quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7437: Parabéns a você (188): Francisco Santos, 68, Montijo; Sousa de Castro, 60, Viana do Castelo



1. A quinze de Dezembro fazem anos cá na nossa Tabanca Grande dois camarigos: (i) o Sousa de Castro, que entra hoje para o Clube dos SEXA, ao perfazer os 60 (*); e (ii) o Francisco Santos, que completa 68 [, foto à direita].


 Estamos perante dois camarigos que, em relação ao tempo da guerra da Guiné, estão um no princípio  ou quase no princípio (Francisco Santos, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista, da CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) e outro no fim ou quase no fim (Sousa de Castro, camarada também das transmissões).


O Francisco, motorista reformado,  faz parte dos órgãos directivos Academia Musical União e Trabalho, de Sarilhos Grandes, com sede em Sarilhos Grandes, Montijo, donde é natural...E, conforme já nos confessou e mostrou, tem o bichinho da poesia popular. (**)... Em sua honra, aqui vai um belo passodoble, tocado numa igreja pela banda filarmónica da sua Academia,  cuja criação remonta a 1898 (A fonte do vídeo é o You Tube onde se encontra tudo como na farmácia).


Sobre a sua companhia, na Guiné, a CCAÇ 557, já temos cerca de duas dezenas de referências no nosso blogue. A ela pertenceram o José Colaço, o médico  Dr Rogério da Silva Leitão (que infelizmente a morte levou este ano) bem como o conhecido advogado, o ex-Alf Mil José Augusto Rocha... Não tenho tido notícias do Francisco, mas espero que esteja bem de saúde.

O Sousa de Castro, esse, também não precisa de apresentação... É o nosso tabanqueiro mais antigo, o nosso tertuliano nº 2, tendo trazido muita gente para o nosso convívio... [Aqui, na foto, à esquerda, na Tabanca de Matosinhos, em 21 de Julho passado, com a esposa Conceição; estivémos junto igualmente no nosso V Encontro Anual, em Monte Real, em 26 de Junho passado]... 


1º Cabo Radiotelegrafista da CART 3494/BART 3873, esteve na zona leste, no Sector L1 (tal como eu), mais exaxtamente em Xime e Mansambo, dois sítios que eu bem conheci, entre finais de 1971 e Março de 1974. 


Minhoto, foi técnico fabril nos Estaleiros Navais de Viana do Castelo, estando hoje reformado. Criou e mantém o blogue da CART 3494, desde Maio de 2008. Vive perto de Viana do Castelo. Para o Xico, dir-lhe-ei que na vida não há limites de velocidade... 68, 69, 70 e por aí fora,  até aos 100, é sempre a carregar no pedal...Que a vida é uma festa, e que os poetas têm o dever de celebrá-la!


A ambos, eu desejo, em meu nome pessoal e de toda Tabanca Grande, o melhor do mundo para as suas vidas e para a sua família. Parabéns por este dia. (***) E muito obrigado por continuarem... connosco! Ao Sousa de Castro, em especial, dou-lhe as boas vindas por entrar, de jure et de facto, no Clube de Suas Excelências (abreviadamente, Clube dos SEXAS)... Para tudo, é preciso idade, sabedoria e paciência...

Parafraseando o nosso poeta popular, de Sarilhos Grandes, eu formulo o voto de que, tal como a valente CCAÇ 557, ou a valorosa CART 3494, uma que andou na guerra da Ilha do Como, e outra na guerra do Xime, continuemos a ser grandes camarigos na nossa Tabanca Grande e na nossa amada Pátria em que hoje os tiros, as minas, as armadilhas, os perigos são outros...

Sejamos grandes camaradas
Nestas terras promissoras,
Mesmo com as morteiradas
E o som das metralhadoras...


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Notas de L.G.:

(*) 15 de Dezembro de 2009 >Guiné 63/74 - P5468: Parabéns a você (52): O segredo do Sousa de Castro, um velhinho da Tabanca Grande (Luís Graça)


(**) 15 de Dezembro de 2009

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7436: Recortes de Imprensa (37): Heróis do mar, de Joaquim Magalhães de Castro em Fugas/Público (Joaquim Mexia Alves)

1. Em mensagem do nosso camarigo Joaquim Mexia Alves*, ex-Alf Mil Op Esp/Ranger da CART 3492, (Xitole/Ponte dos Fulas); Pel Caç Nat 52, (Ponte Rio Udunduma, Mato Cão) e CCAÇ 15 (Mansoa), 1971/73, com data de 13 de Dezembro de 2010:

Caros camarigos:

Somos,  muitas vezes, muito lestos a dizer mal de nós próprios e sobretudo da nossa saga marítima e da nossa presença pelo mundo fora.

E depois... depois somos surpreendidos, porque afinal não fomos a maldade, (o que não quer dizer que não tivéssemos feito algumas), quando acontecem factos com os descritos no artigo em anexo.

Vemo-nos chegar a tantos sítios por onde andámos e sermos recebidos de braços abertos, mas insistimos sempre, (alguns de nós Portugueses), em fazer da nossa História um rol de de malvadez e ignomínia.

Ao fim de tantos anos, de tantas centenas de anos, pelos vistos na maior parte dos casos, para as populações, verdadeiramente populações, desses países, ainda somos uma boa recordação, uma boa referência.

Fica ao vosso dispôr para publicação se assim o entenderem.

Um abraço forte e camarigo do
Joaquim

Um Português sem dúvidas em o ser!


Navio-Escola Sagres > Foto da Marinha Portuguesa, com a devida vénia


Vd. o sítio RTP > Sagres para acompanhar a 3ª viagem de circum-navegação da Sagres que termina em Lisboa a 23 de Dezembro de 2010, 11 meses depois.


O plano detalhado da viagem de 2010 pode ser consultado no sítio da Marinha > Sagres


Recorte do suplemento Fugas do Jornal Público
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 10 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7418: Memória dos lugares (115): As colunas logísticas ao Xitole e Saltinho no tempo do Paulo Santiago (1970/72) e do Joaquim Mexia Alves (1971/73)

Vd. último poste da série de 8 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7403: Recortes de Imprensa (36): Gandembel/Balana, com o Hugo Guerra (Pel Caç Nat 55) e o João Barge (CCAÇ 2317)

Guiné 63/74 - P7435: Os Nossos Seres, Saberes e Lazeres (26): Siga a Marinha (Torcato Mendonça)

1. Mensagem de Torcato Mendonça* (ex-Alf Mil da CART 2339 (Mansambo, 1968/69), com data de 12 de Dezembro de 2010:

Editores Camarigos
Neste dia e país cinzento e frio, veio a reportagem do Luís mostrar ventos de esperança passados.

A Marinha**, o mar que falas deu-me que pensar. Não posso e não devo estar muito tempo sem ver e sentir o mar. Nasci a uma centena de metros dele. Habito, algum tempo por ano com essa paisagem que envio. Noutra, nas outras que igualmente seguem.

Descansava, na Costa Alentejana, em pleno inverno a ver, de dentro do carro ou caminhando pelas falésia, a ver o mar revolto. Assim me aclimatei, meditei e, em parte, me encontrei para voltar a enfrentar a vida civil.

Descia, em certas noites ao Algarve e o carro, qual cavalo amestrado, trazia-me de regresso, manhã cedo a casa. Mesmo cá, anos depois, "atava-o" e esquecia-me onde. Tempos de adaptação, tempos longos, demasiado longos.

Que tem isto a ver com com o blogue? Só porque no comentário ao belo escrito do Luís Graça saí das regras. Vendo bem, talvez não.

Tenho o direito de não gostar dos ingleses, de discordar com Berlim e a Convenção Colonialista que esventrou todo um Continente. Pior, bem pior, criou, anos depois aquando das ditas independências, pequenos déspotas ou ditadores uns já desaparecidos, outros em corruptos poderes.
Lastimo que alguns aqui, neste nosso País, se tenham acoitado. Outros aqui são elegantemente recebidos e seus lacaios têm as honras a serem principescamente adulados... os dólares. Não só. A falta de vergonha ou remorso estúpidos. De tudo um pouco e o lusitano porreirismo.

Curiosamente a nossa colonização foi mais suave. Sempre má evidentemente. Séculos de exploração, gastos em deboche e por outros.

A questão do dito "Mapa Cor de Rosa" é uma utopia bacoca. Contudo não merecia o tratamento que teve. Tempos que havia mais união entre nós. Seria assim? Hoje nesta sociedade de clique e informação instantânea não me parece haver essa união.
Vejam a hipocrisia da revelação de certos segredos... e tomam-se medidas repressivas contra as denuncias? Mas o denunciado está correcto? Claro que prefiro viver na Europa... do que em certas democracias ou mesmo em estados mandantes deste mundo. Porca vida ou vice-versa.

Tentarei ir ver essa exposição... por mim, a Marinha, a nossa sempre me orgulhou.

Não sou Patrioteiro... eiros ou otas, não obrigado

Fui deslizando e certamente não vão ler, até porque saí do tema. É do tempo e da idade.

Abraços do Torcato

Old Seaman

My life Sea or Landscape

Gardunha Rainbow

Gardunha Winter
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7407: (Ex)citações (118): O ventre da guerra na zona leste (Luís Graça / Torcato Mendonça / Carlos Marques Santos)

(**) Vd. poste de 12 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7423: Agenda Cultural (94): A exposição A Marinha na República, Museu da Marinha, em Lisboa, Belém, até ao dia 5 de Janeiro de 2011 (Luís Graça)

Vd. último poste da série de 12 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7424: Os Nossos Seres, Saberes e Lazeres (25): Segunda parte do filme do meu tempo de tropa (Alcides Silva)

Guiné 63/74 - P7434: Agenda cultural (95): Os anos da guerra colonial, de Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes: hoje, 3ª feira, às 18h30, no Corte Inglês Gaia Porto


OS ANOS DA GUERRA COLONIAL
Sessão de Lançamento >  Convite

A editora QuidNovi, os autores Aniceto Afonso e Carlos Matos Gomes e o El Corte Inglés Gaia Porto têm o prazer de o(a) convidar para a sessão de apresentação do livro Os Anos da Guerra Colonial que ocorrerá no próximo dia 14 de Dezembro, 3ª feira, às 18:30h, na Sala de Âmbito Cultural, piso 6, do El Corte Inglés Gaia Porto (Av. da República, 1435, V.N. de Gaia).

A apresentação da obra estará a cargo do coronel David Martelo.

A nossa editora fez um levantamento sobre os blogs militares relacionados com este tema. Gostaríamos de o convidar a estar presente nesta sessão de lançamento e contamos coma a sua ajuda para a divulgação deste evento. (...)

Para qualquer questão ou pedido deverão ser utilizados os contactos indicados na nota de imprensa.

Com os melhores cumprimentos e devidos agradecimentos,

Miguel Gonçalves
Editor Adjunto
QUIDNOVI
QN - Edição e Conteúdos S.A.
Praceta D. Nuno Álvares Pereira, 20 - 3ºCJ
4450-218 Matosinhos - Portugal
tel/fax: +351 22 938 81 55

Guiné 63/74 - P7433: Facebook...ando (3): Uma dramática ida de Buba a Gandembel (Raul Brás, ex-Sold Cond Auto, CCAÇ 2381, Buba, 1968/70)



Guiné > Região de Tombali > Aldeia Formosa < CCAÇ 2381 (1968/70> Viatura Unimog 411, mais conhecida por burrinho, destruída por mina A/C na estrada Aldeia Formosa - Gandembel. "A fotografia é de autoria do camarada Estorninho, é ele que está na foto, e foi tirada em Aldeia Formosa... Dá para ver o estado em que ficou a viatura, mas não o cansaço que tínhamos, mal dormidos, comida tinha sido uma ração de combate para cada homem, devido ao percurso ser curto. Mesmo com as coisas a correr do pior,  nada ficou para trás" (R.B.).


Foto: © Arménio Estorninho (2010). Todos os direitos reservados



1. Mensagem do Raul Brás, ex-Soldado Condutor Auto da CCAÇ 2381, “Os Maiorais”, que esteve em Buba, Quebo, Mampatá Empada nos anos de 1968/70 (*). O Raul, que é nosso camarigo, tem também conta no Facebook. É daí que retiramos, com a devida vénia, o relato que ele faz de uma dramática coluna a Gandembel, em finais de Julho de 1968.


Uma coluna de Buba a Gandembel

Parti de Buba, dia 25 de Julho de 1968, pelas 6 horas da manhã, com destino a Aldeia Formosa, eram apenas 30 quilómetros, mas (…) no primeiro dia apenas se conseguiu fazer 12 quilómetros, ao pôr-do-sol, aconteceu o pior…  Durante a coluna já se tinham detectado algumas minas anticarro, [foi preciso montar e desmontar o pontão móvel, devido aos pontões destruídos]. 


A última mina  não foi detectada e rebentou no Unimog que transportava as Transmissões. O Operador de Rádio, duas horas depois,  já não se encontrava no mundo dos vivos, o Unimog ficou como apresenta a foto (acima), que é de autoria do camarada Estorninho.

Aí pernoitámos, fez-se dia, viaturas em movimento, 30 minutos depois cai o flanco direito numa emboscada, o inimigo vem à retaguarda atacar a cauda da coluna. Comunicações não havia, desde que tinha acontecido o pior.

Pelas 10 horas da manhã passaram os Fiat mas,  por acaso, até esse momento ninguém tinha conhecimento de tal coluna. Aí com o rádio Banana, consegue-se entrar em contacto. Meia hora depois aparecem os bombardeiros T6.

Chegou-se pela noite a Aldeia Formosa. Dia 28,  então, a coluna vai a Gandembel. Os nossos comandantes de pelotão reuniram cada um com o seu grupo de combate, e aí nos transmitiram  todos os cuidados que tínhamos que ter em todo o percurso, intervalo uns dos outros o maior possível, no caso de haver emboscada, deitar-se no chão o mais rápido possível, aí ficar no mesmo sítio alguns segundos, e depois rastejar até um abrigo que nos desse mais confiança, para não acontecer o mesmo que tinha acontecido um mês antes (…). 


Noutra coluna, antes da minha, tinham as nossas tropas caído numa emboscada, ficaram lá 13 camaradas. Fornilhos eram pelo menos 16. Um Unimog dos pequenos cabia lá à vontade, num dos buracos. A perna de um camarada encontrava-se em cima das árvores, o corpo de outro camarada encontrava-se no meio da mata, só mais tarde, com a continuação das colunas, é que foi retirado, apenas em esqueleto, e com as cartucheiras à cintura. Foi o camarada Caliça, da 2381, os Maiorais, que o foi retirar. E era assim Gandembel. E quantos Gandembéis nós não conhecemos por essa Guiné fora ?! (***)


Um abraço a todos
Raul Brás
_________________


Notas de L.G.:


(*) Vd. poste de 13 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5806: Tabanca Grande (202): Raul Rolo Brás, ex-Sold Cond Auto da CCAÇ 2381 “Os Maiorais”, Buba/Quebo/Mampatá/Empada, 1968/70


(**) Vd.poste de 2 de Dezembro de 2010 >Guiné 63/74 - P7369: As minhas memórias da guerra (Arménio Estorninho) (19): Factos mais importantes da CCAÇ 2381 no Subsector de Aldeia Formosa


(...) Aldeia Formosa > Factos mais importantes relacionados com as actividades desenvolvidas pela CCaç 2381 no Subsector de Aldeia Formosa e a actividade do IN, no período que mediou de 18 de Julho de 1968 a 21 de Janeiro de 1969. (...)


Ano de 1968
Julho
Dias 25/26



(...) 2 Gr Comb  seguiram em coluna auto de Buba para Aldeia Formosa, a fim de assumirem imediatamente o Comando dos Destacamentos da Chamarra e Mampatá.  Durante a coluna, feita pela antiga estrada Buba – Sinchã Cherno – Bolola – Missirã –Ieroiel – Mampatá – Aldeia Formosa, há vários meses não patrulhada nem utilizada pelas NT, foram detectadas e levantadas 9 minas A/C, e, sofreram as NT 2 emboscadas, que causaram 3 feridos às nossas forças. Foi deflagrada uma mina A/C por uma viatura causando a sua parcial destruição, 1 morto e três feridos ligeiros às NT.

Saliente-se o esforço despendido nesta coluna pelas nossas forças, que durou 36 horas para se vencerem escassos 30Kms. Foram encontrados todos os pontões destruídos (7 pontões!!!), tendo que se montar por todas as vezes o pontão móvel que seguia na coluna. 4 das minas detectadas como se apresentavam com dispositivo de anti-levantamento tiveram que ser destruídas. 



Numa estrada estreita que permitia a custo a passagem de uma viatura pesada, piorou com os buracos resultantes das minas deflagradas, tendo-se que se abrir passagem através da mata com o consequente esforço e dispêndio de energias. 


Salienta-se também o facto de na coluna seguirem 3 obuses de 14cm com aproximadamente 7 toneladas cada, que atascaram diversas vezes, atrasando bastante a coluna. Apesar de tudo, a distância foi vencida sem nunca o moral das NT ter decrescido, nem aquando do rebentamento de 1 mina ter causado um morto e privado de comunicações, pois a viatura destruída era precisamente a das Transmissões. (...)


Vd. também O meu diário (José Teixeira, CCAÇ 2381), publicado na I Série do blogue:


1 Janeiro 2006 > Guiné 63/74 - CDXI: O meu diário (José Teixeira, CCAÇ 2381) (2): Buba/Aldeia Formosa, Julho de 1968 


(...) Buba/Aldeia Formosa, 24-26 de Julho de 1968

Comecei a Guerra. Saí de Buba dia vinte e quatro, às seis da manhã, e cheguei a Aldeia Formosa dia vinte e cinco, às vinte e uma, depois de durante dois dias batalhar com o IN, com o tempo e ultrapassar outras dificuldades.

A estrada (picada) está num estado lastimoso: buracos de minas, pontes destruídas e outros obstáculos que a muito custo se venceram. Os primeiros sete quilómetros foram percorridos em oito horas e meia.

O primeiro ataque foi de abelhas. Eram tantas que mais pareciam uma pequena nuvem e era ver quem mais corria a fugir da sua picada. Eu fiquei quedo como um penedo sentado na berma, entre os arbustos, a conselho de um africano que estava a meu lado e não sofri uma picada. Assustado e perturbado pelo zumbido à minha volta e pela côr que o meu corpo foi tomando na medida em que se fixavam à minha roupa, na cara e na cabeça. Neste estado pude apreciar a confusão de uma fuga precipitada, um tanto hilariante. Se o IN tivesse atacado nesse momento era um desastre total, tal foi a desorganização gerada.

Depois... veio aquela mina roubar mais uma vida e pôr duas em perigo... Inimigo cobarde !... Frente a frente não consegue atingir os seus objectivos e ataca à traição, num pequeno descuido dos picadores.

Que culpa terá aquele jovem que me morreu nas mãos, que os homens não se amem ? Que culpa tenho eu ?

A noite começou mais cedo neste negro dia de vinte e quatro de Julho! Esta vida salvava-se, mas um mal nunca vem só. A viatura atingida era o carro do rádio e consequentemente desde aquela hora (16 h) ficamos completamente isolados do resto do mundo. O ferido mais grave e que veio a falecer era o radiotelegrafista. Isto é guerra...

Quando nos dispúnhamos a montar acampamento o radiotelegrafista morreu. Com o impacte do rebentamento tinha ido ao ar e caiu de peito, rebentando por dentro. Eu e o Catarino nada pudemos fazer.

Esperávamos que o IN atacasse de noite pois tinha sido detectado pela aviação durante o dia. Felizmente durante a noite não houve surpresas e eu, entregue totalmente ao ferido que sobrou para mim, o condutor da viatura sinistrada, um pouco mais conformado recomecei, melhor recomeçámos a marcha com toda a cautela, pois no dia anterior, além da mina que rebentou, foram localizadas mais três.

Para alimentação deste dia não tínhamos nada. A ração de combate mal chegou para o primeiro dia. À frente havia IN, "manga dele", havia buracos, pontes interrompidas. Havia minas, só não havia comida.

Ainda não tínhamos percorrido três quilómetros, quando caímos na primeira emboscada. Dois bigrupos esperavam-nos. Felizmente a Milícia que protegia os flancos, descobriu-os e, sem compaixão, todas as máquinas de guerra funcionaram. O meio e a rectaguarda da coluna embrenhados no mato aguardavam prontos a intervir o que não foi necessário. Quinhentos metros à frente é a vez da retaguarda ser flagelada e obrigar o soldado português a mostrar as suas capacidades de luta. Deste segundo encontro há registar dois feridos.

A coluna recompôs-se e continuou a sua marcha de 30 viaturas carregadas de mantimentos e armamento (três obuses 14, entre outro material). A meio da manhã chegaram os Fiat. Com a aviação sentimo-nos mais seguros e confiantes. Os feridos foram evacuados de heli. Uma coluna que normalmente se faz em oito horas, demorou dois dias.

Agora que sinto o barulho do matraquear das armas, que sinto o silvar das balas assassinas sobre a minha cabeça, começo a sentir um tremendo ódio a tudo o que seja guerra. Sim. Odeio os homens que, em vez de se amarem, se guerreiam. Que culpa tenho eu que os homens não vivam o amor ?

Quando abriu a emboscada escondi-me debaixo de uma viatura e senti bem perto as balas a assobiarem, pois um IN estava em cima de uma palmeira à minha frente, a fazer fogo. Ainda tentei usar a arma que tinha comigo, mas esta encravou à primeira tentativa e ainda bem. Fui apenas um espectador.

Que eu jamais faça guerra... Que eu ame sempre. (...)



(***) Último poste da série >  4 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7377: Facebook...ando (2): Duas fotos do Durval Faria, Nossa Senhora do Rosário, Lagoa, São Miguel, RA Açores, que pertenceu à CCAÇ Esp 274 / BCAÇ 356, CTIG, 1962/64

Guiné 63/74 - P7432: Estórias avulsas (45): Reabertura da picada Galomaro-Duas Fontes-Saltinho (António Tavares)

Galomaro > António Tavares no Gabinete de Reabastecimentos do BCaç 2912


1. Mensagem de António Tavares* (ex-Fur Mil da CCS/BCAÇ 2912, Galomaro, 1970/72), com data de 12 de Dezembro de 2010:

Caro Vinhal,
A picada para o Saltinho via Galomaro-Duas Fontes tinha sido abandonada pelo BCaç 2851 após vários problemas criados pelo terreno e o INIMIGO.

O BCaç 2912 reabriu a picada (era a bandeira dos nossos Comandos) e após os trabalhos possíveis chegou o dia da coluna de reabastecimentos à CCaç 2701 que foi um fracasso total com viaturas civis e militares atoladas, viradas, feridos, mantimentos roubados, inutilizados... um caos em custos materiais e monetários que felizmente não se traduziu em perdas humanas nem contacto com o IN.

Foi a primeira e última coluna de reabastecimentos, pelo BCaç 2912, nesta picada, que eu, o Sargento de Reabastecimentos, felizmente não participei naquela aventura.

Esta picada foi "utilizada" pelo BCaç 2851, BCaç 2912, BCaç 3872, e por todos teve de ser abandonada.
Os reabastecimentos continuaram pelo difícil triângulo Bambadinca-Xitole-Saltinho.


Em Galomaro (1970/72), trabalhei bastante com a logística desta coluna comandada pelo Alf Mil Reabastecimentos, Jesus, do BCaç 2912, dada a importância do acontecimento e reabertura desta picada para o COSSÉ …tinha que se dar pompa.

As viaturas civis eram alugadas em Galomaro, duas a Francisco A Regala, e Bafatá. Havia recomendações do COMCHEFE para o aluguer da viatura de um Guinéu que tinha perdido outra viatura numa emboscada entre Bafatá e Nova Lamego.

As viaturas eram pagas ao quilómetro, que para o mesmo percurso variavam, isto é, o percurso, por exemplo, entre GALOMARO-BAMBADINCA podia ser pago ao custo (?) no total de 40 ou 50Kms, cada viagem, conforme a aprovação do COMCHEFE em Bissau.

Reclamações não faltavam dos camionistas! Nos casos mais aberrantes reclamávamos ao COMCHEFE justificando as distâncias pelos mapas cartográficos mas quase sempre em vão!

Coitados, tinham de aceitar de cara alegre as incongruências da tropa!

Quem estava nos Comandos em Bissau é que “sabia”, ”sentia”, ”gozava” os dissabores das tropas nas matas.

Brincávamos com o Alf Mil Jesus, dizendo-lhe que tinha sido ele a dar azar porquanto pela sua primeira viagem a comandar uma coluna de reabastecimentos, JESUS não tinha dado a bênção ao Jesus para levar tudo em condições a bom porto, leia-se CCaç 2701, no Saltinho.

HERÓIS, desta teimosia (todos sabiam as adversidades para vencer aquele terreno) dos Comandos na reabertura da picada, foram os HOMENS do BCAÇ 2912 que trabalharam com abnegação na reconstrução da picada, mas o recompensado… o Comandante do Batalhão que foi louvado pelo COMCHEFE.

Pessoal da Secção de Reabastecimentos. Da esquerda para a direita: Soldado Condutor Auto Matias, 1.º Cabo Castiço, Fur Mil Tavares, Alf Mil Jesus e Major Sousa Teles, 2.º Comandante do Batalhão.

Um abraço
António Tavares
ex-Fur Mil SAM
Foz do Douro
11 de Dezembro de 2010
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 13 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7278: Estórias avulsas (99): Flora e Fauna de Galomaro (António Tavares)

Vd. último poste da série de 30 de Outubro de 2010 > Guiné 63/74 - P7193: Estórias avulsas (98): Memórias de uma noite terrível em Canquelifá – 1971 (Francisco Palma)

Guiné 63/74 - P7431: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (35): Maravilhas do blogue... 36 anos depois (Nelson Herbert/Magalhães Ribeiro)


1. O nosso Amigo e Jornalista da Voz da América (VOA), Nelson Herbert (foto à esquerda), que acompanhou atentamente a série “Cerimónia da transição da soberania nacional na Guiné”, recentemente lançada nos postes P7388, P7393, 7400 e 7404, tendo prestado, a meu pedido pessoal, a sua melhor e imediata colaboração na identificação correcta das pessoas que aparecem em algumas das fotos, trocou comigo algumas profícuas e interessantes mensagens e, numa delas, dizia o Nelson a propósito da referida identificação: “Todas as faces da foto em questão, as três primeiras pessoas pertencem a uma mesma família mestiça... a família Sá, com profundas raízes em Mansoa...“.
36 anos depois

Logo que li o apelido da família “Sá”, fiquei espantado, pois o único homem do PAIGC com quem eu contactei e travei amizade em Mansoa, algures nos fins do mês de Agosto de 1974, e até tenho uma foto com ele, tinha como apelido Sá. 

“É demasiada coincidência” - pensei eu.
Nessa altura, por incrível que pareça, eu, um Operações Especiais, estava a substituir o vagomestre da companhia (que havia sido evacuado para a Madeira, de onde era natural, devido a doença hepática), quando um dia me bateu na porta um homem mulato e, fazendo a continência, pediu-me licença para entrar e falar comigo.
Olhei melhor para ele e para a farda e vi logo que das NT, ele não era!
Estendeu-me a mão cumprimentando-me efusiva e respeitosamente como se me conhecesse há uns anos, seguindo-se, mais palavra menos palavra, o seguinte diálogo:
- Bom dia, chamo-me Antero Sá e sou um comandantes operacionais do PAIGC, que actuava aqui na zona de Mansoa, em idos tempos de guerra.
- Ai sim? – disse eu, expectante.
Como eu ia começar a fumar ofereci-lhe um dos meus cigarros, que ele aceitou, agradecendo.
- Se achas bom, leva o resto do maço de tabaco (... SG ventil, devia ter uns 5/6 cigarros).
Voltou a agradecer e o modo respeitador, educado e de admiração, como ele aceitou os cigarros e me agradeceu aquele instintivo e espontâneo gesto jamais o esquecerei. Disse-me que os levaria para distribuir pelos seus homens que estavam acampados junto da Tabanca, aguardando que lhes entregássemos o quartel, comentando:
- Tudo o que nos chega, ou nos dão, distribuímos irmãmente entre nós todos. Se houver um só cigarro, um dos homens acende-o e vai passando para o outro, que dá a sua passa, e, por sua vez, passa a outro… e outro… até ele acabar. Com a alimentação também é assim, o que há para comer é dividido em partes iguais pelo pessoal.
Notei nas suas palavras que a fartura não era o forte para as bandas daquela malta do PAIGC. Por uma questão de constrangimento, respeito e dignidade, não lhe perguntei se estavam a passar dificuldades, nem era preciso fazê-lo.
Pensei: “Tudo o que aqui temos no depósito de géneros (na altura estava bem fornecido), quando formos embora, vai ficar a estragar-se e, tenho a certeza absoluta, estes 'gajos' estão a passar dificuldades.”
No dia seguinte, ao fim da manhã, estava eu a preparar uma sanduíche de chouriço, já quase havia esquecido o Sá, quando me vieram dizer que estava um turra à porta-de-armas que pediu para me falar.
Quando lá cheguei, vi que ele ali me esperava. Cumprimentamo-nos e ele puxou de um maço de cigarros NOPINTCHA, com 2 cigarros dentro, dizendo-me:
- Quero retribuir a oferta de ontem. O meu pessoal diz que o tabaco que mandaste, é muito macio e como vi que és um apreciador, vim-te trazer este para experimentares.
- Obrigado - disse-lhe eu.
Como não tinha mais nada que dizer, saiu-me:
- Acompanhas-me numa sandes de chouriço e uma cervejinha?
Ele olhou-me frontalmente e respondeu:
- Claro que aceito, vamos a elas!
No fim de comermos e cavaquearmos de assuntos trivialíssimos, evitando sempre aprofundar o tema guerra, perguntei-lhe se ele não queria levar o resto do delicioso chouriço para dar aos seus homens. Ele aceitou logo e voltou com a conversa da divisão:
- Levo sim, muito obrigado. Vou dividi-lo pelo resto da minha rapaziada.
Um dia, contou-me que havia sido incorporado no Exército Português, mas devido a desconfianças permanentes, interrogatórios pidescos e maus tratos por suspeitas da sua eventual colaboração (?) com o PAIGC, ele acabou por desertar e passar-se para as fileiras do PAIGC.



Na véspera da entrega do aquartelamento o Sá ofereceu-me, como prova da sua amizade o seu boné militar, o emblema do PAIGC, uma bandeirinha da Guiné-Bissau e as duas munições que estavam no topo dos carregadores das suas armas (uma de AK47 e outra de uma Simonov), que, felizmente, não chegou a disparar sobre as NT.
O tempo voou e até ao dia 9 de Setembro, em que entregámos oficialmente o quartel ao PAIGC, todos os dias conversávamos sobre as mazelas e consequências do violento passado e as melhores previsões do futuro da Guiné-Bissau.
Depois, nunca mais soube nada dele, até ao passado dia 9 de Dezembro de 2010.
Na foto pode ver-se eu e o Sá junto de um Unimog, que, por ordem superior emitida de Bissau, foi entregue ao PAIGC para as deslocações do seu pessoal e que o Sá, para evitar eventuais confusões, identificou com tinta na porta PAIGC. Em cima, sentado da parte de trás da viatura, está sentado creio que um dos filhos dele.
Magalhães Ribeiro

2. Em 9 de Dezembro o Nelson Herbert, enviou-me mais uma mensagem que dizia:

MARAVILHAS DO BLOGUE
SÓ HOJE, NAVEGANDO PELOS MEANDROS DO BLOGUE...CHEGUEI AO POSTE EM QUESTÃO... O COMANDANTE DO BIGRUPO DO PAIGC QUE ACTUAVA EM MANSOA... E CUJO PARADEIRO ESTOU TENTANDO APURAR, RESPONDE PELO NOME DE ANTERO SÁ... MEMBRO DE UMA INFLUENTE FAMÍLIA MESTIÇA, DE MANSOA, CUJO PATRIARCA, O SR. SÁ, ERA UM CONHECIDO COMERCIANTE PORTUGUÊS NAQUELA VILA OU CIDADE...
Guiné-Bissau > Região do Oio > Mansoa > O Eduardo com um quadro do PAIGC. Foto do nosso co-editor, reproduzida no Correio da Manhã, edição supracitada. Posteriormente, o Eduardo disse-me que se tratava do comandante do bigrupo de Mansoa, de nome Antero Sá  (a viver actualmente em Portugal).
Trata-se de um indivíduo mestiço, natural de Mansoa, que pertenceu às NT (exército, presumo), e que terá desertado para o PAIGC, na sequência de um alegado e grave conflito com um superior hierárquico.
O Eduardo conviveu com ele "ainda umas semanas"... Tornaram-se amigos: ambos eram "rangers", um do lado, outro do outro...
O Eduardo, quando substituiu temporariamente o furriel vaguemestre da CCS do BCAÇ 4612/74, chegou a arranjar alguma comida e cigarros para os homens do bigrupo do comandante Sá...

Espero que o Eduardo aceite o meu convite para escrever sobre este período de sobreposição das duas forças, em Mansoa, nas últimas semanas antes da sua partida para a Metrópole... Ele tem mais umas dezenas de fotos deste período de convívio com o inimigo de ontem, em Mansoa...
Nelson Herbert

3. Em 9 de Dezembro o Nelson Herbert, enviou-me mais uma mensagem que dizia:
Caro Magalhães

Sim o seu amigo da foto, responde pelo nome de Antero Sá... e esteve na guerrilha do lado do PAIGC... Pertence à mesma família mestiça da foto, alias creio ser o único homem... no meio de tantas mulheres da família Sá... Uma família mestiça, cujo patriarca, o Sr. Sá era português com uma mercearia e comércio em Mansoa... proprietário de alguns camiões... e sobre alguns membros da família sempre pairaram suspeitas de colaboração a guerrilha... isto pelo facto dos camiões da família, terem em varias ocasiões, ido poupados de ataques ou emboscadas do PAIGC... E isso só por si... suscitava as tais interpretações próprias da época...
O Antero Sá foi sim militar português...
Quanto ao seu paradeiro, já iniciei os contactos junto dos sobrinhos e espero localiza-lo brevemente e pô-lo em contacto consigo... Acredito no entanto que esteja a viver em Portugal!
Mantenhas
Nelson Herbert

4. Pois a concluir esta rocambolesca estória, o Nelson Herbert só sossegou quando lhe enviaram e ele me comunicou o número de telefone do Antero Sá, ainda a viver na Guiné-Bissau, (e que eu ainda vou utilizar esta semana a ver se consigo falar com ele novamente 36 anos depois), que lhe foi indicado por um grande amigo dele e a quem volto a agradecer aqui, publicamente, este gesto de amizade e camaradagem.
__________
Nota de M.R.:

- Segundo fui informado, com confirmação do próprio via telefone, após atribulada vida de guerreiro na Guiné, o Antero Sá vive desde 1975 em Portugal.

Guiné 63/74 - P7430: Convívios (287): Novo Encontro da Tabanca da Linha (3) (José Manuel Matos Dinis /Miguel Pessoa/Mário Fitas)


1. O nosso Camarada José Manuel Matos Dinis (ex-Fur Mil At Inf da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), enviou-nos, em 12 de Dezembro de 2010, a seguinte mensagem, com fotos de Mário Fitas e Miguel Pessoa:
Almoço da Magnífica Tabanca da Linha

Aguardava-se com grande expectativa o almoço de confraternização realizado no passado dia dez, uma sexta-feira, dia aziago para os que vivem de crendices, potenciado pela recordação do último que se realizara e merecera fartos comentários sobre a qualidade alimentícia, e o preço esportulado, todos coincidentes no que em linguagem comum se designa por barretaço.
A expectativa alargava-se a outras áreas de acção terrorista, com as anunciadas presenças do Dinis e do António Graça de Abreu, que têm brindado o estimado público com ameaçadores postes e comentários, enrijecendo a luta dos pontos de vista sobre a guerra santa, de quem ganhou e quem perdeu, sobre os vilões e os heróis, sobre complexos esquerdizantes ou reaccionários, com mais ou menos propósito, pois como todos sabiam, e mostravam-se apreensivos, em tempo de guerra não se limpam as armas. Luta-se com tudo, até à dentada. E foi assim que a coisa se resolveu.

Contavam-se as espingardas, e misturavam-se os simpatizantes na óbvia tentativa de se neutralizarem, quando os litigantes se encararam e correram um para o outro de braços abertos a selar uma paz, provisória, que permitisse refazer forças pela aliança estratégica no ataque ao almoço. Abancaram os senhores da guerra onde os outros permitiram, que isto de resolver os problemas do estômago não tem favoritos.
Conversaram os participantes sobre os mais variados temas, trazendo à evidência que a história da Guiné ainda está por fazer, mormente, no que às refeições dizia respeito, essa indesmentível fonte de moral e capacidade, que um certo bardo ainda não acabou de as cantar.
Todos juntos, eram mais de vinte e dois, incluindo três simpáticas senhoras, as esposas do Marques, do Humberto Reis e do Miguel Pessoa, a nossa Giselda.


Após o repasto, quando as conversas reatavam de vitalidade, o Zé Carioca fez uma nova prelecção sobre os objectivos e necessidades para uma associação de solidariedade para com os jovens guineenses, que lhe anda a matutar no toutiço há muito tempo e, agora, pretende concretizar. A dedicação apresentada com alguma nervoseira, mereceu palmas.
Tiraram-se retratos para a posteridade, anunciou-se a pretensão do Alberto Branquinho querer comprar uma casa na linha, com vista para o mar, ou outro privilégio que convença a esposa à mudança, e, vim a descobrir, só para fazer parte integrante dos membros da Magnifica.


Notaram-se faltas: em primeiro lugar a do impulsionador desta Tabanca, o Rogério Cardoso que se debate com dores no meio das vértebras (a ver se alguém providencia uma bagaceira que lhe restitua a alegria de viver); em segundo lugar, o sempre requisitado Luís Graça, que não resistiu aos apelos de uma belíssima aluna para lhe fazer um exame (não é para todos, sosseguem, isto de fazer exames às melhores alunas, é só para quem tem muita experiência e continua a praticar); em terceiro lugar, menciono todos os restantes atabancados e voyeurs, que não sabem o que perderam.

Espero ter cumprido a minha parte com discrição, pois nem sequer mencionei o vinho que, pecaminosamente, o Fitas derrubou sobre o Rosales, sabe-se lá porquê, pelo que dou por terminada esta tarefa, e vou fazer uma sesta que me ponha em paz com as volúpias bem combinadas do robalo com o tintol.
Abraços fraternos
JD
2. Também o nosso Camarada Humberto Reis (ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCAÇ 12 - Contuboel e Bambadinca -, 1969/71, enviou um resumo das actividades deste convívio, com algumas das suas fotos:
Camaradas,
Aqui vão umas fotos da almoçarada de Natal realizada hoje, dia 10, da raparigada e rapaziada da Tabanca da Linha.
Foi no Restaurante de comida transmontana "O Infante" na estrada de Algés para Linda-a-velha. Não identifico o pessoal todo mas alguns são mais mediáticos que outros.
Reconhecem-se o Fernando Marques da CCaç 12, a esposa Gina, a Giselda, o Miguel Pessoa, o Gabriel Gonçalves tb. da CCaç 12, o Moreira da CCS do Bart 2917, o Graça de Abreu, o José Dinis, o José Carioca e o Mário Fitas dos Lassas de Cufar.

Aquele abraço
Humberto Reis
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Nota de M.R.:

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Guiné 63/74 - P7429: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (37): Teixeira Pinto - Erro que podia ter sido fatal

1. Mensagem de Luís Faria (ex-Fur Mil Inf MA da CCAÇ 2791, Bula e Teixeira Pinto, 1970/72), com data de 20 de Novembro de 2010:

Amigo Carlos Vinhal
Um bom dia.

Como as anteriores, mais uma passagem verídica de “Viagem…” que à altura me viria a afectar bastante em alguns dos dia-a-dias seguintes e que sai agora, ao fim de trinta e nove anos, do exclusivo conhecimento dos intervenientes.

Para ti Vinhal e para os que tiverem a paciência de ler, o meu abraço.
Luís Faria


Viagem à volta das minhas memórias (37)

Teixeira Pinto - Erro que podia ter sido fatal

Ao meu 2.º GRCOMB foi finalmente atribuído um descanso de dias na actividade operacional de intervenção, passando a operar em serviços e patrulhamentos, aliados a emboscadas na povoação e imediações, o que para nós era uma espécie de férias que nos começou a diminuir a tensão psicológica, levando-nos porventura a baixar um tanto a guarda, o que a acontecer, podia traduzir-se no facilitismo e no erro fatal.

Por muito pouco esse erro… não aconteceu,ficando-me de emenda, como responsável!

No meu 2.º GRCOMB, logo após as primeiras Operações na Guiné, tínhamos instituído que quem fizesse anos seria dispensado de qualquer serviço nesse dia, podendo inclusive e eventualmente, beneficiar também da dispensa de um amigo. Era de certo modo uma maneira de premiar o Pessoal mais que merecedor e ao mesmo tempo prevenir qualquer situação de fragilidade emocional potencialmente de risco, em especial na mata, onde a segurança devia ser sempre uma constante. Na situação em concreto (neste descanso), os graduados revezavam-se nas saídas, considerando a ausência ou diminuta periculosidade das mesmas.

A época das chuvas caminhava para o seu termo, não obstando a que fortes bátegas de água, mais ou menos prolongadas, se abatessem dos céus alagando tudo e que, ao esparramar-se no chão levantava uma espécie de nevoeiro, como se de um aspersor se tratasse.

Assim está o tempo nesse final de tarde em que íamos fazer um patrulhamento com emboscada nocturna pela Povoação e periferia próxima, com regresso previsto, salvo erro, pelas uma ou duas da manhã

Um e depois outro elemento do grupo pedem por licença de anos e pela presença no convívio de alguns amigalhaços. A autorização é-lhes concedida, já que foi considerada uma saída sem ou diminuto risco. Ao Castro (Fur Mil) digo-lhe que dado o pouco Pessoal que ia alinhar, não era preciso vir, pelo que ficou a descansar. O Barros creio que estava para… a Família!?!

Na parada, sob chuva séria, um 2.º GRCOMB (?!) composto por cerca de uma dúzia de elementos com armamento leve e sob o meu comando (só levava a Walter) apresenta-se ao Cap. Branco que, vendo o pequeno número de Homens, me interroga se estamos todos. Mediante a minha resposta afirmativa recebe a apresentação e arrancamos debaixo do aguaceiro.

A zona pré determinada para emboscar era algures entre o perímetro da Povoação e a Ponte Alferes Nunes. Pelo caminho íamos patrulhando a periferia.

Noite adentro e o dilúvio não abranda, ensopando-nos até aos ossos, apesar da protecção dos ponchos. Ainda um tanto afastados da zona de emboscada reparo em duas moranças isoladas à face do caminho e para não nos castigar mais, resolvo e dirijimo-nos para a protecção dos seus beirais zincados. Pareciam inabitadas.

Digo à rapaziada para se abrigar mas, por estarmos fora de zona não queria barulho de molde a acordar ou sermos pressentidos pelos eventuais moradores, já que se o “baldanço” chegasse aos ouvidos do Comando, na certa me lixava. O Cor Pára Durão não era para brincadeiras!!

A Rapaziada anuiu satisfeita e por lá fica abrigada, em conversa sussurrada à mistura de umas cigarradas. Avisados de que vou fazer a segurança e verificar o terreno, afasto-me por um trilho na perpendicular, entre capim alto, que a uma trintena de passos se divide à minha direita com um outro que parece ir na direcção da povoação. Logo a seguir a essa bifurcação, resolvo posicionar-me do lado direito, aninhado sobre os calcanhares e dissimulado no capim, quase à face do trilho, de molde a poder perscrutá-los, ficando coberto pelo poncho e em observação por uma nesga do capuz cerrado sobre a cabeça.

O tempo vai passando e da Rapaziada atrás de mim, não ouvia qualquer barulho, talvez por terem seguido o meu pedido ou por o som ser abafado pelo ruído do aguaceiro.

A chuva continua a cair com força e a dada altura parece-me distinguir a uma vintena de metros, vultos silenciosos na noite que se aproximam, vindos em fila pelo trilho na minha direcção! Surpreso, empunho a Walter, encolho-me e fico estático. Os olhos aguçam-se-me tentando perceber se é população, o que seria estranho àquela hora. Ligeiros continuam a avançar na minha direcção e começo a distingui-los melhor… parece-me… trazem armas… também um RPG! Grande porra, são turras… estou fod …!!


Sem hipótese de ir para junto dos meus, puxo-me lentamente um pouco para trás, aninho-me mais no capim com a Walter já em posição de fogo e fico pronto a disparar com o primeiro na mira. Tenho a noção de que um ou dois tombariam sem que em princípio e dado o meu posicionamento, algo me acontecesse ! O pensamento voa para os meus Homens que, se eu disparar ficarão no enfiamento dos tiros de resposta e serão apanhados de surpresa, na certa com graves consequências. Pena não levar granadas!

Um “flash” mostra-me três hipóteses possíveis: não me detectam e continuam em direcção ao Pessoal, só me possibilitando disparar quando a maioria já por mim tivesse passado, fazendo assim com que a resposta fosse na minha direcção (em principio não me atingiria) e como tal em direcção oposta aos Rapazes, que ao mesmo tempo ficariam alertados e interventivos.

A segunda hipótese, com sorte a melhor, seria eles virarem à esquerda pelo trilho sem me detectarem. A acontecer isso… não haveria tiros.

A terceira hipótese, ser detectado… a acontecer seria um cu de boi !!

A decisão está tomada, só disparo se for detectado ou se eles se dirigirem na direcção dos meus Rapazes. Resta aguardar. Preparado e estático, rezo para que não se ouça a Rapaziada desprevenida.

Continuam a aproximar-se ligeiros e em silencio… dez metros, cinco metros, um metro… estou em tensão, mas calmo e frio… começo a contá-los… vão-me passando pela frente quase me roçando, dezassete elementos com espaçamentos curtos - quinze metralhadoras visíveis, confirmados dois RPG e não um - que começam a virar à esquerda, só Deus sabe porque e vão desaparecendo na noite.

Estávamos safos, graças a Deus. Três ou quatro minutos se tanto que me pareceram uma eternidade, se tinham escoado. De imediato movimento-me e instruo o Pessoal, que de nada se tinha apercebido. Pelo “banana” AVP1 contacto o Comando, alertando para eventual flagelação e informando do observado.

O mote estava lançado… movimentações bélicas iriam acontecer… outra dor de cabeça ia começar !

Luís Faria
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 21 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7314: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (36): Teixeira Pinto, uma nesga do Paraíso