− Morreu na Flandres, na I Grande Guerra.
− Quem, o seu avô ?!
− Sim, o meu avô materno. Na Flandres. Teria 33 anos, a idade de Jesus Cristo quando foi crucificado.
− Ah!, a Flandres, o grande matadouro da Europa.
− O meu avô Ortiz… Sou de origem basca e francesa, pelo lado da minha mãe.
− Daí o apelido Ortiz, não ?!…E quando é que vocês vieram para Portugal ?
− A minha mãe e os irmãos vieram como refugiados de guerra… Fugidos da guerra civil espanhola.
− Em 1936 ?!...
− Não, já em meados de 1937, depois do bombardeamento de Gernika (com K).E esclareceu a minha interlocutora:
− Claro, eu ainda não era nascida, nem os meus irmãos. A minha mãe teria então 24 anos…
− Pelo que vejo, Manuela, é uma história comprida, a da vossa família. Comprida e dramáticamente cumprida.
− E trágica, pode acrescentar. Pelo caminho ficaram alguns dos meus familiares, do lado materno, os Ortiz. Todos vítimas da guerra.
E depois de um curto silêncio, enquanto bebia o seu sumo, a Manuel repetiu enfaticamente:
− Vítimas da guerra, da violência, da intolerância, da estupidez humana…
− Sei do que fala, também eu fui obrigado a vestir uma farda, a pegar numa arma e a fazer uma guerra, a guerra colonial, na Guiné. Contra a minha consciência, contra os meus valores...
− Uma tia, a mana mais velha da minha mãe, morreu no antigo Congo Belga, por altura da independência, em 1960 ou 1961, já não posso precisar . Barbaramente assassinada, à catanada. (Catanada, é assim que se diz ?)... Era enfermeira numa missão católica.
Adiantou depois, a Manuela, que conhecera a tia quando ela veio de férias a Portugal. Teria então os seus cinquenta anos, creio que nascera em 1908. Lembrava-se do ano, 1958, porque fora na altura da “campanha do Humberto Delgado para a presidência da República”. Mas a tragédia da família , que começara na Flandres, em 1918, não acabava aqui.
− O meu tio Ortiz, o único rapaz, filho do meu avô, já antes, em 1944, tinha sido morto num campo de concentração nazi. Aos 38 anos anos. Era o mais velho.
E depois confidenciou-me:
− Vou conhecer Berlim, é a minha primeira vez, acho que vou tirar uns dias de licença para poder viajar até à fronteira da Alemanha com a Polónia. Pode ser que eu descubra o sítio onde o meu tio Ortiz foi assassinado. Pelo menos quero conhecer Auschwitz. Vou ver se arranjo coragem para ir, pelo menos, até Auschwitz.
Uma colega alemã, de origem polaca, já tinha dado à Manuela umas dicas sobre a região e a localização de alguns dos antigos campos de concentração nazis, na Alemanha e na Polónia.
− O alemão não é o meu forte. Só sei uns rudimentos. Formei-me em línguas românicas. E, na realidade, nem sei para onde foi enviado o meu tio. Como vocês dizem em Lisboa, não fiz o meu TPC, não tive tempo com a ida ao Porto.
2. A Manuela Ortiz Fernandes era, pois, neta do “soldado desconhecido”. Uma barragem de artilharia alemã – é fácil de imaginar − tê-lo-á apanhado a conduzir a sua ambulância quando evacuava feridos graves, perto da linha da frente.
− A família nunca soube pormenores. Difícil de imaginar é o horror desta cena da morte do avô. Os seus restos mortais nunca foram encontrados, o que de alguma modo adensa o mistério das circunstâncias da sua morte.
− Não repousam por isso – esclareci eu – em nenhum dos cemitérios militares da Flandres, com direito a lápide de pedra, placa com identificação (nome, posto e data da morte)… Nem à cruz dos cristãos.
O avô da Manuela, infelizmente, teria ficado numa pilha de restos humanos, numa vala comum, no próprio campo de batalha… Pulverizado. Mas, a pior de todas ainda era a vala comum do esquecimento, como é costume dizer-se a propósito dos milhões de combatentes de todas as guerras da História.
A Manuela pegou nesta minha observação, trivial, para ir buscar um exemplo ao seu passado em Portugal:
− Ah!, sim, infelizmente, no colégio de freiras, no Porto, onde eu andei, só se falava dos heróis, dos reis e dos generais, sobretudo como vencedores das nossas guerras. Fazia-me sempre confusão. Muito menos se falava da guerra do ultramar. Eu tinha 15 anos, ia fazer 16, quando rebentou a guerra de Angola. Ainda andava no 5º ano, e ainda estávamos chocados, lá em casa, com a morte da tia no Congo.
Em boa verdade, não se falava das guerras, não fossem as pobres criancinhas, suscetíveis, indefesas, ficaram para sempre traumatizadas… Os rapazes, esses, teriam a oportunidade, única, de conheceram uma guerra a cores e ao vivo, dentro de alguns anos, pensei eu... Em Angola, Guiné ou Moçambique...
− Não se esqueça – recordou-me ela – que eu ainda apanhei a “escolinha” do Estado Novo.
− Também eu, Manuela… E em boa verdade, ainda tenho saudades do bibe e do pião... Mas diga-me uma coisa: há fotos, ao menos, desse seu avô?
− Vi, uma vez, uma foto dele, no dia em que terá sido promovido a sargento, presumo eu. Era um garboso militar do serviço de saúde. Bonitão, de bigode farfalhudo, como se usava na época. Era basco, do sul de França. Depois da tropa seguira a carreira militar.
E acrescentou:
− Havia uma outra foto, com os filhos e a mulher. A minha mãe, que devia ter dois anos, estava sentada ao seu colo. Ao lado, dos pais, cada um dos outros filhos, a irmã e o irmão da minha mãe, que eram mais velhos. Deve ter sido tirada em 1913 ou 1914, pouco antes do início daquela maldita guerra.
− Esses filhos, a sua mãe e os seus irmãos, os seus tios, o que lhes terá acontecido depois?
Tentando delicadamente, mas algo a contragosto, satisfazer a minha curiosidade intrusiva, a Manuela disse-me que só sabia, por alto, o que se tinha passado, no pós-guerra. Aos três irmãos, tendo ficado órfãos, e sendo menores, foi-lhes atribuído uma pensão de sangue do Ministério da Guerra. Pôs-se, ao que parece, a hipótese de serem “institucionalizados”: como filhos de militar falecido (ou desaparecido) em combate, poderiam ser internados num orfanato. O mais velho teria 12 ou 13 anos. A mãe, essa, já estava internada num hospício. Mas em vez de irem parar a um orfanato, foram acolhidos por uma outra família basca, do outro lado da fronteira, que tinha sido poupada aos horrores da guerra.
− Como vim, mais tarde, a descobrir, as duas famílias ainda eram aparentadas, com um trisavô comum. Daí nos tratarmos por primos…
E aproveitou para me dizer que dava muita importância aos “laços de sangue” e que esse seria um traço forte da cultura basca… O que não me convenceu, mesmo sabendo pouco ou nada da cultura basca:
− Mais do que aos laços de sangue, eu dou importância à língua, à partilha de afetos, às memórias, às vivências comuns… A sua mãe falava basco?
− Infelizmente, não. A minha mãe e os seus irmãos só falavam o francês e o espanhol. A minha avó materna não era basca, são as mães, no país basco (e em toda a parte, julgo eu) que transmitem a língua (materna) aos filhos.
− E depois o português, claro?!
− Ah!, sim, mas só mais tarde. Todos aprenderam o português, exceto o meu tio Ortiz que, esse, havia regressado a França, em 1936, já homem feito, na altura do “Front Populaire”. Em Bilbau, já era um bom cozinheiro. Tirou depois um curso de “chef de cuisine”.
Sobrevoávamos já a França, quando ela me começou a falar, surpreendentemente com grande ternura, desse tio que ela nunca conhecera, a não ser de fotografia e das conversas, esparsas, com a mãe.
Cozinheiro de profissão, militante comunista, membro da Resistência Francesa, o tio Ortiz teria sido preso, em 1941, logo a seguir ao armistício, numa cidade da Côte Azur pela milícia do Governo de Vichy, e mais tarde “miseravelmente” entregue à Gestapo.
Terá passado primeiro pelo campo de Gurs, nos Pirinéus Atlânticos, originalmente criado pelos franceses para acolher os refugiados republicanos, espanhóis e internacionalistas, fugidos do terror franquista, e que, depois, com o governo de Vichy, fora transformado em campo de detenção para os membros da resistência francesa, judeus e outros…
Uns meses a seguir, o tio Ortiz terá sido transferido, com outros detidos considerados perigosos (com destaque para os comunistas) para o campo de Royallieu, na comuna de Compiègne, a nordeste de Paris. E aqui perdeu-se o seu rastro. Sabe-se que mais de cinquenta mil presos deste campo (incluindo judeus) foram depois deportados para campos de concentração e de extermínio fora da França: Auschwitz, Ravensbrück, Buchenwald, Dachau, Sachsenhausen, Mauthausen, Neuengamme… Qual deles terá sido a "última morada" do tio Ortiz ?
− A Manuela, então, não sabe em qual deles morreu o tio…
− Infelizmente, não sei, ou ainda não sei. Quando quis voltar a falar com a minha mãe sobre o passado da família e o destino trágico dos seus dois irmãos, já ela estava mal, com idas frequentes ao IPO, no Porto. E em 1975, também não tínhamos cabeça para nada, muito menos para recordar o passado. Eu ia fazer 30 anos, já estava a dar aulas como professora de francês, e o verão quente de 75 também mexeu muito comigo. Houve saneamentos de pessoas, a política estava ao rubro, havia conflitualidade por todo o lado, nos quartéis, nas ruas, nas empresas, nos campos, nas escolas...
− Foi um ano difícil para todos.
− A minha mãe, ainda lúcida, foi assaltada pelos fantasmas da guerra civil espanhol. Mas procurámos poupá-la, ocultando-lhe a situação social, politica e militar que se estava a viver, incluindo os problemas da empresa do pai… Morreu em paz, na véspera de Natal. E ficou sepultada na terra onde fora muito feliz.
− Se é que se pode morrer em paz – comentário meu, desastrado.
Procurei emendar, desviando o rumo da conversa e perguntando-lhe pela avó materna. Resposta algo evasiva e sobretudo seca e ríspida:
− Não sei nada dela. Pouco ou nada me contaram sobre ela em criança. Era um assunto tabu na família.
A Manuela viria, mais tarde, a descobrir, pelo álbum da família e da pouca correspondência que se salvara, das andanças de terra em terra, que a avó francesa (ela disse-me o nome, que não fixei) enlouquecera na sequência do trágico desaparecimento do marido. Vestira-se de luto, como as mulheres dos pescadores da nossa costa, mas não acreditava na sua morte. Tinha a secreta esperança que ele tivesse sido feito prisioneiro pelos alemães.
– Morreria cedo, a avó, num manicómio. Mas, como disse, não era de origem basca.
− Uma família destroçada – comentei eu.
− A minha mãe também morreria cedo, como já lhe contei. Em 1975, aos 63 anos, no Porto. De cancro da mama, doença que na altura era quase incurável. O meu pai ainda a quis mandar para Londres, mas os médicos desencorajaram-no. E ele, já com 78 anos, também estava com pouca força anímica.
− A Manuela fala basco?
− Nunca falei. Nem a minha mãe. Como já expliquei, só o meu avô materno é que era basco, Em Bilbau, comecei agora a aprender, já sou capaz de ler e compreender alguma coisa. Mas é uma língua tramada para os nossos ouvidos, indo-europeus. E, depois, verdadeiramente não me sinto basca. Sou muito mais portuguesa, e tripeira, se quiser... embora também goste de Lisboa, onde fiz o meu curso. A minha mãe, essa, sim, tinha as melhores recordações do país basco, da sua adolescência e juventude passadas na província de Biscaia, perto de Bilbau… O basco falava-se sobretudo nas zonas rurais e havia (e ainda há) vários dialectos.
– Mas tem material genético basco no seu ADN...
– Apenas uma pequena parte, nem sequer metade... E mesmo que fosse metade basca e metade portuguesa, o que é que isso queria significar?
– Nada!... Mas há a lotaria genética... Qual a metade boa, qual a metade má?
– Só me preocupo com os "defeitos de fabrico"... Olhe, por exemplo, o cancro da mama... Quanto ao resto, é puro racismo... Será que os bascos são mais "violentos" ou "truculentos" que os portugueses?
– Oh!, Manuela, não quis dizer isso nem sequer insinuar...
– A ETA não é um fenómeno exclusivamente basco, nem eu me identifico com a violência revolucionária seja da ETA ou de qualquer outra organização nacionalista radical...
– Outros dirão terrorismo...
– Não entro por essas diferenças semânticas e conceptuais. Poupem-me! Violência é violência. Mas quem quis destruir a identidade, a cultura, a língua bascas ? Mais recentemente o Franco... que proibiu os bascos de falarem a sua língua e transmiti-la aos seus filhos... Mas no passado, os bascos também foram discriminados, tal como outras minorias...
– Desculpe, Manuela, se involuntariamente a ofendi ou melindrei. Também temos. na nossa história comum, como portugueses, períodos de grande violência, físicq e simbólica.
– Pelo que sei de História (e sei pouco, confesso), Portugal está longe de ser o tal país de brandos costumes que a propaganda de Salazar contrapunha ao resto da Europa do seu tempo... Embora a minha mãezinha estivesse grata ao Portugal de Salazar, diga-se de passagem...
A família que acolhera (e depois adotara, legalmente) a mãe da Manuela e os seus irmãos, no início dos anos 20, teve meios de se refugiar em Portugal. Eram nacionalistas e republicanos, mas católicos, como muitos bascos. Beneficiaram das boas relações comerciais e até de amizade que mantinham no Porto. Era gente com tradição no negócio do vinho, com filial no Porto. Gente de “classe média alta”, segundo a Manuela.
− Foram os nossos “avós”. Infelizmente já morreram. Regressaram, no final dos anos 50, aos arredores de Bilbau onde sempre tiveram a casa e a quinta, a “baserri”, que entretanto fora transmitida ao filho varão, o mais velho, o equivalente à figura do nosso morgado. E que cuidou do património. Nunca saíra de Bilbau, apesar das grandes dificuldades do pós-guerra. Também nunca mais o vi, a esse meu primo, que fomos visitar uma vez, teria eu os meus 10 anos.
− Portugal tornou-se assim a terceira pátria da vossa família.
−Sim, a minha mãe conheceu aqui o meu pai, também ele negociante de vinhos, amigo dos meus avós adotivos… Na Praia da Granja, no início dos anos 40… Era quinze anos mais velho que a minha mãe. E daí a razão de eu ter nascido, em 1945, no Porto, já depois do fim da guerra. Sou filha do pós-guerra, faço sempre questão de o dizer. Mas, em contrapartida, o meu nascimento foi saudado com a bomba atómica de Hiroshima e Nagasaqui, nasci poucos dias depois, em agosto de 45.
O senhor Fernandes era um conceituado comerciante de vinhos e espirituosas, grossista, importador e exportador, da praça do Porto, com armazéns em Vila Nova de Gaia, na margem esquerda do rio Douro.
Sabia-se (alguns amigos mais íntimos e a família) que tinha uma ascendência cristã-nova, com raízes provavelmente na medieva comunidade judaica sefardita da cidade do Porto. A família deve ter tido, em finais do séc. XVII, problemas com a Inquisição, razão por que se mudou, na totalidade ou em parte, para o Brasil onde prosperou. Alguns terão regressado com a corte de Dom João VI, em 1821.
O patriarca da família não tinha pretensões a títulos nobiliárquicos como o futuro apoiante da causa de D. Pedro IV e da sua filha Dona Maria II, o José Ferreira, que num dia será sido feito cavaleiro, no outro barão, e depois visconde, e por fim, conde... O conde Ferreira, o grande benemérito do nosso liberalismo.
Apesar de ter conhecido e até convivido, ao que parece, com o capitão Barros Basto, o senhor Fernandes nunca se aproximou da comunidade israelita do Porto. Punha os seus negócios acima de outros interesses. Mas sempre foi um homem do seu tempo, “laico, republicano, liberal… e tolerante”. Foi o retrato que me fez a sua filha, já depois de chegarmos a Berlim.
3.
Mas quem era afinal a Manuela Ortiz Fernandes?
Eu já conhecida de Lisboa, das “lides profissionais”. Se não erro, desde o ano da adesão de Portugal e da Espanha à CEE, a Comunidade Económica Europeia. Ainda não havia a União Europeia nem o euro. Estamos a falar de 1986.
O meio profissional ligado à saúde e segurança no trabalho (ainda se dizia por cá “higiene e segurança no trabalho”, por um lado, e “medicina do trabalho”, por outro…) era então pequeno e toda a gente se conhecia, daqui ou de acolá (ministério do trabalho, que tutelava a área, empresas, médicos do trabalho, técnicos de higiene e segurança, Escola Nacional de Saúde Pública, etc.).
Devo ter conhecido a Manuela nalgum encontro ou fórum internacional. Sei que ela na altura trabalhava em Barcelona, e estava cá com uma representação catalã. E ficámos em contacto. Reencontrávamo-nos agora, no aeroporto a caminho de Berlim, uns anos depois da queda do muro e da reunificação da Alemanha. Continuávamos a tratarmo-nos por você. Sentia que ela gostava de guardar alguma distância e, como toda a gente, tinha as suas defesas. Mas era uma pessoa agradável, uma boa companhia sobretudo quando se está no estrangeiro, por uns dias, em trabalho.
Estávamos os dois a participar numa conferência internacional sobre saúde e segurança no trabalho (“health and safety at work”). Eu, como académico, ela como tradutora-intérprete da Agência Europeia de Segurança e Saúde no Trabalho, com sede em Bilbao, criada em 1994, responsável pelo evento em parceria com a autoridade alemã para as condições de trabalho, se bem recordo.
Por sorte, estávamos alojados no mesmo hotel, de três estrelas, confortável, barato, e com bons acessos, perto da estação de metro que nos levava ao centro de conferências onde se realizava o nosso encontro.
O edifício, embora totalmente remodelado, ainda tinha traços da arquitetura “estalinista” do pós-guerra. A zona oriental de Berlim ainda era um mundo à parte, embora já sem o muro (ou com apenas alguns restos dele, todos grafitados). Era muito procurada pelos turistas, até porque os preços da hotelaria e restauração eram mais baixos do que do “outro lado”, ocidental… E depois ainda era um “museu vivo” da antiga RDA – República Democrática Alemã…
Para a Manuela e para mim, era uma sensação estranha: o muro estivera de pé entre 1961 e 1989, dividindo não só os berlinenses e os alemães, como os próprios europeus. Era o “muro da vergonha” de todos nós, europeus, e não só dos alemães...
Se é verdade que a reunificação da Alemanha, há sete anos atrás, em 1990, marcara o fim da chamada guerra fria (opondo a União Soviética aos seus antigos aliados ocidentais da II Guerra Mundial), demo-nos conta, já em 1997, que infelizmente outros muros, invisíveis (ou menos visíveis a olho nu), se estavam a erguer na nossa velha e adorada Europa de então. E que a Rússia afinal era um urso ferido e humilhado, o que não era bom para ninguém, a começar pelos europeus, tanto do leste como do oeste.
A decadência urbanística ainda era evidente. Mas Berlim já era então um estaleiro de obras públicas, estava em marcha a segunda reconstrução da cidade, depois da terrível destruição da II Guerra Mundial. (Quem não se lembra do filme "Alemanha, Ano Zero", de Roberto Rosselinni, de 1948?)