sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Guiné 63/74 - P7690: Estórias do Juvenal Amado (35): Rodéro, o corneteiro com falta de embocadura

1. Mensagem de Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1972/74), com data de 26 de Janeiro de 2011:

Caros Luís, Carlos, Magalhães, Briote e restante atabancados
Esta é mais uma pequena estória mas que também tem importância, pois com o povo diz, também as pedras pequenas ajudam a fazer o muro.

Juvenal Amado


Estórias do Juvenal (35)

O RODÉRO CORNETEIRO E A FALTA DE EMBOCADURA

O Rodéro era um daqueles casos, que só tinha sido apurado para o serviço militar porque naquele tempo, só escapavam poucos e muito aleijados. Alentejano extremamente magríssimo com cara, que fosse a situação que fosse, era sempre de outra dimensão, de quem recorria ao barril do tintol constantemente, mesmo que fosse mais martelado que outra coisa. De vinho só tinha o nome e vagas parecenças, o líquido que vinha nos bidões de 200 litros.

Figura simpática, trabalhava na messe dos oficiais e sargentos, respondia sempre com um sorriso, dizendo que estava tudo em forma, fosse o que fosse que se lhe perguntasse, assim entre um bocadinho de pão e uma tala quina de chouriço, que lhe tinham enviado da terra.

Com uma navalhinha cortava as rodelinhas do dito e pequenos pedaços de pão, com precisão quase cirúrgica. Saboreava as duas coisas com uma reverência como se estivesse na missa. De uma forma ancestral honrava o alimento, por vezes tão difícil de conseguir do povo alentejano.

A sua especialidade era a de corneteiro, mas tendo em vista a sua fraca figura, cedo deixou de exercer. Com um peito daqueles, os sons eram pois os mais disformes e dificilmente se descortinava o toque do rancho, do de reunir, ou mesmo para a Bandeira.

Um dia já para o fim da comissão, estando o 2.º Comandante no Comando do Batalhão, foi necessário recorrer ao Rodéro como corneteiro, pois os outros estavam impedidos, não sei porque razão.

Foi de manhã no içar da Bandeira que a coisa se deu.

Estava uma Secção formada junto ao mastro, às ordem de sentido e apresentar armas, vai o Rodéro dar inicio ao respectivo toque.

Bem os sons que saíram do cornetim eram mais parecido com um saco cheios de gatos que se pretende abandonar num balseiro.
O soldado encarregue de hastear a Bandeira não sabia o que fazer, até que olhou para Oficial de Dia que ele lhe fez sinal para avançar. Não se percebeu onde começou e acabou o toque, pouco faltou para a guarda de honra se desmanchasse a rir.

Findo o acto, lá vem o Rodéro com aquele ar inocente, pensando para os seus botões, que eram todos uns maldizentes e que até nem tinha tocado nada mal.

- Estão-se a queixar! Eu queria ver-vos era a vocês!

Quem não tinha assistido mas ouvido, juntou-se aos que tinham presenciado a vivo e a cores.
Pela parada fora toda a gente arreganhava os dentes.

O nosso 2.º Comandante que tinha presenciado tudo, quando o Rodéro ia a passar por ele, perguntou-lhe com um ar meio divertido:

- Óh Rodéro o que é que foi aquilo? - Responde o nosso afamado corneteiro:

– O quê que quer que lhe faça mê Major? Foi o que se pode arranjar.

Foi uma gargalhada geral, e o acontecimento ficou para a história, que é bom de ver que nunca mais se repetiu.

A nós disse-nos com o ar mais natural do mundo, que tinha sido falta de embocadura.
Passou ser palavra de ordem quando íamos beber uma cerveja, dizíamos que era para tratar da embocadura.

Há tempos tive notícias dele pelo Caramba. Estava bem na sua simplicidade de sempre.
Como eu gostaria de lhe dar um abraço e ouvir da boca dele, que aquele toque tinha saído assim por falta da embocadura.

Um abraço
Juvenal Amado
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 18 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7634: Estórias do Juvenal Amado (34): Só o aprendiz sabe o que custa aprender

Guiné 63/74 - P7689: Notas de leitura (194): Ordem Para Matar, de Queba Sambu (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos* (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 26 de Janeiro de 2011:

Queridos amigos,
Ou o Tenente-Coronel Queba Sambu diz a clara certidão da verdade ou é um dos maiores pantomineiros da história. Temos aqui, tintim por tintim, nomes, datas e embustes, prisões, homicídios, cenas que imitam a CIA e o KGB, ou então é puro delírio, trata-se de terrorismo de Estado, ou anda muita gente a assobiar para o lado. Não se pode ficar indiferente a este relato amplamente documentado se bem que o livro, por falta de revisão, chega a ser caótico no português e nas nomenclaturas.
Se algum dos confrades conhecer o contraditório destas acusações e denúncias, por favor, ajude-nos.

Um abraço do
Mário


Episódios de terror e despotismo nos tempos de Luís Cabral e Nino Vieira

Beja Santos

“Ordem para Matar, dos fuzilamentos ao caso das bombas da Embaixada da Guiné”, escrito pelo Tenente-Coronel Queba Sambu (Edições Referendo, 1989) é uma leitura indispensável para quem quiser entender as práticas de sanha demencial do poder despótico que se exerceu ao mais alto nível, depois da independência. O seu autor foi um chefe de serviços secretos, especialista em contra-informação. Quadro do PAIGC desde os anos de luta armada, mereceu a confiança dos dois primeiros presidentes da República e acompanhou de perto actos de puro terror e pôde presenciar as manifestações mais repugnantes do poder totalitário destes dois dirigentes. O que se estranha é não ver esta obra discutida ou contraditada, parece haver vontade de a tapar com um manto diáfano da incomodidade, como se não fosse politicamente correcto dissecar os desmandos e a bestialidade do poder autocrático, tal como ele foi exercido por homens que se diziam seguidores do pensamento de Amílcar Cabral. É tal a riqueza de informação deste libelo de Queba Sambu, que o iremos repartir para ter acesso a informação raramente versada.

O autor inicia o seu trabalho com um “breve historial da luta nacional de libertação” inserindo o seu próprio protagonismo. Passa-se adiante tudo quanto ele escreve sobre o fenómeno da descolonização e está seguramente documentado e é hoje incontestável. Educado numa missão católica em Catió, Sambu estagiou na União Soviética e daqui voltou para a região Sul, ficando às ordens do comando de Gan-Tchombê, na região de Cubisseco, em 1970. Relata pormenorizadamente o apoio que recebeu dos “padres italianos”. De Catió fugiu para as zonas libertadas. Por determinação do comando dos serviços de segurança do PAIGC foi transferido para colaborador do comandante de segurança do sector de Tombali, em 1971. Em 1973 voltou à URSS para estagiar e mais tarde foi nomeado comandante do comando de Gan-Tchombê. Descreve a Operação Mar Verde, o assassinato de Amílcar Cabral e a ofensiva de 1973. O episódio mais interessante deste depoimento tem a ver com a retaliação que o PAIGC perpetrou com um plano para assassinar Spínola em Bubaque, em retaliação pela morte de Amílcar Cabral. Ele refere que foram destacados Agostinho Pereira e Marcos da Silva para preparar o plano do atentado, a operação não se consumou por nunca terem chegado botes de desembarque equipados com motores potentes.

A seguir ao 25 de Abril, descreve as conversações entre o PAIGC e as autoridades portuguesas e depois detalha as suas novas missões no aparelho de Estado. O PAIGC, mal chegado a Bissau, pôs em movimento uma nova máquina de segurança, prevendo um inimigo interno, que convinha vigiar e reprimir, montou uma máquina de investigações secretas susceptível de policiar todos os opositores incluindo a FLING. Observa o agravamento das condições de vida da população, os protestos mal dissimulados contra a polémica questão da unidade Guiné/Cabo Verde e as críticas feitas a Luís Cabral sobre a situação ruinosa para onde descambava o país. Para Queba Sambu, a equipa governativa deu prioridade aos burocratas e desagregou-se a confiança no PAIGC. Necessitando, nessa conjuntura, de exibir um culpado, a culpa partidária implantou um regime de terror, começando pelos ex-comandos africanos.

Para Queba Sambu, desde 1974 que se preparava um pretexto para fuzilar os ex-comandos, a começar pelos mais influentes. Estes começaram a fugir para o Senegal e daqui foram recambiados e entregues às forças de repressão. A dar fé aos argumentos utilizados, iam-se igualmente desenvolvendo antagonismos de forças nacionalistas, interiores e exteriores, bem implantadas nas estruturas da função pública. Apareceram organizações de oposição ao PAIGC como a OANG – Organização Anticolonialista da Guiné-Bissau que se opunha à unidade federalista Guiné/Cabo Verde e que pretendia erradicar o chamado “neocolonialismo cabo-verdiano da Guiné”. A segurança actuou, prendeu, torturou e fuzilou. Queba Sambu descreve como se processou a perseguição aos ex-comandos, como foram presos os dissidentes do PAIGC e como foram organizados espectáculos públicos de fuzilamentos.

No início de 1977, por se ter recusado a cumprir ordens do secretário-geral da Segurança, Sambu foi designado para a Escola da Polícia Nacional e Ordem Pública. Volta a fazer curso na União Soviética e é num contexto de uma progressiva degradação económica, em 1980, que se monta o cenário que leva ao golpe de 14 de Novembro, traduzido no afastamento e até prisão dos dirigentes cabo-verdianos e à criação de um conselho da revolução tendo Nino à frente, numa altura em que Luís Cabral estava detido na fortaleza da Amura.

O golpe de Estado, trouxe expectativas a vários movimentos contestatários, incluindo a FLING. É esse um dos aspectos mais válidos da descrição feita pelo Sambu, fica-se com um quadro de actuação de duas correntes da FLING e, segundo ele, ascendeu ao poder, ou tornou-se influente perto dele a presença de inimigos do PAIGC ainda agarrados a concepções colonialistas. São acusações vagas e genéricas que valem o que valem.

E chegámos assim a um novo contexto de instabilidade que se expressou por uma série de golpes de Estado (ou as suas simulações) após o 14 de Novembro. Depois de 1981, Sambu passou a chefiar os serviços da contra-informação das Forças Armadas. Sambu não queria aceitar este cargo e escreve: “Recordo as especulações urdidas aquando da chegada à Guiné do grupo de oficiais do estágio na União Soviética e do qual eu fazia parte. Dizia-se que a nossa estadia naquele país tivera por objectivo a aprendizagem de métodos de interrogatório, tortura a presos políticos e formas de homicídio clandestino. Era enorme a aversão geral pelos serviços de contra-inteligência civil e militar e os seus elementos chegaram a sofrer fortes pressões, da parte de familiares e amigos, no sentido de abandonarem as funções”.

É época dos golpes e contragolpes, das intrigas permanentes e de um indescritível estado de suspeição ao mais alto nível. Datará dessa época uma movimentação tribalista para perseguir os quadros balantas do PAIGC, a começar pelo mais popular e influente, Paulo Correia, então Ministro da Defesa. Mal tomou posse, Sambu foi envolvido em inquéritos tendo por motivo o comportamento de elementos ligados à hierarquia do comando militar. O que se apurou foi existir um grave mal-estar social e militar visto alguns membros do Estado-Maior e todos os comandos das unidades do interior estarem abusivamente a fazer requisições excessivas de géneros alimentícios, incapazes de ver as terríveis condições de vida em que se encontravam os seus subordinados. Diz ele que havia requisições das chefias que chegavam a atingir duas toneladas de arroz, 100 litros de óleo e 300 quilos de açúcar enquanto os subordinados quase nada tinham para comer. Este relatório foi transmitido a Nino que classificou a situação de "imoralidade colectiva". Nino exigiu medidas severas a quem voltasse a praticar tais tipos de delitos ou actos de corrupção. Mas o descontentamento das Forças Armadas prosseguiu, também por faltas de pré e soldo dos militares. É neste ambiente de descontentamento que foram montados vários esquemas de intentonas e de golpes sediciosos.

(continua)
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 27 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7682: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (17): Algumas conversas para melhor perceber o PAIGC

Vd. último poste da série de 23 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7659: Notas de leitura (193): Entre o Paraíso e o Inferno, de Abel Jesus Carreira Rei (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P7688: Memória dos lugares (127): A despedida de Bedanda, CCAÇ 6 (Dezembro de 1971/Março de 1972) (Mário Bravo, médico)



Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971/72>  Um das imagens de marca do Alf Mil Médico  Mário Bravo, a de ... entusiástico jogador de futebol... Ei-lo aqui em mais uma "jogada para o golo"... [ O Vasco Santos, ex-1º Cabo Cripto, CCAÇ 6, 1972/73, já tentou identificar, em comentário a este poste,  os vértices destes triângulo: Alf Mil Bravo, Alf Mil António Teixeira e Fur Mil Luz, das Informações - Pel Rec Inf ?]

Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971/72>  O Alf Mil Médico  Mário Bravo  junto a uma das valas do perímetro defensivo do aquartelamento.



Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971/72>  O Mário Bravo diz que esta foto terá sido tirada no Natal de 1972...  É mais provável ter sido no Natal de 1971, já que ele chegou a Bedanda nos princípios de Dezembro de 1971... e partiu para o HM 241, em Bissau, em Março de 1972, tendo ali cumprido o resto da comissão... A menos que tenha decidido passar o Natal de 1972 com os seus camariogos da CCAÇ 6... Dos alferes, em primeiro plano, um será o Borges (à esquerda) e o outro o Figueiras (à direita). [Comentário do Vasco Santos: da esquerda para a direita, Alf Borges, Cap Ayala, Alf Siva (artilheiro) e Alf Figueiras (ou Figueiral???)].




Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971/72>  O Alf Mil Médico  Mário Bravo, a meio, de pé,  na segunda metade da foto, do lado esquerdo, posando para a posteridade, no meio dos quadros metropolitanos da CCAÇ 6, na hora da despedida... Pelas suas contas, esta cena terá ocorrido em Março de 1972... O primeir militar, na primeira fila, do lado esquerdo, parce-me ser o Cap Cav Carlos Ayala Botto, de pingalim na mão,  futuro ajudante de campo do Gen Spínola, e também membro do nosso blogue.

[Comentário do Vasco Santos: Cap Ayala, Leão (Mecânico) e outro não identificado;
 de pé (1ª. fila, da esquerda para a direita):  Orlando (escriturário),  Nelinho (enfermeiro), Sérgio (transmissões) e  Dr. Bravo... Depois: Gaia (não sei o nome, estava na cantina praças, na vaguemestria), Carlos Azevedo, Dias e Silva (ou Pinto, enfermeiro)...Lembro-me de toda a restante malta da foto mas, de nomes, nem por isso].


1. Mais fotos enviadas pelo  nosso camarada Mário Bravo (ou Mário Silva Bravo), ex-Alf Mil Med, CCAÇ 6, Bedanda (1971/72), hoje cirurgião, ortopedista, reformado,  vivendo no Porto.  Em princípio, são as últimas fotos que ele têm de Bedanda.

Depois de sair de Bedanda, em Março de 1972, o Mário Bravo foi colocado no Serviço de Estomatologia do HM 241, em Bissau... Aí conheceu diversos colegas de profissão, milicianos, de que falaremos em próxima oportunidade... (LG).


Fotos: © Mário Bravo (2011) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados
 
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Nota de L.G.:

Guiné 63/74 - P7687: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (51): Na Kontra Ka Kontra: 15.º episódio




1. Décimo quinto episódio da estória Na Kontra Ka Kontra, de Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70), enviado em mensagem do dia 27 de Janeiro de 2011:


NA KONTRA
KA KONTRA


15º EPISÓDIO

Já noite, depois do jantar, o Alferes Magalhães passa pelo “bentem” apenas para dar as boas-noites ao pessoal, e vai deitar-se. Desde que tinha chegado à tabanca ainda não tinha ouvido uma sinfonia até ao fim. Desta vez, com tempo, e com os seus problemas quase todos resolvidos, ia tentar ouvir a 5ª de Mahler completa.

Conseguiu. Por isso dormiu até mais tarde. Acordou com o barulho do pessoal a falar alto. Saiu da morança e passou pelo “legionário” dizendo-lhe para lhe aprontar o café enquanto ainda ia passar pelo forno. Queria ver se não havia fissuras, pois não sabia como se comportava aquele barro ao secar. Verificou que estava tudo perfeito e foi tomar o café.

Definitivamente iria haver pão, mas não como imaginara…

A meio da manhã, com todos os trabalhos a decorrer, inclusive a apanha de lenha para depois queimar no forno, eis que se começa a ouvir o ruído de viaturas. Conforme as instruções recebidas todo o pessoal se aprontou, vestindo a camisa os que estavam em tronco nu, o que era habitual quando estavam a trabalhar. O Alferes sabendo que, quer o Comandante Chefe de Bissau, quer o Coronel de Bafata não iam aparecer ali num Unimog, aos saltos, não se preocupou muito com quem lá vinha. Era com certeza o pessoal da Companhia de Galomaro.

Passados uns minutos chega uma coluna de três Unimogs. Houve os cumprimentos habituais, como se o pessoal já não se visse há séculos. Além do sempre esperado correio, traziam abastecimentos de toda a ordem e, naturalmente, pão! Logo o Alferes anteviu a possibilidade de não forçar com fogueiras a secagem do forno, para este não estalar. Havia pão para dois ou três dias.

Os que chegaram foram dizendo que traziam duas arcas “térmicas”, uma com gelo e a outra com cervejas frescas. Seria boa ideia habituar o palato a cervejas frescas se depois teriam que as beber a trinta e tal graus? Sempre se tiraria a barriga de misérias.

Foi sol de pouca dura. Um qualquer “inteligente” em Galomaro, em vez de por o gelo numa arca e as cervejas noutra, pôs tudo misturado. O que chegou foram apenas cervejas frescas e água…

Uma coluna, trazendo correio e abastecimentos, era sempre bem vinda mesmo sem mensagem prévia. Esta muito mais, pois trazia um grupo de sete soldados e um Furriel para reforçar a guarnição de Madina Xaquili. Pena era que não trouxesse qualquer reforço de armas pesadas ou mais granadas para o morteiro. Enfim, sempre era alguma coisa.

O João arranjou mais umas moranças para os oito homens acabados de chegar e, depois das despedidas do pessoal que retornava a Galomaro, vão todos almoçar.

Logo à mesa, o Alferes Magalhães pensou em entregar ao Furriel acabado de chegar, parte das responsabilidades que tinha sobre os ombros. Uma razão sobressaía: ter mais tempo para se dedicar à sua bajuda.

Nesta primeira refeição, a conversa repartiu-se por um lado entre os dois graduados como seria natural, por outro entre todo o resto do pessoal partilhando as suas experiências. O Alferes põe o Furriel a par de toda a situação e pede-lhe para executar as funções de orientação dos trabalhos que ele próprio vinha exercendo.

O pessoal foi dormir a sesta e os dois graduados continuam à mesa a bebericar uma boa bagaceira acabada de chegar. A mesa, sob um alpendre de folhas de palmeira e implantada numa pequena elevação, proporcionava quase sempre uma aragem refrescante. O Alferes conta ao camarada as suas intenções sobre a Asmau, única bajuda casadoira da tabanca. Conta que as coisas já estão adiantadas, pelo menos para ele, e que talvez no dia seguinte já fosse “negociar” com o Chefe da Tabanca, Adramane, pai da Asmau. O Furriel, acabado de chegar e só conhecendo o Alferes agora, não expressa qualquer opinião sobre o assunto. Apenas lhe deseja felicidades.

Depois de uma pequena sesta o Alferes faz o que o João Sanhá lhe tinha feito no dia da sua chegada: Vai mostrar os recantos da tabanca ao Furriel. Fala-lhe nas sentinelas metidas na mata para os lados de Padada, mostra-lhe o fornilho detrás do poilão, os abrigos e vão à fonte. Pelo caminho o Alferes vai dizendo:

- Nosso Furriel, foi a época seca, passaram uns seis meses sem chover e poucos lugares haverá na Guiné que tenham nesta altura uma nascente de água a correr e com a qualidade que já vai apreciar.

Estavam a chegar ao fim da zona desmatada e iam entrar na zona ensombrada da mata onde se situa a fonte, quando o Furriel pára olhando fixamente para o grupo de mulheres que estavam a lavar roupa. Fica estático. Mudo por instantes, talvez a pensar no que iria dizer ao Alferes.


Fim deste episódio
Até ao próximo camaradas.
(Fernando Gouveia)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 27 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7680: A guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (50): Na Kontra Ka Kontra: 14.º episódio

Guiné 63/74 - P7686: Notas fotocaligráficas de uma viagem de férias à Guiné-Bissau (João Graça, jovem médico e músico) (2): 6/12/2009, domingo, 1ª consulta, um baptizo muçulmano, um casório católico, uma visita a uma fábrica de caju... 7/12/2009, 2ª feira: 1º dia de consultas. 42 doentes à porta do C.S. Materno-Infantil de Iemberém


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Iemberém > Centro de Saúde Materno-Infantil > 7 de Dezembro de 2009 > O 1º dia de consulta do médico João Graça... 42 doentes à porta... (Foto tirada às 12h55)


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Iemberém > 6 de Dezembro de 2009 > Domingo, festa de baptizado muçulmano (10h25)... A eterna divisão do trabalho, homens de um lado, mulheres do outro...






Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Iemberém > 6 de Dezembro de 2009 > Festa de baptizado muçulmano (10h25)...  Preparação da comida... 



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Iemberém > 6 de Dezembro de 2009 > Festa de baptizado muçulmano (10h26)... Rapando a cabeça da criança, com uma gilete...




Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Iemberém > 6 de Dezembro de 2009 > Festa de baptizado muçulmano (10h34)...  Uma mãe (in)expressiva... uma "mater dolorosa" (?)...


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Iemberém > 6 de Dezembro de 2009 > Festa de baptizado muçulmano (10h27)... Pose majestática de um homem grande...



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Iemberém > 6 de Dezembro de 2009 > Festa de baptizado muçulmano (10h52)... Actuação de um grupo de músicos da Guiné-Conacri, com instrumentos tradicionais...


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Iemberém > 6 de Dezembro de 2009 > Festa de baptizado muçulmano (11h31)... Actuação de um grupo de músicos da Guiné-Conacri, reforçados com um novo elemento, o portuga João Graça...


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > A estrada Iemberém-São Francisco > 6 de Dezembro de 2009 > Foto tirada às 12h14, a caminho da festa de casamento em S. Francisco... Esta imagem, para qualquer ex-combatente do Cantanhez, evoca seguramente um passado de guerra, o terror das minas e das emboscadas quase à queima-roupa...





Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > São Francisco > 6 de Dezembro de 2009 > Festa de casamento (13h47)... Posando junto ao bolo de casamento, feito (e enfeitado) à moda europeia... Reconheço, à direita, o incansável Domingos Fonseca, o "arqueólogo" de Guileje, quadro técnico da AD e membro da nossa Tabanca Grande



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > São Francisco > 6 de Dezembro de 2009 > Festa de casamento (16h48)... As cozinheiras em acção... aqui como em toda a parte, que o dia era de festa rija...



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > São Francisco > 6 de Dezembro de 2009 > Festa de casamento (16h41)... Reconheço, à esquerda, o motorista da AD, o Antero, que andou comigo em Março de 2008 e agora com o João, em Dezembro de 2009.



Fotos: © João Graça (2009) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados



1. Continuação da publicação dos  apontamentos (mais estenográficos do que caligráficos...), do diário de viagem do João Graça, acompanhados de algumas das centenas fotos que fez, nas duas semanas que lá passou (*)... Nos  cinco primeiros dias (de 6 a 10 de Dezembro de 2009) vamos encontrá-lo, como médico, voluntário,  no Centro de Saúde Materno-Infantil de Iemberém. Nalguns casos, por serem de todo ilegíveis ou fazerem referências muito pessoais a terceiros, optei por assinalar com parênteses rectos e reticências [...] essas partes do diário... Noutros casos, acrescentei, também dentro de parênteses rectos [   ], algumas notas da minha lavra,  decorrentes das nossas conversas sobre esta viagem (memorável, para ele)...


O João Graça, que celebrou no passado dia 21, as suas vinte e sete primaveras, pede-me para aproveitar o ensejo para  agradecer todas as manifestações de simpatia, carinho e amizade, de que foi alvo,  expressas publicamente no nosso blogue, por parte de mais de três dezenas de camaradas, amigos e camarigos (**)...


Ele ficou muito sensibilizado e um dia promete (re)conhecê-los, a todos,  ao vivo, ao Jero, Manuel Maia, Torcato, Artur Soares,  Mário Migueis, António Graça de Abreu,  Joaquim Mexia Alves, Filomena, Jorge Cabral, Eduardo Campos , César Dias, A. Santos, Manuel Marinho, Fernando Almeida, António Marques, Paulo Santiago, Manuel Amaro, J. Belo, José Câmara, Juvenal Amado, Adriano Moreira, José Corceiro, Jorge Narciso, Vasco da Gama, Manuel Reis, Jorge Picado, Felismina, António Tavares, José Martins, Luís Borrega, Hélder Valério e Zé Teixeira…



6/12/2009, domingo



Dia 2 – Iemberém e S. Francisco


17. J…, [investigadora portuguesa], amiga do C… [vem à] consulta com menina de 5 anos . Dor de dentes e barriga inchada. Abcesso dentário. [Medicação: ] ciprofloxacina e ibuprofeno. Volta na terça.


18. [A J… está a fazer] doutoramento em conflitos nas áreas de reserva ecológica. Comunidade ‘versus’ ecologia. Deu-me 10 000 francos (mais ou menos 15 €), uma “fortuna”,  para amanhã decidir evacuação de uma menina [, com suspeita de HIV/Sida] , com a enfermeira Vera, [brasileira] (Centro de Saúde Materno Infantil de Iembérem)


19. Baptizado muçulmano. Sacrifício de um carneiro para escolher nome de menino.


20. Abdulai apresentou-me a sua mulher [, bonita…]


21. Casamento com o bispo [de Bafatá] em S. Francisco. (…) Tínhamos combinado [, com o Domingos Fonseca e a esposa,] sair às 8h30, eram 12h00 ainda estávamos cá [, em Iemberém]. Dancei e pus tudo a rir.


22. Visita com os italianos [, cooperantes, reformados,] de Veneto [, região nordeste de Itália], a uma fábrica de caju. “Noi portiamo il know how” [, Nós trazemos o conhecimento      tecnológico ].


23. Nós, convidados de honra, a comer à mesa. Só homens.


7/12/2009, segunda-feira


Dia 3 - Iemberém


24. 1º dia de consultas. 42 doentes.

[Continua]

[ Revisão / fixação de texto / título / selecção, edição e legendagem das fotos: L.G.]


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Notas de L.G.:


(*) 16 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7622: Notas fotocaligráficas de uma viagem de férias à Guiné-Bissau (João Graça, jovem médico e músico) (1): 5/12/2009, sábado, viagem de carro, de Bissau (13h30) a Iemberém (21h50)
 
(**) Vd. poste de 21 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7647: Parabéns a você (204): João Graça, médico, músico e amigo da Guiné-Bissau (Tertúlia / Editores)
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quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Guiné 63/74 - P7685: Tabanca Grande (262): António Teixeira, ex-Alf Mil, CCAÇ 3459/BCAÇ 3863 (Teixeira Pinto) e CCAÇ 6 (Bedanda), 1972/73

1. Mensagem de António Henrique Teixeira* (ex-Alf Mil da CCAÇ 3459/BCAÇ 3863 - Teixeira Pinto, e CCAÇ 6 - Bedanda; 1971/73), com data de 25 de Janeiro de 2011:

Caríssimo amigo:
Lamentavelmente, bem tentei procurar (que sei que tenho algures), os dados referentes ao Batalhão de Caçadores que me levou para a Guiné, mas não o consegui.
Apenas sei que depois de ter estado na Amadora, na altura Regimento de Infantaria 1, onde formei o Batalhão, fui para a Guiné em 1971, creio eu que terá sido no mês de Setembro.

Esse Batalhão foi para Teixeira Pinto, cabendo-me a mim a sorte de ir para um destacamento que ficava em Calequisse.(Isto, claro, depois de um pequeno estágio com o Batalhão em Bolama).

Um pouco mais tarde, não muito, fui chamado para comandar uma Companhia de Instrução de Milícias no Pelundo, onde estive cerca de 2 meses. Cheguei ainda a passar por Bachile, mas apenas uma semana ou pouco mais.

Terminada a instrução no Pelundo, e mal chego de férias da metrópole, fui chamado para Bolama de novo, para um curso intensivo destinado a formar oficiais e sargentos para as Companhias de Caçadores.

Sou então colocado em Bedanda, na CCaç 6, onde fiquei até ao final da comissão.
Bem, até ao final da comissão no papel, porque ainda passei mais de um mês na boa vida em Bissau, onde me limitava de vez em quando fazer de oficial de dia nos Adidos, e a comer as belas ostras pelas esplanadas.

Sei que regressei da Guiné em Setembro de 1973, tendo vindo de avião. Desde os meus tempos de Pelundo, nunca mais me juntei ao meu Batalhão de origem, tendo apenas algumas notícias que me iam chegando de vez em quando.

Realmente, para mim a Guiné foi basicamente Bedanda, onde fiz grandes, enormes amizades, algumas delas ainda em contacto permanente nestes dias que correm.


Mas vamos então à minha identificação:

Alferes Miliciano António Henrique Teixeira
Nascido a 21 de Junho de 1948
Residente em Espinho
Actualmente reformado do Ensino Secundário.
Licenciado em Educação Física e Desporto, fui professor desde Dezembro de 1973 até Agosto de 2006.

email: ahoct@netcabo.pt

Como foi pedido, junto algumas fotos tipo passe quer desse tempo, quer actuais. Agora compete a vocês escolherem.
Tenho também bastantes fotos, muitas delas que vou ter de digitalizar, e que posteriormente poderei colocar no blog.

Uma delas, gostaria de enviar já, porque é uma foto que eu gosto particularmente.
Trata-se do nosso Cabo Dias, homem de Braga, pessoa extraordinária, e que era quem tratava de nós na messe de oficiais.


Esta foto que lhe tirei quando escrevia para a família, eu gosto de lhe dar o título de "saudade".


Gostaria também de informar que em Bedanda, herdei do furriel vagomestre, por troca de alguns escudos, um estúdio de fotográfico, que fez a delícia de muita gente e muito me ajudou a passar o tempo. E que também foi responsável pela minha paixão pela fotografia.

Resta-me apenas acrescentar que já me tornei também "amigo" da "Tabanca Grande de Luís Graça" no Facebook, e de vez em quando lá irei "postar" qualquer coisa.

E para finalizar é com grande alegria que o digo, que depois do anterior mail que enviei para aí, já recebi mensagens do Dr. Mário Bravo, do José Vermelho e do Vasco Santos. O grupo está a engrossar e em todos a mesma ideia: vamos juntar este pessoal de Bedanda.

Um grande abraço e até breve,
António Teixeira


2. Comentário de CV:

Caro camarada António Teixeira, bem-vindo à Tabanca Grande, onde afinal já estás instalado, quer através do Facebook, quer dos dois postes já publicados no nosso Blogue*.

O teu Batalhão é quase de certeza o BCAÇ 3863 que embarcou para a Guiné em 16SET71, onde chegou a 22SET71. Era composto, além da CCS, pelas Companhias operacionais: CCAÇ 3459, CCAÇ 3460 e CCAÇ 3461. A tua Companhia deve ter sido a 3459 que tinha "sede" em Bassarel e destacamentos em Chulame, Blequisse, Bajope e Binhante, que poderás encontrar no mapa de Teixeira Pinto.

Pelo que contas, quase nunca desarrumavas as malas pois andavas sempre de um lado para o outro. A CCAÇ 6 e Bedanda marcaram-te mais pelo que será de onde terás mais camaradas referenciados.

No Blogue podes, através dos marcadores CCAÇ 6 e Bedanda, encontrar muitas histórias de camaradas que passaram por esta Companhia e esta localidade.

A par da curiosidade que terás em através do Blogue encontrar camaradas, poderás e deverás contar-nos algumas das tuas experiências nas diversas Unidades e locais que palmilhaste, acompanhadas pelas fotos que tens em mão e que ajudarão a ilustrar os textos.

Recebe da minha parte, em nome da tertúlia e dos editores, um abraço de boas-vindas.
CV
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Nota de CV:

(*) Vd. postes de:

23 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7661: Tabanca Grande (261): António Teixeira, ex-Alf Mil, CCAÇ 6 (Bedanda, 1972/73), contemporâneo de Mário Bravo, José Vermelho, Pinto de Carvalho, Vasco Santos
e
26 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7677: Facebook...ando (8): Ganha força a ideia de um próximo encontro dos ex-Bedanda: Mensagens de António Teixeira, Mário Bravo e Hugo Moura Ferreira

Guiné 63/74 - P7684: Contraponto (Alberto Branquinho) (22): Quê?! Catota?!


1. Mensagem do nosso camarada Alberto Branquinho (ex-Alf Mil de Op Esp da CART 1689, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), com data de 11 de Janeiro de 2011:

Caríssimo Carlos Vinhal
Junto vai o texto para o Contraponto (22), cujo título poderá, no imediato, parecer menos "decente".
No entanto, a palavra que poderá, porventura, ferir pessoas mais sensíveis consta do glossário do blogue, na coluna mais à esquerda.

Com um abraço
Alberto Branquinho



CONTRAPONTO (22)

- QUÊ?! CATOTA?!

Foi esta a reacção de espanto que tive ao ler o livro de mini contos irreverentes, “nonsense”, irónicos, surrealistas “Doutor Avalanche” de Rui Manuel Amaral (Angelus Novus, Editora), página 93 (“A tampa de uma esferográfica”):

“Por que escarafunchava ele o ouvido com a tampa de uma esferográfica? Bem, talvez por causa disto: uma grande, redonda, brilhante e interessantíssima catota. E por que é que uma catota pode ser tão interessante? Ora, como todos os geógrafos experimentados sabem, as catotas germinam e saem exclusivamente do nariz. Esta, porém, saiu do ouvido, solene e orgulhosamente empinada na tampa da esferográfica.”

Reacção seguinte: - Que coincidência, a imaginação do autor ter inventado a palavra “catota”! Podia ter inventado uma outra qualquer.

Mas assaltou-me a dúvida: - Será que a palavra existe mesmo na língua portuguesa? Consequência: corrida aos dicionários.

E não é que o autor tem razão? A palavra “catota” é usada no Brasil e tem mesmo a ver com o nariz.

“Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa”:
“catota… muco nasal ressequido; meleca;...“

Confirmando “meleca”:
“meleca… macaco (muco ressequido)……………….“

Assim é, pelo menos, no nordeste brasileiro.

Do atrás exposto constatei, com espanto:

- Como foi possível um homem chegar aos sessenta e tantos anos sem saber o que é catota… (em linguagem nordestina…).

Alberto Branquinho
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Notas de CV:

1. Huíla
Edificação do hospital da missão de Catota será concluída este ano

Lubango – As obras do hospital da missão de Catota, no Lubango, e a reabilitação de outro em Cavango, na província do Huambo, pertencentes à União de Igrejas Evangélicas de Angola (UIEA), estará concluído este ano, informou hoje o presidente da organização religiosa, Eduardo Chikete.
Em declarações à Angop, perspectivando as acções a desenvolver no decurso deste ano, o interlocutor disse tratar-se de obras estimadas em um milhão e 150 mil dólares, dos quais um milhão é financiamento do governo e 150 mil de apoios diversos.
De igual modo, continuou o reverendo, pretende-se reforçar a produção nos projectos de desenvolvimento agrícola, numa fazenda na zona do Giraúl (Namibe) e o pecuário, com o alargamento das suas produções, mormente de hortícolas tubérculos e criação animal, para ajudar os obreiros na sua dieta alimentar.
Consta também dos projectos da instituição religiosa a realização de uma caravana automóvel de paz do Bié ao Moxico, contra o alcoolismo e droga.
Notícia retirada da internete, ANGOP, Agência Angola Press, com a devida vénia.


2. Cabral, Salvador das Bajudas Desfloradas
Finda a comissão, calculem (!), fui louvado. O Despacho do Exmo. Comandante do CAOP Dois referia, entre outros elogios, a minha “habilidade para lidar com a tropa africana e populações”, a qual me havia “granjeado grande prestígio”.
Esquecido, porém, foi o essencial – evitei a dezenas de Bajudas o repúdio matrimonial e a consequente devolução do preço. Essa tão meritória actividade, sim, teria merecido, não um simples louvor, mas uma medalha…
Entre Fulas, Mandingas e Beafadas, as mulheres eram compradas, alcançando-se verbas elevadas. Cheguei a arbitrar casamentos, cujo dote atingiu os trinta contos! Claro que era exigida a virgindade, que às vezes havia desaparecido… Era então que o Alfero odjo grosso era procurado para remediar o que parecia irremediável.
Quanto ao teste pré-matrimonial, a cargo das mulheres grandes, que utilizavam um ovo(!), a questão resolvia-se, com alguns pesos.
O mais difícil era a prova do sangue no lençol, que devia ser exibido no dia seguinte à cerimónia. Equacionado o problema, adoptei uma solução que sabia já ter sido usada entre outras gentes com sucesso. Comprei em Bafatá pequenas esponjas, as quais embebidas em sangue de galinha, e metidas no local apropriado deram um resultadão.
Não houve mais Bajuda que não casasse em total e absoluta virgindade e confesso que me dava um certo gozo assistir às manifestações de júbilo dos viris maridos, no dia seguinte aos casamentos, no meio da algazarra da Tabanca.
Espalhada a minha fama, acorreram noivas de todo o lado. Ponderei mesmo montar um gabinete especializado, tendo chegado a escrever um folheto publicitário a informar que Alfero poi catota noba, dam trezbintim.

Jorge Cabral no Poste Guiné 63/74 - DCXXXIX: Estórias cabralianas (7): Alfero poi catota noba

3. Vd. último poste da série de 13 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7608: Contraponto (Alberto Branquinho) (21): Ensinar/Aprender a ler

Guiné 63/74 - P7683: Memória dos lugares (126): Os meus camaradas da CCAÇ 6, em Bedanda (Dezembro de 1971 / Março de 1972) (Mário Bravo, ex-Alf Mil Med)


Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971/72>  O Alf Mil Médico  Mário Bravo, entre os furriéis da companhia... Boa disposição, boa música, bom uísque (a garrafa mais pequena era de Old Parr, uísque velho)... Os nomes  dos furriéis já se varreram da memória do nosso camarigo... O Mário Bravo não terá estado mais do que 4 meses em Bedanda (enter Dezembro de 1971 e Março de 1972, com algumas saídas, pelo meio, até Guileje, Gadamael e Cacine)...  A CCAÇ 6 era então comandada pelo jovem Cap Cav Carlos Ayala Botto, futuro ajudante de campo do Gen Spínola.



Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971/72>  O Alf Mil Médico  Mário Bravo, tendo a seu lado o Alf Mil Borges, açoriano... 




Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971/72>  O Alf Mil Médico  Mário Bravo, ao meio, ladeado pelos Alf Mil Borges (à sua direita) e o Figueiras (à sua esquerda)



Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1971/72>  O Alf Mil Médico  Mário Bravo posando num monumental bagabaga (com cerca de 5 metros de altura)...



1. Mais fotos enviadas pelo  nosso camarada Mário Bravo (ou Mário Silva Bravo), ex-Alf Mil Med, CCAÇ 6, Bedanda (1971/72), hoje cirurgião, ortopedista, reformado,  vivendo no Porto. Depois de sair de Bedanda, em Março de 1972, o Mário Bravo foi colocado no Serviço de Estomatologia do HM 241, em Bissau, onde aprendeu a tratar dos nossos dentinhos... Um belo dia quem se sentou na cadeira do médico dentista foi o Spínola... É uma história que ele vai contar dentro de dias... (LG).



Fotos: © Mário Bravo (2011) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados

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Nota de L.G.:

Último poste da série 26 de Janeiro de 2011 > Guiné 63/74 - P7675: Memória dos lugares (125): Aldeia Fomosa (hoje, Quebo): em busca de fotos do Cherno Rachide, que morreu em 1973 (Pepito / Vasco da Gama)




(*) Vd. postes anteriores, recentes, relativos ao Mário Bravo [, foto acima,] e à sua passgem pela CCAÇ 6, Bedanda (1971/72) (sobre Bendanda temos já cerca de 4 dezenas de referências; e sobre a CCAÇ 6, cerca de duzenas e meia).