domingo, 5 de junho de 2011

Guiné 63/74 - P8374: Monte Real, 4 de Junho de 2011: O nosso VI Encontro, manga de ronco (1): As primeiras fotos


Monte Real, Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca  Grande > As primeiras fotos do nosso convívio que teve, ao almoço, 126 participantes (é o número que o Carlos Vinhal me acaba de confirmar; a meio da tarde, tivemos algumas agradáveis surpresas, de malta que veio de outros encontros que se estavam a realizar na região: caso do J. Casimiro Carvalho e esposa, do António Pimentel, do Hernani Figueiredo...).

Um quadro em acrílico sobre tela, da autoria de Nataliel (2011) - nome artístico do nosso... Juvenal Amado! - foi vendido em leilão, arrematado por 120 aéreos, destinado aos projectos de solidariedade sob a liderança da Tabanca de Matosinhos. O leiloeiro foi o António Pimentel, sob a alta supervisão do Álvaro Basto, régulo da Tabanca Pequena (que hoje é já um caso sério...). O quadro foi arrematado pelo nosso camarada, antigo artilheiro de Gadamael (1973/74), hoje médico,  C. Martins.


Monte Real, Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca  Grande > A "nossa madrinha de guerra" e poetisa, Felismina Costa (que compareceu com a Cláudia e o João Carlos) foi uma das muitas caras novas que vieram ao nosso encontro... Ei-la aqui, a meia da tarde, com o Fernando Gouveia, que está a autografar um dos exemplares do seu livro Na Kontra Ka Kontra... O Fernando conseguiu vender cerca de 40 exemplares da obra. E espera ainda poder vender pelo correio. O produto (líquido) da venda destina-se a fins de solidariedade (projecto de apoio às crianças de Bafatá).


Monte Real, Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca  Grande > O "nosso minino" (Adilan), o Zé Manel, hoje com 50 anos, com o Manuel Joaquim... Foram duas das muitas estrelas que fizeram do nosso grande encontro mais um grande ronco, o da camaradagem, da amizade e da solidariedade... Adorei conhecê-lo: desenvolto, portuga dos sete costados, casado com uma angolana, crítica em relação ao rumo que tomou o seu país de origem (infelizmente, os seus biológicos já morreram; a sua verdadeira família hoje está aqui em Portugal)...O Manuel Joaquim, que também conheci pela primeira vez, em carne e osso, era um homem feliz, orgulhoso do seu "minino"...


Monte Real, Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca  Grande > O Victor Tavares, o grande apontador da MG 42 da CCP 121/BCP 12, veio de Águeda com a filha do Paulo Santiago (estudante da licenciatura em solicitadoria em Castelo Branco) que representou o pai ausente em França (aonde se deslocou acompanhando a sua equipa de rugby)... Esteve ao cuidado da Alice Carneiro que ficou triste por não se ter despedido dela, ao fim do dia (Tivemos que seguir para a Lourinhã, ao fim da tarde).



Monte Real, Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca  Grande  > Outra cara nova > A Rosa, esposa do Alcídio Marinho, do Porto, Miragaia... Eles representaram os velhinhos da Guiné, neste caso, a CCAÇ 412, que esteve em Bafatá (na altura com a uma vasta zona de acção que ia de Cantacunda ao Enxalé, e de Bambadinca ao Xitole)... O Alcídio já me entregou a "papelad" para ingressar formalmente no blogue...


Monte Real, Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca Grande  > O Joaquim Peixoto (Penafiel) trouxe outra cara nova, o António Brito da Silva (Baião)... Ambos foram Fuir Mil da  ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3414 (Bafatá e Sare Bacar, 1971/73).



Monte Real, Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca  Grande  >  A Alice descobriu que o António Brito da Silva, filho do "João Semana" de Baião, o  Dr. Silva, era um seu "velho conhecido"... Acontece que no próximo dia 11 de Junho de 2011 temos, eu e a Alice, um convívio na famosa Quinta de Tormes, pertencente à família Eça de Queirós e hoje sede da Fundação Eçaq de Queirós... O António Brito ainda tem laços de parentesco com o genial escritor de A Cidade e as Serras.  O António também ficou "cravado" para engrossar as hostes da Tabanca Grande.




Monte Real, Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca Grande > O António Graça de Abreu e a sua simpatiquíssima esposa de Xangai, a dra. Wang Hai, médica... A Wang integrou-se muito no espírito da Tabanca Grande. o casal veio directamente de Córdóva, Espanha, para o nosso encontro.



Monte Real, Palace Hotel > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca Grande > Outra das grandes surpresas do dia foi o Mário Bravo, o nosso médico da Região de Tombali (esteve em Bedanda, passou por Guileje e Gadamael, Bissau e Teixeira Pinto, onde conheceu o António Graça de Abreu). Ortopedista, reformado, vive no Porto., veio acompnhado da esposa, também médica, pediatra, de nome poética Marília Lília. Casaram-se em Junho de 1974. Acabavam de fazer uma viagem pelo Alentejo para comemorar a efeméride. Gostei de a conhecer e da falar com ela.


Monte Real, Hotel Palace > 4 de Junho de 2011 > VI Encontro Nacional da Tabanca > As primeiras fotos >  Dois camaradas que jogavam em casa, sendo naturais de Leiria: o nosso tabanqueiro Agostinho Gaspar e o Manuel Domingos  Santos, que veio acompnhado da esposa, Maria Isabel... Prova de que o Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande, o Manuel Domigos conhecia alguns dos meus amigos da Gândara dos Olivais... Outro camarada de Leiria que gostei de rever foi o Vitor Caseiro, bem como o Jaime Brandão, antigo Fur Mil Pil, que esteve na Guiné, e que é de Monte Real, tal o Joaquim Mexia Alves. 

Fotos (e legendas): © Luis Graça (2011). Todos os direitos reservados

sábado, 4 de junho de 2011

Guiné 63/74 - P8373: Convívios (347): XXIII Encontro/Convívio do BCAÇ 2884 “MAIS ALTO”, Régua, 28 de Maio (José Firmino)



1. O nosso Camarada José Firmino (ex-Soldado Atirador da CCAÇ 2585 / BCAÇ 2884, Jolmete, 1969/71), enviou-nos uma mensagem com um texto e fotos da festa do seu batalhão:

XXIII Encontro/Convívio do BCAÇ 2884 “MAIS ALTO”

Decorreu no passado dia 2011-05-28 na Cidade do Peso da Régua, o XXIII almoço anual do BCAÇ 2884 "MAIS ALTO", com concentração no adro da Igreja de Nossa Senhora do Socorro, pelas 10,30h seguido de chamada, eis que surge o primeiro sinal que algo esta para acontecer e não é que aconteceu mesmo!... Pois não tardou a saltar para a mesa um presunto, pão maravilhoso e ainda uma bola de carne bem saborosa, acompanhada de bom vinho tinto da região. Aproveito o momento para agradecer ao Carvalho pela gentileza de nos ter presenteado com este belo petisco.

Feito o reconhecimento, seguimos para a Igreja onde foi celebrada missa em memória dos camaradas falecidos, seguindo-se de sessão fotográfica para mais tarde recordar.

De seguida rumamos em caravana na direcção do Restaurante o "TORRÃO" onde foi servido um excelente almoço, regado com a qualidade do néctar da região, mas que mesmo servido em abundância não causou danos ou baixas nas tropas presentes. Enquanto decorria o almoço, tentando por a conversa em dia, nos olhando uns aos outros, muito mais robustos, com cabelos prateados ou brancos, mas com muita vontade de viver.

Terminamos fazendo votos, de que possamos estar no próximo encontro/convívio a realizar na cidade de Fátima do ano 2012. Lamentamos que alguns camaradas, que por motivos vários, não puderam estar presentes.

Quero também dizer que foi uma agradável surpresa voltar a encontrar o "Vianense" que se fez acompanhar da sua simpática esposa, não me podia também esquecer, do Pereira, pessoas que não via desde ano de 1971.

A organização como sempre, esteve à altura, na pessoa do sempre incansável, Sr. Pinto da Costa. Por outro lado, lamentamos a ausência do Baltazar que à última hora não pode responder à chamada, devido a um problema de saúde, a quem desejamos desde já, rápidas melhoras. Fez-se representar pela sua filha, Paula e seu genro Ilísio Ribeiro, a quem agradecemos de nos honrar pela sua presença.

Parabéns aos organizadores!

Até ao ano em FÁTIMA

Abraço do tamanho do mundo,
José Firmino (nome de guerra Régua)


O "Vianense" acompanhado pela esposa
 O sorriso aberto do Carvalho e dois camaradas

Aspecto geral da sala
Da esquerda para direita: Fur Mil Araújo, José C. Ferreira e Fur Mil Lino

Paula Ribeiro, filha do Baltazar
A beleza do Rio douro, zona onde foi realizado o XXII convívio
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Nota de M.R.:

Guiné 63/74 - P8372: Os nossos camaradas guineenses (33): O Zé Carlos regressou ao seu mundo, à sua tabanca, à sua morança... (Luís Graça)...




Lisboa, 2 de Junho de 2011 > A Gina, o António Marques e o Zé Carlos Suleimane Baldé... A última foto a contar do fim é um detalhe  da fachada do antigo Banco Nacional Ultramarino, criado em 1864 para ser o banco emissor dos territórios ultramarinos  durante mais de um século... Na foto, vê-se o antigo brasão de armas da Guiné... O edifício, na Rua Augusta, Lisboa, alberga hoje o MUDE - Museu da Moda e do Design...

Fotos: © Luís Graça (2011). Todos os direitos reservados



1. O José Carlos Suleimane Baldé (ex-1º Cabo da CCAÇ 12, Bambadinca e Xime, 1969/74) regressou ontem,  ao fim da noite, a Bissau, depois umas férias de 15 dias, em Portugal, que ele não conhecia e com o qual às vezes sonhava... 

Com 61 anos, o nosso camarada considera-se velho e cansado...  Trabalha no duro (os tempos são outros, mesmo para os orgulhosos fulas cuja filosofia de vida era, no passado, fazer a guerra e rezar, as duas únicas ocupações dignas de um homem)... Tem de trabalhar no duro para poder sustentar duas mulheres e uma numerosa prole. 

A realização deste sonho (conhecer Portugal) só foi possível graças à determinação de um casal (o Jaime Pereira, seu antigo comandante, no período de 1971/72,  e a Odete Cardoso) que lhe deram hospedagem e carinho. Mais: graças aos bons contactos que a Odete tem com o Ministério dos Negócios Estrangeiros (ela foi em tempo vice-presidente do ICP - Instituto da Cooperação Portuguesa, trabalhando actualmente no Tribunal de Contas), foi possível vencer as pequenas e grandes dificuldades não só burocráticas como logísticas e telecomunicacionais, que se entrepuseram na realização deste projecto...  

A Odete, que é só conheci há uns meses, é uma força da natureza.  Também o Jaime (que é gestor numa empresa privada) deu parte do seu precioso tempo para tornar inesquecível esta estadia do Zé Carlos em Portugal... Mas não posso deixar de mencionar outros apoios, de resto já aqui referidos como o casal Sobral (José e Ermelinda, ambos médicos, de Coimbra), o J. L. Vacas de Carvalho, o Victor Alves (ex-Fur Mil SAM da CCAÇ 12, também da mesma época, 1971/72) e o casal Marques (Gina e António). Sem esquecer os camaradas, anónimos, da CCAÇ 12, que também se quotizaram para pagar a viagem de ida e volta. É um gesto bonito que merece ficar aqui registado.

Estive anteontem, 5ª feira com o Zé Carlos e o casal Marques. Foram visitar o estádio do Benfica (o Zé Carlos fez questão de ir... à "catedral") e seguiram depois para Peniche e Óbidos (O Zé Carlos é um apaixonado pela história de Portugal, e aliás um dos livros que lhe ofereci foi a crónica do Gomes Eanes de Azurara, escrita em 1453, sobre o descobrimento e a conquista da Guiné, para além de um selecção de postes do nosso blogue e ainda uma cópia da história da CCAÇ 12).

Num outro dia, o Marques tinha-o levado a Fátima e às grupas de Mira D'Aire. Julgo que também foi ao Oceanário, aos Jerónimos e ao CCB com o J. L. Vacas de Carvalho.  Passeou igualmente com o Jaime e a Odete. Visitou familiares e patrícios (que se costumam juntar todos os dias no Largo de São Domingos). Tive pena de não poder ter estado mais tempo com o Zé Carlos e de não poder ter partilhado, com ele, algumas destas emoções.

Já não o via desde Coimbra, em 21 de Maio (*)... Desta vez, achei-o um pouco abatido, ou talvez um pouco apreensivo, na véspera de partir.  Não se mostrou tão expansivo. Acredito que isso possa ter sido provocado pela ansiedade da partida, e pela convicção de que na sua terra tem muitas poucas perspectivas de futuro. Em Portugal, os seus papéis da tropa (portuguesa) de nada lhe valeram. O Zé Carlos nunca fez descontos para a Segurança Social (incluindo subsistemas como a Caixa Geral de Aposentações). Além disso, não é cidadão português (e esse argumento é decisivo)... Julgo que esta é a maior decepção que ele leva da sua viagem a Portugal... Os cinco anos e duzentos e tal dias que esteve ao serviço do exército português  não lhe deram quaisquer benefícios... direitos... Nada! ...Bem, pelo contrário, poderia ter sido sumariamente executado nos tempos de brasa... (Valeram-lhe os "anciãos" de Bambadinca que, em pleno tribunal popular, o defenderam como um bom homem e um bom guineense)...

Dentro em breve ele vai casar a sua filha com o filho de um antigo camarada e amigo da 2ª secção do 4º Gr Comb da CCAÇ 12, o Sori Baldé... Ele pertence a um outro mundo, para o qual volta... Ainda pensei em convidá-lo a integrar o nosso blogue... Mas percebi a tempo quão atrozmente ridícula era a minha proposta... Em Amedalai ele não tem nada, para além de um telemóvel e uns óculos que lhe deu a Odete... Para além da sua morança e de alguma terra para lavrar... Antigo professor ou monito escolar, não tem computador nem email nem internet nem sabe o que é isso... Não tem nada e tem medo da palavra "política"... Um blogue, para quê ? O que é isso ?... Que resposta lhe poderia eu dar ? Não saberia dar-lhe nenhuma... 

Confesso que fiquei deprimido por sentir que há homens que podem ter medo do medo... E que podem ainda, hoje, quarenta anos depois do fim da guerra colonial, sentir medo... E eu tenho medo de escrever mais e complicar a vida de antigos camaradas meus, que foram meus camaradas de armas... 

Até sempre, camarada Zé Carlos! Os amigos e camaradas da Guiné, reunidos em Monte Real, por ocasião do VI Encontro Nacional da Tabanca Grande, saudam-te e encorajam-te! À distância, estamos com um olho em ti, velamos por ti!...

PS - Ainda se pode ter medo... E mais do que isso, medo do medo... Na Guiné-Bissau, em muitas partes do mundo... Lembrei-me do Alexandre O'Neil e do seu Poema pouco original do medo... 
  

O medo vai ter tudo

pernas
ambulâncias
e o luxo blindado
de alguns automóveis
Vai ter olhos onde ninguém os veja
mãozinhas cautelosas
enredos quase inocentes 
ouvidos não só nas paredes 
mas também no chão 
no tecto
no murmúrio dos esgotos 
e talvez até (cautela!) 
ouvidos nos teus ouvidos
O medo vai ter tudo 
fantasmas na ópera
sessões contínuas de espiritismo
milagres
cortejos
frases corajosas
meninas exemplares
seguras casas de penhor
maliciosas casas de passe
conferências várias
congressos muitos
óptimos empregos
poemas originais
e poemas como este
projectos altamente porcos 
heróis
(o medo vai ter heróis!) 
costureiras reais e irreais 
operários
(assim assim)
escriturários
(muitos)
intelectuais
(o que se sabe) 
a tua voz talvez 
talvez a minha 
com certeza a deles
Vai ter capitais
países
suspeitas como toda a gente
muitíssimos amigos
beijos
namorados esverdeados
amantes silenciosos
ardentes
e angustiados
Ah o medo vai ter tudo 
tudo
(Penso no que o medo vai ter 
e tenho medo 
que é justamente 
o que o medo quer)
O medo vai ter tudo 
quase tudo 
e cada um por seu caminho 
havemos todos de chegar 
quase todos 
a ratos
Sim
a ratos

Alexandre O'Neill - Poesias Completas (1951/1983)

 (Reproduzido daqui, com a devida vénia)
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Nota do editor:



sexta-feira, 3 de junho de 2011

Guiné 63/74 - P8371: In Memoriam (82): Fotos de Cecília Maria de Castro Pereira de Carvalho Supico Pinto, antiga Presidente do Movimento Nacional Feminino (Mário Fitas)


1. O nosso camarada Mário Fitas, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 763, “Os Lassas” - Cufar -, 1965/66, enviou-nos a sua homenagem pessoal a Dª Cecília Supico Pinto, recentemente falecida.


Camaradas,

Sem qualquer preconceito político, revelo aqui a minha admiração por uma mulher que soube conviver com os jovens soldados nos tempos da guerra (hoje velhos Combatentes).

Julgando ser de interesse para o Blogue e para a história do conflito na Guiné, anexo algumas fotos da D. Cecília Supico Pinto (com a esposa do Cap  Costa Campos, comandante da CCAÇ 763) em Cufar, terra dos Lassas.

Em duas das fotos podemos vê-la acompanhada de D. Maria da Glória (França).



Com um abraço do tamanho do Cumbijã,
Mário Fitas



Fotos: © Mário Fitas (2011).Todos os direitos reservados
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Nota de M.R.:

Guiné 63/74 - P8370: Dando a mão à palmatória (27): Silvino Manuel da Luz: troca de fotografias (Nelson Herbert / Beja Santos)

1. Mensagem de nosso amigo Nelson Herbert [EUA]:

De: Nelson Herbert [herbertlopes@yahoo.com]
Enviada: sábado, 28 de Maio de 2011 20:25

Assunto: Guiné 63/74 - P8335: Notas de leitura (242): O Meu Testemunho, uma luta, um partido, dois países, por Aristides Pereira (6) (Mário Beja Santos)"


Um reparo ao Beja Santos... ou aos editores. A foto ilustrativa da referência feita a Silvino da Luz, nã
o corresponde à pessoa em causa... A foto é sim do até há bem pouco tempo presidente do parlamento caboverdiano, o jurista Aristides Lima, hoje candidato às eleições presidenciais de Setembro próximo!

Lima foi igualmente secretário geral (presidente ?) do PAICV...Cabo Verde ! 

Nelson Herbert

2. Comentário de Beja Santos:

 De: (DGC) Beja Santos <Beja.Santos@dg.consumidor.pt>

Data: 31 de Maio de 2011 11:11

Assunto: Resposta/Esclarecimento



Meu Caro Nelson Herbert,

Agradeço-te a gentileza do reparo. O seu a seu dono. Gostei tanto do depoimento do Silvino Manuel da Luz, achei ali tanta nobreza de carácter, veracidade nas convicções, coerência nas tomadas de posição políticas, que logo procurei uma sua imagem. 

Pois pus o nome dele no Google, caí numa publicação cabo-verdiana que referia no seu nome como possível candidato presidencial, pronto aqui está o erro. Muito grato te fico se me enviares uma autêntica fotografia do Silvino da Luz, assim se reparará a minha asneira. Um abraço do Mário.


3. Comentário do editor: 


Obrigado aos nossos dois amigos. Já foi reparado o erro. As nossas desculpas às personalidades em causa. E, claro, aos nossos leitores. Já agora, acrescente-se que Silvino da Luz foi também embaixador de Cabo Verde em Angola, durante 6 anos, até 2007.

Guiné 63/74 - P8369: Convívios (346): Encontro de confraternização da Companhia Independente 763, Sesimbra, 29 de Maio de 2011 (Mário Fitas)


1. O nosso camarada Mário Fitas, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 763, “Os Lassas” - Cufar -, 1965/66, enviou-nos notícias da festa da sua Unidade.

Encontro de confraternização da Companhia Independente 763
Sesimbra, 29 de Maio de 2011

Camaradas,

Anexo as intervenções e algumas fotos do 12º Almoço da CCAÇ 763 efectuado ontem, 29/05/2011, em Sesimbra.

Estiveram presentes 43 elementos dos "Lassas", acompanhados por esposas, filhos e netos num total de 105 pessoas.
As fotos dos oradores são:
Marília Rodrigues
Mário Fitas
Alferes Miliciano Jorge Paulos

Um Abraço,
Mário Fitas

2. Inicio com as palavras da jovem Marília Rodrigues, que foi buscar a descrição de uma operação da C.CAÇ. 763 ao diário do seu avô, Domingos Rodrigues Botas, soldado 2048/64 pertencente à citada Companhia.
Estimados senhores, camaradas de meu avô, Domingos Rodrigues Botas, soldado 2048/64 da Companhia 763.
Estimadas senhoras e senhores familiares destes homens que foram companheiros de meu avô.
Não podendo estar presente neste convívio, solicitou-me o meu avô Domingos que nós, familiares no total de sete, aqui estivéssemos em sua representação.
Resolvemos então, pegar no seu diário de guerra e trazer aqui um pouco da dolorosa experiência por ele vivida com os seus camaradas e amigos.
Peço desculpa por algum erro pois irei ler apenas o que ele escreveu.

“No dia 24 de Fevereiro partiram em coluna duas companhias, a minha e a 1500, para uma operação que consistia em fazer a limpeza à estrada que vai do cruzamento da mata de Cufar Nalú a Cobumba.



Partimos de Cufar pela 00H30, com destino ao cruzamento e seguimos para a mata de Áfiá, e, pouco antes de chegar ao local, sofremos uma estrondosa emboscada que durou das 04H00 até às sete e tal, debaixo de fogo serrado.


Pretendíamos montar segurança para uma coluna que saíra de Catió, a fim de retirar as abatizes da estrada.

Os primeiros tiros disparados do inimigo iluminavam a estrada com tal intensidade que nos cegava momentaneamente.


Logo nos primeiros tiros foi morto o Fur. Mil. Vaz, cujo corpo caiu para cima de mim.


O camarada que ia à minha frente, ao cair da viatura prendeu a arma do que estava ao lado, ficando este desarmado.


Deitamo-nos na valeta da estrada e começamos a responder ao fogo inimigo.


Dos que se instalaram na valeta do lado direito ficaram protegidos, mas os que saltaram para a valeta oposta ficaram muito expostos ao fogo do IN.

Eu, quando me instalei, verifiquei que não conseguia fazer fogo, pois a minha arma estava encravada.


A determinada altura, senti uma “porrada” num ombro, como se fosse uma pedrada. Tinha acabado de ser atingido por uma granada de mão lançada pelo inimigo, que felizmente não rebentou.


Deixei-me estar quieto e não disse nada. Passado um bocado disse para os que estavam ao meu lado se retirarem mais, porque tinha caído ali uma “coisa” que parecia uma granada de mão.

Dai a pouco já se ouvia queixumes por todo o lado.


Junto a nós tínhamos um camarada morto e tratamos de socorrer um ferido, que só passado algum tempo se ouviu dizer: “Ai.. ai… venham-me buscar!”


Fui ver quem era, mas ele não queria que eu lhe tocasse. Chamei mais alguns camaradas e levamo-lo, entre gritos de dor, pois tinha o corpo todo estilhaçado.

O fogo inimigo continuava.

O meu comandante de grupo mandou avançar a secção da retaguarda, para que nos viesse reforçar e retirasse o ferido que gemia em resultado das dores.

Só às 07H00 da manhã é que se começou a ver qualquer coisa.

Nós continuávamos sem apoio e tentamos retirar, com granadas de fumo.

Quando podemos retirar, trazíamos connosco 16 homens feridos e um morto. Havia ainda um desaparecido.

Quando eu regressei com o ferido ao comando do quartel onde se encontravam os enfermeiros, voltamos a ser atacadas fortemente.

Deitei-me, fazendo fogo com a minha arma automática, que entretanto desencravara. A certo momento esta foi atingida com uma bala no ponto de mira, cuja protecção desapareceu, ficando ainda pequenos bocados de metal por onde a bala tinha passado.

Felizmente voltei a salvar-me.

Os primeiros tiros do inimigo foram efectuados com uma arma pesada, com balas tracejantes, para melhor orientarem o tiro.

Antes de sofrermos esta emboscada, tínhamos passado por uma estrada toda armadilhada cerca de 300 homens e, por sorte, nenhuma das minas e armadilhas rebentou.

Como já disse, o primeiro morto que tivemos, logo no início do combate, foi um furriel que, logo nos primeiros tiros, um acertou-lhe na cabeça, tendo-lhe varado o capacete.

Quanto ao desaparecido, só demos por falta dele quando chegamos ao quartel. Como as evacuações dos feridos foram feitas de helicóptero, próximo do local da emboscada, pensamos nós que também tivesse sido evacuado.

Por fim, constatou-se que este tinha ficado por lá, no terreno da emboscada, ferido ou morto.

O corpo do Furriel Miliciano Vaz, foi colocado numa urna de chumbo comprada por nós, que foi chumbada em Cufar, seguiu para Catió, Bissau e dali para a Metrópole.

Obrigado pela atenção prestada, e as minhas desculpas se vos recordei tempos dolorosos.

3. Palavras do ex-furriel miliciano de Operações Especiais Mário Fitas:


“Caros camaradas! Queridos amigos! Companheiros da aventura que foi a participação na Guerra em terras da Guiné.

Estimadas senhoras esposas, filhos, netos e amigos destes nobres homens que, aos vinte anos, souberam cumprir a missão que a Pátria lhes exigiu.

Peço compreensão e entendimento para aquilo que vou dizer e que é de minha inteira e única responsabilidade.

Fiz a guerra com os meus companheiros na, à altura, Província Portuguesa da Guiné, internacionalmente reconhecida como tal, como parte do Estado Português.

Uma época mundialmente muito difícil.

A Guerra-fria estava no seu auge, as grandes potências digladiavam-se pelo controlo do mundo.

Em África nascia o movimento apelidado de Negritude, iniciando-se o aparecimento dos movimentos independentistas, com as potências Europeias a abandonarem de qualquer maneira África, que ficava à mercê de disputas étnicas e de que resultaram os graves problemas ainda hoje vividos.

Julgo ter cumprido o compromisso de cidadania, totalmente consciente, sem ter em consideração qual o poder político vigente na altura.

Resumi-me como disse a cumprir um dever, independentemente das minhas ideias.

Hoje passados que são 46 anos, com conhecimentos muito mais completos de toda a situação da guerra e os motivos a que a levaram, posso afirmar com firmeza que todos perdemos.

A guerra é a invenção mais estúpida da humanidade. Mas estivemos nela. Estando nela tivemos de a fazer. Opção zero: Ou matávamos ou deixavam-nos matar!

Esta preliminar explicação tem razão de ser derivado às várias situações que hoje nos são postas:

Nós soldados combatentes fomos sempre ignorados! Fomos e somos hoje achincalhados por senhores generais que estiveram na mesma guerra na Guiné, enchendo o peito de condecorações à custa do valoroso soldado Português e acusando-os de serem bandos dentro do arame farpado.

Por militares, políticos, pseudo-escritores analistas de profissão (treinadores de bancada), mas com eco em alguma comunicação social, a quem muitos de nós ajudámos a dar a liberdade de poderem falar. Somos hoje alcunhados de ter feito parte de um exército fascista.

Sobre nós são lançados labéus acusadores de termos deixado na Guiné uma miserável herança ao General Spínola.

Ignorantes do passado, ou não, dizendo a verdade: Enganam-se!

O contrário pode ser confirmado a partir da página 175 do livro: “O meu testemunho” de Aristides Pereira - Secretário-geral adjunto do PAIGC e mais tarde Presidente da Republica de Cabo Verde -, sobre a situação do PAIGC, de 1966 a 1968.

Toda essa situação foi resultante de quem actuou na Guerra antes de Spínola.

Quanto a nós! Os últimos homens de farda amarela, mas de camuflado, basta referir o descrito no prefácio de “Pami na Dondo A Guerrilheira”, página 10, cito:

“O Governador e comandante-chefe na altura, chegou a confidenciar a alguém que se tivesse seis (6) Companhias como a CCAÇ 763 o problema da guerrilha estaria resolvido.”

Quem foi alcunhado de “LASSAS” pelo próprio chefe da guerrilha no Cantanhês, Zona 11, e mais tarde Presidente da Guiné-Bissau João Bernardo Vieira (Nino)?

Cumprimos aquilo que a Pátria nos pediu e os políticos não souberam resolver. Não deitámos para o caixote do lixo quinhentos anos de História.

Só estes homens que aqui estão, poderão contar o que foi a sua juventude com uma G3 na mão, construindo um aquartelamento de raiz, porque os primeiros três meses em Cufar, foram vividos nos buracos como toupeiras.

Só quem viveu os dolorosos momentos da C.CAÇ. 763, tem autoridade para falar do que é: “Ser nobre na Paz e na Guerra” e a forma como irmãmente por nós foi tratado todo o povo da Guiné.

A História um dia mostrará toda a verdade e compreenderá os caminhos das margens do Cumbijã, das matas de Cufar Nalu, Camaiupa, Àfiá, Cachaque, Cantumane, Cabolol, Flaque Injã, Caboxanque, Cadique, Cafal, Darsalame e Cachanga.

Foram os nossos caminhos queridos camaradas! As nossas pegadas marcaram indelevelmente todos estes trajectos.

Há quinze dias estive com homens que a determinada altura nos acompanharam nos citados caminhos e que mandam um grande abraço de saudade para todos nós. São os homens da C.CAV. 1484.

Agora:

Para vós! Esposas, companheiras amantes e amigas!

Para vós! Filhos, netos e amigos adorados, destes “Cotas” combatentes.

Estes homens são dignos de respeito. Se a Pátria e aqueles que a não quiseram servir os tem ignorado e abandonado, aceitai-os vós pelo seu sangue suor e lágrimas com que regaram a terra vermelha, a lama dos pântanos e rios, e as águas das bolanhas da Guiné.

Viva a C.CAÇ. 763!

Vivam os LASSAS de Cufar!

4. Palavras do ex-alferes miliciano Jorge Paulos:

Caros Companheiros, Amigos e Familiares,

Mais um ano se passou sobre a última vez que nos juntámos para almoçar, confraternizar e relembrar os momentos que, em conjunto, andámos pelas terras da Guiné vivendo aquela aventura de uma guerra, rastejando nas matas e atravessando linhas de água, tarrafos e bolanhas, com água e lodo pelos pés, pela cintura ou mesmo pelo peito, em que, a todo o momento, sentíamos a presença de um “inimigo numeroso, aguerrido e bem armado”, que, naturalmente, nos causava angústias e sobressaltos que era preciso vencer.

Guerra que nunca desejámos mas que enfrentámos com determinação e coragem porque, enquanto portugueses, o país assim nos exigia. E digo exigia porque, quer quiséssemos quer não, tínhamos de ir arriscar as nossas vidas, sem que nunca nos tivessem dito bem para quê.

Porque a verdade, companheiros, é que muitos lá morreram e muitos outros ficaram afectados para toda a vida, sem que jamais o país tenha verdadeiramente reconhecido e compensado esses enormes sacrifícios.

Pelo contrário, as gerações seguintes, que tem estado de uma forma ou doutra no poder e por ele continuam a lutar, querem lá saber que a vida que hoje têm e que é incomparavelmente melhor do que foi a nossa, tenha resultado, em grande parte, do nosso sacrifício e do nosso árduo trabalho. Hoje, o que conta, é o interesse pessoal, como se pode ver pelas medidas cegas que vão ser tomadas e que afectam, entre outras coisas, as reformas, tornando a vida dos mais idosos muito mais difícil.

Quando vemos a juventude actual, que só tem tido facilidades, vir para a rua gritar que estão “à rasca”, temos de sorrir e pensar que, de facto, eles não sabem nem sonham o que é estar “à rasca”.

Mas Companheiros, não vale a pena lamentar a escuridão; o que é preciso é acender o fósforo para podermos ver de novo.

Como dizia um político francês “os pessimistas são meros espectadores, os optimistas são quem transforma este mundo”.

Habituados, como fomos, a lutar contra a adversidade, lembremos os momentos difíceis porque passámos, mas tenhamos também a satisfação de, apesar de tudo, podermos estar aqui e agora, de novo, a festejar a vida com a família e os amigos.

É bom aproveitarmos, ao máximo, estes pequenos momentos, porque também a abelha é pequena e, todavia, produz o que de mais doce existe.

Até para o ano Companheiros e felicidades para vós e para as vossas Famílias.

Viva a Companhia de caçadores 763 !!!

Jorge Paulos

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Nota de M.R.:

Guiné 63/74 - P8368: Notas de leitura (244): Guynea, de Arlinda Mártires (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Maio de 2011:

Queridos amigos,
Desta vez a descoberta ocorreu num alfarrabista à entrada da Rua das Portas de Santo Antão, nos baixos do Palácio da Independência.
Ia para a biblioteca da Sociedade de Geografia de Lisboa, fazer umas leituras do antropólogo António Carreira.
É o que se chama, lido esta Guynea, uma agradada surpresa. E é de perguntar como é que é possível nenhum de nós saber que existia uma poetisa luso-guineense chamada Arlinda Mártires.
Um abraço do
Mário


Guynea, a poética do deslumbramento do quotidiano

Beja Santos

“Guynea”, de Arlinda Mártires, é um pequeno volume de poesia de um coração grande, muito grande, a transbordar deslumbramento pelas gentes e terras da Guiné.

Arlinda da Conceição dos Mártires Nunes foi Leitora na Escola Normal Superior Tchico Té, em Bissau, entre 1993 e 1998, teve participação activa no GREC - Grupo de Expressão Cultural e em Tcholona – Revista de Artes e Letras.

A poetisa homenageia o que há de mais singelo que o seu olhar afaga (olha até ao fim do horizonte), vive encantada com os valores e as particularidades do universo guinéu, sobre eles discursa alegremente, entusiasticamente. Não hesito em dizer que este punhado de poemas é um caso sério na linguística luso-guineense (“Guynea”, por Arlinda Mártires, UNEAS-União dos Escritores e Artistas de São Tomé e Príncipe,2004).

Comove-se a Arlinda Mártires com as acácias rubras, os odores agridoces dos cajueiros, canta hossanas ao ventinho rasteiro da estação seca, exalta Rubane, ilha de águas de gentes serenas. Dir-se-á que é uma poesia de simplicidade deliberada, pois contém-se o vocabulário, enxuga-se a métrica, adoça-se a lírica à altura do enfeitiçamento tropical. Vamos aos exemplos:


estação seca

Janeiro
sopra ventinho rasteiro
levanta a terra vermelha
entra na boca, na orelha,
entranha-se no pulmão.
De tudo faz sua cama
do chão até ao poilão
passa por casas e leitos
leva vírus e maleita
de uma vez se deita
depois do primeiro trovão.


estação das chuvas

Cai a chuva
em catadupa
lava matas e casas
(a outras leva)
Lava corpo, não a boca.
Escorrem rios
pelo telhado.
Pela estrada
lagoas de água vermelha,
morna, parada,
berço de coaxar de rãs,
cólera, malária,
morte.


É como se a poetisa também saboreasse a proximidade/intimidade nestes registos de aguarelas expressionistas e sonoridades em torno das estações. Mas os locais também a tocam. Veja-se


Cacheu

Em Cacheu
jaz o Império.
Mira ainda o rio
a Fortaleza
que as cabras guardam
sem pastor.
Trocaram o mar pela terra,
por onde foram deitados,
navegadores, vice-reis e
governadores.
Permanecem os canhões,
cofre de memória
e de aves marinhas,
contra os quais
só a ferrugem marcha.


Temos as pessoas, o contexto em que se movem, a profissão e até a condição feminina. O que fascina é a contenção, mão há rodriguinhos e o fraseado multi-étnico soa autêntico, translúcido, um ocidental que se delicia com as carícias do sol do Equador. Outros exemplos:


menino de criação

Meio-dia
na tabanca
sol vertical
palha e barro.
Deserto
o caminho arde rubro.
O silêncio mora
na sombra do poilão.
Correm nus no bantabá
os meninos de criação
mãos sujas de terra e de chabéu
pedem ao branco a caneta, o chapéu
e chove o riso e a alegria.
Por tão pouco se ganha o dia


bidera

Sentada está a bidera
sob a mangueira florida
está formosa e divertida.

Pão a espreitar na bacia
no chão de terra vermelha
brinco a luzir na orelha
gargalhar de melancia
corpo em pano d’alegria
vida a rir da própria vida
está formosa e divertida.

Crianças nuas de roda
outra na mama chupada
aiôôô… có-cóóó… risada
gengiva azul desde a boda
dentes de alvura toda:
pon ka na bai, amiga?
Está formosa e divertida.


Chamemos-lhes, à falta de melhor termo, de apontamentos líricos sobre o quotidiano, rendições sublimes à multiculturalidade. Sim, sublimes, na particular circunstância de corresponderem, na íntegra ao que o coração colhe e a lírica empresta música, tudo despojado na ocupação da palavra pela paisagem dos sentimentos cooperantes pelo gosto das gentes, em devoção pela natureza, pelo resgate do território. É de perguntar como é que se editam 500 exemplares de tantíssima beleza e originalidade numa linguagem do luso-guineense. E são mais dois poemas, em jeito de despedida:


costureiro

Toc-toc-toc
Toc-toc-toc
baloiça o pedal
basin, seda,
linho, legoss.
Toc-toc-toc
Toc-toc-toc
mastiga a agulha
boubou, folhos,
rendas, taille-bas.
Toc-toc-toc
Toc-toc-toc
cavalgam os dias
turquesa, esmeralda,
rosa
pretu nok


feito pedra

Ocorre-me aos lábios
um corpo ébano
flancos de potro selvagem
entre colinas de mármore.


Não se esqueçam, se houver alguém que esteja a preparar uma antologia de poesia luso-guineense que não cometa a indelicadeza (injustiça) de omitir esta “Guynea”.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de Guiné 63/74 - P8353: Notas de leitura (243): Província da Guiné, 1972, publicado por Agência-Geral do Ultramar (Mário Beja Santos)