domingo, 11 de abril de 2010

Guiné 63/74 - P6142: Em busca de... (123): Procuro informações sobre Camaradas da CART 1612 / BART 1896 (Fernando Manuel Belo)


APELO
CART 1612 do BART 18
9
6

1. O nosso Camarada Amílcar Ventura enviou-nos um e-mail com o seguinte apelo:
Camaradas,

Este apelo foi-me pedido pelo nosso Camarada Fernando Manuel Belo, que foi Soldado Condutor da 3ª CCAÇ do meu batalhão.

Ele tem alguma dificuldade em dominar estas coisas da informática e pediu-me para eu o ajudar.
O apelo é do seu irmão, que também esteve na Guiné, cujo nome é Américo António de Oliveira Belo e era Soldado Condutor da CART 1612 do BART 1896.
Era conhecido pelo “Murtosa” e esteve nos anos 1966/68, em Aldeia Formosa, Buba, Bissorã e Mansoa.
Gostava muito de saber o que é feito dos seus Camaradas da Companhia.
O seu contacto via e-mail é:
fernandombelo@hotmail.com

2. A CART 1612 era um das três companhias operacionais do BART 1896 (As outras duas eram a 1613 e a 1614).
A CART 1612 seguiu em 13 de Dezembro de 1966 para Bissorã, actuando em Insumeté, Insantaque e Iusse.
Em 27 de Julho de 1967, deslocou-se para Buba, e actuou em Nhala, Darsalame e Buba Tombo.

Em 18 de Novembro de 1967, estacionou em Aldeia Formosa, tendo actuado em Colibuia, Chamarra e Porto Balana.Finalmente em 13 de Julho de 1968, recolheu a Bissau, de onde regressou ao Continente .

3. Em busca efectuada pelo Google, verificamos que este BART 1896, tem o seu convívio anual, de que resultou um pequeno artigo publicado na revista da Liga dos Combatentes, Nº 348, de Junho de 2009.

Infelizmente como se pode verificar, no ps além de um nome (que obviamente deve ser de um elemento do batalhão), não tem qualquer indicação do seu contacto.

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Nota de M.R.:

Guiné 63/74 - P6141: Parabéns a você (104): Jorge Picado, ex-Cap Mil (Os editores)


1. Mais um nativo do signo Carneiro festeja hoje, dia 11 de Abril de 2010, o seu aniversário. É ele o meu Comandante na CART 2732, ex-Cap Mil Jorge Picado(1).

O Jorge completa hoje 73 jovens anos. Vai fazer muitos mais, e nós, seus amigos e camaradas, aqui estaremos a contá-los para nos associarmos à sua alegria.

Jorge, a Tabanca inteira envia-te um abraço e votos de longa vida.

Mansabá, Messe de Oficiais, 11 de Abril de 1971 > Assim festejou Jorge Picado os seus 34 anos. Ainda de pé: Ex-Alf Mil Nunes Bento, hoje Ten Cor Ref; ex-Cap Mil Jorge Picado, o aniversariante e Ex-Alf Mil Rodrigues. Dos sentados não reza a história.

2. Com uma certa vergonha, mas com a maior honestidade, confesso que não ligava o Jorge a um Comandante com quem tinha ido, meio a pé, meio de transporte, a Fátima(2) . Não a Fátima de Leiria, mas a Fátima de Binta, ali perto de uma picada que liga a estrada Mansabá/Farim com o Olossato.

Não andámos de joelhos à volta da Capelinha das Aparições, mas fizemos penitência tal que, de certeza, os nossos pecados e os dos nossos vindouros estão redimidos.

E disse eu, para minha vergonha, que não reconhecia o senhor Eng.º Jorge Picado como meu ex-Comandante. Perante tão infame afirmação, o Jorge envia-me um foto tirada em Mansabá, onde ele aparecia... e eu também.

Mansabá > ABR71 > Festa do baptisado da filha do senhor José Leal > Nesta foto, à civil, com barba, o ex-Fur Mil Carlos Vinhal e ao fundo, fardado, o ex-Cap Mil Jorge Picado, ladeado pelo senhor José Leal e pelo Alf Mil Manuel Casal.

Esta menina, segura pelo pai e pelo Jorge Picado, sob o olhar atento e sorridente do ex-Alf Mil Manuel Casal, fará em Outubro próximo 39 anos. Como o tempo passa!!!

A partir desse dia, nunca mais fui o mesmo. Dizia ele que tinha feito a tal Operação a Fátima e que até tínhamos capturado três granadas de canhão sem recúo IN. Quem foi que verificou se elas estavam armadilhadas, quem foi? Eu próprio. Vergonha em cima de vergonha.

Claro que hoje tenho mais um amigo que ri comigo da minha desmiolada memória.

No pressuposto de que hoje (dia 11) estarei no Funchal, não quis, mesmo assim, perder a oportunidade de felicitar o meu amigo Jorge Picado e desejar-lhe uma vida longa com muita saúde, junto de seus filhos, netos, demais família e amigos que os tem às centenas.

O Jorge, quando pode, comparece nos convívios da malta. Já o vi na Tabanca de Matosinhos, em Ortigosa no Encontro da Tabanca Grande e até em Arruda dos Vinhos, não por estes, mas porque alguns elementos da CART 2732 se encontraram, e ele quis estar presente. Não pôde estar ontem no Encontro da nossa Companhia no Funchal por motivos particulares o que eu lamento.

Jorge Picado é já um veterano do Blogue. Lembremos o que nos disse em Abril de 2008:

Olá
Também pertenço ao grupo dos que palmilharam as poucas estradas alcatroadas e as muitas picadas da Guiné-Bissau.

Desde Bissau, Nhacra, Jugudul, Mansoa, Braia, Infandre, Cutia, Mansabá, Bironque, K-3, Farim, passando o rio Mansoa em João Landim, Bula, Có, Pelundo, Changalana, Jolmete, Teixeira Pinto, Canobe, Bara, Bajope, Blequisse, Cajinjassá, Capol, Bachegue, Boja, Chulame, Bassarel, Chanto, Bajobe, Bó, Calequisse, Cati, Biacha, Cabienque, Pandim, Cancal, Tame, Carenque, Batucar, Bugulha, Cajegute, Ponta Pedra, Caió, Tebebe, Belabate, Caiomete, Petabe, Beniche, a célebre Ponte Alf Nunes, Churobrique, Bachile, Capó, Cacheu (fui de meio aéreo) e também por meio fluvial acabei por pisar bolanhas na Ilha de Jeta e visitar Omaia na Ilha de Pecixe, além das bolanhas de Ilha de Jete.

Eis a minha identificação para que o Carlos Vinhal há 37 anos na CART 2732 em Mansabá, o Luís Camões há 38 anos na CCAÇ 2589, bem como o Luís Nabais na CCS do BCAÇ 2885 em Mansoa me sirvam de padrinhos na entrada desta Tertúlia, se ainda recordam este nome.

Jorge Manuel Simões Picado, natural e residente em Ílhavo, a poucos dias de chegar aos 71 anos, Eng.º Agrónomo de profissão (aposentado da Função Publica) e por gosto, Cap Mil por imposição e a contra-gosto, comandei (mal ou menos mal) a CCAÇ 2589 desde 24 de Fevereiro de 1970 até 15 de Fevereiro de 1971 quando a deixei a caminho do Cumuré e me apresentei no QG em Bissau para aguardar novo destino, tendo seguido para comandar a CART 2732 a partir de 8 de Março de 1971 até 29 de Abril de 1971, indo acabar a comissão no CAOP 1 em Teixeira Pinto desde 4 de Maio de 1971 até às vésperas de 9 de Abril de 1972, dia do meu desembarque no Aeroporto de Lisboa.

Perdoem-me qualquer erro, mas sou ainda um neófito nas novas tecnologias. Só estou ligado à Internet desde o passado dia 29 de Março e ainda não domino estas ferramentas, de tal modo que tive de me socorrer dum dos meus netos para aceder ao blogue, depois de ter lido a notícia no suplemento Y do Publico de sexta-feira [, dia 4 de Abril de 2008, que fez uma referência ao blogue Luís Graça e Camaradas da Guiné: Não deixes que sejam os outros a contar a tua guerra]. Por isso ainda não posso enviar fotografias.

J. Picado

Mansabá > O ex-Cap Mil Jorge Picado rodeado do seu staff, oficiais sargentos e impedidos da Messe de Oficiais

O Jorge Picado com o Luís Graça, sorridentes, aquando da visita do Editor do Blogue à Costa Nova.

Arruda dos Vinhos > Janeiro de 2009 > I Encontro da CART 2732 > Jorge Picado, Alfredo Gouveia e Inácio Silva

Ortigosa 2009 > Encontro da Tabanca Grande > Jorge Picado e Idálio Reis. Dois ex-combatentes da Guiné, dois Engenheiros Agrónomos.
__________

Notas de CV:

(1) Vd. postes de:

e


Vd. outros postes de Jorge Picado em: Jorge Picado e Estórias de Jorge Picado

Vd. último poste da série em:

11 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6140: Parabéns a você (103): Manuel Marinho* (ex-1.º Cabo da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512, Nema/Farim e Binta, 1972/74) (Os Editores)

Guiné 63/74 - P6140: Parabéns a você (103): Manuel Marinho* (ex-1.º Cabo da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512, Nema/Farim e Binta, 1972/74) (Os Editores)

»+» F*E*L*I*Z...A*N*I*V*E*R*S*Á*R*I*O «+«
1. Completa hoje 59 aninhos o nosso Camarada Manuel Marinho* (ex-1.º Cabo da 1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512,
Nema/Farim e Binta, 1972/74).

2. Vamos recordar a sua apresentação neste blogue, que foi publicada no dia 15 de Setembro de 2009, no poste
P4957:

“Apresenta-se o ex-1.º Cabo Manuel Alberto Costa Marinho, do 1.º GComb/1.ª CCAÇ/BCAÇ 4512, comissão em Nema/Farim, Binta, em 1972/74.
É com enorme sentido de gratidão, extensível aos restantes colaboradores do blogue e a todos os tertulianos da Tabanca Grande, que me dirijo, pela primeira vez.
Mais vale tarde que nunca.
Como ex-combatente da Guiné, não posso ficar indiferente ao que de melhor temos neste País para testemunhar o que foi a Guerra Colonial, mais concretamente a da Guiné, vivida e contada pelos seus protagonistas, por isso mais uma vez, um muito obrigado pelo excelente trabalho que podemos testemunhar.
E antes de mais peço a admissão na “Tabanca”, certo que já o poderia ter feito, mas só agora julgo oportuno, pelo facto (se calhar egoísta) de estar a ajudar uma sobrinha a fazer um trabalho sobre a Guerra Colonial, foi a miúda, que me incentivou a contar as minhas vivências na Guiné, depois de consultar muitas vezes o blogue, e sabendo que estive no inferno de Guidaje, praticamente em todas as suas incidências.
Como muitos de nós já o disseram, é penoso lembrar o que já estava na penumbra da memória, mas acho valer a pena este esforço, porque entendo que uma parte muito importante das nossas vidas ficou para sempre na Guiné, numa Guerra da qual eu não me envergonho de ter participado, e sou dos que sabiam minimamente para o que iam.
Depois porque ao longo destes anos (e já são 35), somos vergonhosamente ostracizados por todos os poderes instituídos neste País, que foram coniventes com o apagar da memória colectiva, de tudo o que diga respeito à Guerra Colonial, e mais grave do que isso, transformando os que por razões várias desertaram, em heróis, e nós que combatemos, só nos falta pedir desculpas por ainda estarmos vivos a contar (dissecar) esta guerra.
Pessoalmente, sinto-me ofendido com a imagem redutora que tem sido dada às gerações que se seguiram, não quero louvores, mas exijo respeito pelos que morreram, e por todos os que ficaram marcados por ela para sempre.
Desculpa camarada Luís este desabafo, corta tudo o que achares necessário, porque sinto esta revolta surda sempre que abordo esta questão.
Quero saudar muito especialmente os camaradas Amílcar Mendes (*) da 38.ª de Comandos, Victor Tavares da 121 dos “Páras” e o Albano M. Costa da CCAÇ 4150, os dois primeiros que descrevem operações de combate e o Albano que me fez rever Binta, peço desculpas ao omitir mais camaradas, sei que os há que viveram Guidaje e escreveram sobre esse fatídico mês, os Fuzileiros por exemplo.
Como também não desejo que outros contem a Guerra por mim, vou descrever o ataque à primeira coluna para Guidaje, que como é sabido não chegou ao destino.”
3. Como vem sendo habitual, sempre que me toca a mim – MR -, publicar estes postes aniversariantes, para melhor tentarmos avaliar o perfil do Manuel Marinho, recorri mais uma vez à consulta do seu signo de zodíaco – Carneiro -, para nativos entre 21/03 e 20/04”, num site que se tem vindo a tornar muito popular nesta matéria e ao qual se tem acesso através do endereço: KAZULO (http://horoscopo.kazulo.pt/4866/signos-do-zodiaco.htm), que diz textualmente o seguinte:
Carneiro
21/03 a 20/04
Com os nativos de Carneiro e os que o têm com ascendente, a primeira impressão é a de uma pessoa egocêntrica e de um signo independente, assertivo e impulsivo.
Os Carneiros não perdem tempo e quando tomam uma decisão, agem sobre ela de forma habitualmente rápida.
São energéticos e excelentes lideres mas nem sempre o melhor «seguidor».
São óptimos a iniciar as coisas mas deixam-nas frequentemente para um dos signos fixos acabar.
Altamente competitivos, gostam de se colocar à prova constantemente.
Apesar de governados por Marte e bastante temperamentais, a fúria é passageira e são em regra acolhedores e inspiradores.
Apresentam qualidades como a coragem e lealdade mas também a impaciência e têm um forte sentido de individualidade.
Atraem e realçam estas qualidades também nos outros e o dia de um nativo de Carneiro começa normalmente com um entusiástico estrondo.
Aparentam uma certa ingenuidade, por confiarem e acreditarem que os outros são tão directos e honestos como eles.
Marte na primeira casa astrológica influência a personalidade de forma similar.
A frase chave para nativos de Carneiro é «eu sou».
Com ascendente de Carneiro, as atracções viram-se para Balanças, governado na sétima casa, a dos parceiros.
Carneiro é um dos quatro signos Cardeais, por estar ligado à mudança de estação e do solstício, tendo como elemento o Fogo.
Anjo: O Arcanjo Cassiel é o protector dos nativos do Signo Carneiro. Cassiel é chamado Anjo Guerreiro e aqueles que nascem sob a sua influência são pessoas criativas, destemidas e determinadas.
Líderes natos, gostam de ocupar cargos de chefia e de desempenhar funções de elevada responsabilidade.
Possuidores de um carisma e encanto naturais, são amados por todos e até mesmo as suas atitudes irreflectidas são perdoadas e encaradas como uma encantadora particularidade da sua personalidade.
O Arcanjo Cassiel desenvolve a coragem e a imaginação. Ajuda a moderar a ambição, o espírito de competição e o egocentrismo.
4. Independentemente das mensagens e comentários que os nossos Camaradas enviarem e colocarem, futuramente, no local reservado aos mesmos, neste poste, queremos em nome do Luís Graça, Carlos Vinhal, Virgínio Briote, Magalhães Ribeiro e demais Camaradas da Grande Tabanca que por vários motivos não puderem enviar as suas mensagens, cantar-te a seguinte cantiguinha muito tradicional:
PARABÉNS A VOCÊ,
NESTA DATA QUERIDA,
MUITAS FELICIDADES,
MUITOS ANOS DE VIDA,
HOJE É DIA DE FESTA,
CANTAM AS NOSSAS ALMAS,
PARA O AMIGO MANELINHO,
UMA SALVA DE PALMAS!
E mais acrescentamos:
O nosso maior desejo, neste teu aniversário, é que junto da tua querida família sejas muito feliz e que esta data se repita por muitos, bons e férteis anos, plenos de saúde, felicidade e alegria.
E mais te desejamos, que por muitos mais e boas décadas, este "aquartelamento" de Camaradas & Amigos da Guiné te possa dedicar mensagens idênticas, às que hoje lerás neste teu poste e no cantinho reservado aos comentários.
Estes são os mais sinceros e melhores desejos destes teus Amigos e Camaradas, que como tu, um dia, carregaram uma G3 por matas e bolanhas da Guiné.
Com montanhas de abraços fraternos
____________
Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:
9 de Abril de 2010 >
Guiné 63/74 - P6133: Parabéns a você (101): Jorge Canhão (ex-Fur Mil At Inf da 3.ª CCAÇ/BCAÇ 4612), festeja hoje os seus 60 anos (Os Editores)

sábado, 10 de abril de 2010

Guiné 63/74 – P6139: Estórias avulsas (31): Emboscada em Lamel (Fernando C. G. Araújo, ex-Fur Mil OpEsp / RANGER da 2ª CCAÇ / BCAÇ 4512)


1. O nosso Camarada Fernando Costa Gomes de Araújo* (ex-Fur Mil OpEsp/RANGER da 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512, Jumbembem, 1973/74), enviou-nos a sua 4ª mensagem, com data de 10 de Abril de 2010:

Emboscada em Lamel
(região entre Jumbembem e Farim)
Lamel > 1974 > 02FEV, Notas na minha agenda/diário, sobre a emboscada no “Alto de Lamel” (1 morto e vários feridos)

02-02-1974 - 10h00 -, O meu pelotão, que estava reduzido a 15 ou 17 unidades, e um pelotão de Madeirenses que nos tinha vindo reforçar recentemente, saímos para fazer contra-penetração no trilho de Lamel, numa acção motivada por informações recolhidas de que um dos quadros superiores, de maior nomeada do PAIGC - Luís Cabral -, ia passar ali para o interior da Guiné.



Ao fim de algumas horas de marcha, paramos para almoçar (uma ração de combate individual) e descansarmos um pouco entre as habituais conversas e algumas anedotas.


Findo este período deslocamo-nos pela picada até ao “alto de Lamel”.


Ao chegarmos lá, o primeiro homem da coluna - o Reis -, avistou um vulto suspeito aninhado na picada, que, aparentemente, estava a colocar uma mina.


Pousámos o equipamento que trazíamos, além do normal nestas saídas, e, de armas em punho, fomo-nos aproximando do local onde o Reis tinha avistado o tal suspeito. Este ao aperceber-se da nossa presença fugiu de imediato para o interior do mato.


Quando o Reis – o nosso homem da metralhadora HK-21 -, chegou ao local onde tinha estado o tal suspeito, estalou um “fogachal” medonho.


Abrigamo-nos rapidamente do fogo inimigo e respondemos de imediato do mesmo modo.


A nossa sorte nesta emboscada, foi o Reis andar sempre com a HK-21 limpa e lubrificada, coisa que eu sabia bem, pois quando passava na caserna do 2º pelotão via-o sempre a limpar esta sua atribuída arma, e eu rotineiramente perguntava-lhe: “Reis essa arma está bem limpa?”


Ele sorria e respondia invariavelmente: “Furriel está limpinha e bem lubrificada.”


A compensação deste trabalho dava agora os seus frutos, na reacção a esta emboscada, pois o Reis quando via os inimigos levantarem-se, para avançar em nossa direcção, disparava curtas e certeiras rajadas, obrigando-os a deitarem-se novamente, tendo abatido assim 2 ou 3 dos guerrilheiros atacantes.


A troca de fogo estava cerrada e começou a instalar-se a confusão.


Em determinado momento reparei que o homem das transmissões - o Marante -, havia deixado cair a antena do rádio AVP-1, sem se aperceber.


Avisei-o, apanhei a antena e entreguei-lha ao mesmo tempo que lhe gritei: “É a única hipótese que temos de contactar com o quartel!”


O PAIGC lançava em nossa direcção sucessivas granadas de RPG 2 e RPG 7, e, confesso, perante aquele cenário infernal só pensei que não ia sair vivo dali.


Para agravar o nosso estado psíquico e anímico, vimos a nossa força ficar substancialmente reduzida, já que o pelotão de Madeirenses, quando a emboscada rebentou, desatou a fugir em debandada pelo meio da picada fora, deixando-nos ali sozinhos em pleno combate contra um inimigo muito superior, quer pelo poder de fogo em cena, quer pelo número de activos que se deduzia estar ali em grande número.


Comecei a chamá-los e a insultá-los aos berros ferozmente, com todo os nomes feios e depreciativos de que me lembrei e possam estar a imaginar.


Apesar de toda a confusão instalada, notei que a tropa avançada do PAIGC estava a tentar envolver-nos atravessando a picada em posição de técnica de combate.


Disse ao homem do morteiro: “Martins, bate a zona para onde eles se estão a dirigir… rápido!


O Martins assim fez e como não obtivemos resposta, fomos retirando lenta e atentamente para o lado de Farim.


A dado momento só tínhamos 2 ou 3 granadas de morteiro de 60 mm, porque no início da emboscada a rapaziada começou a disparar, tudo o que tinha à mão, indiscriminadamente, sobre a mata sem ainda sequer terem avistado qualquer IN.


Como eu não tinha avistado nenhum alvo, também não tinha disparado qualquer tiro e até deu para dispensar 3 dos meus carregadores da G3 a três dos meus homens.


Mais ou menos a meio da emboscada, o 1º Cabo Ferreira, que nesse dia foi escalado para levar a bazuca, levou um tiro num pé e, em vez de rastejar até nós como mandam as “regras”, não o fez, tendo-se posto em pé, sendo logo alvejado com uma granada de RPG no peito, o que lhe provocou a morte instantânea.
Fomos obrigados a continuar a retirar para o lado oposto (Farim), com vários feridos graves, já que o inimigo estava a utilizar a táctica de envolvimento (vulgar meia-lua), cortando-nos a retirada para o nosso quartel.


Entrei então na picada de Lamel onde se cruzava o trilho, com mais dois ou três homens armados de G3, em posição de rajada.


Comecei a sentir o coração mais acelerado, pois sabia que se estivessem ali meia dúzia de “turras”, era o suficiente para nos apanharem à mão.


Rezando para que não fosse necessário, eu ia disposto a vender cara a minha vida se preciso fosse.


A certa altura chegou junto de mim um soldado com um buraco no braço esquerdo manifestamente originado por um estilhaço. Amarrei-lhe o meu lenço verde-preto dividido em diagonal, que usava habitualmente para me camuflar, a fim de lhe estancar o sangue e amparei-o segurando-lhe também a sua arma, porque a sua vontade era abandoná-la ali, dadas as terríveis dores de que estava a padecer.


Atravessamos o trilho de “Lamel” sem problemas, e atingimos a ponte do mesmo nome, que era o ponto de encontro das duas picagens vindas de Jumbembem e de Farim.


Fiquei preocupado quando cheguei à ponte de Lamel só com dois ou três soldados, pois não sabia da localização dos restantes.


O que seria feito do resto do pelotão? – perguntei-me.
Passados uns 10 a 15 minutos aparecem mais 4 ou 5, que me narraram uma história de arrepiar.


Contaram-me então, que não tiveram tempo de fugir para um lugar mais seguro e refugiaram-se numa grande cova natural, que existia na parte inferior ao lado da picada, e, ali anichados silenciosamente, ouviram os guerrilheiros do PAIGC, murmurando entre si, a aproximarem-se daquele local.


O que lhes valeu foi que eles iam tão obcecados para capturarem os nossos despojos (bornais, cobertores, etc), que largáramos na picada quando retiramos durante o confronto na emboscada, que nem deram por eles.


Quando eles acabaram de falar, gelou-se-me o sangue nas veias só de imaginar esta situação, porque caso tivessem sido detectados, ou teriam sido mortos, ou apanhados à mão. “Há gajos com muita sorte!” – pensei eu.


Finda a emboscada, saíram do quartel em nosso auxílio a CCAÇ 51 (que sofreu também uma forte emboscada), e o Grupo Especial de Milícias 322 (Jumbembem), que foi igualmente emboscado.


Enfim, aquela zona esteve toda a ferro e fogo… um autêntico inferno.


Mais tarde, chegaram finalmente reforços de Farim, tendo-nos escoltado (2ª Companhia do BCAÇ 4512), até ao nosso aquartelamento em Jumbembem.


Chegado ao quartel, continuava obcecado pela morte do 1º Cabo Ferreira, que, além de tudo o mais, era casado e deixou à sua esposa dois filhos para criar.


Este sensível e terrível facto, aliado a alguns remorsos e mau estar que eu sentia, porque uns dias antes eu tinha optado por castigá-lo com dois reforços, para evitar o seguimento de uma participação por abandono de um posto de vigia, se tivesse agravado numa punição superiormente agravada pelas nossas hierarquias, fez com que eu não conseguisse conter algumas lágrimas.


Foram as primeiras e as últimas que derramei na Guiné!
Foto 35 > Jumbembem > 1974 > FEV02, Chegada de uma operação de reconhecimento em Lamel
Foto 36 > Jumbembem > 1973 > Saída de um grupo em direcção de Lamel
Foto 37 > Jumbembem > 1973 > O Soldado Ferreira, aqui a lançar areia com uma pá para uma Berliet e que viria a falecer combate (02FEV74), na emboscada aqui descrita
Foto 38 > Jumbembem > 1974 > Estado em que ficou uma Berliet destruída por uma mina A/C, em Lamel
Foto 39 > Jumbembem > 1973 > JUL05, Na picada de Fambantã
Foto 40 > Jumbembem > 1974 > Com uma metralhadora HK 21, que a dada altura passei a usar em substituição da G3
Foto 41 > Jumbembem > 1973 > JUL01, Na picada de Sare Tenem
Um abraço,
Fernando Araújo
Fur Mil OpEsp/RANGER da 2ª CCAÇ do BCAÇ 4512
Fotos: © Fernando Araújo (2009). Direitos reservados.
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Nota de M.R.:
Vd. último poste desta série em:

Guiné 63/74 - P6138: O Spínola que eu conheci (5): Os depoimentos de Joaquim Mexias Alves e José Manuel Matos Diniz




Vídeo: 6' 47'' Luís Graça (2010). Direitos reservados (Alojado em You Tube > Nhabijoes)

Apresentação do livro Spínola: Biografia, da autoria do historiador Luis Nuno Rodrigues (Lisboa, A Esfera dos Livros, 2010). Local: Lisboa, Fundação Mário Soares, 8 de Abril de 2010. Sessão presidida por Mário Soares.

Excerto da intervenção do Embaixador João Diogo Nunes Barata, antigo chefe de gabinete de Spínola na Guiné. Neste excerto, é feita uma apreciação global do autor, o historiador Luís Nuno Rodrigues (ISCTE e IPRI)  e da obra. Embora este vídeo tenha sido gravado em contexto público, pedi a devida autorização ao autor, Embaixador Nunes Barata, para reproduzir aqui a sua imagem e as suas palavras, pedido esse que foi gentilmente deferido.


Lisboa > Fundação Mário Soares > 8 de Abril de 2010 > Sessão de apresentação do livro Spinola: Biografia, de Luís Nuno Rodrigues (Lisboa: A Esfera dos Livros, 2010). Da esquerda para a direita: o embaixador João Diogo Nunes Rodrigues, o presidente da Fundação, Mário Soares, o autor, Luís Nuno Rodrigues, e a representante da editora, Margarida Damião.

Foto: © Luís Graça  (2010). Direitos reservados.




... (
1. António Sebastião de Spínola (1910-1986) faria 100 anos no próximo dia 11 de Abril, domingo, se fosse vivo. Morreu em 13 de Agosto de 1966, aos 86 anos. "Vítima de embolia pulmonar, no Serviço de Doenças Infecto-Contagiosas do Hospital Militar, na Ajuda, em Lisboa" (Manuel Catarino e Miriam Assor - Spínola: Senhor da Guerra. S/l: Presselivre, Imprensa Livre SA, 2010, p. 235). O centenário do seu nascimento será necessariamente objecto de diversas celebrações e eventos, algumas já anunciadas (*).

"Quem era, quem foi - o que não é exactamente o mesmo - António de Spínola ?", pergunta Carlos Matos Gomes, no prefácio ao supracitado livro... Acaba de sair, na editora A Esfera dos Livros, aquela que já é considerada a sua primeira grande biografia (pela quantidade e qualidade da informação, pelo rigor metodológico do autor, um conceituado académico): Spínola: Biografia, do historiador Luis Nuno Rodrigues (748 pp.).

Para já, queremos continuar a publicar os testemunhos e depoimentos dos nossos camaradas que serviram sob as ordens de (e conheceram, mesmo que supercialmente) o brigadeiro e depois general António Spínola, (ou simplesmente Spínola) como Governador Geral e Comandante Chefe no TO da Guiné (1968-1973) (**). Para já dois comentários, de Joaquim Mexia Alves e José Manuel Dinis (*).  Outros comentários, ou mesmo texto mais elaborados, serão bem vindos.

Como escrevi há dias, aquele que foi, para muitos de nós, o Velho, o Caco, o  Caco Baldé, o Homem Grande, o Bispo, algumas  das alcunhas por que era conhecido entre a tropa,  o Com-Chefe  e Governador-Geral António Spínola,  não o conhecemos assim tão bem quanto o julgamos... Temos a tendência, bem portuguesa, por ficarmos pela rama, pelo anedótico, pela pequena história, pelo boato, pelo preconceito, pelo  fait-divers...

É a altura de confrontarmos as nossas recordações de Spínola com a biografia do homem, do português, do militar e do político que passou à História (ou que, pelo menos, é já hoje objecto da investigação historiográfica).

É altura de olharmos, critica mas desapaixonadamente, para aquele que foi um dos mais importantes actores da cena político-militar do nosso tempo de jovens, combatentes e cidadãos ... Venham daí mais testemunhos a acrescentar aos dos nossos camaradas Vasco da Gama, Jorge Félix, Jorge Picado, Joaquim Mexias Alves e José Manuel Dinis.


(i) Joaquim Mexia Alves:

O General Spínola foi, independentemente do ódio de alguns, um digníssimo oficial superior das Forças Armadas Portuguesas, que muito as prestigiou.

Foi sem dúvida um comandante de homens que nunca voltou a cara ao perigo, arriscando às vezes até mais do que seria desejável na sua posição de Comandante Chefe.

Se numa dessas temeridades acontecesse o pior, qual não seria a vitória para o PAIGC ?!

Numa operação com desembarque de LDG no Corubal, abaixo da Ponta do Inglês, estava à nossa espera no cimo do talude do rio, para nos incentivar. Não vi lá mais nenhum oficial superior, nem comandantes de Batalhão.

Como todas as pessoas também cometeu erros, mas no computo geral, julgo que foi um grande Português e um Grande e Competente Militar.

Já tardava esta homenagem.

Se puder lá estarei com orgulho de ter servido sob as suas ordens.

(ii) José Manuel Matos Dinis

O Gen Spínola não foi, seguramente, uma figura consensual. Na aplicação disciplinar, usou de vários critérios e incongruências; do ponto de vista estratégico, não se lhe conheceu um golpe de asa capaz de virar o rumo dos acontecimentos; enquanto Com-Chefe não foi capaz de montar uma máquina de auditoria e fiscalização, no sentido de moralizar e solidarizar os serviços de intendência e os comandos das diversas unidades; também as diversas Repartições, muitas vezes deram mostras de alheamento face às necessidades da guerra; enquanto político não manifestou um pensamento coerente, e só com o Portugal e o Futuro deu uma nota da sua visão, mas foi impotente para condicionar o Movimento dos Capitães a tomar a linha de rumo ali traçada, apesar de "envolvido" ab initio; com a lei que regulamentou a carreira dos oficiais, tanto alinhou com os milicianos, como com os do QP; enfim, vaidoso e ambicioso, desde cedo deu a ideia de querer vir a ser a 1ª figura da nação. Claro que também teve qualidades, mas acho relevantes as críticas anteriores.

Uma ocasião, enquanto estive hospitalizado, o meu pelotão foi colocado numa aldeia, em autogestão, até que um dia a abandonou face aos sucessivos atrasos na distribuição do almoço. Era um pelotão valente, esforçado, generoso e optimista, apesar das reiteradas manifestações de desprezo e castigo por parte do comando (capitão e sargentos).

Pois nesse período, o General Spínola deslocou-se a Tabassi onde teve um cordial encontro com a rapaziada, de tronco nú e barbas por cortar.

Foi o meu Comandante, estarei presente numa homenagem de veteranos, se assim for decidido, mas afastada pelo menos cem metros da oficial, pois não posso alinhar e dar um agreement aos hipócritas, incompetentes, e metidos em trapalhadas, que dominam este país. O General, pelo menos, não deu ideia de se ter servido da posição em proveito pessoal, e foi corajoso, talvez excessivamente.

Abraços fraternos.

J.Dinis

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Notas de L.G.:

 (*) Vd. poste de 2 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 – P6097: Agenda Cultural (67): Homenagem da Câmara Municipal de Lisboa ao Marechal António Spínola (Mário G. R. Pinto)

(**) Vd. postes anteriores desta série:

17 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4041: O Spínola que eu conheci (4): Mansoa, 17 de Março de 1970, com o Ministro do Ultramar (Jorge Picado)

 1 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P3953: O Spínola que eu conheci (3): Um homem de carácter (Jorge Félix)

24 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3935: O Spínola que eu conheci (2): O artigo da Visão e o meu direito à indignação (Vasco da Gama)

24 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3929: O Spínola que eu conheci (1): Antes que me chamem spinolista... (Vasco da Gama)




sexta-feira, 9 de abril de 2010

Guiné 63/74 - P6137: Notas de leitura (91): Depois da guerra, as recordações da região de Cacine... e algo mais , de Luís Rosa - II (Beja Santos)

1. O nosso Camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil At Inf, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), enviou-nos, com data de 9 de Abril de 2010:

Queridos amigos,

Graças ao camarada Manuel Joaquim, conheci a primeira edição de “Memória dos Dias Sem Fim”, que se encontra facilmente nas livrarias.

Tenho para mim que há parágrafos deste livro que irão passar à posteridade.



Depois da guerra, as recordações da região de Cacine... e algo mais

Referimos aqui, há uns tempos atrás (poste P5503, de 19 de Dezembro de 2009), a obra do escritor Luís Rosa “Memória dos Dias Sem Fim” (Editorial Presença, 2009).
Luís Rosa é hoje um autor conceituado e a literatura da guerra colonial da Guiné fica a dever-lhe páginas sublimes.
Na recensão então feita, houve a preocupação de mencionar parágrafos desta obra que seguramente farão parte das antologias do género, tendo deplorado o final do romance, de um mau gosto enorme pela sua impossibilidade cultural, guineense não é macaco de feira, ocidental de ocasião.
Graças ao nosso camarada Manuel Joaquim, acabo de descobrir que o Luís Rosa já tinha feito uma edição de autor desta mesmíssima obra em 1990, tendo-a intitulado “Depois da Guerra”.
Tudo começa no cais do Pidjiquiti e com uma conversa com o comandante Nalu, ali se aborda o massacre do Pidjiquiti de 1959. As páginas dedicadas a Sangonhá são de uma enorme beleza:
“Tínhamos chegado a Sangonhá na véspera. Ao cair da noite ouvimos para sul três tiros em Canefaque.
Três tiros de arma grossa. Era o sinal.
O percurso para Sangonhá tinha sido difícil. Com os guerrilheiros a emboscarem a coluna.
Os guinchos a puxarem as enormes árvores tombadas na estrada.
As serras mecânicas gemendo num esforço entrecortado.
A ramaria caindo e sendo arrastada. Os sapadores pesquisando as minas no chão poeirento e nas abatizes.

Os tiros dispersos vindos do mato, levavam a morte num silvo ou morriam nos troncos.
De um lado e de outro uma vontade decidida de avançar ou vender cara a retirada. Mais atrás seguia o grosso da coluna, apenas pelo ruído se apercebendo do que passava à frente...
Assim se entrou de rompante no cruzamento de Sangonhá, blindados à frente, cortando com as rajadas as largas folhas das bananeiras, enquanto os tiros do mato iam rareando, dizendo pela distância e por fim pelo silêncio, a resignação, pela retirada forçada.
Os homens do mato refugiaram-se no Quitafine, enviando mensagens para toda a área de que a tropa ocupara Sangonhá.
Depois tinham surgido aqueles três tiros em Canefaque, no extremo sul. Era o sinal de reunir todos os grupos da guerrilha, da área de Cacine a Cabedu, de Cameconde à Ilha de Melo...
Aqueles três tiros para o lado de Canefaque fizeram-nos prever o pior. Tínhamos dois blindados Fox e dois velhos granadeiros.
Pusemo-los aos cantos, para cruzarem o fogo e imporem respeito. E assim, uns na vala, outros nos carros, passámos aquela noite.
A segunda noite, porém, chegou com a sensação rasgante e densa de que qualquer coisa ia acontecer.
Logo que a escuridão caiu sobre as palmeiras, começaram-se a ver pequenas luzes, como de isqueiros ou pirilampos.
Todas as forças da guerrilha da península do Quitafine se tinham juntado para acabar com a guarnição...
A escuridão e os mangueiros, ajudaram a aproximação. A ponto de um homem do blindado se aperceber de uma sombra a deslocar-se a uns cinquenta metros.
Abriu fogo e o inferno explodiu, escancarando a gorge por todo o lado. Não durou muito. Talvez uma meia hora.
Quando a manhã surgiu ainda embrulhada em trevas, mas já deixando distinguir a nitidez das formas, ouviu-se uma voz seguida de muitas, exclamações de espanto interrogativo.
À volta do quartel viam-se capacetes imóveis, um homem semi-erguido, ainda agarrado ao arame farpado e aquela arma imponente espreitando em desafio por detrás do “mangueiro”. São descrições de uma elevada contenção, a sobriedade que não deixa margens para a lamechice.
Aqui e em muitos pontos da obra, o horror é sempre condicionado pela justa medida, não se dissimula o olhar de África por outra observação que seja a do militar que põe perguntas sóbrias e concretas, que executa sem vanglória ou à procura de ficar no retrato.
Assim fala de um prisioneiro barbaramente tratado, no fundo não passa de um doente, foi preciso um diagnóstico do médico para acabar com a pancadaria selvagem.
Assim fala de uma velha mulher que terá vindo de um acampamento inimigo, que atravessa Sangonhá sem uma palavra e que caminhou para o lado da fronteira, à procura de um destino que ninguém entendia.
Assim se fala da brutalidade das relações sexuais com uma sinceridade que nos recorda a fio-de-prumo o que vimos, ouvimos ou soubemos que existiu.
É um livro que merece ser lido, independentemente do juízo crítico que faço ao final da obra. Há aqui páginas de ouro, aqui se gravou em pedra rija muita dor incontida num encadeamento de relatos de elevado valor literário.

Luís Rosa


Um abraço,
Mário Santos
Alf Mil At Inf Cmdt do Pel Caç Nat 52
__________

Notas de M.R.:

Vd. também, sobre esta obra e seu autor, o poste desta série publicado em:

19 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5503: Notas de leitura (44): MEMÓRIA DOS DIAS SEM FIM, romance de Luís Rosa - I (Beja Santos)

Vd. último poste da série publicado em:

7 de Abril de 2010 > Guiné 63/74 - P6124: Notas de leitura (90): Relação de Bordo, de Cristóvão de Aguiar (I) (Beja Santos)

Guiné 63/74 - P6136: Agenda cultural (70): A banda portuguesa, de música klezmer, Melech Mechaya, em Lisboa, no Teatro Villaret, 12 de Abril, 2ª feira, às 21h30






Fonte: Melech Mechaya (2010).

1. Os Melech Mechaya [lê-se Melec Mecaia], banda portuguesa de música klezmer, a que pertence o João Graça (violino), membro da nossa Tabanca Grande desde Dezembro de 2009, têm encontro marcado dia 12 do corrente,às 21h30, no Teatro Villaret, com os seus fãs, amigos e admiradores. O concerto,  que marca o seu regresso à capital portuguesa,  terá como destaque o disco Budja Ba, mas também será pretexto para a apresentação de algumas faixas novas.
Fundado em 1964,  por Raul Solnado, o Teatro Villaret reabre agora ao público, com a apresentação da banda que lotou o Santiago Alquimista, na noite de passagem de ano.

Teatro Villaret

Avenida Fontes Pereira de Melo, 30 A
1050-122 Lisboa
Telefone: 213 538 586
E-Mail: teatrovillaret.reservas@gmail.com
teatrovillaret@gmail.com
 

2. Próximos concertos dos Melech Mechaya

25 Abr 2010,  21:30 > Fórum Romeu Correia,  Almada

1 Mai 2010,  22:00 > A anunciar
22 Mai 2010,  22:00 > Cine-Teatro [1ª parte: Old Blind Mole Orkestra (FR)],  Estarreja

10 Jun 2010 22:00 > Festas de Abrantes,  Abrantes

11 Jun 2010 21:30 > Ivanov, peça de teatro de Techov, pelo grupo Truta, Centro Cultural Vila Flor,  Guimarães

12 Jun 2010 22:00 > Ciclo da Primavera,  Montemor-O-Novo

24 Jul 2010 22:00 > Festa Privada,  Mafra

20 Ago 2010 1:00 > Festival Bons Sons,  Tomar

21 Ago 2010 22:00 > Festival Ecos da Terra,  Celorico de Basto

3. Crítica de Eelco Schilder a Budja Ba, in FolkWorld Magazine


" (...) Very different is the approach of Portuguese band Melech Mechaya. This band exists out of five outstanding musicians and mixes the tradition of Klezmer and Yiddish music from several (European) regions with an occasional Arabic or Balkan vibe and also some Portuguese traditional influences now and then. They can be party animals but also play more melancholic songs like the beautiful Fado Tantz. Most material they play is known (yes, Hava Nagila is there as well). A nice album, well played and occasionally really catchy but also predictable at moments."


Tradução livre: Muito diferente é a abordagem de banda ortuguesa Melech Mechaya, onde se destacam cinco excelentes músicos, que mistura a tradição da música  klezmer e yiddish de várias regiões (Europa) regiões com umas ocasionais sonaridades árabes ou balcãs e  mas também com alguma influência da música tradicional portuguesa. Eles tanto podem ser animais de festa, mas tocar canções mais melancólicas como o belo Fado Tantz.  A maioria ds temas que eles tocam é conhecido (sim, Hava Nagila lá está também). Um belo álbum, bem executado, com momentos realmente cativantes.

Guiné 63/74 - P6135: Parabéns a você (102): Miguel, uma Pessoa de Cinco Strelas, mas também o Pil...antra que levou a nossa camarada Giselda ao altar (Luís Graça)


Guiné > Bissau > Bissalanca > BA 12  (1972/1974 > O então Ten Pilav Miguel Pessoa.



Comunicado das Forças Armadas Portuguesas, publicado na imprensa da época, em que se relatava o "acidente" de que foi vítima o Tenente Pil Av Miguel Pessoa.  Por não dar trunfos ao IN(inimigo), o abate de um Fiat G91 por uma nova arma, o míssil terra-ar Strela, era apresentado à opinião pública da Metrópole em versão muito mais soft... O excerto que aqui se reproduz, creio que era do extinto Diário Popular.

Fotos: © Miguel Pessoa (2009). Direitos reservado.


1. Não se pode falar do Miguel (Pessoa) sem falar de outra Pessoa, a Giselda … Uma e outra são Pessoas de Cinco Strelas. Foi a guerra e a Guiné que os juntaram (até agora, para sempre)…Essa é, de resto, uma história, do seu foro íntímo, que eles não contaram no nosso blogue (nem estamos à espera que venham a contar, com muita pena nossa)…

Não sei exactamente quando nem onde se casaram… Mas subsiste a humana curiosidade dos tabanqueiros (e não há tabanqueiro que não tenha um pouco de louco e voyeurista): Como é que um jovem tenente pilav [, pil...antra ? ] se apaixona por uma jovem sargento enfermeira pára-quedista, em tempos tramados, strelados, como eram aqueles, de fim-de-guerra (ou de saldos de guerra) ?

Por muitas voltas que dê à história, não sei quem foi a culpa: de Guileje ? do Strela ? do milagre da recuperação no dia 26 de Março de 1973 ? da lotaria das escalas e dos turnos ? Nesse dia, a Giselda estava de serviço… Coincidências ? Destino ? Fado ? De fado, não foi, mas também não terá sido propriamente uma história de fadas… Gosto de imaginar que, noutra encarnação, ela foi a fada e o Miguel o seu príncipe encantado (e encanado como a perna da rã)…

O Miguel Pessoa (n. 1946) já aqui nos contou como foi parar à Metrópole, e ao fim de uns largos meses de tratamento e recuperação no Hospital Militar Principal, em Lisboa, regressou a casa, neste caso, Base Aérea nº 12, Bissalanca, Guiné-Bissau…

Outra pergunta, que fica sem resposta: voltou, porquê ? por motivos patrióticos ? por dever profissional ? ou por que deixara a Giselda, de coração destroçado, em Bissalanca ? (Bem, sabemos que as enfermeiras pára-quedistas não dormiam na base, mas sim em Bissau, longe das vistas dos pil…antras).

Não se pode fala do Miguel sem falar da Giselda,  mesmo em dia de anos do Miguel, porque eles são o mais mediático casal de camaradas da Guiné, o mais amoroso, o mais simpático, o mais encantador, o mais glamouroso, mas também  o mais discreto, o mais tudo... Bom, eles são únicos… Por muitas razões e mais uma: de facto, são o único casal de camaradas da Guiné com licença de residência (e com direito a cama, mesa e roupa lavada) na Tabanca Grande!...

E quem são eles, exactamente ? Ele é o Miguel Pessoa (ex-Ten Pilav, Bissalanca, BA12, 1972/74, hoje Cor Pilav Ref). Ela é a Srgt Pára-quedista Giselda Antunes (apelido de solteira)... Seguramente o único casal do mundo que foi atingido - cada um deles, separadamente, em ocasiões diferentes, e em areonaves diferentes - , por um míssil SAM 7 Strela...

Já em tempos escrevi: “A Guiné e o Strela os juntou, sob a benção da FAP... Por mim já estavam no Guiness Book of Records se isso ajudasse a aumentar o PIB do nosso país e a contribuir para tornar ainda maior a nossa Tabanca Grande, além de mais felizes [os nossos tabanqueiros]... E, claro, Ele & Ela”.

 Acontece que hoje é o dia  de aniversário do Miguel (*), e daqui a vinte dias, a 29, o da Giselda. Ele é nativo do signo Carneiro. Ela é Touro. Como eu, pessoalmente, não acredito na astrologia, julgo que eles não são nem melhores nem piores pessoas por serem, ele, Carneiro, e ela, Touro. Só sei que são duas excelentes aquisições do blogue, das melhores que  já fizemos…

Há quanto tempo está o Miguel connosco ? Não sei, assim de repente, responder a essa pergunta... Creio até que não houve uma entrada formal, com fanfarra militar, na nossa Tabanca Grande. Ele foi entrando, no início de 2009,  e ficou. E está de pedra e cal. E,  mais tarde, trouxe a prenda da... Giselda, que é a única verdadeira camarada, até agora,  que nós temos na nossa Tabanca da Guiné.

O nosso Carlos Vinhal meteu "uns dias de férias" por motivos de convívio (anual) da malta da sua companhia. Parte hoje para o Funchal. Fica, pois, para mim a difícil (mas grata) tarefa de saudar o Miguel e dizer-lhe quanto ele é estimado e acarinhado no nosso blogue (sem esquecer o blogue dos Especialistas da BA 12, Guiné 1965/74, fundado e animado pelo nosso camarada e amigo Victor Barata, o primeiro elemento da FAP a entrar para a nossa Tabanca Grande).

Sempre o conheci, ao Miguel,  com um acentuado low profile. Não gosta de dar nas vistas, de se pôr em  bicos de pés, de falar de si... Não entra em polémicas. Incomoda-se quando nos desviamos do nosso objectivo comum é que pôr em letra de forma, bem arrumadinhas, no blogue, as nossas recordações do tempo da guerra colonial na Guiné.  É sempre muito crítico em relação aos textos que nos manda: Vejam lá se isto tem interesse, vejam lá se isto se enquadra no espírito do blogue... É, além um disso, um camarada que gosta de se voluntariar para tarefas do back office como, por exemplo, a organização dos nossos encontros anuais. E, como já vimos, tem um imenso sentido de humor... Adora andar de tabanca em tabanca a petiscar e sobretudo a dar dois dedos de conversa. Sempre som o seu asa, a Giselda... Em matéria de amigos, tem já uma lista de todo o tamanho... É impossível não gostar dele como Pessoa, com aquela cara e aquele corpinho de Ursinho de Peluche... Se o Caba Fati tivesse conhecido antes o Kurika da Mata se certeza que não teria disparado o seu Strela... para matar!

Mas assim consegui/conseguimos a pô-lo a escrever histórias que já dariam material para um livro. Registo mais de quatro dezenas no nosso blogue, ou seja, outros tantos postes, divididos pelos marcadores Miguel  Pessoa e Miguel Pessoa (Cor Pilav).  E se em ele tem talento para a escrita, que é uma coisa que só se quando  a gente decide... escrever para comunicar com os outros.

Miguel, grande tabanqueiro: parabéns por este dia, parabéns pela tua amizade e camaradagem, parabéns pela tua Giselda e demais família. Espero, amanhã, em Moura, dar-te, ao vivo, o abraço que hoje só  posso mandar-te por via digital...

Luís Graça

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Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de  9 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4160: Parabéns a você (4): No dia 9 de Abril de 2009, ao camarada Miguel Pessoa, Cor Pilav Ref (Editores)

Guiné 63/74 - P6134: Em busca de... (122): Procuro informações sobre meu pai: João José Viana Dias de Azevedo, do BCAÇ 2905 (João Azevedo)


1. O filho de um nosso Camarada, já falecido, de nome João Azevedo, enviou-nos um pedido de publicação do seguinte apelo, tentando obter algumas notícias sobre o seu falecido pai, João José Viana Dias de Azevedo, que foi Fur Mil a CCAÇ 2658:

APELO
Batalhão de Caçadores 2905

Boa tarde,

Chamo-me João Azevedo e sou filho de um antigo combatente na Guiné pertencente ao Bat Caç 2905, tendo estado na Guiné entre os anos de 1970 e 1972, sensivelmente.

Vi o vosso blogue, na internet, e verifiquei que o nome do meu pai não aparece nas listagens de antigos combatentes.

O nome do meu pai é igualmente João Azevedo (João José Viana Dias de Azevedo) e era natural de Viana do Castelo. Infelizmente já faleceu, em 2002, vítima de um cancro e se fosse vivo teria agora 62 anos.

Faleceu longe da família e por esse motivo, fiquei com poucas recordações fotográficas (antigas) dele.

Recordo-me de ver fotos do tempo da Guiné dele e dos seus camaradas, mas tudo isso está perdido, pelo motivo que referi.

Nesse sentido, gostaria de saber se me poderiam ajudar a encontrar camaradas de meu pai, que possuam fotos em que ele também apareça e me ofereçam cópias, em papel, ou em suporte informático, para eu poder ficar com algum registo fotográfico dele desse período marcante da sua vida.

Foto de meu pai: João José Viana Dias de Azevedo, que foi Fur Mil a CCAÇ 2658, com a idade de 20 anos, aproximadamente, correspondente ao período em que esteve na Guiné, para ajudar a identificá-lo.

Sei também que ele, até 2001, foi aos encontros anuais de antigos combatentes do seu batalhão, por isso, creio que algum camarada o poderá identificar e quem sabe ajudar-me neste meu pedido.

Fico a aguardar feedback de vossa parte

Atenciosamente,
João Azevedo

2. Numa busca pelo blogue, foi possível verificar que temos entre nós 4 elementos do BCAÇ 2905, que poderão dar alguma reposta, ou ajuda, ao João, começando pela Companhia a que ele pertenceu, já que o batalhão era composto por 4 companhias.

Os 4 Camaradas citados são:

  • O Rogério Ferreira, que foi Fur Mil Inf MA, da CCAÇ 2658/BCAÇ 2905;
  • O Júlio César, que foi 1º Cabo da CCAÇ 2659/BCAÇ 2905;
  • O Ângelo Alberto de Almeida Campos, que foi 1.º Cabo Escriturário da CCAÇ 2659/BCAÇ 2905;

  • O Paulino Pereira, que foi Fur Mil At Inf da CCAÇ 2660/BCAÇ 2905.

3. O João Azevedo agradece, desde já, que toda e qualquer informação e, ou, fotos sejam enviadas para o seu e-mail pessoal: jjrazevedo@hotmail.com
__________
Nota de M.R.:

Vd. último poste da série em:

25 de Março de 2010 > Guiné 63/74 - P6046: Em busca de... (121): Camaradas do ex-1.º Cabo Manuel Silva Ferreira, CCAÇ 1684/BCAÇ 1912, Guiné 1969/71 (Júlio César)