quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13645: História do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74) (António Duarte): Parte XI: dezembro de 1972: (i) talvez a primeira quadra festiva do Natal e Ano Novo passada, no setor L1, sem ataques nem flagelações do IN; (ii) por outro lado, o comandante 'Nino' Vieira vem pessoalmente à frente Bafatá-Xitole para censurar e punir maus tratos infligidos às populações locais pelos seus guerrilheiros


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) / CCAÇ 12 (1969/71)  > 1969 > A capela de Bambadinca (onde havia uma pequena comunidade cristã).. Também servia de "capela mortuária"...


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Bambadinca > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) / CCAÇ 12 (1969/71)  > O fur mil at inf Arlando  Roda,  fotografado no presépio montado em Bambadinca, possivelmente no Natal de 1969, no primeiro ano da CCAÇ 12 (que esteve ao serviço, no meu tempo, de dois batalhões, o BCAÇ 2852 e o BART 2917 (1970/72). Este último foi rendido pelo BART 3873 (1972/74).

Fotos: © Arlindo Roda (2011). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: LG]


1. Continuação da publicação da história do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74), a partir de cópia digitalizada da história da unidade, em formato pdf, gentilmente disponibilizada pelo António Duarte.

[António Duarte, ex-fur mil da CART 3493, companhia do BART 3873, que esteve em Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba e Bissau, 1972/74; foi voluntário para a CCAÇ 12 (em 1973/74); economista, bancário reformado, foto atual à esquerda].


Dois destaques, no mês de dezembro de 1972 (com o BART 3873 a fazer um ano de comissão no TO da Guiné: a partida em Lisboa, no T/T NIassa foi em 22/12/1971):

(i)  o Natal e o Ano Novo  foram tranquilos, no setor L1 (que inclui os subsetores de Bambadinca, Xime, Mansambo e Xitole); contrariamente à tradição, o PAIGC deixou a rapaziada comer as rabanadas, beber o vinho finho e contar as janeiras na santa paz do senhor: não houve, nesta época festiva, nem ataques nem flagelações aos numerosos aquartelamentos e destacamentos guarnecidos por forças o BART 3873;

(ii)  há indícios de que o IN, na região (a frente Bafatá-Xitole), anda desorientado e nervoso, a dar tiros nos pés, a maltratar a população tradicionalmente sob o seu controlo ou onde, sob duplo controlo, em tabancas, "dosso nosso lado", onde  há simpatizantes (, muitas vezes por razões de parentesco): é o caso por exemplo das populações (balantas) de Mero e de Bissaque; numa visita de inspeção (sic) à "frente Bafatá-Xitole", é o próprio 'Nino', o então mítico  comandante João Bernardo Vieira 'Nino, quem vem em pessoa censurar e reprimir abusos dos guerrilheiros locais contra a população... (´É o que se pode ler na história da unidade - BART 3873, Bambadinca, 1972/74).

Por outro lado, Spínola está de novo em Bambdinca, em 19 de dezembro, para presidir às cerimónias de encerramentop do 4º turno de milícias...Um dos pelotões, o Pel MIl 358, composto por gente de Mero, vai defender a sua própria tabanca... É um revés muito sério para o partido de Amílcar Cabral. Algo impensável no meu tempo, em 1969, em que éramos (a CCAÇ 12) recebidos com hostilidade passiva, em Mero...

Por outro lado, na sua alocução, Spínola utiliza um fraseologia política que é nova, conceitos como "participação" ou "Guiné mais justa e mais rica"...

É feita ainda uma referência ao jornalista francês Dominique le Roux, que uns meses antes visitara o CTIG e o setor L1,  e que é  apresentrado como um simpatizante dos movimentos nacionalistas africanos, mas ao mesmo tempo capaz de protestar junto da histórica e influente revista  "Jeune Afrique" pela publicação de uma reportagem tendenciosa em relação ao PAIGC e à Guiné portuguesa.  (LG)

________________

Dezembro de 1972: talvez  a primeira quadra festiva do Natal e Ano Novo passada, no setor L1, sem ataques nem flagelações do IN

Guiné 63/74 - P13644: Tabanca Grande (447): Egídio Avelino Lopes, ex-Tenente Pilav da BA 12 (Bissalanca, 1966/67)... É o nosso grã-tabanqueiro n.º 668

1. Mensagem do nosso camarada Fernando Gouveia (ex-Alf Mil Rec Inf, Bafatá, 1968/70) com data de 21 de Setembro de 2014:

Carlos:
Com vista a satisfazer a voragem do blogue, qual dragão chinês, aí mando este duplo trabalho, da apresentação de um novo tabanqueiro, o Egídio Lopes, e duma viagem à China a qual está interligada com a apresentação do Egídio.

Dado o seu grande tamanho, em termos de fotos, faz a publicação como entenderes.

Com um grande abraço.
Fernando Gouveia


O mundo é pequeno e a nossa tabanca é … grande.

Sim, o mundo é pequeno. Pois não é que se foram encontrar, na terra do dragão, lá no outro lado do mundo, quatro ex-combatentes sino-admiradores?

Dos quatro, três são conhecidos da Tabanca Grande porém o quarto carece de apresentação no blogue. Trata-se de Egídio Lopes com o nome de guerra, lá na Guiné, de “Brutus”.

Contrariamente ao que é habitual passo eu próprio a apresentar o “Brutus”, mandando as respectivas fotos, do tempo da guerra e de agora bem como a primeira história da guerra, que me contou. Mais tarde, “fazendo um looping”, será ele a gerir os seus assuntos junto do blogue.


O Egídio Avelino Lopes e eu próprio nascemos no concelho de Torre de Moncorvo, embora em aldeias diferentes. O Egídio na freguesia da Lousa.

Como Piloto do Quadro, antes de ir para a Guiné, fez vários cursos de pilotagem, nomeadamente com os jactos T37, T33, F86 e Fiat G-91.

Já na Guiné, onde esteve de Março de 1966 até Outubro de 1967, como Tenente Piloto na BA 12, foi o fundador da Esquadra dos FIAT G-91 - TIGRES, voando também no DO-27.
Nessa altura a missão principal dos Fiats era a destruição das antiaéreas e apoio próximo às missões das FT, tendo sido várias vezes atingido pelo fogo das antiaéreas.
Nos DO-27 realizou missões de REVIS e transporte de pessoas e bens para e entre quartéis.

Depois da Guiné a sua actividade como piloto não parou e em 1968/69 aparece como Capitão Piloto de Experiências nas OGMA e faz o curso de piloto de helicópteros AL II e AL III.

Em 1970/72 faz uma comissão em Angola, no avião Noratlas.
E como muitos outros bons pilotos não deixa de ser piloto da TAP, de 1973 a 2000.

De 2000 a 2010 foi Assessor de Segurança Operacional da ANA e de 2001 a 2005 foi Director Adjunto da Academia Aeronáutica de Évora.


O Tenente pilav Egídio


Pilotos Fiat G91- Guiné 1966. Da esquerda para a direita: TCor Hugo (CMDT Grupo); Alf. Luís António; Ten. Egídio Lopes (CMDT Esquadra Fiat); Cap. Costa Pereira (Operações); 1.º Sarg Cardoso e Fur. Mec.


Antiaéreas que os Fiat atacavam no Quitafine


Fotos ©: Egídio Lopes (2014)


Uma pequena história contada pelo Egídio, que se espera venha a contar muitas mais.

Quase no final da minha comissão, regressava à Base voando a cerca de 10.000 pés, depois de mais um ataque a antiaéreas no Quitafine.

De repente vejo um DO-27 por baixo de mim e a voar por cima do Cantanhês. Chamei-o e disse-lhe para se afastar imediatamente pela direita, porque estava a ser alvejado por uma antiaérea.
Assim fez e livrou-se de ser abatido, porque àquela velocidade e altitude era “tiro e queda”!

Quando aterrou na BA12, o piloto (Cap. Vasquez, recém chegado e um operacional de mão-cheia) veio ter comigo a exagerar que lhe tinha salvo a vida!

- Não ouvias os disparos da antiaérea, àquela altitude e já tão próximo?

Resposta:
- Ouvia um matraquear, mas julgava que eram os cintos soltos da parte de trás do DO, que estavam a bater!

Ainda hoje recordamos esta cena, com alguma saudade e muita amizade, não obstante o perigo evidente, que só pode ser compreendida por quem andou pelas terras da Guiné.

Aquele abraço
Egídio Lopes


2. Comentário do editor

Aqui deixamos o nosso obrigado ao camarada Fernando Gouveia por ter trazido até nós o novo tertuliano Egídio Lopes. Ao nosso novo Grã-Tabanqueiro enviamos um abraço de boas-vindas em nome da tertúlia e dos editores Luís Graça, Eduardo Magalhães Ribeiro e Carlos Vinhal.
____________

Nora do editor

Último poste da série de 20 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13631: Tabanca Grande (446): Alexandre Alberto Correia Cardoso, ex-Soldado Apontador de Armas Pesadas da CCAÇ 2464 CCAÇ 2464/BCAÇ 2861, Biambe, 1969/70)... É o nosso grã-tabanqueiro nº 667

Guiné 63/74 - P13643: Biblioteca em férias (Mário Beja Santos) (9): Dentro do Peak District, a vasculhar belezas incomparáveis

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Agosto de 2014:

Queridos amigos,
Chega de vos cansar com estas viagens inglesas, uma coisa é a viagem ser inolvidável para quem a faz outra para quem acompanha os relatos apaixonados, rendidos, do viajante.
Este Peak District tem desfiladeiros, regatos, estâncias termais, arquitetura imponente, casas senhoriais e marcas profundas da I Revolução Industrial. O apanhado de imagens procura impressionar-vos para quem se sentiu, sem reservas, impressionado do princípio ao fim.
O Luís desafiou-nos em encher estes passos, em férias, falando das nossas férias. Foi assim que eu as vivi, e é com a maior satisfação que procurei transmitir-vos a alegria deste viajante.

Um abraço do
Márioviage


Biblioteca em férias (9)

Dentro do Peak District, a vasculhar belezas incomparáveis

Beja Santos

O Peak Distric fica em Derbyshire, nas Midlands. A ideia era percorrer uma pequena superfície a pente fino, monumentos arqueológicos dentro de quintas, ver regatos, passear nas florestas, embrenhar-nos em casa senhoriais ímpares, parar em feiras, percorrer instalações da I Revolução Industrial. É disso que vos vou relatar, sabendo antecipadamente que esta síntese não contribui em si tão favoravelmente como eu gostaria para vos aliciar a vir até aqui, dispostos à vida pedestre, a misturar ambiente com história, visitas a aldeias e pequenas cidades. Paciência, é o que posso fazer e faço-o com imenso gosto. Vamos então à última etapa desta viagem. Primeiro a visita a Haddon Hall, sentimo-nos pequenos e até atrapalhados a detetar o que ali há de normando, de gótico e de Tudor, há por ali intervenções que chegaram até há um século atrás, intervenções dignas, nada de “fachadismo”. As reconstituições convencem.


Haddon Hall tem belas tapeçarias, móveis genuínos não faltam. A parede é do tempo. Senti-me nos tempos isabelinos e não desgostei.


Um detalhe do salão de receções, procurei registar o varandim onde os músicos alegravam os serões dos antepassados dos duques de Rutland e seus convidados. As dimensões são impressionantes e, curiosamente, o salão é acolhedor, é mesmo íntimo.


Este corredor é impressionante, quem concebeu esta ala sabia da poda, tinha tato fino para o cumprimento largura e altura, é tudo gigantesco e não é, grandioso e acolhedor. Entra muita luz, todas estas casas procuram rasgar janelas para vencer os invernos rigorosos, os tempos de negrume, que são longos.


No Peak District há património mundial da humanidade, e grandioso, digo-o sem exagero. Ali para os lados de Cromford, de Derwent Valley assinala a chegada da revolução industrial, do motor de ignição, do tear mecânico, o que estão a ver é uma das primeiras fábricas de lanifícios do mundo, isto, ainda por cima rodeado de vales frondosos, como Matlock Bath, que se mostra abaixo.


Matlock Bath terá sido assim há cerca de 180 anos atrás, o esforço para manter a sua beleza é grande, a despeito das lojas de Fish and Chips e de traquitana inconcebível. Ali perto temos Cromford onde um dos pioneiros da revolução industrial, Sir Richard Arkwright mandou construir Willersley Castle, hoje uma guest house superintendida pela Christian Guild Holidays, os preços são módicos, ali pernoitei.


Willersley Castle, Cromford, Derbyshire. Hoje não está exatamente assim, mas é dos pontos altos das belezas incomparáveis do Peak District. Mais: passeia-se à volta de Willersley Castle e fica-se com a sugestão de que Sintra para aqui se transmutou, em sem qualquer prejuízo.



A fotografia é minha, o postal é de 1930, tirei-a em Cromford, na visita aos primórdios do mundo fabril, em Inglaterra e em todo o mundo. O postal mostra-nos Derwent Valley e vale a pena andar por ali, muitas fábricas desapareceram, havia moinhos em profusão, hoje é meramente um recanto turístico, um espaço de negócios, de escritórios, de entretenimento.


Está na hora da abalada. Estas são as Midlands, mas não sai de Derbyshire. O leitor encontrará nomes como Biddulph Grange Garden, aconselho a visitar se gosta de floricultura, de um espaço reconstruído, com jardins secretos e recantos íntimos; Buxton é uma estância termal encantadora tem ópera e tudo; Leek para ser sincero, foi um desapontamento, mas vi lá uma instalação fabril abandonada que me arrepiou; Ashbourne é uma pequena jóia, com os seus declives e muita arquitetura jorgiana e eduardiana; e há Tidewell com uma imponente igreja, e visitei Eyam que tem uma casa espantosa, Eyam Hall. Chegámos ao fim. Para quem quiser, tenho mapas, brochuras e ofereço-me como cicerone para quem quiser ir visitar com um guia apaixonado. O Peak District gravou-se-me na alma. Nada mais a acrescentar.

************

Nota do autor:
Tinha programado que a série terminaria hoje, mas seguir-se-à a resenha de uma viagem que fiz recentemente a Bilbau.
____________

Nota do editor

Último poste da série de 17 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13618: Biblioteca em férias (Mário Beja Santos) (8): Notas soltas de viagem em Inglaterra, Maio-Julho de 2014

Guiné 63/74 - P13642: Histórias da CCAÇ 2533 (Canjambari e Farim, 1969/71) (Luís Nascimento / Joaquim Lessa): Parte XXIII: O quotidiano em Canjambari...(Agostinho Evangelista, 1º pelotão)








1

1. Continuação da publicação das "histórias da CCAÇ 2533", a partir do documento editado pelo ex-1º cabo quarteleiro, Joaquim Lessa, e impresso na Tipografia Lessa, na Maia (115 pp. + 30 pp, inumeradas, de fotografias). (*)

Desta vez ex-sold Agostinho Gomes Evangelista, do 1º pelotão conta-nos como era, a seus olhos, o dia a dia em Canjambari, que não era muito diferentes de outros buracos por onde todos ou quase todos nós passamos, meses e meses e meses a fio, no TO da Guiné, (LG)

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13641: Caderno de Poesias "Poilão" (Grupo Desportivo e Cultural dos Empregados do Banco Nacional Ultramarino, Bissau, Dezembro de 1973) (Albano de Matos) (1): Pássaro tecelão, de Albano de Matos, p. 5


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Bambadinca (?) > CCS/BCAÇ 2852 (1968/70) >  Ninhos do "pássaro tecelão" (?)...

Foto © José Carlos Lopes (2013). Todos os direitos reservados. (Edição  e legendagem: L.G.)







Capa do documento policopiado do Caderno de Poesias Poilão", editada em dezembro de 1973 pelo Grupo Desportivo e Cultural dos Empregados do Banco Nacional Ultramarino (O  GDC dos Empregados do BNU  foi criado em 1924).










"Pássaro tecelão", o poema de Albano de Matos (p. 5), que abre o  perqueno livro, de 35 pp., O Albano de Matos, editor literário, juntou nesta primeira antologia da poesia guineense,  24 poemas,  de 11 poetas lusófonos (4 da Guiné, 3 de Cabo Verde e 4 de Portugal).




1. O nosso camarada Albano Mendes de Matos [, ten cor art ref, que esteve no GA 7 e QG/CTIG, Bissau, 1972/74, e foi o "último soldado do império",], mandou-nos uma cópia, em pdf, do Caderno de Poesias "Poilão"...

Essa aventura (cultural) já aqui foi contada (*). Ele foi um dos obreiros deste livrinho, quer como editor literário quer como autor.

Ficou-nos a curiosidade em saber mais sobre o  conteúdo desta brochuira que representou uma lufada de ar fresco no ambiente, já cético e depressivo, de Bissau, no final da guerra. O lançamento da obra foi feita em fevereiro de 1974, a escassos dois meses do 25 de abril. 700 exemplares do texto, policopiado, esgotarm-se num ápice.

Com o devido apoio e a competente autorização do nosso camarada Albano de Matos (, hoje a viver no Fundão, ) vamos (re)publicar este caderno de poesia, dando-o a conhecer a um público mais vasto de leitores lusófonos, em Portuigal, na Guiné-Bissau, em Cabo Verde e demais lugares do espaço lusófono.

Obrigado, Albano, com o nosso apreço e gratidão. E também ao Aguinaldo de Almeida, que fez parte da equipa deste projeto cultural. LG


[Foto acima;  Bissau > 1974 > Albano de Matos, a preparar o Caderno de Poesias «Poilão», no Clube Militar de Oficiais; foto à direita: o Albano de Matos, hoje]

_________________

Nota do editor:

(*) Vd.poste de 13 de abril de 2014 >  Guiné 63/74 - P12975: Memórias dos últimos soldados do império (2): A aventura do "Caderno de Poesia Poilão", de que se fizeram 700 exemplares, a stencil, em fevereiro de 1974, em edição do Grupo Desportivo e Cultural dos Empregados do BNU (Albano Mendes de Matos)


(...) Posso dizer que fui o último militar português a vaguear pelas ruas de Bissau, de onde saí, na noite de 13 de Outubro, para o aeroporto de Bissalanca, para regressar a Portugal, no último avião da Guiné, na madrugada do dia 14 de Outubro de 1974.

 (...) Colocado em Bissau, sujeito a horários, não tive condições, nem disponibilidade para contactos com os povos negros. Em Bissau, passei a frequentar a UDIB - União Desportiva Internacional de Bissau, da qual fui sócio (...), o Grupo Desportivo e Cultural do Banco Nacional Ultramarino e a Associação Comercial. Na UDIB e no Grupo Desportivo e Cultural do BNU, colaborei na organização eventos culturais, como, concursos literários e sessões de teatro.



Nos inícios do mês de Dezembro de 1973, ao ler o jornal «Voz da Guiné», deparei com um escrito de Agostinho de Azevedo, alferes miliciano, creio que chefe de redacção do jornal, insinuando que não havia poesia na Guiné. Respondi com um escrito, «O Despertar da Guiné», dizendo que havia poesia na Guiné e que, em breve, iríamos ter um Caderno de Poesias, com o título de «Poilão», a designação de uma árvore sagrada na Guiné. Depois da publicação do primeiro número, seriam publicados cadernos de poesia de um só autor.

No Grupo Desportivo de Cultural do BNU, conheci guineenses e cabo-verdianos que faziam poesias e pedi originais para colaboração em «Poilão», que ainda guardo no meu arquivo. Juntei 24 poemas de 4 poetas da Guiné, 3 de Cabo Verde e 4 de Portugal.

De modo artesanal, fiz 300 exemplares do caderno. Dactilografei os poemas, imprimi-os em duplicador, dobrei as folhas e agrafei-as em capa de cartolina, esta impressa em tipografia, com desenho do poilão da autoria de um alferes miliciano, do Batalhão de Transmissões.

Os 300 exemplares do Caderno de Poesias «Poilão», editado pelo Grupo Desportivo e Cultural do Banco Nacional Ultramarino, esgotaram-se na noite do lançamento. Sem preço de capa, cada pessoa dava a importância que queria. O preço por unidade foi de 20$00 a 100$00.

Por minha proposta, o dinheiro angariado foi doado à Leprosaria da Cumura, nas proximidades de Bissau. Preparei, então, mais 400 exemplares que se esgotaram num dia. Havia apetência para a Poesia na Guiné. Eu apercebi-me desse facto.


 (...) Com um mês de licença, em Portugal, e com as antevisões do 25 de Abril, não foram publicados mais cadernos.

O Caderno de Poesias «Poilão» está referenciado, praticamente, em todas as Bibliografias, Dicionários, Histórias e Estudos da Literatura Africana de Expressão Portuguesa, sendo considerado como a primeira Antologia de Poesia na Guiné-Bissau. Tem sido referido em tertúlias, seminários e encontros culturais.

Em «Poilão», colaborou Pascoal D’Artagnam Aurigema, falecido em 1991, que foi um dos principais poetas da Guiné-Bissau [. Nasceu, em Farim, em 1938]  (..:).

Guiné 63/74 - P13640: Parabéns a você (790): Tony Borié, ex-1.º Cabo Op Cripto do CMD AGR 16 (Guiné, 1964/66)

____________

Nota do editor

Último poste da série de 21 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13632: Parabéns a você (789): Coutinho e Lima, Coronel Art Ref (Guiné, 1963/65; 1968/70 e 1972/73); Teresa Almeida, Amiga Grã-Tabanqueira (Liga dos Combatentes) e Raul Albino, ex-Alf Mil da CCAÇ 2402 (Guiné, 1968/70)

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13639: Dossiê Os Libaneses, de ontem (e de hoje), na Guiné-Bissau (7): Vermeer teria gostado de pintar as libanesas de olhos verdes... (Valdemar Queiroz, ex fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70)


"A rapariga com brinco de pérola" (c. 1665)... Uma das obras primas do pintor holandês Johannes Vermeer (1632-1675). Óleo sobre tela (44,5 cm x 39 cm). Localização atual: Galeria Mauritshuis, Haia. Imagem do domínio público. Cortesia de Wikipedia.

 .
1. Mensagem do  Valdemar Queiroz 
[, ex-fur mil, CART 2479 / CART 11, Contuboel, Nova Lamego, Canquelifá, Paunca, Guiro Iero Bocari, 1969/70]

Data: 15 de Setembro de 2014 às 01:25

Assunto: Ainda sobre as libanesas (*)

Ora viva, caro Luís Graça.

Cá te temos, desta vez pra sabermos o que é o belo. Isto para voltarmos a falar das libanesas de Nova Lamego e/ou Bafatá.

Quanto eu gostava de saber o que é o belo, agora que em toda a zona da Agualva/Mercês há um florescer de plumas, milhares de plumas, que é uma beleza de ver, ou se só as 'Meninas de Avignon', do Picasso, ou 'As meninas' ,de Botticelli, são uma beleza de ver?

 E por que razão as raparigas/mulheres libanesas de Nova Lamego ou Bafatá, não seriam uma beleza de ver? Que mal estaria a rapazida a fazer,  se só apreciassem os olhos verdes das libanesas? Cometiam um grave sacrilégio de apreciar a sua beleza, ou querendo lá saber disso teriam que apreciar o saber do passar a ferro, o mudar a água ás azeitonas, o fazer uma sopa de beldroegas e esperar? 

Acho que não, a rapaziada gostava de ver raparigas bonitas, libanesas, fulas, mandingas e até as filhas dos da metrópole que eram mais finas. Não havia nenhum mal nisso, era absolutamente normal.

Quem em 1969/70, na Guiné, não gostava de ver uma mulher de olhos verdes, sem estar a pensar nas mulheres de olhos castanhos, azuis ou pretos para fazer comparações e também pensar que todas as mulheres têm olhos bonitos, que elas haveriam de ser um dia as nossas companheiras e as mães dos nossos filhos?

Pois é, caro Luís, naquele tempo, há  45 anos, sem querer, já nós apreciávamos a 'Mulher com brinco de pérola', de Vermeer , sem com isso desgostar da 'Mulher de Afife com arrecadas', da 'Mulher com o joelho à mostra na Pastelaria Suíça', ou 'A Vera de biquíni amarelo na Caparica'.

Pois é, caro Luís, isto do belo dá pano para mangas e é só escolher, pra nós as libanesas chegavam: libanesas de olhos verdes, nunca tinhamos visto.

Um abraço e gostei de ver tuas fotos e de ler os teus poemas.
Valdemar Queiroz


Sintra > Zona da Agualva/Mercês  > Setembro de 2014 > "Há um florescer de plumas, milhares de plumas, que é uma beleza de se ver"...

Foto (e legenda): © Valdemar  Queiroz (2014). Todos os direitos reservados [ Edição: LG]
________________

Guiné 63/74 - P13638: Selfies / autorretratos (2): filho único, com pai emigrado no Canadá, podia também ter saído do país, aos 17 anos... Passei pela universidade de Coimbra e lutas académicas, tendo decidido participar na guerra colonial, contrariado e sabendo ao que ia (Manuel Reis, ex-alf mil cav, CCAV 8350, Guileje, 1972/74)

1. Comentário de Manuel Reis ao poste P13623


[, Foto á esquerda: Manuel Augusto Reis, em Guileje, 1973:  foi alf mil cav, CCAV 8350, Guileje, Gadamael, Cumeré, Quinhamel, Cumbijã, Colibuia, 25/10/72 - 27/8/1974]

Amigo e ex-camarada Vasco:

Abriste uma frente de diálogo bastante interessante e que o Luís com o seu saber deu uma ajuda suplementar.

Conheço o Vasco desde os tempos de escola, com um percurso um pouco idêntico, mas trilhando o mesmo caminho: colégio de Anadia e Universidade de Coimbra e,  imagine-se, ....Gadamael. 

Aproveito para lembrar o percurso dos meus familiares no que à guerra diz respeito. Meu avó (materno) foi mobilizado para a 1ª guerra mundial e participou na batalha de La LYs. Consegui ouvir algumas peripécias, dispersas, dos momentos difíceis, que teve de suportar, na sua qualidade de granadeiro. 

No seu regresso era um homem destroçado anímicamente. A minha presença na sala tornava-se incómoda, pelo que me era dada ordem de retirada.

Na casa dos meus avós vivia-se um ambiente republicano, sendo o meu bisavô, Pedro, meu grande amigo, constantemente perseguido. A maior parte das noites eram dormidas em palheiros, afastados da sua residência. Lamento que o diário do meu avó se tenha extraviado, a sua importância, para mim, era bastante significativa.

Seguiu-se o meu pai, que é mobilizado para alinhar na 2º guerra mundial, sendo enviado para Moçambique, durante 3 anos, onde supostamente se previa um desembarque de tropas japoneses. Nada faria supor esta mobilização do meu pai, recém- casado. Não sofreu os traumas da guerra, mas a ausência da família foi dura.

Poucos anos passados, face ás dificuldades económicas, o meu pai emigra para o Canadá onde permanece durante mais de 20 anos. No ano em que eu completava 17 anos e perante o espectro da guerra que pairava sobre a minha cabeça, desloca-se a Portugal e coloca-me a possibilidade de emigrar também. 

O meu pai, homem simples do campo, tem a noção e a preocupação de que a guerra me espera.Possibilita-me que decida .Estar-lhe-ei  eternamente grato. Acabei por recusar, via a guerra ainda muito longe, e com um percurso académico satisfatório, nada o aconselhava. 

A minha entrada na academia, e o meu envolvimento nas lutas académicas, rasgaram-me outros horizontes e quando decidi, contrariado, participar na guerra que já se vivia nas ex-colónias, sabia para o que ia. A decisão era sustentada no plano familiar, pois na qualidade de filho único, não imaginava um afastamento prolongado dos meus pais.

Um grande abraço.

Vasco,  as caçoilas estão prontas!

Manuel Reis

__________________

Nota do editor;

Último poste da série > 22 e setembro de  2014 > Guiné 63/74 - P13634: Selfies / autorretratos (1): por que é que fomos à guerra... (Vasco Pires / Luís Graça / Francisco Baptista / José Manuel Matos Dinis)