da Guiné. Em dias de calor tórrido estar a trabalhar debaixo de chapas de zinco escaldantes era aborrecido e cansativo, porém nada comparável com quem andava em Operações nas matas. Repito: era impossível comparações.

Também ouvia boa música que o Comandante comprava para as Messes de Oficiais e Sargentos. No fim da comissão ofereceu um disco a cada Sargento e Oficial da CCS. O meu disco é o da imagem.





Jogávamos matraquilhos, cartas, xadrez.

A rádio e a “Maria Turra” também eram escutadas. Esta umas vezes dizia a verdade, outras inflaccionava os acontecimentos com o número de mortos e feridos das NT. Águas passadas… Em 1970/72.


(TEXTO ESCRITO SEGUNDO A ANTIGA ORTOGRAFIA)
António Tavares
Foz do Douro, 16 de Março de 2014
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Nota do editor

Último poste da série de 27 de Janeiro de 2014 > Guiné 63/74 - P12643: O que é que a malta lia, nas horas vagas (26): A Bola, o Diário de Notícias, a Vida Mundial, Banda Desenhada... (Jorge Araújo, ex-fur mil, op esp/ ranger, CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/1974)

Guiné 63/74 - P12881: Blogpoesia (384): O Dia Mundial da Poesia, 21 de Março de 2014, na nossa Tabanca Grande (XV): Manuel Sampaio / Artur Conceição / Rui Vieira Coelho



[, representado no nosso blogue por Filomena Sampaio, viúva do nosso camarada Manuel Castro Sampaio, ex-1.º Cabo TRMS que pertenceu à CCS/BCAÇ 3832, Mansoa, 1971/73]



Poema de Manuel Castro Sampaio, enviado pela viúva, Filomena Sampaio, nossa grã-rabanqueira


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[ex-Sold Trms Inf e Cond Auto, CART 730, Bissorã, Farim e Jumbembém(1965/67]


Não tenho o mínimo jeito ...mas uma quadra sempre se arranja...
Um abraço, Artur Conceição


Viva o dia da Poesia
e o dia da Primavera,
Haja Paz,  haja alegria,
Aqui e em toda a Terra.


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[ex-Alf Mil Médico Rui Vieira Coelho,  BCAÇ 3872 e 4518, Galomaro, 1973/74]

Caro Luís
Conforme a tua sugestão,  aqui vão uns versos feitos no sentido de identificar o lugar de reunião dos camaradas da Guiné na região do Porto,  Gondomar, mais propriamente a Tabanca dos Melros.


A todos vós, "Guinéus", .
Nessa terra d'adopção, 
Juntar Pátria,  Amor e Deus,
Unir sonho e coração.

Alguns foram vã glória, 
Outros persistem viver
Unidos pela memória, 
P'rá amizade de rever. 

Rever gentes e lugares, 
Melros de tantas tabancas
Atravessaram os mares,
Com ondas pretas e brancas,

No fundo de todos nós,
Com muita amizade e sorte
P'ra nunca ficarmos sós
Nem nunca perder o Norte.

Um grande alfabravo do Rui Vieira Coelho
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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 21 de março de 2014 >  Guiné 63/74 - P12879: Blogpoesia (383): O Dia Mundial da Poesia, 21 de Março de 2014, na nossa Tabanca Grande (XIV): Pensa meu soldado cansado, pensa... (Mário Vasconcelos)

Guiné 63/74 - P12880: Parabéns a você (706): José Lino Oliveira, ex-Fur Mil Amanuense do BCAÇ 4612/74 (Guiné, 1974)

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Nota do editor

Último poste da série de 17 DE MARÇO DE 2014 > Guiné 63/74 - P12846: Parabéns a você (706): José Armando F. Almeida, ex-Fur Mil TRMS do BART 2917 (Guiné, 1970/72)