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sábado, 21 de agosto de 2021

Guiné 61/74 - P22472: Meu pai, meu velho, meu camarada (67): Lembrando, no centenário do seu nascimento, a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte V


Cabo Verde > São Vicente > Mindelo > c. 1943 > A cidade, a baía o Porto Grande e o Monte Cara ao fundo.  Ao centro,  em segundo plano, o edifício de maior volumetria é o Liceu Gil Eanes, por onde passou a elite do Mindelo e onde estudou Amílcar Cabral (que ali completa o 7º ano do liceu, em 1944, seguindo depois para Lisboa onde se licenciou em engenharia agronómica, no Instituto Superior de Agronomia
). 

Cortesia de Adriano Miranda Lima / Blogue Praia de Bote (2012). Informação complementar de Adriano Miranda Lima: “Foto de origem desconhecida mas que parece ser da Foto Melo ou do José Vitória”. 



Estrada Lourinhã-Peniche EN 8-2], cruzamento para a Praia da Areia Branca > 7/9/1942 > Foto enviada pelo irmão, Domingos Severino, o primeiro a contar a esquerda. Possivelmente foi em “dia de sortes”, do grupo dos nascido em 1922… Reconhece-se o Toni, o segundo a contar da esquerda;  o Carlos Fidalgo,  o terceiro; e o Rei, o quinto;  todos falecidos. Não 
é possível identificar o 4º elemento e 6º (de bicicleta). Foto: arquivo da família.



Lourinhã, estrada Lourinhã-Peniche, 7/9/1942... Uma fotografia com amigos, contemporâneos do meu pai... Do grupo da foto anterior. Nenhum deles está hoje vivo, se bem os reconheço. O segundo do lado esquerdo, é o meu tio, irmão do meu pai (dois anos mais novo) e meu saudoso padrinho de batismo, Domingos Henriques Severino. O terceiro é o Toni. O quinto  é o Carlos Fidalgo (, mais trade sócio da firma Fidalgo & Matos Lda) e o sexto o José Frade. A foto, enviada para Cabo Verde, está assinada pelo Domingos Severino.



Lourinhã > 6/12/1942 > Da esquerda para a direita: Nazaré, Ascensão e Maria Adelaide, três vizinhas e amigas de Luís Henriques, fotografadas na ponte sobre o Rio Grande, Lourinhã. Foto enviada para o amigo e vizinho, expedicionário em Cabo Verde, com "votos de verdadeira e sincera amizade". A primeira parte da legenda é ilegível.

Lembro-me de todas elas. A Maria Adelaide já morreu. Da Ascensão perdi-lhe o rasto. A Nazaré, conhecia-a bem, era a tia da Mariete, a família toda foi para a América,   em meados dos anos 50. E julgo que casou por lá... Será que ainda é viva ? Era "ajuntadeira" (costureira de calçado), e trabalhou muito para o meu pai, sapateiro, que dava trabalho a muita gente na Lourinhã.

Lembro-me bem da ti Adelina, mãe da Nazaré, nossa vizinha, e que era um, espécie de curandeira lá do bairro... Nós morávamos na rua dos Valados, ou do Castelo, e elas na rua, paralela, a do Clube... Quando puto, e quando doente, ela - a tia Adelina - aplicava-me as suas mezinhas, receitas da medicina popular com séculos de eficácia simbólica e terapêutica... Lembro-me, com repulsa, das suas unturas, na garganta, feitas com “gordura de galinha”, para tratar da papeira... Foto: arquivo de famíl



Lourinhã > s/d > c. 1940/50 > Passeando com primos e primas… Luís Henriques é o primeiro da esquerda. Na outra ponta, o primo António Francisco Sousa (que emigrará, muito mais tarde, para Moçambique). Foto: arquivo de família.


Cabo Verde > São Vicente > Mindelo > “Maio de 1943. O jardim de Mindelo onde respirei lufadas de perfume e pó de arroz: isto quando se passava por grupos de senhoras ou meninas. Quando se ouvia tocar a música, à volta deste jardim passeavam milhares de transeuntes”. Foto Melo, pertencente ao arquivo da família.

Na realidade, tratava-se da Praça Nova, ajardinada (hoje, Praça Amílcar Cabral), onde havia/há um coreto, um quiosque, um lado e os bustos de dois insignes portuguesa, o poeta Luís de Camões e o Marquês Sá da Bandeira (Santarém, 1795 - Lisboa, 1876), 
uma grande figura, como militar e político do liberalismo, que  liderou a  luta contra o esclavagismo no Portugal do séc. XIX.




Cabo Verde > São Vicente > Mindelo > Maio de 1943 > O jardim de Mindelo. A estátua de Luís de Camões, inaugurada em 1940… Foto: arquivo de família


Cabo Verde > S. Vicente > Mindelo > "Junho de 1943. Alguns internados do depósito dos convalescentes. Entre eles, estou também eu, sentado, lendo [o livro ] ‘Os Bastidores da Grande Guerra’. Luís Henriques , 1º Cabo nº 188/41, 1º Batalhão Expedicionário, R.I. nº 5. S. Vicente. C. Verde".

 [ O meu pai é o primeiro da 1ª primeira fila, do lado direito, assinalado com um círculo a vermelho; esteve internado cerca de 4 meses, já no final da comissão, por doença de pulmões; a morbimortalidade entre os expedicionárias era elevada; o livro em, questão podia o ser de Adolfo Coelho, "Nos bastidores da grande guerra", documentário, editado em 1934, em Lisboa, pela Livaria Clássica Editora].



Cabo Verde > S. Vicente > 1/12/1942 > "Uma das fases do jogo de voleibol no dia da festa da Restauração, organizada pelo R. I.  nº 5, em Lazareto, 1/12/1942, S. Vicente, C.Verde. Luís Henriques". Foto: arquivo da família.



Cabo Verde > São Vicente > Mindelo > Cais acostável, baía e o Monte Cara, ao fundo > “Agosto de 1942- A nossa maior alegria, depois dos trabalhos, o banho, em que tantos aprenderam a nadar. Entre tantos, estou eu, Luís Henriques. Em cima do cais, estão os nossos sargentos Peralta e M. Pereira (falecido)”.

 Segundo nos contava, ainda chegou a salvar mais do que um camarada, em risco de se afogar… Um deles, ao que parece, terá tentado o suicídio, uns meses antes do regresso a casa: sofria de sífilis, um das doenças sexualmente transmissíveis que mais afligia o contingente expedicionário, numa altura em que ainda não exista a “bala mágica”, o antibiótico… Recordo-me de o meu pai me dizer que no Mindelo “até as pedras tinham vénereo” (sic)… Segundo o nosso camarada Adriano Lima, a penicilina só chegou a Cabo Verde no início de 1945. Foto: arquivo da família.


Fotos (e legendas): © Luís Graça (2020). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.


5. Continuação da "história de vida" de Luís Henriques, ex-1º cabo at inf, 3ª Companhia do 1º Batalhão do RI5, unidade mais tarde integrada no RI 23 (*). Esteve no Mindelo entre julho de 1941 e setembro de 1943. Era natural da Lourinhã. Faria 101 anos,se fosse vivo, no dia 19 de agosto de 2021. A pandemia de Covid-19 impediu a realização, o ano passado, da homenagem que a família e alguns amigos lourinhanses queriam prestar-lhe.  O seu filho mais velho, o nosso editor Luís Graça, reuniu entretanto, numa pequena brochura de 100 páginas, o essencial da informação documental sobre a sua vida (*).
 

Antes de partir para Cabo Verde, o jovem Luís Henriques foi ao Nadrupe reiterar a sua vontade de continuar a namorar a filha do senhor Manuel Barbosa, pequeno agricultor com terras próprias (e outras de renda), e sete bocas para alimentar  (a esposa e seis filhos, 3 rapazes e 3 raparigas)… 

O futuro sogro terá sugerido que rompesse o namoro, porque não se sabia o que podia acontecer, “podia morrer ou arranjar outra” (sic)… Mas o meu futuro pai manteve-se fiel à promessa de continuar a namorar a Maria da Graça (que também assinava Maria da Graça Barbosa, mas no seu BI era apenas a Maria da Graça, nascida em 6 de agosto de 1922, no dia da festa local, o da N. Sra. da Graça).

Do Mindelo escreve à sua namorada, futura noiva e esposa, Maria da Graça. Eis algumas quadras que chegaram  até nós:

Deus ao fazer as três Graças,

Sua obra deu por finda,

Nasces tu, Maria da Graça,

A quarta Graça, a mais linda.

(c. 1941)

Desterrado nesta terra,

A saudade me consome,

Que Deus nos livre da guerra,

Já nos basta a sede e a fome.

 

Estou farto de engolir pó,

Nesta ilha abandonada,

Mas sinto-me menos só,

Quando penso em ti, minha amada.

 

Maria, minha cachopa,

Não me sais do pensamento,

Logo que eu saia da tropa,

Vou pedir-te em casamento.

 

 (c. 1942)

 


Lourinhã > Lourinhã > Abril de 1991 > Luís Henriques (1920-2012), com 70 anos, com a esposa, Maria da Graça (1922-2016). Celebravam nesse ano os 45 anos de casados ( e as "bodas de ouro", em 1996). Foto: arquivo da família.


Correspondia-se também com vizinhos, amigos e amigas da Lourinhã. Infelizmente, essa correspondência perdeu-se, com o tempo. Escrevia em papel fino, e ia mandando fotos, em geral de formato reduzido, legendadas no verso e algumas vezes a tinta verde.

Nos tempos livres, dedicava-se ao desporto: futebol, voleibol, natação. E gostava de ler e escrever. É natural que houvesse uma biblioteca  pública no Mindelo. E o próprio RI 23 deveria ter alguns livros para ocupação dos tempos livres dos expedicionários.

Era um leitor compulsivo. Lembro-me de me ter citado, entre outros, o romance do escritor austríaco, de origem judaica, Stefan Zweig (1881-1942), “Vinte e quatro horas na vida de uma mulher” (1935), que eu, confesso, nunca li.

Sinopse: "A rotina de um hotel na Riviera é abalada por uma notícia escandalosa. Uma mulher abandona o marido e as duas filhas, em nome de uma paixão por um jovem que havia acabado de conhecer. Este episódio despoleta uma acesa discussão entre os hóspedes do hotel e leva a Senhora C., uma aristocrata inglesa de sessenta e sete anos, a recordar um episódio secreto da sua vida que a tortura há mais de duas décadas. Vinte e quatro horas na vida de uma mulher é um relato apaixonante e intimista sobre a vida de uma mulher que se liberta das correntes do pudor e do preconceito social em nome de uma paixão avassaladora." (Fonte: A Esfera dos Livros).

Em 1942, o escritor e a mulher haviam-se suicidado em Petrópolis, no Brasil, país que os acolheu, no exílio.  Antes tinham passado duas vezes por Portugal. O meu pai deve ter tido acesso à edição de 1937, com a chancela da Civilização, Porto, trad.  Olando Alice. Terá sido um dos livros que  mais o marcou na sua vida, a avaliar pelo número de vezes que o citava. 

Em Cabo Verde, Luís Henriques foi contemporâneo dos pais de outros membros  da Tabanca Grande, nossos camaradas  (Hélder Sousa, Augusto Silva Santos, Luís Dias) ou amigos (Nelson Herbert)... Recorde-se os seus nomes: 

  • Ângelo Ferreira de Sousa (1921- 2001) (nascido no Cartaxo, a 28 de abril de 1921);
  • Armando Duarte Lopes (1920-2018) (nasceu no Mindelo; emigrará depois para a Guiné, onde foi futebolista);
  • Feliciano Delfim Santos (1922-1989) (esteve na ilha do Sal) (nascido a 22 de abril de 1922);
  • Porfírio Dias (1918-1988) (esteve no Mindelo, quase 3 anos, entre julho de 1941 e maio de 1944) (nasceu em Lisboa, em 30 de julho de 1919).

(Continua)

_________

Nota do editor:

(*) Vd. postes anteriores da série > 


22 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21282: Meu pai, meu velho, meu camarada (65): Lembrando, no centenário do seu nascimento, a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte III

20 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21273: Meu pai, meu velho, meu camarada (63): Lembrando, no centenário do seu nascimento, a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte II

sexta-feira, 20 de agosto de 2021

Guiné 61/74 - P22470: Meu pai, meu velho, meu camarada (66): Lembrando, no centenário do seu nascimento, a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte IV


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Lazareto [?] > Novembro de 1941 > "Em diligência no paiol [?], eu e 30 colegas. Eu, ao centro”… Pormenor do grupo: ao centro. Luís Henriques está assinalado com um retângulo a amarelo. Foto: arquivo da família.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > "Num dos funerais que cá se realizou , ao passar nas salinas (?) em São Vicente. 1942. Luis Henriques" Foto: arquivo da família.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > No dia 15 de Fevereiro de 1942, os três amigos íntimos [, da direita para a esquerda,] Luís Henriques, António F. Delgado e José Leonardo... os três bigodinhos, à revelia do RDM,  querem é dizer que têm bigode... discreto, à Clark Gable (1901-1960)... [Eram três 1ºs cabos inseparáveis, todos da mesma companhia, sendo o José Leonardo, da Serra do Calvo, Lourinhã: emigrará depois para a América onde irá faleceu]. Foto: arquivo da família.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > "Duas secções [. Menos de um pelotão,] em diligência. No paiol, São Vicente, novembro de 1941. Luis Henriques". Foto: arquivo da família



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > "Duas secções [. Menos de um pelotão,] em diligência. No paiol, São Vicente, novembro de 1941. Luis Henriques". Pormenor da foto anterior: o 1º cabo inf Luís Henriques é o segundo a contar da direita para a esquerda. Foto: arquivo da família


Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > Novembro de 1941. "(Ao fundo, navio italiano) Para as refeições [ilegível] nos juntávamos todos os 30 [do pelotão]". [Ao lado esquerdo, um grupo de miúdos, à espera dos restos...]. Foto: arquivo de família.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > RI 23 > 1941 > O primeiro Natal passado na ilha. Foto: arquivo de família.


Fotos (e legendas): © Luís Graça (2020). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.


Lembrando, no centenário do seu nascimento,
 a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, 
o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte IV




Cabo Verde > São Vicente > Mindelo > 1941 > Luís Henriques.
1º Cabo Inf da 3ª Companhia do 1º Batalhão do RI5. unidade mais tarde
integrada no RI 2.  Esteve no Mindelo entre julho de 1941 e setembro de 1943.  
Foto: arquivo de família.



4.  Figura muita popular e querida da sua terra natal, Lourinhã, e ainda ali  lembrado com saudade, nasceu há 101 anos,  em 19 de agosto de 1920 e morreu com 91 anos, os últimos cinco dos quais passados no Lar e Centro de Dia de N. Sra da Guia, na Atalaia. Foi um pequeno empresário (sapateiro), seccionista e treinador de futebol de camadas jovens do SC Lourinhanse (, de que era,antes de morrer, o sócio nº 1). 

Devido à pandemia de Covid-19, a família e os amigos  tiveram  que adiar a singela homenagem que tencionavam fazer-lhe, no dia 22 agosto de 2020, no centenário do seu nascimento. Também não será ainda neste ano da (des)graça de 2021, que essa homenagem se fará. Mas a família, no próximo domingo, irá recordar, em cerimónia privada, a sua figura: faria ontem 101 anos, se fosse vivo. Vamos continuar a publicar uma série de postes que já preparados, há um ano,  sobre a sua história de vida,  para publicação no nosso blogue  (*)


 
O RI 23 foi constituído em Cabo Verde, na Ilha de S. Vicente, sob o comando do Brigadeiro Augusto Martins Nogueira Soares (Agosto de 1941 a Dezembro de 1944). Faziam parte deste regimento as seguintes unidades (**):

  • 1 Batalhão do RI 5 (Caldas Rainha) ( a que pertencia o Luís Henriques e outros camaradas, naturais do concelho da Lourinhã)
  • 1 Batalhão do RI 7 (Leiria)
  • 1 Batalhão do RI 15 (Tomar)
  • Bateria de Artilharia Costa 1
  • Bateria de Artilharia Costa 2
  • Bateria Artilharia Contra Aeronaves 9,4 cm
  • Bateria Artilharia Contra Aeronaves 4 cm
  • Bateria de Referenciação, a 2 Divisões
  • 2ª Companhia de Sapadores Mineiros do Regimento de Engenharia 2

Ao RI 23 pertenciam ainda os seguintes serviços de apoio:

  • Parque de Engenharia
  • Secção de Padaria
  • Depósito de Subsistências e Material
  • Laboratório de Análise de Águas
  • Hospital Militar Principal de Cabo Verde
  • Depósito Sanitário
  • Tribunal Militar

À semelhança dos Açores (cuja guarnição militar foi reforçada com 30 mil homens, bem como da Madeira, com mil homens), para a defesa de Cabo Verde, e sobretudo das duas ilhas com maior importância geoestratégica, a ilha de São Vicente e a ilha do Sal, foram mobilizados 6358 militares, entre 1941 e 1944, assim distribuídos por 3 ilhas (i) 3361 (São Vicente): (ii) 753 (Santo Antão); e (iii) 2244 (Sal).

Mais de 2/3 dos efetivos estavam afetos à defesa do Mindelo (, ou seja, do porto atlântico, Porto Grande, ligando a Europa com a América Latina, a par dos cabos submarinos).

Os portugueses, hoje, desconhecem ou conhecem mal o enorme esforço militar que o país fez, na época da II Guerra Mundial, para garantir a soberania portuguesa nos territórios ultramarinos. Cerca de 180 mil homens foram mobilizados nessa época.

Em Cabo Verde chegou a temer-se a invasão dos alemães, dado o valor estratégico do arquipélago, à semelhança do arquipélago dos Açores, cobiçado pelos aliados. Quantas vezes me falava disso, o “meu pai, meu velho, meu camarada”... Ele, que simpatizava com os Aliados, falava-me da presença discreta dos alemães na ilha: chegaram a fazer um desafio de futebol com a tripulação de um navio alemão (, não posso afirmar se civil ou militar). E antes do reforço do nosso dispositivo de defesa da ilha de São Vicente e Santo Antão, o que só começa a ocorrer em meados de 1941, os submarinos alemãs eram com relativa frequência avistados ao la largo da ilha de São Vicente,e  das que estão mais próximas (Santo Antão, São Nicolau mas também Santiago) (Vd. Adriono Miranda Lima - Forças Expedicionárias  a Cbo Verde na II Guerra Mundial, edião de autor, Tipografia S. Vicente, Mindelo, 2020,  pp. 105 e ss.)

No Mindelo, tal como em Lisboa, havia espiões de um lado e do outro, alemães, italianos, ingleses, portugueses... E terá sido nesta época de fome, de guerra e de desgraça que se começou a desenvolver o nacionalismo cabo-verdiano que estará na origem do futuro PAIGC, fundado e liderado por Amílcar Cabral (a partir de 1956).

Só havia “vapor” (barco), com mantimentos e correio, de dois em dois meses… A saudade da terra era mitigada pela presença de diversos lourinhanenses, o furriel miliciano Caxaria, o Jaime Filipe, ambos da Atalaia, o Boaventura Horta, da Lourinhã, o Leonardo, da Serra do Calvo, e outros, que pertenciam à mesma unidade (RI 23, constituído na Ilha de São Vicente, 1941/44). 

Todos, infelizmente, já falecidos, o último, o António Caxaria, com 102 anos (**)... Já há não sobreviventes dessa geração... Para mais, foi uma geração sem cronistas. É uma pena que as suas memórias desapareçam com a sua morte física, a  morte física nossos pais, últimos soldados do império tal como nós... Mas todos eles trouxeram consigo algumas lembranças da ilha, e nomeadamente fotografias do célebre estúdio Foto Melo... 

Enfim, estas pequenas histórias que aqui se deixam, do Luís Henriques e outros "expedicionários",  fazem parte da história comum de Portugal e Cabo Verde (**)...

Numa época de elevado analfabetismo (, mais de 40% dos homens no grupo etário dos 20-24 anos, em 1940, eram analfabetos!), o Luís Henriques sacrificava, com gosto, os seus tempos livres, escrevendo dezenas de cartas por semana em nome de muitos dos seus camaradas. Aos 91 anos ainda se lembrava dos números de tropa (!) de alguns dos seus camaradas, dos seus nomes completos e até das moradas (!) para onde enviava as cartas.

Em nome do Fortunato Borda d'Água, do Cercal, Azambuja, por exemplo, chegava a escrever 22 cartas por semana... O Fortunato tinha duas namoradas, uma morena e outra loura, "uma que chorava ao pé da mãe dele, e outra que se ria, em plena rua" (sic)... O meu pai um dia teve que o ajudar a decidir-se:

- Ó Fortunato, afinal de quem é que tu gostas mais ? Com quem queres casar, quando voltares à terra ? Quem é que vai a ser a mãe dos teus filhos ? A que se ri, na rua, ou a que chora no ombro da tua mãe ?...

- Ó Luís, claro que é da que chora np ombro da minha mãezinha...que eu gosto mais.

Durante anos, visitaram-se mutuamente.

Lembrava-se também dos nomes e de algumas histórias dos seus oficiais, alguns, bem “prussianos, militaristas, germanófilos”, de acordo com figurino da época, um deles herói da Guerra de Espanha, "com as pernas todas furadas por balas" (sic)...

Lembrava-se até dos resultados dos renhidos torneios de futebol e de voleibol que se realizavam no Lazareto, entre o Mindelo e o Monte Cara, entre tropas de diferentes subunidades... e em que ele participava. 

Claro, lembrava-se das praias e dos tubarões, dos navios, e até dos espiões (que lá também os havia, como em Lisboa, ao serviço de um lado ou do outro das potências beligerante)... E a chegada de qualquer navio era uma festa, tanto para os expedicionários como para os naturais da ilha...Chegou a ir a bordo de um navio da marinha mercante para estar com um vizinho, membro da tripulação, que era natural de uma povoação vizinha da Lourinhã (, Atougia da Baleia, se não erro).

Ia a missa aos domingos, como bom católico. E tinha uma menina, uma "Bia", que gostava dele, encontravam-se na igreja de N. Sra. Luz... O sonho das raparigas da ilha era arranjar um namorado metropolitano e sair daquela miséria...

Tinha o bom hábito de ler. Tinha uma bela caligrafia e uma escrita com desenvoltura. Fez a 4ª classe com 9 anos, e começou logo trabalhar. Era bom em números... No Mindelo, escreverá centenas e centenas de cartas, em nome daqueles que na época (e eram muitos...) não sabiam ler e escrever... Escrevia uma média de 20 e tal cartas por semana...

Muitas vezes eram os próprios rapazes cabo-verdianos, engraxadores de rua, escolarizados, alguns estudantes do liceu Gil Eanes (o único que havia nas ilhas, e cujo reitor era um professor goês, culto...) que liam as cartas recebidas pelos expedicionários, metropolitanos, analfabetos... Que triste ironia!... 

Para mais numa época de pavorosa seca e epidemia de fome que roubou a vida a milhares de cabo-verdianos (cerca de 25 mil) (**)... Apesar de menos sentida na ilha de São Vicente do que nas outras ilhas, a fome foi também aqui mitigada graças à solidariedade dos "nossos pais, nossos velhos, nossos camaradas"...

Mas, coisa linda e fantástica, os ex-expedicionários de Cabo Verde desta época continuaram a encontrar-se durante muitos e muitos anos, até à década de 1990... O meu velhote costumava ir aos encontros do 1º Batalhão do RI 5, nas Caldas da Rainha... até que as pernas começarem a fraquejar  e a maior parte deles, dos seus camaradas, acabou por morrer.  O António Caxaria  costumava dar-lhe boleia,de carro (***). 

O mesmo se passava com os outros regimentos: RI 7 (Leiria), RI (11 (Setúbal), RI 15 (Tomar)... Cabo Verde ficou-lhes no coração para sempre...

Capa do romance de Manuel Ferreira (1917-1992), que fazia parte da exposição comemorativa
do 1º centenário do escritor Manuel Ferreira (1917-1992), também ele expedicionário em São Vicente, neste período, com o posto de furriel miliciano


O autor de "Hora di Bai" (1962) era natural da Gândara dos Olivais, Leiria, onde tenho amigos e familiares que o conheceram em vida. Morreu em Linda a Velha, Oeiras.

Expedicionário do RI 7 (Leiria), o fur mil Manuel Ferreira (1917-1992), futuro capitão SGE e escritor, conheceu, no Liceu Gil Eanes, aquela que virá a ser a sua muher e mãe dos seus filhos, também ela escritora, notável contista, Orlanda Amarílis (1924-2014). Ambos frequentavam este liceu. Orlanda era colega de turma do Amílcar Cabral (1924-1973) ... A família de Amílcar Cabral mudou-se para o Mindelo em 1937: é de todo provável que nos dois anos e tal que lé esteve, entre julho de 1941 e setembro de 1943, o meu pai se tenha cruzado com o futuro dirigente do PAIGC.

Manuel Ferreira acabou por ficar seis anos no Mindelo (1941-1947) e ser um dos cofundadores e animadores da revista literária "Certeza" (1944), de vida efémera mas com grande impacto na vida cultural da ilha.



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > "Dia 14 de agosto [de 1942], data gloriosa para a nossa gente lusa (Aljubarrota). Recordando essa data em Mindelo com o içar da bandeira nacional junto ao liceu Gil Eanes e marchando o regimento de infantaria 5 nas ruas da cidade". Foto: arquivo de família.

É um edifício com história, hoje conhecido como Liceu Velho... A elite do Mindelo passou por aqui... O liceu Gil Eanes (antes, Infante Dom Henrique) funcionou aqui de 1938 a 1968. A sua construção data de meados do séc. XIX. Teve vários usos, além de estabelecimento de ensino, foi quartel e correios...



A seca e a fome que assolaram Cabo Verde nessa época, e que fizeram milhares e milhares de mortos (inspirando o romance de Manuel Ferreira (1917-1992), “Hora di Bai”, publicado em 1962), tiveram impacto na consciência de bom português, bom cristão e bom lourinhanense, que era o 1º cabo Luís Henriques. O seu "impedido", o Joãozinho, que ele alimentava com as suas próprias sobras do rancho, também ele morreria, de fome e de doença, em meados de 1943.

Ainda se comovia, passados tantos anos, ao dizer-me que deu à família do miúdo todo o dinheiro que tinha em seu poder (c. de 16$00) - na altura, estava hospitalizado -, para ajudá-la nas despesas do enterro. 

Lembro-me de ele me dizer que um 1º cabo, em comissão em Cabo Verde, ganhava na época qualquer coisa como 130$00 por mês... De volta à metrópole, não terá mais do que 200$00 ou 300$00 no bolso. Para ele o dinheiro “nunca foi fêmea”...

Para se ter um ideia do valor do dinheiro nessa época de racionamento alimentar e especulação de preços dos géneros mais essenciais, podemos acrescentar o seguinte: 

(i) um quilo de bacalhau, em 1943, no Porto, custava 10$40, preço tabelado, ou 16$00, no mercado negro; 

(ii) um quilo de arroz, em 1941, na Guarda variava entre os 2$80, preço tabelado, e os 4$00, no mercado negro; 

(iii) o preço de um litro de azeite, em 1941, na Guarda, variava entre os 7$50 (azeite corrente) e os 8$50 (azeite extra), mas no mercado negro os preços podiam atingir 3, 4 ou 5 vezes mas;

(iv) um assalariado agrícola, na década de 1950, dez anos depois, não ganhava mais do que 20$00.

Numa população, como a do Mindelo, que não devia ultrapassar os 15 mil habitantes, a passar por graves problemas como o desemprego crónica, a seca, a fome e a emigração forçada, a presença de mais de 3300 “expedicionários” na ilha, entre 1941 e 1944, teve um grande impacto, com aspetos positivos e negativos (Vd. o livro do nosso camarada Adriano  Lima, 2020)(**). Manuel Ferreira, por ex., refere o seguinte, no seu livro “Morabeza” (1ª edição, 1958):

“Durante a última guerra, com a presença da tropa, o ritmo da vida do arquipélago, em muitos aspetos foi alterado, e daí terem surgido várias mornas alusivas a factos que mais chocaram a população, principalmente a de São Vicente [B.leza, pseudónimo de Xavier Cruz, compôs uma morna intitulada “punhal de vingança” onde refere que as moças agora só se encantam com “furrié”]. [p. 30]

 [ Citado por João Serra, in: 4 de junho de 2017 > Guiné 61/74 - P17507: Memória dos lugares (361): Mindelo em plena II Guerra Mundial, visto por Manuel Ferreira (1917-1992) (João Serra). Disponível em https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2017/06/guine-6174-p175007-memoria-dos-lugares.html   ]

(Continua)
__________


Notas do editor:

(*) Vd. postes anteriores:

22 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21282: Meu pai, meu velho, meu camarada (65): Lembrando, no centenário do seu nascimento, a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte III


(**) Vd. também:

14 de junho de  2021  > Guiné 61/74 - P22279: Notas de leitura (1361): "Forças Expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial", de Adriano Miranda Lima; Março de 2020, Edição de Autor (Mário Beja Santos)

11 de setembro de 2020 > Guiné 61/74 - P21346: Notas de leitura (1306): "Forças Expedicionárias a Cabo Verde na II Guerra Mundial", livro de Adriano Miranda Lima (edição de autor, Mindelo, 2020, 241 pp.): a história escrita com paixão, memória e coração (José Martins)

sábado, 22 de agosto de 2020

Guiné 61/74 - P21282: Meu pai, meu velho, meu camarada (65): Lembrando, no centenário do seu nascimento, a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte III




Cabo Verde > S. Vicente > Mindelo > "23/7/1941. Chegada ao 1º Batalhão Expedicionário do R.I. nº 5 a São Vicente, Cabo Verde. Na fotografia estou eu com alguns camaradas da minha companhia. No porto do Mindelo fomos entusiasticamente recebidos. Luís Henriques". [Partida a 18 de Julho de 1941, do Cais da Rocha Conde de Óbidos, Lisboa]. Fonte: Arquivo da família.


Cabo Verde >S. Vicente > Mindelo > 14/8/1942. Desfile de tropas, no dia da infantaria. 
Foto Melo. Arquivo da família.




Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mindelo > 23/7/1941. Chegada à ilha e defile das tropas expedicionárias do RI 5. Lê-se no verso da foto: "O senhor governador da colónia passando revista ao batalhão expedicionário do RI 5, acompanhado pelo nosso comandante. Passa neste momento [revista] à 3º companhia. Meu capitão Martens (ou Martins ?) Ferraz". Não tenho a certeza do sítio, talvez seja Praça Nova. O governador seria, na altura, o capitão José Diogo Ferreira Martins.


Fotos (e legendas): © Luís Graça (2020). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.


Lembrando, no centenário do seu nascimento, a popular figura do lourinhanense Luís Henriques, o “Ti Luís Sapateiro” (1920-2012) - Parte III



3. O Luís Henriques que faria cem anos, no passado dia 19 de agosto de 2020, se fosse vivo. Hoje, sábado, dia 22, vai ser celebrada na igreja de Ribamar, Lourinhã, uma missa, em sua memória, às 18h30. O celebrante será o padre Batalha, seu velho amigo e pároco de muitos anos na Lourinhã.

Tinha memórias muito fortes (incluindo registos fotográficos, de que se selecionam aqui alguns) dos difíceis tempos que passou no Mindelo, Ilha de São Vicente (26 meses, entre julho de 1941 e setembro de 1943; nos últimos 4 meses esteve hospitalizado, por problemas pulmonares, entre maio e agosto de 1943). Mas voltemos à partida, em 18 de julho de 1941, do paquete "Mouzinho de Albuquerque, que teve honras de título de caixa alta no vespertino "Di
ário de Lisboa":






Excertos do Diário de Lisboa (diretor: Joaquim Manso), sexta-feira,  18 de julho de 1941, p. 5,  Cortesia da Fundação Mário Soares > Casa Comum > Arquivos > Diário de Lisboa / Ruella Ramos.



Foi, então, no T/T "Mouzinho", da Companhia Colonial de Navegação, que o 1º cabo inf Luís Henriques e outros expedicionários do 1º batalhão do RI 5, das Caldas da Rainha, rumaram para Cabo Verde, ilha de São Vicente, em 18 de julho de 1941, conforme notícia do "Diário de Lisboa", acima reproduzida. A viagem não era isenta de riscos, bem pelo contrário (, como jávimos no poste anterior): estávamos em plena II Guerra Mundial e estava acessa a batalha do Atlântico Norte.

O Batalhão do RI 5 (Caldas Rainha) ( a que pertencia o Luís Henriques e outros camaradas, naturais do concelho da Lourinhã) será depois integrado no RI 23 ,constituído em Cabo Verde, na Ilha de S. Vicente, sob o comando do Brigadeiro Augusto Martins Nogueira Soares (Agosto de 1941 a Dezembro de 1944).



Cabo Verde > S. Vicente > Mindelo > Praia da Matiota > Maio de 1943 > "Matiota e a sua baía que é a melhor de S. Vicente, aonde se passa um bocado divertido", lê-se no verso. Possivlement Foto Meo. Fonte: arquivo da família.

 As forças do RI 5 estavam aquarteladas no Lazatero, no sopé do Monte Cara,a oeste do Mindelo. Na altura não havia aeroporto (hoje em São Pedro). Nem a Baía das Gatas era uma praia turística...



Cabo Verde > Ilha de São Vicente > Mapa de 2007, da autoria de Francisco Santos. Imagem copyleft. As forças do RI 5 focaram estacionadas no Lazatero, no sopé do Monte Cara,a oeste do Mindelo. (Fonte: Cortesia de Wikipédia. Reedição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

(Continua)
 
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Notas do editor:

Último poste da série > 21 de agosto de 2020 > Guiné 61/74 - P21277: Meu pai, meu velho, meu camarada (64): Foto do sargento Joaquim José Fitas, o meu tio Quim, na véspera de partir para Cabo Verde, como expedicionário, em plena II Guerra Mundial (Mário Fitas)

sexta-feira, 5 de junho de 2020

Guiné 61/74 - P21045: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (73): Pesquisa documental para um filme sobre a Cesária Évora (Mindelo, 1941 - Mindelo, 2011)


Cabo Verde > Mindelo > Cesária Évora, na Rádio Barlavento,  20 de junho de 1971.
Foto: cortesia da página oficial de Cesária Évora


1. Mensagem da nossa leitora Rosa Silva:

Date: quinta, 14/05/2020 à(s) 17:58
Subject: Pesquisa documentário Cesária Évora

Olá, boa tarde a todos.

Em primeiro lugar espero que se encontrem bem de saúde.

Chamo-me Rosa Silva e estou a trabalhar na produção de um documentário sobre Cesária Évora. Trata-se de um filme,  de cariz cinematográfico, que propõe uma viagem ao universo de Cesária Évora.

Pensado para cinema, o filme pretende revelar a verdadeira história da mulher que, aos 50 anos, saltou da mais profunda miséria para o estrelato mundial, sendo uma das mais consagradas cantoras de um país de língua oficial portuguesa. 

Assim, temos levado a cabo uma vasta pesquisa de material de arquivo em diversos países. O filme conta com autoria e realização de Ana Sofia Fonseca, sendo produzido pela Carrossel Produções, em co-produção com a Até Ao Fim Do Mundo.

Encontrei este blog:

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2009/09/guine-6374-p5021-meu-pai-meu-velho-meu.html

Estamos à procura de imagens do Mindelo anos 60/70 e também fotografias e vídeos que possam existir da Cesária Évora. Temos a informação que ela dava concertos nos barcos, bares. Por ventura têm imagens do que refiro ou têm conhecimento quem possa ter?

Ficaríamos muito gratas com a vossa preciosa ajuda.

Aguardo o vosso feedback. Obrigada,

Rosa Silva

rosasilva@ateaofimdomundo.com

Até ao Fim do Mundo - Imagens e Comunicação, Lda

Rua da Fraternidade Operária, nº4
2794-024 Carnaxide - Portugal
Tel: +351 21 425 47 77
Telm: +351 966 230 699
www.ateaofimdomundo.com

2. Resposta do nosso editor Luís Graça, em 24 de maio p.p.:

Rosa, olá. Obrigado pelo seu mail. Infelizmente, não sei se a poderei ajudar muito...Este blogue, coletivo, que eu fundei há 16 anos, administro e coedito, é sobre a(s) memória(s) da guerra colonial, em especial na Guiné, no período de 1961/74...

Alguns dos meus camaradas de armas (incluindo eu próprio) também tiveram os pais em Cabo Verde, como expedicionários na altura da II Guerra Mundial, em São Vicente, Santo Antão e Sal, mais exatamente entre 1941 e 1944... Na altura também lá esteve o futuro escritor Manuel Ferreira. Mas a nossa querida Cesária Évora estava então  a nascer (Mindelo, 27 de agosto de 1941)...

Há, no entanto, um espólio fotográfico, no nosso blogue, que a vossa equipa pode usar, com uma única condição: citação da fonte, o blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné.

Ver aqui descritores como:

Cabo Verde (335)
crioulo (72) 
Manuel Ferreira (12)
Meu pai meu velho... (85 referências)
Mindelo (39)
morna (14)
RI 23 (3)

E ainda:

Adriano Lima (15) (coronel, reformado, do exército português, oriundo do Mindelo...Acaba de publicar um livro sobre as tropas expedicionárias em Cabo Verde, na II Guerra Mundial)...

Disponha. Tem aqui o meu contacto: telem 931 415 277.

Boa saúde, bom trabalho, bom filme. Luís Graça

PS - Rosa, podemos publicar o seu apelo : temos vários camaradas que passaram por Cabo Verde durante a guerra colonial, 1961/74... Se autorizar, podemos publicar no blogue... Diga-me qualquer coisa...

3. Resposta da Rosa Silva, com data de 26 de maio p.p.:

Caro Luís,

Muito obrigada pela sua resposta e parabéns pelo seu trabalho. Guardar memórias, organizar o arquivo, é algo que considero muito valioso e dá sentido ao material recolhido

Quanto ao documentário sobre Cesária vamos continuar a pesquisar.

De qualquer modo, obrigado pelas suas  sugestões. Seria muito importante publicar no seu blogue e ficaria muito grata. Se quiser pode dar os meus contactos:

Mail rosasilva@ateaofimdomundo.com
Telem: 966230699


PS - Indicaram-me estes nomes de militares, mas mais do início dos anos 60,  que estiveram em S. Vicente. Dizem-lhe alguma coisa? Alguma sugestão para eu pesquisar e chegar até estas pessoas?

Coronel de Infantaria Fernando Gil Almeida Lobato de Faria
Coronel de Infantaria Domingos José Cravo
Coronel de Artilharia Humberto Rosa Neto
Tenente de Infantaria Joaquim Simões Duarte
Coronel António José Santiago Maia de Simas
Tenente Santiago Maia
Tenente Coronel, ao tempo, alferes, Manuel Augusto Gamboa de Matos, subalterno da Companhia de S. Vicente
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domingo, 30 de dezembro de 2018

Guiné 61/74 - P19345: In Memoriam (332): Armando Duarte Lopes (1920-2018): antiga glória do futebol guineense, morreu no passado dia 18 o "Búfalo Bill"; foi a enterrar na sua terra natal, o Mindelo, ilha de São Vicente, Cabo Verde (Nelson Herbert Lopes, EUA)



Gâmbia > Bathurst > 1953 > Comemorações da entronização da Rainha Isabel II, de Inglaterra > Foto da seleção de futebol da Província Portuguesa da Guiné > De pé, da esquerda para a direita, Antero Bubu (Sport Bissau e Benfica; capitão), Douglas (Sport Bissau e Benfica), Armando Lopes (UDIB), Theca (Sport Bissau e Benfica), Epifânio (UDIB) e Nanduco (UDIB); de joelhos, também da esquerda para a direita: Mário Silva (Sport Bissau e Benfica), Miguel Pérola (Sporting Club de Bissau), Júlio Almeida (UDIB), Emílio Sinais (Sport Bissau e Benfica, Joãozinho Burgo ( Sport Bissau e Benfica) e João Coronel (Sport Bissau e Benfica).

No 1º jogo, a seleção da Guiné ganhou à seleção da Gâmbia por 2-0, com golos de Joãozinho Burgo; no 2º jogo, as duas seleções empataram 2-2 (com golos, pela Guiné, de Mário Silva e Joãozinho Burgo). Antiga colónia inglesa, a Gâmbia acedeu à independência em 1965.

Legenda de João Burgo Correia Tavares: vd. livro Noberto Tavares de Carvalho -  "De campo a campo: conversas com o comandante Bobo Keita", Porto, edição de autor,  2011, p. 41.

Caboverdiano, da Ilha do Fogo, onde nasceu em 1929, Joãozinho Burgo era mais novo do que o Armando Lopes (n. 1920) mas dez anos  mais velho que o Bobo Keita (n. 1939). O auge da sua carreira é em 1960, com o apuramento da seleção de futebol da Guiné para a fase de qualificação para a disputa da taça Kwame Nkrumah.

Vencedora da Série D, a seleção guineense foi disputar a final em Acra, capital do Gana: além de Joãozinho Burgo, fizeram parte dessa equipa Bobo Keita, Júlio Semedo (Swift, guarda-redes), Antero 'Bubu', Vitor Mendes ('Penicilina'), 'Djinha', João de Deus, 'Chito', Luís 'Djató', 'Nhartanga' (que jogará depois em Portugal), entre outros...

O Joãozinho Burgo deixou de jogar na época de 1966/67, para de seguida ir tirar o curso de treinador, ainda em 1967, em Setúbal (onde teve como colegas de curso o José Augusto, o Coluna e o Cavém)

O Bobo Keita  (1939-2009), embora sportinguista de coração, assinou e jogou pelo Sport Bissau e Benfica, clube do seu pai, alfaiate... O mais interessante era verificar a grande popularidade que tinha o futebol nessa época, nomeadamente em Bissau, mas também no interior (Mansoa e Bafatá, por ex.).

O futebol, tal como o exército,  também foi um viveiro de militantes, combatentes e dirigentes ao PAIGC (Júlio Almeida, Júlio Semedo, Bobo Keita, Lino Correia...). Era interessante saber porquê...

O pai do nosso amigo e grã-tabanqueiro Nelson Lopes Herbert, de seu nome Armando Duarte Lopes, foi também, pois, uma antiga glória do futebol cabo-verdiano e guineense ("Armando Bufallo Bill, seu nome de guerra, o melhor futebolista da UDIB - União Desportiva e Internacional de Bissau. Também jogou no Sport Bissau e Benfica, de longe a melhor equipa de futebol da província,  e foi internacional pela selecção guineense.

Trabalhou depois na administração de portos da Guiné, e inclusive na   porto fluvial de Bambadinca, entre 1969 e 1971, na altura em que eu estive em Bambadinca, na CCAÇ 12 (julho de 1969/março de 1971). Tenho pena de o não ter conhecido pessoalmente, mas seguramente que nos cruzámos algumas vezes....


Foto: © Armando Lopes / Nelson Herbert (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].





Armando Duarte Lopes (Mindelo, 1920 - Mindelo, 2018),antiga glória do futebol de Cabo Verde e da Guiné


Fotos: © Nelson Herbert Lopes  (2018. Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].



Monte Cara, Mindelo, S Vicente, Cabo Verde  >  Monte Cara é uma montanha na parte ocidental da ilha de São Vicente, Cabo Verde. Assemelha-se a um rosto humano olhando para o céu, daí o seu nome, o que significa 'Montanha do rosto'. Foto (e legenda) de cronologia da página do Facebook do nosso amigo Nelson Herbert. (Reproduzida aqui com a devida vénia).


1. Mensagem, com data de 26 do corrente, nosso amigo e grã-tabanqueiro Nelson Herbert Lopes [jornalista, nascido em Bissau, filho da antiga glória do futebol cabo-verdiano e  guineense, Armando Duarte Lopes, o "Búfalo Bill; vive nos EUA, onde trabalha ou trabalhou na VOA - Voice of America):

Meu Caro Luis

Espero que tenha tido um bom Natal cheio de surpresas agradaveis.

Estas linhas apenas para lhe deixar saber que infelizmente o meu “Velho” Armando Duarte Lopes faleceu no passado dia 18 de Dezembro com 98 anos de idade... e foi a enterrar na última sexta feira no seu Mindelo natal. Não resistiu a uma paragem cardíaca...

Um abrço e um Feliz Ano Novo.

Nelson Herbert

2. Comentário do nosso editor Luís Graça:

Tínhamos até agora uma meia dúzia de referências ao pai do nosso amigo Nelson Herbert Lopes (*). Chega agora ao fim da sua viagem terrena. 

Cabo-verdiano do Mindelo, nasceu em 1920 (ou em 1922 ?)  fez o serviço militar na sua terra natal, no RI 23. em 1943, na altura em que também lá estava, como expedicionário, o meu pai, meu velho e meu camarada, Luís Henriques (1920-2012):  ambos tinham uma paixão pelo futebol, e ainda é possível que se tenham conhecido...(**)

O RI 23 foi também a unidade onde prestaram serviço, como expedicionários durante a II Guerra Mundial,  o Ângelo Ferreira de Sousa (1921-2001), pai do nosso camarada Hélder Sousa, e o Porfírio Dias (1919-1988), pai do nosso  camarada Luís Dias. (*)

Ao filho Nelson Herbert e demais família e amigos, ficam aqui registadas as condolências dos amigos e camaradas da Guiné que se sentam sob o poilão da Tabanca Grande. (***)

3. Mensagem de Nelson Herbert, de 20 de outubro de 2011,  21:05 (***)

Assunto: Futebol e Nacionalismo

Caro Luis

"As equipas de futebol deram bastantes militantes ao PAIGC... Era interessante saber porquê...No caso do Bobo Keita, foram decisivas as viagens ao estrangeiro (Ghana, Nigéria...) com a seleção nacional, até 1960, ano em que ele passou à clandestinidade"... E eis (mais) um capítulo da história da Guiné ainda por aprofundar !!!

Repare que a seleção de que Bobo Keita fazia parte, contava igualmente com um dos elementos fundadores do PAIGC, refiro-me pois ao cabo-verdiano Júlio Almeida (guarda redes, que deduzo estar na foto a que fez referência) , então técnico agrário da Granja de Pessubé, [onde trabalhou com] Amílcar Cabral !!!

A indicação e a consequente transferência de Júlio Almeida do futebol mindelense para a UDIB de Bissau foi iniciada, a pedido do clube guineense - creio que [no ínício dos] anos 50- pelo meu pai [ Armadndo Lopes], na altura de férias em S. Vicente, a ilha de natal de ambos.

Convém não perder de vista que, ante a então apertada vigilância da PIDE, a "bola" foi por sinal a via encontrada por Amílcar Cabral para a conglomeração, na periferia de Bissau, de guineenses e cabo-verdianos em redor de ideais nacionalistas.

E falando ainda de futebol, recordo ter lido em tempos no blogue um poste que fazia referência ao papel dos soldados portugueses na Guiné, na "massificação" do futebol naquela antiga província ultramarina.

Obrigado por partilhar!

Mantenhas

Nelson Herbert
_______________

Notas do editor:

(*) Vd. por exemplo postes de;