(À esquerda:) Capa do livro Guiné Diário da Guiné: 1969-1970: O Tigre Vadio, de Mário Beja Santos, editado por Temas & Debates e Círculo de Leitores, Lisboa, 2008, a ser lançado no próximo dia 11 de Novembro, no Museu da Farmácia, em Lisboa (À direita: Convite)
Texto de
Mário Beja Santos
ex-Alf Mil,
Comandante do Pel Caç Nat 52,
Missirá e Bambadinca,
1968/70
Fotos (e legendas): ©
Beja Santos (2008). Direitos reservados
Nota dos editores:
Este é o 50º (e último) episódio da série
Operação Macaréu à Vista, Parte II, que cobre o período de Setembro de 2007 até agora. Em termos cronológicos, corresponde ao segundo ano da comissão do Beja Santos, à frente do Pel Caç Nat 52, ou seja, desde Agosto de 1969 até ao fim (Agosto de 1970).
Durante 50 semanas, o nosso camarada e amigo Beja Santos mandou-nos, religiosa, metódica e disciplinadamente, os 50 episódios desta narrativa, que agora deu origem ao seu segundo livro,
Diário da Guiné: 1969-1970: o Tigre Vadio.
Tigre de Missirá era a alcunha ou o nome de guerra do nosso camarada.
Tigre Vadio foi o nome de código da operação que, em Março de 1970, o comando do sector L1 da Zona Leste planeou e mandou executar às suas forças operacionais, na região do Cuor, a norte do Rio Geba Estreito. Uma operação dramática (e sangrenta) que levou o Pel Caça Nat 52, a CCAÇ 12 e outras forças a território controlado pelo PAIGC, a enfrentar o PAIGC, em sua casa, na região de Madina / Belel... (Mais os seus aliados: as abelhas, a sede, o clima, o terreno...).
Pelo meio, ficam muitas outras peripécias, venturas e desventuras de um oficial miliciano, comandante de um pelotão de caçadores nativos. Um jovem, melómano, culto e crente, que vem da militância JUC - Juventude Universitária Católica, carismático, determinado, corajoso, perfeccionista, e com o seu quê de aristocrático, que trata os seus homens por você, e que se corresponde com o poeta Ruy Cinatti e o comandante Teixeira da Mota...
Graças aos aerogramas que escrevia diariamente à sua noiva e depois esposa, Cristina Allen, aos seus apontamentos do seu caderno diário, à memória fotográfica de elefante tanto sua como de alguns dos seus homens que vivem hoje em Portugal (com destaque para o Queba), foi possível, ao Mário, terminar com sucesso, alivío e sentido do dever cumprido esta tarefa, quase sobre-humana, de pôr em linha (e depois em papel) as memórias de uma riquíssima experiència humana e militar no TO da Guiné.
O nosso blogue, que o coaptou e acolheu, em meados de 2006 - e lhe
estragou os planos de "escrever as suas memórias da Guiné" após a reforma, aos 67 anos... - aproveita, simbolicamente, este momento para o saudar e para lhe agradecer. Ele foi, nestes últimos dois anos, um bloguista militante, indefectível, com presença semanal, nas nossas páginas. E assim continuará, esperamo-lo bem. Quem conhece(u) o Mário e com ele convive(u), sabe que não é homem para "capinar sentado"... Ideias e obra não lhe faltam.
Por tudo isto, ele merece a nossa singela homenagem, o nosso reconhecimento público, e sobretudo a expressão da nossa amizade e camaradagem. Dia 11 de Novembro próximo, no lançamento do
Tigre Vadio, esperamos encher o Museu da Farmácia com a nossa presença, com a presença da malta da Tabanca Grande, com a presença de todos os amigos e camaradas da Guiné.
Um Alfa Bravo, Tigre!
A equipa editorial do blogue,
Luís Graça
Carlos Vinhal
Virgínio Briote
Operação Macaréu à vista - II Parte > Episódio L (*)
ACALMA-TE, MÁRIO, A GUERRA ACABOU
por Beja Santos
(i) Uma marcha processional a caminho do Carvalho Araújo
Só muitos anos mais tarde é que soube como se espalhara a notícia. O Domingos Silva, já a viver em Bissau, telefonara à D. Leontina, nos CTT de Bambadinca, para deixar uma mensagem a um primo em Bricama, pedira as novidades, soubera que eu tinha partido há dois dias para Bissau. No mercado do Bandim encontrou o Zé Pereira que por sua vez encontrou Quebá Sissé em Brá que por sua vez veio ao hospital de Bissau e encontrou no Pidjiquiti o José Jamanca. O telefone árabe ficou imparável, todos aqueles com quem combati no Cuor e nos outros regulados exigiram “partir mantenha”. De modo que, preparava-me eu para ir buscar as duas volumosas caixas em madeira ao Depósito de Adidos, quando à saída do Vaticano III tive a surpresa de encontrar um rancho de amigos prontos para me ajudar.
Aproveitámos uma boleia naquela manhã ensolarada na ruidosa estrada de Santa Luzia, a minha ilustre comitiva fazia catadupas de perguntas (o que vais fazer em Lisboa, onde vais viver, vais ficar longe da família, quando vais voltar à Guiné, se não te importas, levas um bilhete para mandar camisa, calça, sapato, equipamento de futebol, mandas fotografia com senhora e toda a família...). Nisto, o Domingos Silva desceu ao concreto e perguntou se eu não levava arte africana para Lisboa. Acordei para a realidade dos presentes, mesmo a tinir com falta de dinheiro. Assentou-se que íamos primeiro a Brá carregar as caixas, dali seguiríamos para o cais, já com a indicação do local onde ficariam no Carvalho Araújo. No regresso, o Domingos e o José Jamanca iriam comigo à Missão Católica para fazer as compras das ditas lembranças. Foi um alegre cortejo, o mercado de Bandim estava no auge do mercadejar, ouviam-se todas as línguas da Guiné, encontravam-se todos os trajos, era um festival de cor, de cheiros e sons.
À entrada do cais, na posse de uma guia de marcha, subimos a escada até ao portaló, pareciam urnas em madeira natural, avançámos para o convés onde recebi instruções da cabine onde ia ficar e o local onde podíamos depositar as caixas. É neste emaranhado de encontros e desencontros, de gente que entra e sai, que dei de frente com o José Alberto e o Tomé que não via desde que saímos de Mafra, em Outubro de 1967. Abraço puxa abraço acordámos ficar os três na mesma cabine. Saí daquele bulício para regressar ao de Bissau, não tinha palavras para agradecer a todos os meus antigos soldados a surpresa do encontro, o imprevisto de tão linda despedida.
N/M Carvalho Araújo da Companhia Insulana de Navegação
Na Missão Católica fui timidamente escolhendo gazelas, pássaros, árvores da vida, guerreiros, sempre a verificar os escassos escudos e logo a seguir assisti a um vibrante regateio em que o Domingos me aliviou na carteira e me sobrecarregou na consciência, na verdade eu estava a poupar à custa da obra dos missionários. Mais abraços e marquei a despedida para as 11h da manhã do dia seguinte, exactamente uma hora antes do Carvalho Araújo se lançar pelo Canal do Geba em direcção ao Atlântico. O Domingos aproveitou para me lembrar que era cristão e que gostaria muito de ficar com uma lembrança minha, talvez aquela cruz que eu tinha num fio ao pescoço, talvez o meu livro de orações, roupa não valia a pena era muito notória a nossa diferença de peso. Tudo isto me enternecia, a tudo procurava dizer que sim. A desoras fui almoçar, mas o estado de espírito de quem vivia sem obrigações era superior às minhas forças. A humidade da época das chuvas era de cortar à faca, refugiei-me no sombreado da messe de oficiais onde acabei de ler, depois de dormitar,
Viver com os outros, de Isabel da Nóbrega, consagrado com o Prémio Camilo Castelo Branco.
É uma prosa original, estruturada em diálogos, pensamentos, declarações e contrapontos. Trata-se de uma reunião mundana, é o culminar de um jantar com o reencontro de amigos e familiares dos anfitriões. Está ali muito da sensibilidade da classe média portuguesa do início dos anos 60. Não há uma só referência à guerra de África, os casais falam dos pais e dos filhos, de amizades desorientadas, no torvelinho dos silêncios há quem recorde traições, infidelidades, doenças mais ou menos graves, os espíritos liberais confrontam-se com os tradicionalistas, estes nitidamente cautelosos e defensivos. Alguém, dentro da reunião mundana, propõe um jogo, algo como o resumo de um romance que todos gostariam de escrever, não assinado, que depois seria lido em voz alta, competindo à assembleia (os participantes da reunião) adivinhar o autor. É um pouco como o teatro dentro do teatro, os diálogos entram em conflito e, paradoxalmente, em unidade, com o que cada um pensa interiormente. Assim se desfia a trama do romance em que múltiplos contadores colam as suas histórias que vencem as solidões pois que a apoteose de todas estas reuniões é descobrir sempre a alegria de nunca estarmos sós. Estão aqui bem vincados os caracteres destes grupos sociais, os seus gostos e as suas preferências, vemos timidamente o discurso da emancipação da mulher, o rompimento com o país imóvel, as contradições de uma classe que aspira ao desenvolvimento e à liberdade de espírito. Leio, volto atrás, identifico pessoas, atitudes, ambientes. Conheço um pouco deste país de que fala Isabel da Nóbrega, rendo-me ao encadeado da psicologia das personagens, à conversação e ao sonho, à afirmação categórica e à dúvida escondida. Um belo romance.
Capa de João Câmara Leme, Portugália Editora, 1965. Trata-se de um jantar de gente das classes médias, celebra-se o restabelecimento do anfitrião, nessa noite de Verão um conjunto de familiares e amigos vai discorrer sobre os temas que os preocupam: o crescimento dos filhos, os preconceitos sociais, os divórcios, as leituras, as recordações da juventude, entre outros. É um vasto encadeado de diálogos a que se misturam reflexões íntimas de quem escuta e sentencia. Está ali mais ou menos tudo o que pensava uma classe a liberalizar-se, obrigando os tradicionalistas a refugiarem-se em esquemas lógicos defensivos. Uma classe média que não vivia a guerra em África e que praticamente vivia à margem do regime de Salazar. Obra original, subtil e cruel com a solidão daqueles que se alimentam a viver com os outros.
(ii) O momento da partida
Encontramo-nos à porta da cervejaria Mário, bebemos todos Fanta, a todos prometi escrever em breve. Ando, aliás, com o meu caderninho viajante, espero esta tarde começar a listar as minhas actividades assim que chegar a Lisboa. De novo em cortejo ou roda-viva avançamos para o cais, oiço exclamações atrás de mim, é Jolá Indjai que chega, sabia que ele tinha voltado à Guiné tratado da sua tuberculose, vem com um sorriso doce agradecer a hospitalidade dos meus familiares. É nesse momento que não sustenho as lágrimas, vejo o espanto e a confusão no rosto dos meus amigos, a situação resolve-se quando a sirene nos chama para bordo. No convés aceno a todos e junto-me aos oficiais que vão ouvir uma prelecção feita por um oficial general que agradece os serviços que prestámos à Pátria. A todos cumprimenta e abandona o salão prontamente cercado pelos seus acompanhantes. É o tumulto da despedida, agora tenho tempo para observar a excitação dos contingentes cabo-verdianos e açorianos com quem vou viajar. Sente-se a serpentina de calor abafado pelo Canal do Geba fora, há quem identifique Prabis, depois Ponta Prainha e depois Ponta Biombo. A caminho do lusco-fusco temos Caió à direita e a ilha Caravela à esquerda. Depois, entramos no negrume do Atlântico.
Antes, durante e a seguir ao almoço aproveitei para saudar gente que não via há anos, depois escrevi e li. Ficou registado no meu caderninho viajante: dar prioridade à visita à mãe do Carlos Sampaio, visitar o Sr. Raimundo Rodrigues Oliveira que me mandava pelo Natal broas pagando bem caro os portes de correio, agora está tolhido numa cadeira de rodas, ir buscar o Fodé, o Paulo e o Alcino (?) e passearmos por Lisboa.
Estou a ler
Aquele dia inesquecível, de James Hilton, de quem já tinha lido
Adeus Mr. Chips e o singular romance policial
Acidente ou Crime?. Estou rendido à subtileza da história e aos contrastes de uma relação conjugal condenada à ruptura. Naquele dia inesquecível, 1 de Setembro de 1921, George Boswell recebe a visita de Lorde Winslow, que visita Browdley, a cidade industrial onde George trabalha cheio de empenho para a melhoria das condições de vida dos seus munícipes. Lorde Winslow pede-lhe que o acompanhe numa viagem ao Continente, poios o seu filho, Jeff, vive uma relação amorosa, ruinosa, com Lívia a mulher de George Boswell. Sigo empolgado o drama deste conselheiro municipal e director de jornal regional. Somos levados ao passado, a outro drama, o da família Channing, a família de Lívia, depois à paixão de George por Lívia, a morte do filho do casal, os graves desencontros.
Interrompo a leitura, regresso ao convívio, ao jogo das cartas, ao jantar e às conversas sem rumo nem destino. Alguém, na mesa do comandante, informa que a água do banho está racionada, temos sensivelmente trinta minutos entre as 6h45 e as 7h15 para usarmos o chuveiro. Habituados que estamos todos às soluções práticas, entendi-me prontamente com o José Alberto e o Tomé: punha o despertador para as 6h45, saía da cabine para o chuveiro, minutos depois regressaria, seria a vez do José Alberto, a seguir a este tomaria duche o Tomé. Ora, o que se passou no primeiro, no segundo e no terceiro dia? Ainda a limpar-me chamava o José Alberto, quando este regressava o Tomé informava que não precisava de tomar banho, ficava para a manhã seguinte.
Passados estes três dias, não me contive e perguntei ao José Alberto: "O que se passa com o Tomé, está chateado, vai tomar banho a outro sítio, quer que se comece por ele, és capaz de me explicar?”. Surpreendido pela minha curiosidade, o José Alberto deixou-me de boca aberta: “Pá, o Tomé nunca tomou banho na Guiné, deves ser o único que não sabe. Mesmo quando jogava futebol ou vinha das operações, molhava-se com um pano humedecido, não me perguntes porque é que ele não cheira mal. O espantoso é que faz a barba todos os dias, lava a cabeça e põe brilhantina”.
Vivi doze dias numa cabine com o Tomé e a verdade é que não havia maus cheiros. Às vezes olhava-o de lado, a ver se ele se coçava ou a sujidade aparecia na pele ou caía no chão. Era a primeira vez que eu ouvia falar num ser humano, branco, preto ou mulato, totalmente incompatibilizado com o banho durante dois anos consecutivos naquela tórrida África Ocidental.
Tradução de Leonel Vallandro, capa de Bernardo Marques, Colecção Dois Mundos, Livros do Brasil. É um romance muito belo, de estrutura formal, uma interessante análise de uma cidade industrial entre o século XIX e o fim da segunda guerra mundial. Iremos simpatizar do princípio ao fim com George Boswell, a sua moral de dedicação às pessoas e às obras, sentir elevado apreço pelos sentimentos de Lívia, sua mulher, até percebermos que se transformou num autómato da determinação. Aquele dia inesquecível ocorreu a 1 de Setembro de 1921, quando George Boswell soube que Lívia partira para se juntar a Jeff, um jovem diplomata filho de Lorde Winslow. O mundo de George mudou, centrou-se no seu serviço público a Browdley e ao trabalho autárquico. No final, Lívia vai reaparecer mas George toma partido pelas decisões do filho, que a mãe pretende oprimir. James Hilton, naquele início dos anos 70 em que eu o estava a ler, caminhava para o esquecimento. No entanto, este livro, +por si só comprova que estamos perante um grande escritor.
(iii) Do Sal para São Vicente, de São Vicente para Ponta Delgada
Estremunhado, acordo naquele amanhecer barulhento. Fui ver à escotilha, a aridez do Sal está diante de nós, a gritaria da tropa cabo-verdiana é ensurdecedora quando descem para o batelão que os conduz a terra firme, dizem-nos adeus mas só olham para a sua ilha. E seguimos sem nada à vista na linha do horizonte até que vários pontos minúsculos nos dão conta que contornamos um arquipélago, o Carvalho Araújo avança para a baía do Porto Grande em Mindelo. Tivemos licença para sair, Mindelo tem um belo património, em primeiro lugar alugámos táxis e partimos para a praia de Salamansa, por vinte escudos cada um teve uma barrigada de marisco, depois regressámos ao Mindelo que impressiona pela sua arquitectura colonial, é uma cidade cheia de história, ganha pelo pitoresco da posição, graças ao Monte Cara a despontar num dos recantos da baía e avistando-se Santo Antão lá ao fundo. Sente-se a cultura, o nível de alfabetização, sem dúvida a África cruza-se aqui com a Europa. Entardecia quando o Carvalho Araújo levantou ferro a caminho dos Açores.
Ando amolecido, passeio-me pelo convés com uma braçada de livros,
A Metamorfose, de Kafka,
O Caso do Olho de Vidro, de Erle Stanley Gardner, o livro de James Hilton e até a
História da Guiné, de João Barreto, cuja capa está já praticamente desfeita. A excitação dos primeiros dias está a esfriar, as emoções assentam, há cada vez mais gente a meditar para o fundo do horizonte, é lá que uma nova vida nos aguarda.
Leio um pouco da
História da Guiné, a sua separação de Cabo Verde, em 1879, isto no tempo de Fontes Pereira de Melo. O novo governo colonial faz tratados com régulos, procura reduzir os atritos, o que não impede um número crescente de revoltas que transformam os acordos e os tratados de paz em coisa nenhuma. Na verdade, governa-se em Bolama, há comércio no Cacheu e na região dos presídios mas a obediência é sempre contingente, com o liberalismo a missionação tornou-se insignificante, as revoltas reacendem-se a todo o instante. É na página 310 que dou de novo com Marques Geraldes, de quem já aqui se falou quando era
comandante de Geba e que fora resgatar gente roubada junto do régulo Dembel, com um comportamento e uma galhardia que me comoveram, isto em 1883. O autor desta História da Guiné chama-lhe um herói esquecido, refere a sua ousadia quando Marques Geraldes, já tenente, toma a tabanca do régulo de Mansomine, ataca Mussá Moló, em 1886, o que vai trazer alguma tranquilidade na região do Geba. É um tempo de assaltos, de disputas ferozes entre régulos, Bissau está permanentemente hostilizada, a Guiné parece não atrair investimentos nem colonos, tenta-se mesmo criar uma companhia majestática abrangendo toda a colónia, mas tudo falha. Fecho o livro e recordo com saudade os seis meses que vivi em São Miguel, as amizades que cimentei. Esses amigos estarão amanhã à minha espera no porto de Ponta Delgada.
Foi a primeira história da Guiné, escrita por um sanitarista. Está longe de ser um livro perfeito, mas abriu caminho para os dois volumes "A Guiné Portuguesa", de Teixeira da Mota, de 1954. Nos anos 80, René Pélissier iria publicar a "História da Guiné - Portugueses e Africanos na Senegâmbia, 1841-1936", entre nós editada pela Editorial Estampa, em 1989. O João Barreto organizou o seu trabalho à procura de público amplo que se interessa-se fundamentalmente por: o reconhecimento da história da Guiné e o processo colonizador que se lhe seguiu, com capitanias e presídios; a história da Guiné depois da Restauração de 1640, uma minuciosa descrição do que ali ocorreu ao longo de todo o século XIX, a definição de fronteiras, a questão de Bolama, o aparecimento do Governo Autónomo, a letargia do fim de século, a Guiné e a I República, o tráfego de escravos, a obra de Teixeira Pinto, as missões religiosas, a reorganização dos serviços administrativos. A despeito de todos os seus defeitos, é a obra de arranque para a ténue historiografia disponível sobre a Guiné, como colónia e país independente.
Será uma experiência emocionante. Com lentidão, o navio avança para o comprido dedo do molhe do cais, uma multidão de mulheres vestidas de preto vigia a aproximação dos seus filhos, maridos, netos. Ouve-se o sulcar das águas e o resfolegar da casa das máquinas, há gaivotas em toda a parte, nem no navio nem em terra se ouve uma voz. Estamos a escassos metros quando alguém grita de terra, ergue-se um coro, os braços acenam freneticamente, parece que se deu o milagre instantâneo do reconhecimento. É uma alegria contagiante, quase todos os que vão para Lisboa choram desalmadamente com a possessão que se instalou nos que estão em terra e que parecem querer voar para o navio, tal a vibração do sangue. O barco atraca, a tropa açoriana desce a escada em alvoroço, só vejo braços abertos, só oiço gritos, toda aquela espontaneidade avassala quem está a bordo e só depois, discretamente, descemos para terra. Temos direito a só regressar de madrugada.
No cais, aguardam-me Maria e Marino Teves, a Bibi e algumas filhas do Dr. José Maria de Medeiros, o padre Weber. Aguento o embate, sou levado para a rua de Santa Clara n.º 2 onde nos esperam mais amigos, segue-se um quase banquete, não se fala da guerra, fala-se exclusivamente daqueles tempos de 1967 e 1968 que precederam a partida para a Guiné. Telefono à Cristina, tenho a voz embargada quando lhe digo eufórico: “Dentro de três dias, ao amanhecer, estarei em nossa casa”. A Cristina responde: “Com o dinheiro disponível, creio que não poderia fazer melhor. O quarto tem o essencial, chegam hoje umas estantes para a sala, com o tempo compraremos mais electrodomésticos. Para começar, penso que não vais ficar decepcionado”.
(iv) Chegada a Lisboa
Anoiteceu quando chegámos a Cascais, de mansinho o Carvalho Araújo planta-se em frente ao Bugio. Estou a acabar de ler
Aquele dia inesquecível. Lívia comunica a sua separação, parte para Genebra. George Boswell trabalha desalmadamente, Browdley desenvolve-se, prospera. Vem nova guerra, o filho de Lívia e Jeff Winslow aparece em Browdley ferido. Mais tarde George reencontra Lívia, esta procura reaproximação, mas os afectos estão mortos. Aquele dia inesquecível mudara tudo. Meditava neste belo romance mas as luzes de Cascais e Estoril prendiam-me como um íman. Rendo-me definitivamente ao pandemónio que vai a bordo.
Em alvoroço, subimos e descemos todos os andares do Carvalho Araújo, à procura de referências e de diferenças, assinalando em voz alta o que conhecemos, ouve-se o trânsito na Marginal, ouve-se o rolar dos carros na ponte sobre o Tejo. Há um estado anormal de excitação, joga-se até desoras, bebe-se muito, parece que é exactamente agora que acabou a guerra. É a febre do primeiro dia fora da comissão militar, parece que já estamos desfardados.
Comemos o pequeno-almoço à pressa, há quem esteja à mesa com os seus pertences à volta, não vá chegar aí uma ordem para regressar à Guiné. Saímos de roldão, quem vem em unidade militar tem de controlar as emoções, a gente da rendição individual foge para as saídas, indiferente à gritaria dos diferentes administrativos a quem compete indicar aonde nos devemos apresentar. Fico a saber que as minhas caixas seguem para um quartel na Calçada da Ajuda, informam-me que tenho uma entrevista com um major da unidade na manhã seguinte, o Exército pretende fazer um contrato comigo. Saio desabrido por aquele Cais da Rocha do Conde de Óbidos onde embarquei na manhã de 24 de Julho de 1968. Visto a farda n.º 2, com a calça comprida, não tive dificuldade em conseguir um táxi, quando me instalo, com a mala bem pesada e a arte guineense atada por cordas, posta nos meus costados, parece que estou a dar ordens para partirmos para o Xime ou o Xitole. Faço perguntas, oiço comentários, identifico sítios, assombro-me com algum edifício desconhecido.
O táxi passa pelo Cais das Colunas, esta é a minha Lisboa, pareço um gaiato a apontar para o Castelo de São Jorge, banzado com os cacilheiros, o trânsito da Baixa, a imponência quieta da Avenida da Liberdade. Passamos pelo Saldanha, só faltou acenar ao Monumental, onde fui tantas vezes ao cinema e teatro. É uma manhã de Agosto quente, mas não sinto a humidade da Guiné, incendeia-me o entusiasmo de querer avisar meio mundo que cheguei a Lisboa e que tenho planos para recomeçar a minha vida. O táxi perece voar, é a vez do chofer fazer perguntas, tem um filho a fazer recruta, quer saber se a guerra da Guiné é tão dura quanto por aí dizem à boca calada. Dou respostas assépticas, hoje não quero que o senhor chofer tenha maus sonhos. Passamos pelo Campo Grande que conheço a palmo, o jardim está a definhar, talvez seja do calor do Verão, tem pouco a ver com o verde viçoso e os lindos canteiros de flores que sempre conheci em miúdo. De repente, lembrei-me da felicidade que senti, tinha eu 11 anos, quando achei uma nota de 20 escudos dentro do jardim e ofereci à minha mãe. O táxi vira à direita e entra na Avenida do Brasil, pára ao lado da Garagem Dragão, tinha sido esta a referência que a Cristina me dera ao telefone, estava eu em Ponta Delgada.
Tiro a custo o malão pesado, a arte guineense chocalha com tanto movimento, os mirones param na rua com este quadro insólito. Toco a campainha, oiço a declaração de alegria da Cristina. À porta de um sexto andar gritamos e beijamo-nos. Arrasto o malão para a entrada, a Cristina freme de entusiasmo, quer mostrar o espaço organizado: a salinha com alcatifa em tom azul-marinho, depois um quarto ainda vazio, a cozinha com a mesa já posta para o almoço, é daqui que avisto uma Lisboa com arranha-céus até ao Sheraton, vou fazendo perguntas, a Cristina procura responder. Depois o corredor faz um cotovelo, há uma casa de banho e ao fundo o nosso quarto com janela tendo o Júlio de Matos como fundo. É um ambiente cheio de ternura, a Cristina foi uma grande artífice com os poucos tostões disponíveis.
É no momento em que lhe estou a pegar nas mãos e lhe procuro agradecer tudo quanto tem feito por mim que sinto um rugido medonho, as paredes estremecem, sinto um pânico, estendo os braços com as mãos viradas para a frente, sinto-me em Missirá, procuro um morteiro 81 cercado por bidões cheios de terra e cimentados, preparo-me para gritar, quero todos a postos para reagir contra as gentes de Madina. São segundos de total desencontro, os olhos procuram orientar a melhor resposta para aquele ataque ao fim da manhã.
A Cristina apercebe-se de que estou a viver aquilo que ela já lera em relatos sobre quem chega da guerra: um simples estampido de um carro põe um ex-combatente à procura do inimigo, deitado no chão ou lançando-se sobre as pessoas. A Cristina serena-me: “Estamos na linha do aeroporto, dentro de dias estás completamente habituado a este barulho. Acalma-te, Mário, a guerra acabou. Olha, tens ali uma carta do Ruy Cinatti. Vou acabar o almoço, tenho sardinhas no forno, como tu pediste”.
Recomposto do choque, abro a carta do Ruy. Começa com uma linda saudação, diz que está a escrever um livro sobre Timor e que entretanto prepara duas conferências. Diz que está contente com a minha decisão de voltar a estudar e oferece-me um poema:
Tempo de Vigília
Da realidade concreta erguer um hino
que eleve os corações ao seu destino,
mas tê-la, primeiro, qual a mão
que aperta, doendo,
destruindo ilusão
que a siga, fútil.
Ó delírio épico,
actual e sádico!
Ó salário! – medo
vago, involuntário!
A multidão inclina-se
perante o morto,
subindo até ao cimo da fadiga
o rosto absorto.
No lodo inquieto,
barrento, de águas vivas, jaz oferto
o corpo múltiplo
dos que negaram ser escravos.
Paz e perdão
aos vivos que alinham
cohortes futuras.
Alegria só
aos que se libertam.
A carta termina:
“É a minha vez de lhe agradecer toda a companhia que me deu. É possível que não entenda porque lhe ofereço hoje este poema. Daqui a uns anos falaremos. V. veio diferente, veio liberto e melhor preparado para lutar na vida. Não se arrependa pelo amor que deu e recebeu. É bom tê-lo de volta. Não se esqueça do que viveu. Não se esqueça do que sofreu. Transforme tudo em dívida consigo. Até breve”.
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Nota dos editores:
(*) Vd. os postes anteriores desta série, por ordem cronológica:
13 de Setembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2102: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (1): Mamadu Camará, a onça vigilante
21 de Setembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2123: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (2): Não te esqueças de me avisar que já sou teu marido
28 de Setembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2138: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (3): Op Pato Rufia (Xime, Setembro de 1969)
5 de Outubro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2154: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (4): Cartas de Missirá, Setembro de 1969
12 de Outubro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2174: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (5): Aquela Terceira Semana Prodigiosa de Setembro
19 de Outubro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2195: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (6): Hoje perdi o meu braço direito, o Casanova
26 de Outubro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2218: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (7): Afundem a armada de Madina
9 de Novembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2251: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (8): Cartas que levam saudade(s) das terras e das gentes do Cuor
16 de Novembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2270: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (9): E de súbito uma explosão, uma emboscada, um caos...
23 de Novembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2299: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (10): O meu amigo açoriano de Bissau
30 de Novembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2317: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (11): O fantasma de Infali Soncó
6 de Dezembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2331: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (12): Um Adeus a Missirá, e um poema de Ruy Cinatti a M. Caetano e M. Soares
14 de Dezembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2349: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (13): Na despedida de Missirá, em que me tornei um Soncó
4 de Janeiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2407: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (14): O falso descanso em Bambadinca
11 de Janeiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2431: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (15): Oficial e cavalheiro em Bambadinca, às ordens de Dona Violete
18 de Janeiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2449: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (16): Aqueles dias cinzentos e nómadas de Bambadinca em Dezembro
25 de Janeiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2480: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (17): Cartas de Bambadinca, Dezembro de 1969
1 de Fevereiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2498: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (18): Operação Punhal Resistente
8 de Fevereiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2513: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (19): O Natal de 1969 em Bambadinca e na Ponte do Rio Udunduma
15 de Fevereiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2540: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (20): A morte de Uam Sambu, na Missão do Sono, em Bambadincazinho
22 de Fevereiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2570: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (21): Em Bissau, em tempo de Vesperax, curando uma depressão
29 de Fevereiro de 2008 >
Guiné 63/74 - P2595: Operação Macaréu à Vista - II PARTE (Beja Santos) (22): Meu amor, vai acabar entre nós este Oceano!
14 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2637: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja
Santos) (23): Buruntoni: um topázio muito pouco valioso
21 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2668: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (24): Cartas de Bambadinca, Janeiro / Fevereiro de 1970
28 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2693: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos (25): A festa do meu casamento, 7 de Fevereiro de 1970
4 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2720: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (26): Cartas de amor e de amizade
11 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2749: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (27): Quando os mortos abrem os olhos aos vivos
18 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2771: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (28): A euforia de comandar cem homens na Op Rinoceronte Temível
27 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2797: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (29): Lá estarei em Bissalanca à tua espera!
5 de Maio de 2008 >
Guiné 63/74 - P2810: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (30): O Xime, sem ferro mas com fogo...
10 de Maio de 2008 >
Guiné 63/74 - P2831: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (31): Tigre Vadio: Um banho de sangue no corredor do Oio
19 de Maio de 2008 >
Guiné 63/74 - P2861: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (32): Operação Pavão Real
30 de Maio de 2008 >
Guiné 63/74 - P2902: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (33): A correspondência epistolar na véspera do meu casamento
15 de Junho de 2008
Guiné 63/74 - P2945: Operação Macaréu à Vista - Parte II (Beja Santos) (34): Presentes de casamento
20 de Junho de 2008 >
Guiné 63/74 - P2968: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (35): Just Married
27 de Junho de 2008 >
Guiné 63/74 - P2990: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (36): Um memorável batuque, em Bissau, na Mãe de Água, em honra da Cristina
6 de Julho de 2008 >
Guiné 63/74 - P3027: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (37): Com baixa psiquiátrica, no Hospital Militar de Bissau
11 de Julho de 2008 >
Guiné 63/74 - P3048: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (38): No HM241, em Bissau, voando sobre um ninho de jagudis
21 de Julho de 2008 >
Guiné 63/74 - P3078: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (39): Adeus, até ao meu regresso
24 de Julho de 2008 >
Guiné 63/74 - P3091: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (40): Operação Beringela Doce: Da cabeça não me sai aquela mulher morta...
8 de Agosto de 2008 >
Guiné 63/74 - P3120: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (41): Um mês nos Nhabijões
5 de Setembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3172: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (42): Cartas de um militar de além-mar em África... (5)
12 de Setembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3195: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (43): Um grande ataque a Demba Taco
19 de Setembro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3218: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (44): Em Bissau, no julgamento de Quebá Sissé
26 de Setembro de 2008
Guiné 63/74 - P3242: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (45): Um almoço tardio com um engenheiro exterminador
3 de Outubro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3266: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (46): Chegou o meu periquito
10 de Outubro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3290: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (47): Cartas de um militar de além-mar em África para aquém em Portugal (6)...
17 de Outubro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3327: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (48): O adeus a Bambadinca
24 de Outubro de 2008 >
Guiné 63/74 - P3349: Operação Macaréu à Vista - II Parte (Beja Santos) (49): Prometo que hei-de voltar