O Toké (em Timor), ou Tokay Gecko. Copyright (c) 1998 Richard Ling/GFDL Fonte: Wikimedia Commons (com a devida vénia...) Vd. aqui áudios com as vocalizações deste pequeno réptil (Wikipedia, em inglês). |
O Rui Chamusco, nosso tabanqueiro nº 886, é professor de música, do ensino secundário, reformado, natural da Malcata, Sabugal, a viver na Lourinhã. Tem-se dedicado de alma e coração a um projeto de solidariedade no longínquo território de Timor-Leste (a 3 dias de viagem, por avião, a cerca de 15 km de distância em limha reta).
É cofundador e líder da ASTIL - Associação dos Amigos Solidários com Timor-Leste. A ASTIL irá construir e inaugurar, em março de 2018, a Escola de São Francisco de Assis (ESFA), nas montanhas de Liquiçá (pré-escolar e 1º ciclo).
Nessa primeira viagem exploratória, foi decidido, pelo Rui Chamusco e pelo Gaspar Sobral, depois de identificadas as necessidades, expetativas e preferências
da população local, construir-se uma escola nas montanhas de Liquiçá, em Manati / Boebau.
Nesta viagem (e estadia de dois meses) , fez-se acompanhar do luso-timorense Gaspar Sobral, outro histórico da ASTIL, que há 38 anos não visitava a sua terra natal. Em Dili eles vão ficar na casa do Eustáquio, irmão (mais novo) do Gaspar Sobral.
Nestas crónicas acompanhamos o dia a dia desta família, que vive no bairro Ailoc Laran, e que durante a ocupação da indonésia viu a sua casa incendiada, tendo-se refugiado nas montanhas como tantos outros timorenses. Ficamos a saber algo mais sobre a história recente de Tim0or Leste.
Dessas crónicas de 2016, sob a forma de diário, decidimos publicar uma boa parte dos apontamentos, dado o interesse documental que nos parece ter para os nossos leitores que, tal como nós, ainda sabem pouco da história, da geografia, da cultura e dos usos e costumes dos nossos amigos e irmãos timorenses. Para além da grande generosidade humana e do talento literário do autor, são crónicas com "cor, sabor e humor", que acrescentam algo mais sobre a sociedade timorense de ontem e de hoje, incluindo pequenas histórias de vida.
Viagem a Timor: maio/julho de 2016 - Parte V:
por Rui Chamusco (*)
- Dia 17 de junh0 de 2016, sexta feira - Levi, o homem da estátua
Conhecer os heróis enquanto vivos é um privilégio. Aquando da visita à igreja de santo António e aos jardins de Motael tivemos a ocasião de tirar umas fotografias junto à grande estátua de homenagem aos combatentes da resistência, situada no largo da baía e Dili.
O monumento é imponente pela sua grandeza e realidade nua e crua: dois jovens, um caído sob os disparos inclementes
da tropa indonésia e outro que carinhosamente o tenta manter consciente para que se lhe possa prestar assistência.
Ambos sobreviveram aos ataques de Dezembro em 1991. Entretanto, Levi foi para Portugal, e em Coimbra licenciou-se em Hotelaria e Turismo e neste momento está integrado na vida ativa de Timor. Hoje teve a gentileza de vir passar grande do dia connosco, em Ailok Laran.
Ambos sobreviveram aos ataques de Dezembro em 1991. Entretanto, Levi foi para Portugal, e em Coimbra licenciou-se em Hotelaria e Turismo e neste momento está integrado na vida ativa de Timor. Hoje teve a gentileza de vir passar grande do dia connosco, em Ailok Laran.
Pelo que me dei conta Levi está empenhado na construção deste país, bem preparado para enfrentar os desafios de presente e de futuro. Muito interessado na consolidação de um novo partido político que amanhã vai realizar um congresso em Dili.
Gosto especialmente da forma como aborda os assuntos: com decisão e sempre pelo caminho da não violência. Pronto para o combate de ideias e de programas que possam fazer de Timor um país melhor.
Este monumento, símbolo da resistência, personifica e homenageia tantos jovens anónimos que, vivos ou mortos, se sacrificaram em prol da independência de Timor e em particular representa os heróis dos acontecimentos de Montael e do Cemitério de Santa Cruz.
Dizem que o monumento devia ser mais explícito, indicando o nome dos heróis. Mas toda a gente é unânime em reconhecer que o jovem em terra é mesmo o Levi. E eu feliz por conhecer e falar com esta história viva…
- Dia 18 de junho de 2016, sábado - A alegria contagiante das crianças
Por mais que se escreva nada nem ninguém conseguirá expressar cabalmente o manancial de virtudes destas crianças: simples como as pombas, alegres como os passarinhos, humildes como os pobres…Sem grandes artefactos para as suas brincadeiras, qualquer coisa lhes serve e despoleta a imaginação. E de repente, num ato de recriação, vejo-me rodeado de meia dúzia de crianças que não param e cuja vivacidade despertam qualquer velho sonolento como eu. Tentam incluir-me na
brincadeira, nem que seja de uma forma passiva. Brincam com o meu cabelo, fazem os penteados que as divertem e uma delas comenta” o Ti Rui tem um cabelo muito bonitu”.
É assim que eu quero continuar a ser, com alma de criança para que possa apreciar e desfrutar da riqueza deste mundo dos pequeninos, que “pula e avança como bola colorida nas mãos duma criança”.
- 19 de Junho de 2016, domingo- “… Somos crianças de Timor, queremos um mundo melhor.”
Faz parte do refrão da canção aprendida pelas crianças das escolas. É que hoje, domingo, realizou-se uma jornada de sensibilização ambiental na praia de Dolok Oan, uma de duas praias com areia branca da região de Dili. Crianças, pais e encarregados de educação, movimento Tasi Mos.
E até o Secretário de Estado do Turismo participou na recolha de lixo na praia... Munidos de sacos pretos depressa os encheram, ficando de novo o areal à disposição dos prevaricadores ambientais.
É de pequenino que se torce o pepino, diz o ditado. Por isso acredito que estas ações tenham uma influência enorme na educação ambiental do presente e do futuro. Mas há tanta coisa a fazer neste país em vias de desenvolvimento. Quanto lixo a recolher, quantas campanhas a fazer, quantas infraestruturas a implantar!
O preço do progresso é muito alto. As agressões e a falta de respeito para com a mãe natureza são enormes. O mundo do plástico invade todos os cantos e recantos das ruas, das ribeiras, das matas, dos mares. Muito tem a fazer o ministério do ambiente e do turismo se quiser preservar este património ambiental de que a natureza é pródiga em Timor. Não estraguemos estas belezas que Deus nos dá…
- 20 de junho de 2016, segunda feira - Finalmente, o número de conta solidária da ASTIL!
Já não era sem tempo. As dificuldades para a abertura de uma conta solidária foram imensas mas finalmente conseguimos o que pretendíamos. O número de conta (IBAN) já pode ser publicado para que as pessoas com vontade de ajudar economicamente o possam fazer com confiança.
Serei eu o titular, com mais três amigos timorenses que fazem parte do projeto. O controle de entradas e saídas passará por mim, tendo os outros titulares necessidade de pelo menos duas assinaturas para qualquer levantamento ou importância. Qualquer donativo ou qualquer despesa constará obrigatoriamente no dossiê do projeto, de modo a poder ser consultado por quem de direito. Tudo será transparente e devidamente documentado. Não queremos ser em qualquer circunstância objeto de desconfiança ou de más intenções.
É um serviço humanitário que pretendemos implementar, com incidência particular na construção de uma escola em zona carenciada nas montanhas de Boebau e num programa de apadrinhamento de crianças e jovens nas zonas mais pobres de Dili.
Muito temos ainda a fazer, mas não desistimos de fazer o bem sem olhar a quem. Ou por outra, olhando para os mais pobres, os que mais necessitam da nossa ajuda. Aceitaremos toda a boa vontade, desde o óvulo da viúva pobre ao donativo mais expressivo de quem mais pode. Que Deus nos ajude!... porque “se o Senhor não construir a casa, em vão trabalharão os seus construtores”.
- 21 de junho de 2016, terça feira -. Informação aos amigos: Projeto de Solidariedade “ Uma Escola em Timor”
Finalmente, hoje posso anunciar que, depois de algumas dificuldades na criação da conta solidária, já temos o número de conta bem como o respetivo IBAN. A partir de agora quem achar por bem poder e querer contribuir para a edificação da escola em Boibau poderá fazê-lo depositando o seu donativo através do
IBAN: TL 38 0020124493691000162
Code: CGDITLDI
(Caixa Geral de Depósitos – Sucursal Timor / BNU Timor).
Por uma questão de confiança aparecerá como primeiro titular o nome de Rui Manuel Fernandes Chamusco, estando associados mais três titulares para a movimentação da conta, com regras impostas pelo sistema bancário internacional. (...)
O dia 7 de Julho estamos de volta. Até lá… Rui e Gaspar (...)
- 23 de junho de 2016, quinta feira - O império do zinco
Dizem que nem sempre foi assim. Mas hoje em dia, quem visita Timor ou por cá permaneça algum tempo, é impossível que não estranhe a quantidade enorme de zinco que impera nas construções. Poucas ou nenhumas casas estarão livres da sua presença, mas é evidente sobretudo nos telhados, barracões, vedações e outras coisas mais. Dá um aspeto de pobreza, de tristeza ( depressa enferruja…) , de abandono.
É uma questão de eficácia e de custos, dizem. O negócio foi introduzido pelos indonésios, que no início era considerado um luxo, e que progressivamente foi alastrando a tudo o que é sítio. Por isso podemos prever que este negócio está para durar, no presente e no futuro, dominado pelo império do zinco e administrado pela raínha da sucata.
Falar a esta gente em telhados com telha de barro ou de outro material é quase uma ofensa porque exclamam logo “é muito caro!”. As pessoas com mais posses, as pessoas ricas optam por telhados tradicionais, feitos com folhas de palapeira (uma espécie de palmeira) e, claro está, com outros materiais acessórios que lhes confere outra categoria em estilo e segurança. Vejam-se por exemplo as construções turísticas. Mas em todo o lado é assim: quem o tem é que o mostra.
No entanto, custa a compreender que sendo Timor Leste um país onde o calor e a humidade tanto se fazem sentir não haja outra alternativa. Estou a pensar nas casas (barracas) normais de timorenses mais pobres e até de classe média, em que as chapas do zinco são a única cobertura, acumulando o calor já de si insuportável em quase todos os dias do ano.
Será que ninguém do Ordenamento Territorial ou dos Diretórios Municipais estará sensível ao problema?
- Trocas e baldrocas… um automóvel por um bicho!
Das primeiras imagens sonoras registadas logo que chegamos a Timor está sem dúvida o “Toké!”, provocado às noites pelo réptil que lhe dá o nome. Este animal muito apreciado em Timor e na Indonésia, tem um valor patrimonial e económico incalculável. Dizem os timorenses que os indonésios chegam a oferecer um automóvel em troca deste querido bicho.
Um negócio apetecível, não fora o governo timorense ter declarado o seu apoio à preservação desta espécie. Mesmo assim, cá como em qualquer parte do mundo, há-de haver sempre uns “fura-tudo” capazes de dar a volta à lei e aos agentes de modo a conseguirem os seus intentos.
Cá por mim prefiro ouvir todas as noites a presença do “Tó…ke! Tó…ke!”, que por tradição traz saúde e felicidade. Uma dádiva da natureza, mais um irmão a acrescentar ao Cântico das Criaturas de Francisco de Assis – Louvado sejas meu Senhor pelo irmão lagarto que todas as noites nos anuncia os seus louvores ao som do “Tó…ke! Tó…ke”, dando-nos o exemplo de sermos agradecidos e confiantes na tua proteção. De Ti, Senhor, é a imagem da harmonia universal e da contemplação das tuas maravilhas…
- Dia 25 de junho de 2016, sábado - Irra! Outra vez?!...
Foi ele, D.Basílio do Nascimento bispo de Baucau e meu ilustre colega de trabalho na Comunidade de Imigrantes em Paris, que propôs o encontro: “dia 25, jantamos em Dili.”
Tudo bem combinado, com contactos diretos de telemóvel, e vai daí que nem um toque de sua parte. Eu bem tentei mas umas vezes estava incomunicável (“o telefone que contactou não está disponível”), outras chamava mas ninguém atendia.
Como até agora ainda não houve qualquer justificação sou levado a concluir que foi mais uma “mentira” do Basílio. Não sei como se irá redimir, mas cá por mim sou capaz de lhe chamar algum nome feio. O que mais nos esperará?...
- Dia 26 de junho de 2016, domingo - Que susto! O que se passa?...
Eram quase seis e trinta da manhã ( hora local ) quando se ouviu um enorme grito e algazarra. Mais parecia um ataque de guerra. De tal maneira que o Gaspar, muito temeroso por situações que estão a acontecer em Timor, até pensou que seria algum ataque de algum grupo.
Felizmente eram os festejos do golo de Portugal no jogo contra a Croácia para o campeonato europeu. Como é possível tão longe sentir tanta afeição por Portugal? É verdade que é raro encontrar alguém timorense que não tenha nome ou sobrenomes portugueses, mas acreditar que laços como o futebol, as canções, os cânticos religiosos tenham tanta força e expressão só vendo para crer…
Bem podemos onfirmar e dizer que se em todas as ex-colónias portuguesas houver tanta afeição Portugal será um país duradoiro porque está no coração destas gentes.
- Mais prazer em dar do que em receber – Quem dá aos pobres empresta a Deus
Quando se entra na casa de gente pobre, eles dão tudo o que têm. Tudo o que nós damos não é nada em comparação com a generosidade deles. Podem não ter dinheiro mas sente-se uma felicidade imensa quando somos integrados nos seus mundos, nos seus corações.
Quem pode ficar indiferente aos sorrisos abertos destas crianças? Ser chamado de irmão, de Ti Rui, de Pai Rui, enaltece-me e alarga a minha família. À semelhança do “Principezinho” de Saint-Exupéry, quando somos cativados por uma amizade sincera não há dificuldades ou obstáculos que quebrem os laços estabelecidos.
Com tanta gente, tantas crianças a querer-nos bem como podemos não ser felizes? E temos o dever de ajudar os outros a serem felizes também. Olho para estas crianças que brincam sem grande soft hard de jogos e dou-me conta que o ter não é mais importante do que o ser. Qualquer coisa, qualquer objeto serve para estimular a imaginação e a alegria do jogo, com algumas regras, mas onde o exercício e o prazer de jogar são bem patentes.
Com tanta gente, tantas crianças a querer-nos bem como podemos não ser felizes? E temos o dever de ajudar os outros a serem felizes também. Olho para estas crianças que brincam sem grande soft hard de jogos e dou-me conta que o ter não é mais importante do que o ser. Qualquer coisa, qualquer objeto serve para estimular a imaginação e a alegria do jogo, com algumas regras, mas onde o exercício e o prazer de jogar são bem patentes.
Talvez seja a velhice já a comandar-me, mas neste contexto apetece-me cantarolar um velho cântico dos meus tempos de mais jovem “ faz-me ser criança entre os irmãos”. Ou então entoar o “ecce quam bonum et quam jucundum” (em portuguªes, "como é bom, como é agradável") pois a simplicidade, a precaridade, a alegria desta gente é tão grande que transborda para os nossos corações. E se é verdade que “pobres e ricos sempre os tereis convosco”, também é verdade que “quem dá aos pobres empresta a Deus”.
Quem quiser acumular pontos para o julgamento definitivo é melhor começar desde já a investir em algo com garantia de sucesso. E, que se saiba, vamos todos acabar pobres. Pouco ou nada nos deixarão levar. Sejamos, portanto, sábios e prudentes, para fazermos das nossas vidas algo interessante que sirva para a construção de um mundo melhor e que nos dê a certeza de que valeu a pena passarmos por cá, rumo à pátria definitiva.
Hoje o Gaspar e o irmão Eustáquio foram até à montanha Boebau/Manati e chegaram carregados de muitas histórias e de uma espada, património da família materna, utilizada pelo seu bisavô (que foi liurai, régulo). Teve ocasião de ouvir e gravar os seus ascendentes e o ritual anual que está associado a este objeto ( espada).
- Que história tão rica, a da família Sobral
Hoje o Gaspar e o irmão Eustáquio foram até à montanha Boebau/Manati e chegaram carregados de muitas histórias e de uma espada, património da família materna, utilizada pelo seu bisavô (que foi liurai, régulo). Teve ocasião de ouvir e gravar os seus ascendentes e o ritual anual que está associado a este objeto ( espada).
Segundo o relato esta espada matou quatro pessoas nas lutas dos “manuhatis” e data dos anos 1700 e qualquer coisa. Tem sido guardada religiosamente pela família e, todos os anos por altura do ano novo, é celebrado o ritual que consiste em colocar a espada em cima de uma mesa e sobre a folha metálica, são colocados quatro pequenos montinhos constituídos por arroz e carne que são exorcizados pelo chefe de família, pedindo que as culpas das suas mortes não recaiam sobre ninguém da família. Todo o material comestível é em seguida atirado para fora (não é consumido).
Tudo isto se vem arrastando através de várias gerações. E perante a queixa de que não haveria quem pudesse continuar com esta tradição, o Gaspar aceitou ser ele o continuador deste ancestral costume. Não sei é como ele irá proceder porque trouxe a espada consigo e afirma que vai levá-la para Portugal.
Entendam-se, é o que eu mais lhes desejo. Esta “guerra” não é minha. Mas a mim faz-me confusão.
Já há muito tempo que não sentia o Gaspar com tanto medo. E aqui estão as contradições do meu amigo. Fala sem medo, diz o que ele acha que está certo (e para ele é o que deve seguir), argumenta com razões válidas ainda que para isso tenha de repetir mil e uma vezes a mesma coisa, faz críticas a quem acha que deve fazer, etc…,etc…
Mas bem lá no fundo ele tem medo de assumir funções, tem receio de viajar em determinados sítios, desconfia de movimentações controladas pelo poder. Está confuso em engajar-se neste contexto e pensa que o melhor é regressar a Portugal onde livremente poderá exercer a sua crítica. Estará ele a ser sensato e prudente em querer armar-se de “o salvador da Pátria”?
Entendam-se, é o que eu mais lhes desejo. Esta “guerra” não é minha. Mas a mim faz-me confusão.
- Quem tem cú tem medo!...
Já há muito tempo que não sentia o Gaspar com tanto medo. E aqui estão as contradições do meu amigo. Fala sem medo, diz o que ele acha que está certo (e para ele é o que deve seguir), argumenta com razões válidas ainda que para isso tenha de repetir mil e uma vezes a mesma coisa, faz críticas a quem acha que deve fazer, etc…,etc…
Mas bem lá no fundo ele tem medo de assumir funções, tem receio de viajar em determinados sítios, desconfia de movimentações controladas pelo poder. Está confuso em engajar-se neste contexto e pensa que o melhor é regressar a Portugal onde livremente poderá exercer a sua crítica. Estará ele a ser sensato e prudente em querer armar-se de “o salvador da Pátria”?
Sei que o amigo Carlos Almeida antes de partirmos lhe disse “ Não te esqueças que deixas uma mulher e uma filha em Portugal|…” Por mim também já foi repreendido algumas vezes, mas o dom da palavra dele tenta sempre vencer-me. Agora aparece alguém, o amigo Levi, que lhe conta coisas em que acredita, e estou a sentir-lhe um nervoso miudinho, com sinais de medo. Mais vale prevenir que remediar, lhe digo eu.
Vamos a ver em que alhadas se mete. E estou a lembrar-me da quadra do poeta Aleixo que deve ser lema para toda a gente: “Para não fazeres ofensa / E teres dias felizes / Não digas tudo o que pensas / Mas pensa tudo o que dizes.”
Juizinho, “pacaça”. Depois não digas que ninguém te avisou… Aliás o Gaspar, ele próprio, tem de vez em quando levos de alguma humildade comentando connosco que é uma pessoa fraca, que não consegue envolver-se neste pequeno mundo de “mafias controladas”.
Juizinho, “pacaça”. Depois não digas que ninguém te avisou… Aliás o Gaspar, ele próprio, tem de vez em quando levos de alguma humildade comentando connosco que é uma pessoa fraca, que não consegue envolver-se neste pequeno mundo de “mafias controladas”.
Assume que não tem estrutura física nem psíquica para enfrentar este mundo adverso. Em conclusão, vamos ter o Gaspar a lutar como o tem feito até agora pelo desenvolvimento deste país ( e não esqueçamos que ele foi dos primeiros e dos que mais se empenharam na diáspora pela libertação e independência de Timor ) com a pena, caneta, computador, redes sociais, etc… dizendo o que está bem e o que está mal neste país com já 14 anos de independência e que, em muitos campos tanto há a fazer.
Aqui, como em muitos mais países, um dos temas de que mais se fala é da corrupção. Mas fala-se baixinho que as paredes têm ouvidos… e “quem tem cú tem medo!...”
Este é um problema delicado, com difícil resolução. Depois de 14 anos de independência, onde já muito se fez mas muito mais há para fazer, a situação dos veteranos da guerra está a preocupar (a revoltar) boa parte da povoação.
Aqui, como em muitos mais países, um dos temas de que mais se fala é da corrupção. Mas fala-se baixinho que as paredes têm ouvidos… e “quem tem cú tem medo!...”
- Questões de justiça - Os veteranos da resistência
Este é um problema delicado, com difícil resolução. Depois de 14 anos de independência, onde já muito se fez mas muito mais há para fazer, a situação dos veteranos da guerra está a preocupar (a revoltar) boa parte da povoação.
Uns conseguiram arranjar lugar na administração territorial, encaixaram-se na estrutura estatal com trabalho bem remunerado, cujo salário contrasta com a grande maioria do trabalhador timorense: presidentes, deputados, ministros, assessores, secretários uma legião de “gente boa” ocupando lugares de relevo; outros esquecidos e abandonados à sua sorte, sem qualquer ajuda económica, a lamentarem-se do suor e sangue derramado nas batalhas, da esperança depositada em líderes e programas políticos, da condução e orientação deste país. Promove-se quem pouco ou nada fez; esquecem-se os heróis que arriscaram a vida.
O Painô, jovem dinâmico e com alguma influência no seu meio, conseguiu gravar através de um processo não muito ortodoxo, o testemunho de um ex-combatente, que reproduzo com palavras textuais: ” um caralho! Alguns em vez de combater andaram a roubar bananas e agora recebem pensões e são condecorados. Um caralho!...”
O Painô, jovem dinâmico e com alguma influência no seu meio, conseguiu gravar através de um processo não muito ortodoxo, o testemunho de um ex-combatente, que reproduzo com palavras textuais: ” um caralho! Alguns em vez de combater andaram a roubar bananas e agora recebem pensões e são condecorados. Um caralho!...”
Pois é, quando a verdade vem ao de cimo mais não resta que a revolta.
O Vitor, que foi comandante na guerrilha, é um dos habitantes de Ailoc Laran. Homem por volta dos 70 anos, tem uma grande família, ainda com crianças. Queixa-se, mas não se revolta, da injustiça a que são votados os veteranos da guerra. Prefere não receber nada que sujeitar-se a uma pensão de miséria. É uma questão de dignidade: andar direito na vida, ( e juro-vos que ele fisicamente anda direitinho) sem ter que humilhar-nos perante os poderosos.
Mas até quando se aguentará esta situação perigosa? Será que o tempo apagará esta mágoa, esta injustiça? Até onde chegarão os clamores dos pobres?!...
O Vitor, que foi comandante na guerrilha, é um dos habitantes de Ailoc Laran. Homem por volta dos 70 anos, tem uma grande família, ainda com crianças. Queixa-se, mas não se revolta, da injustiça a que são votados os veteranos da guerra. Prefere não receber nada que sujeitar-se a uma pensão de miséria. É uma questão de dignidade: andar direito na vida, ( e juro-vos que ele fisicamente anda direitinho) sem ter que humilhar-nos perante os poderosos.
Mas até quando se aguentará esta situação perigosa? Será que o tempo apagará esta mágoa, esta injustiça? Até onde chegarão os clamores dos pobres?!...
(Revisão / fixação de texto: LG)
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Nota do editor;