1. Mensagem de António José Pereira da Costa*, Coronel Art na reserva, na efectividade de serviço, que foi comandante da CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/74, com data de 29 de Julho de 2010:
Sobre o discurso do António Barreto
Camaradas
Reporto-me ainda aos Poste do Martins de Matos** sobre o discurso do António Barreto e começo com uma frase que questiona muita coisa, embora não pareça.
... “
Sim! Porque deve haver uma ligação qualquer nesta balhana toda! Qual, é que eu gostaria de saber; (...) e explicar porque é que a guerra começou lá e não aqui, ou começou lá sem começar aqui, ou o catano". (in. José Brás, Vindimas no Capim, Pág. 186).
Parece-me que, agora, é fundamental que se responda a duas questões: uma, equacionada pelo discurso do António Barreto e que se pode sintetizar do seguinte modo: o que se entende por ex-combatentes? Outra questão será: o que é que os ex-combatentes querem, devem querer ou será justo que o País lhes dê?
Reparem que não perguntei: o que é que o País pode dar aos ex-combatentes?
Parece-me, também, que se fala muito, por vezes, atingindo altos níveis de demagogia, mas como é habitual, cá com os portugueses, “ficamo-nos um bocado nas covas” e depois ladramos nos corredores. É um pouco o “Espírito Zé Povinho”... Mas isso é com os sociólogos e antropólogos.
Enquanto cidadãos está na altura de tomarmos posições.
Li várias vezes o discurso e achei-o mal conseguido, no mínimo. Dá-me a impressão de que o António Barrento foi adiando a feitura do discurso até à véspera e depois teve que o escrever na madrugada do dia 10, com ideias, mas a cair de sono. De um intelectual que tem vindo, de há uns anos a esta parte, a afirmar-se e a ganhar prestígio com as suas análises ao viver português, eu esperava muito melhor. Está confuso e nem sequer consegue fazer o que parece ser o seu objectivo: a apologia da valentia "em valor absoluto”, (matematicamente falando). Será que pretendia demonstrar que, em qualquer dos campos em confronto – “o bom”(?) ou o “mau”(?) - se pode ser valente? Será que uma decisão qualquer, mesmo resultante da indecisão, pode conduzir à valentia e a uma actuação válida de Homem e Cidadão?
Creio que pretendia louvar a coragem e valentia como qualidades dos homens que tiveram de decidir, num dado momento histórico e com os dados que tinham (ou julgavam ter) na mão, os tais homens que estavam “à esquina errada da História”. É um processo de decisão que tem de ser rápido, porque o tempo (parece que) urge em certos momentos históricos e não há tempo para pedir mais elementos para se poder decidir melhor. E se decidiram desta e não daquela maneira, foi porque a isso foram obrigados. A História dá muitos exemplos desta situação.
Isto para dizer que o discurso não será, nem a apologia de "todos" (independentemente das suas opções), o que até poderá ter o seu quê de justo, nem um louvor e reconhecimento incondicional aos ex-combatentes que muitos quiseram ver nele.
Já houve, no blog, a voz de uma Tertuliana – não sei se viúva se madrinha de guerra de um de nós – a quem o discurso não agradou. Terá razão, pois parece que estamos a estender demasiado o conceito. É que, se calhar, só serão ex-combatentes os que foram à África ou à Índia, em consequência da política do governo da época (desde finais dos anos 50 até 1974 do Séc. passado).
Sobre este tema – “
somos todos valentes” (e, se calhar, até somos) – remeto para o
Poste 4801 do Vítor Junqueira que equaciona o conceito de ex-combatente em sentido amplo ao afirmar que:
“
E, no entanto, quero abraçar:
Os compelidos, faltosos e refractários que, à força ou depois de pensarem melhor, lá acabaram a fazer a queda na máscara ao meu lado;
Aqueles que espalhados pelo Mundo, obtiveram junto dos consulados as suas Licenças Militares definitivas, podendo dar continuidade às respectivas actividades profissionais, e remeter para a Pátria, as paletes de francos, marcos, dólares etc., (...)
Abraço também os que por alergia ao teatro de operações, preferiram servir o país de outra forma, como por exemplo, integrarem a frota bacalhoeira (sabiam?);
E, quanto aos desertores, porque tiveram a coragem de arriscar a prisão ou uma vida inteira no exílio, obedecendo a respeitáveis e nobres ideais, ou partiram por amor à pele, atitude que não se revestindo de uma nobreza por aí além, é igualmente compreensível, envolvo-os também no meu amplexo, mas sem direito a aplauso”.
E continua dizendo que:
“
Por outro lado, não são meus camaradas:
Aqueles que vestindo a nossa farda, eram objectivamente combatentes do IN, a quem forneciam informações e até segredos de que tinham conhecimento, por força das funções que desempenhavam;
Os que tendo integrado as FA de Portugal e jurado fidelidade à sua bandeira, saltaram para o outro lado da paliçada, oferecendo-se para colaborar activamente em planos que visavam a liquidação física de ex-companheiros de armas, incluindo os amigos;
Todos quantos encapotadamente, tal qual laboriosas toupeiras, se colocaram ao serviço de ideologias, objectivos e interesses de potências estrangeiras e pela escrita, pela palavra ou pela acção conspiraram, visando o desprestígio e aniquilação do exército fascista, nós!
Esses não são meus camaradas.
Mas, notem bem, o facto de não serem meus (nossos) camaradas, não me dá o direito de os julgar sob qualquer prisma e ainda menos de os condenar, cabendo esse desígnio a outras instâncias, entre elas a História, que amparada pelo Tempo há-de apreciar de forma asséptica e distanciada os Homens e os factos do último quartel do séc. XX português.”
Chamo a atenção para este último parágrafo, que considero importantíssimo e que, em meu entender, se aproxima muito da ideia do discurso do António Barreto.
Por mim penso que, mesmo (todos) estes últimos que o Junqueira não considera seus camaradas, fizeram uma opção e combateram contra algo de que discordavam. Há quem diga que isso deve ser tido em boa conta. O desertor que se passa para o inimigo opta e o espião também. O articulista que, do exílio, por não o poder fazer no interior do seu país, escreve, criticando a acção do “seu” governo, ou desenvolve acções, a nível diplomático e político, junto das instâncias internacionais opta por algo em que acredita ou, pelo menos combate o que acha mal. A História está cheia de casos destes e, muitas vezes, os “traidores” acabam por ter razão e a sua acção ser reconhecida, pelos seus concidadãos. Às vezes é uma questão de momento histórico...
Remeto agora para um Poste meu, subordinado ao tema: “Quem somos nós?”.
Aí procurei caracterizar, na generalidade, quem éramos antes da partida, recorrendo a frases simples e correntes naquele tempo, mas que traduzem indiscutivelmente, “um certo espírito”. Quem nunca disse ou ouviu dizer:
– “
Se os outros foram e voltaram, eu também poderei ir e voltar”.
– “
E até pode ser que não seja bem assim. Pode ser que o sítio não seja mau e que o tempo passe depressa. No fundo, são só dois anos”.
– “
Tenho fé de que comigo vai ser diferente”.
Quem não se recorda de que à chegada ao TO, (...) uns revoltavam-se, outros aceitavam a sua sorte, como algo que não podia ser modificado. Decidiam resistir (embora não se soubesse bem o isso fosse) enquanto pudessem e como pudessem mas, (...) aquilo era outra terra e – porque não dizê-lo? – outro país.
Estava iniciada a prova que tínhamos de vencer, a nossa experiência traumática.
E se realmente não fosse assim como nos tinham dito? E se o país fosse só um, gerido às cegas e prepotentemente, por uma administração central e repartido por várias parcelas no mundo, cada uma diferente, com diferentes gentes, com diferentes anseios? Cada terra com uma História diferente e com um povo ansiando por uma separação política, que tinha como libertadora. Libertação de quê ou de quem e com que resultados, depois se veria... Não faltam precedentes na História Universal: EUA, Brasil e América Latina, para falarmos apenas dos casos tidos como arrumados pela História, já há muito tempo, na altura em que começávamos a nossa aventura.
Reparem na pertinência da questão levantada pelo José Brás. Se calhar a guerra deveria ter começado aqui e não lá... E porque é que não começou cá? E se tivesse começado cá? Na História não há “ses” e o caminho dos homens, marcado pelo tempo, não pára, com bons ou maus resultados.
Peço também que meditem sobre mais estas questões relativamente às populações que encontrávamos de um e do outro lado:
O que queriam? De que lado estavam e porquê? Se recusavam a protecção e a ligação ao inimigo, preferindo o nosso apoio (...), tendo nascido e sempre vivido ali, quais seriam as razões para tal?
E a experiência traumática continuava, pois o tempo escorria no calendário, com as operações (...) as tarefas monótonas de cada dia, as saudades e as notícias ou a falta delas (...) a vivência em espaços pequenos, quase concentracionários, e, acima de tudo, a falta de resposta a uma questão simples: que faço eu aqui?
Era melhor nem pormos esta questão, de tal modo ela era complicada.
Volto a perguntar:
Mas afinal quem éramos? Cidadãos-patriotas? Soldados-heróis? Acomodados à espera que o tempo passasse e jogando na lotaria do “
não há-de ser nada! E se for que seja menina para vir para a tropa”, como então se dizia?
Se regressarmos ao passado, havemos de encontrar muitos momentos em que, essencialmente, fomos “paus para toda a colher” e muito mais a que a vida impiedosamente nos obrigava. Sem podermos alterar (...) a situação (...) ficávamos, entregues ao fluir do tempo. Sabíamos que a sua contagem decrescente corria a nosso favor e, até lá, havíamos de nos aguentar...
E, já na nossa terra, continuámos a nossa experiência. Agora, na vivência de simples cidadãos, passámos a alegria breve do regresso, a inserção no mundo do trabalho e a constituição de família (...), sofremos a incapacidade de transmitir, mesmo aos que nos são muito próximos, o que tínhamos passado e (...), a bem da nossa saúde mental, decidimos esquecer o sucedido. (...) agora era necessário viver e desfrutar da luta diária da vida, no fundo a razão pela qual os Homens vivem.
A vida foi correndo (...). Ficámos velhos. E os velhos têm necessidade de recordar, contemplando a vida, para se sentirem gente.
Demos a nossa contribuição, modesta como é sempre é a dos homens do povo feitos soldados.
Dentro em breve ninguém nos recordará. E nem pelo facto de termos sido muitos seremos mais recordados. Sabemos que “os povos têm má memória” e que a cultura e o conhecimento de quem fomos ou somos, como povo, é, cada vez menos, uma prioridade na formação e educação dos nossos jovens, logo do nosso Povo.
E aqui pergunto: Para que serviu o que fizemos? E se tudo não passou de um equívoco? E se o que fizemos não serviu para nada?
Talvez tenha servido para pouco, quase nada ou mesmo nada. Se calhar não passou de um esforço inútil, ao qual fomos coagidos, sem hipótese de fuga. Custa, mas poderemos ter que o admitir, mais tarde ou mais cedo.
Ainda uma pergunta mais dura e inquietante: E se nunca tivéssemos combatido em defesa da Pátria? E se a Pátria fosse outra coisa que não aquilo?
Admito que, na Índia, perante a invasão de uma potência estrangeira, as coisas tenham sido diferentes, mas em África, combatíamos contra portugueses que o não queriam ser e que hoje celebram a sua Libertação e reivindicam para si o título de “Combatentes da Liberdade”. Quem se liberta, liberta-se de alguém ou de alguma coisa. Já se viram no papel de repressores? Sim, quem combate contra “Combatentes da Liberdade” ou é tirano ou é repressor. Ou não será?
Ainda por cima, os velhos não cortam as auto-estradas, não chamam fascista ao Presidente, não fazem gigantescas manifestações, não justificam tempo de antena nas televisões. Entre uma telenovela daquelas de enredo mais retorcido do que um saca-rolhas e um tempo de antena para “os velhotes da tropa” as TV nem hesitam... Estamos agora, cada vez mais, condenados ao esquecimento que o tempo sempre traz, mas, enquanto pudermos, temos de lutar contra isso. Será mais uma tarefa da nossa cidadania. Toca-nos procurar passar aos vindouros uma mensagem. E, se o futuro alguma vez perguntar, a nossa resposta será, com a maior clareza sim ou não, mas, desta vez, com a convicção que só a experiência dá.
Apesar de tudo, devemos sentir-nos orgulhosos. Passámos por uma prova que, esperemos, não se repetirá. E quem sabe? (...) Não temos hoje nada para provar a ninguém nem podemos aceitar que nos censurem por aquilo que fizemos ou não fizemos.
Mais ainda, volto a recordar que fizemos uma guerra pobre, que era pobre a nossa logística e os meios operacionais escassos, como se lembram. Faltava muitas vezes o essencial. (...) Os meios do inimigo (...) não cessaram de evoluir ao longo do conflito. As guerras ou se perdem ou se ganham. E nós perdemos. Perdemo-la, sim. E depois? Alguém esperava ganhá-la? Ninguém. Nem os que a aprovavam(?), naquele tempo, nem os que hoje, por preconceito, saudosismo ou desonestidade intelectual, afirmam que a poderíamos e deveríamos ter ganho.
Somos hoje Portugueses, com cerca de 60 anos (normalmente mais), com uma experiência traumática, de dois anos, vivida com cerca de 20, mas com reflexos (alguns bastante dramáticos) para toda a vida. Estamos ricos com uma mensagem a transmitir!
Foi isso que pretendi demonstrar.
Chegados a este ponto, creio que deveremos precisar o conceito de “ex-combatente”. Neste aspecto e correndo o risco de estabelecer um crivo demasiado estreito, direi que ex-combatentes são os que foram e estiveram na Índia ou em África. Todos os outros que o Junqueira referiu e alguns que poderiam ser acrescentados poderão ser considerados noutras categorias e ter outras designações diferentes: resistentes, anti-fascistas, pacifistas, coerentes com as suas convicções, defensores dos direitos humanos, etc. Não ponho em causa o respectivo mérito, a validade da sua actuação nem proponho epítetos. Mas não são ex-combatentes.
E o que é querem hoje os ex-combatentes? Resumindo, diria que querem um reconhecimento da sua acção. Querem um agradecimento dos seus compatriotas.
Esta questão deve ser muito bem equacionada e deverá ter como ponto de partida o facto de que o ex-combatente, ou lutou pela sua Pátria, ou foi forçado a combater por qualquer coisa que lhe disseram que era válido e que ele aceitou como tal. Quer num caso, quer noutro, passou, nos primeiros anos da sua vida adulta, por uma prova que não voltou nem voltará a repetir-se e que só ele sabe o que lhe custou. Se defendeu a sua Pátria é credor de uma forma de reconhecimento. Se se sacrificou por algo que hoje já não se sabe bem o que foi, dever-lhe-á ser reconhecido o sacrifício e outorgada uma recompensa.
Procuremos agora definir que recompensa, que retribuição será essa.
Antes do mais convém ter em conta que o reconhecimento dos ex-combatentes deverá ser sempre feito pelo povo a que pertencem. É suposto que tenham prestado um serviço ao País e um povo deve reconhecer os que o serviram ou aqueles que passaram por uma prova em seu nome. Será a forma mais justa de homenagem. Porém, só se pode homenagear o que se conhece e aprecia e, como sabemos, somos cada vez menos conhecidos e cada vez mais considerados como “os velhotes da tropa”. É cada vez maior o fosso entre “os novos” e nós “os velhos”.
O reconhecimento ou qualquer forma de homenagem resultará, em grande parte, da acção de quem lidera o País, o que não tem sido uma constante. A primeira geração de democratas dá a impressão de não ter sabido lidar connosco. A segunda, já distanciada, poderá ter ouvido falar vagamente de nós... A terceira geração...
Temos de começar a pensar que, se não formos nós a estimular e definir o que queremos em termos de reconhecimento público, ninguém no-lo dará. Não jogamos futebol, por isso nunca poderemos ter junto de nós uma grande multidão a ovacionar-nos. A bandeira nacional acena mais facilmente perante um penalty marcado com a cabeça do que perante um velho que sofreu aquilo que descrevi. Se o nosso povo, cada vez menos, sabe que existimos só se lhe for explicado quem fomos e o que fizemos poderá, alguma vez, testemunhar-nos o seu apreço. Está nas nossas mãos criar uma cerimónia anual(?) em local significativo, simples, à qual possamos estar presentes, com a necessária sobriedade, evitando aquele folclore dos dolmans camuflados sobre as calças de ganga ou as “condecorações” e distintivos diversos semeados pelas t-shirts. Teremos de admitir a possibilidade de “descentralizarmos” a evocação. Somos velhos e alguns, como sabem, começam a aparecer nos convívios transportados pelos filhos e até pelos netos. Sem diluirmos demasiado a nossa presença teremos de ter esta condicionante incontornável em conta. Depois da evocação/cerimónia (o nome tem de ser definido, adoptado e respeitado) poderemos conviver. É para isso que somos homens e cidadãos solidários, mas devemos evitar aproximar demasiado as duas coisas. Os “críticos” estarão sempre à espera de um deslize para as suas críticas...
Teremos de provocar e marcar que o nosso comprometimento e o reconhecimento que queremos é o dos outros cidadãos e não o deste ou daquele dirigente. O nosso comprometimento, como dizia o Vítor Junqueira, é com a Bandeira e, se calhar, é perante essa e só essa que deveremos desfilar. Alguns de nós, sabe Deus com que dificuldade... Era bom que fôssemos aplaudidos por quem assistisse ou fosse a passar, no momento. E se, todos juntos, cantássemos, berrássemos ou chorássemos (ao sentir de cada um) o Hino? Ou se um clarim nos desse os toques que nunca esqueceremos, no meio de um silêncio “de abrir ouvidos”? Esperemos que, se tal alguma vez acontecer, os nossos compatriotas automobilistas não se lembrem de pedir passagem a quem parou... Por mim discordo que se desfile perante homens...
Será bom que isto venha a acontecer, mas acontecerá durante quanto tempo? À medida que formos desaparecendo a nossa visibilidade vai dependendo, cada vez mais, da devoção e da dedicação de outros e, por fim, apenas da sensibilidade e boa educação de alguns, poucos, como é fácil de calcular.
E, mais ainda: será suficiente esta “consagração” anual? Será justo que se fique por aqui?
Sei que há camaradas que entendem que não, mas as opiniões dividem-se quando é necessário explicitar o que falta. Fica o desafio para que surjam propostas.
Foi-nos concedida uma pensão simbólica (dizem uns). Ridícula (dizem outros). Será que deveríamos receber dinheiro? Quanto? Todos por igual? Só os mais pobres? Qual o método de cálculo? Quais os seus fundamentos? A duração das comissões não deverá servir de base ao cálculo. Poderá parecer uma fasquia demasiado baixa, mas, por mim, creio que ir e ter estado era o justo. O risco variou ao longo da guerra, no mesmo lugar, e de lugar para lugar; a pressão do inimigo não foi constante em cada posição que ocupávamos e mesmo o sacrifício determinado pelas condições logísticas que lhe eram inerentes variou, ao longo do tempo. Vai haver, certamente, camaradas que acham mal que se peça dinheiro. Mas, tanto quanto julgo saber, esta é mais uma forma de recompensa e que tem a vantagem de ser mensurável e claramente poder ser avaliada a justiça com que for feita. Não creio que pedir dinheiro como recompensa de serviços prestados ao País seja pecado. Claro que há crise. E somos muitos. Por isso, mais vale desistir da ideia(?). Mas eu não me recordo de ter vivido em algum momento que não fosse de crise...
Levantei esta questão, sabendo que corro o risco de me atacarem e de me censurarem por falar de uma recompensa, em “vil metal”. Fica a ideia, que vale o que vale, como mais uma solução para o problema. Só quero lembrar, contudo, que estamos a falar de um grupo de cidadãos que passou por um sacrifício “em defesa da Pátria” ou em nome de valores que lhe apresentaram como um imperativo de cidadania.
Mas há outras soluções que me parecem mais correctas.
Acho que há momentos e situações da vida em que o apoio do Estado se deverá materializar. Estamos a falar de cidadãos com quase ou bastante mais de 60 anos. Lembro, só por exemplo, os nossos camaradas que, após o regresso se incapacitaram para o trabalho e foram reformados por invalidez. Não será possível adicionar à sua reforma os 4 anos (o dobro do tempo legal de uma comissão) à reforma que tenha que receber. Não é a mesma coisa ser-se reformado, por invalidez, com 16 ou 20 anos de trabalho! Embora haja certas taxas e emolumentos que os reformados e idosos (>65 anos) não pagam ou pagam com desconto, porque não estabelecer um conjunto de bens e serviços de carácter social que os ex-combatentes não pagassem. Terá de ser algo de palpável, claro e imediato. E, acima de tudo, que não se mascare com burocracia e lentidão de procedimentos a concessão de algo que se prometa. As regalias – chamem-lhe o que quiserem – ou se dão ou não se dão. Talvez um cartão de ex-combatente, emitido com rapidez e eficácia por entidade responsável. Depois, vem o mais difícil: encontrar as vantagens que o cartão teria.
Vai longo o paleio e, por isso vou ficar-me por aqui. Procurei definir o conceito de ex-combatente e propor formas de homenagem/reconhecimento para os que, por dever de cidadania ou de serviço à Pátria são credores de algo.
Um Alfa Bravo do
António Costa
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 18 de Junho de 2010 >
Guiné 63/74 - P6614: A minha guerra a petróleo (ex-Cap Art Pereira da Costa) (3): Gente de Cacoca e outros
(**) Vd. postes de:
10 de Junho de 2010 >
Guiné 63/74 - P6574: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (1) (Inácio Silva / Joaquim Mexia Alves)
12 de Junho de 2010 >
Guiné 63/74 - P6582: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (2) (Amaro Samúdio / Felismina Costa)
13 de Junho de 2010 >
Guiné 63/74 - P6591: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (3): O dia do ex-combatente devia ser comemorado noutra data (Ana Duarte)
20 de Junho de 2010 >
Guiné 63/74 - P6618: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (4): No separar é que está o ganhar (António Martins de Matos)
9 de Julho de 2010 >
Guiné 63/74 - P6705: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (5): Não há nada a fazer! (António Martins de Matos)
13 de Julho de 2010 >
Guiné 63/74 - P6725: O discurso de António Barreto no dia 10 de Junho de 2010 (6): É tempo de dizer BASTA! (António Martins de Matos)
Vd. último poste da série de 24 de Julho de 2010 >
Guiné 63/74 - P6781: Controvérsias (98): Quem não se sente... não é filho de boa gente (Carlos Nery)