Guiné > Mapa geral da província ( 1961) > Escala 1/500 mil > Posição relativa de Cameconde, a guarnição militar portuguesa mais a sul, na região de Quitafine, na estrada fronteiriça Quebo-Cacine... Em 1968 era o batalhão que estava em Buba (BART 1896, 1966/68) quem defendia esta importante linha de fronteira...
Infografia: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
1. Há mais de duas dezenas de referências a Cameconde, no nosso blogue, mas há informação este destacamento, que dependia de Cacine (*). Fomos recolher alguns apontamentos:
Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > c. maio de 72/abril 73) > O José Vermelho, quando passou pela CCAÇ 6, as "Onças Negras".
Foto: © Vasco Santos (2010). Todos os direitos reservados.
(i) José Vermelho, nosso grã-tabanaqueiro nº 471, fur mil, CCAÇ 3520 - Cacine, CCAÇ 6 - Bedanda, CIM - Bolama, 1972/74):
(...) Cameconde era um destacamento de Cacine, distando 6/7 Kms entre si.
Tinha uma forma mais ou menos rectangular, talvez aí de uns 50 por 70 mts., encravado no meio da mata, completamente isolado, sem qualquer população civil.
Era o destacamento das N/T situado mais a sul da Guiné.
Tinha em permanência 1 Pelotão de Artilharia + 1 Grupo de Combate de Cacine, sendo este substituído mensalmente por outro, em regime rotativo.
Era feita uma coluna diária Cacine - Cameconde (com picagem) e volta.
Nos primeiros meses de 1972, também fui um dos "turistas voluntários à força", convidado a visitar Cacoca...isto é...o pouco ou nada que restava dela!
Um abraço para todos os camaradas
José Vermelho [ Comentário ao poste P11109]
(ii) Augusto Vilaça [ex-Fur Mil da CART 1692/BART 1914, Sangonhá e Cacoca, 1967/69]
Quando viemos para Cacine, tínhamos o destacamento, Cameconde, onde tínhamos de estar 15 dias. Quando haviam flagelações, bastava uma "obussada " para que os turras desistissem. Eu tirei a especialidade em artilharia, mais concretamente em armas pesadas, como bazuca, morteiros de 60 ou 120 mm. Chefiava uma secção de 5 homens.
Pergunta do J. Casimiro Carvalho:
Ó Gusto, isso aí deve ser um 10,5 [,. referência a foto, a seguir, do Augusto Vilaça junto a um obus que me parece ser 8.8] ?! Cameconde era com abrigos, casamatas ? Eu estive aí em 73.
Resposta de Augusto Vilaça:
Olá. Quando lá estive, o nosso refúgio eram os abrigos, um em cada quadrado. Como sabes, esses abrigos eram muito frágeis. Felizmente nunca caíu um morteiro neles, senão.....
Comentário de Silvério Lobo:
Amigo augusto estive lá, em 2008, com o Luís Graça, vi um abrigo bem forte, com alguns frases do vosso tempo [Eu e o Silvério Lobo, estivemos em Cacine, não em Cameconde]
Comentário de J. Casimiro Carvalho:
Eu estive de passagem em Cacine. Cameconde tinha casamatas fortificadas e estava desativado. Ou estou enganado ?
[Fonte: Página do Facebook da Tabanca Grande, Grupo Antigos Combatentes da Guiné, 30/7/2012]
Guiné-Bisssau > Região de Tombali > Setor de Cacine > Cacine, na margem esquerda do Rio Cacine > 2 de Março de 2008 > Simpósio Internacional de Guileje (1-7 de Março de 2008) > Visita dos participantes ao sul > Por aqui passou a CART 1692... Esta tosca placa em cimento, delicioso vestígio arqueológico dos "tugas", diz-nos que em dois dias, de 16 a 18 de Abril de 1968, foi construído este abrigo, em tempo seguramente recorde, a avaliar pelas "60 bebedeiras neste 'priúdo'... TRABALHO RÁPIDO". Estão também gravados dois topónimos portugueses, Nisa e Alenquer.
Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cacine > 2 de março de 2008 > Visita no âmbito do Simpósio Internacional de Guiledje (1-7 março de 2008) > O Silvério Lobo junto a uma "bunker", construído pelas NT em cimento armado (, seguramente pelo BENG...).
Fotos: © Luís Graça (2008). Todos os direitos reservados
(iii) Quem tem estórias, deliciosas, de Cameconde (e de Cacine) é o Juvenal Candeias (, ex-alf mil, CCAÇ 3520, Estrelas do Sul, Cacine e Cameconde e Guileje, 1971/74] [, foto à esquerda]
Reproduzo aqui, a do Viente Piu (**)
(...) Vicente era o Furriel de Minas e Armadilhas do 2º Grupo de Combate da CCaç 3520! Popularmente era conhecido por Piu, alcunha que nada tinha a ver com um temperamento piedoso, mas simplesmente com o seu vício de caçador de passarada!
Era ele, provavelmente, quem mais contribuía para o moral elevado das nossas tropas. Embora não fosse aquilo a que habitualmente chamamos uma figura carismática, o Vicente era a boa disposição permanente e contagiante, que nos permitia rir com gosto e facilidade!
Era o homem sempre pronto a pregar partidas aos camaradas!
O Vasconcelos, Furriel de Artilharia em Cameconde, homem dos obuses 14, era uma das suas principais vítimas! Pequenino e bom de bola, fazia inveja ao Garrincha, de tal modo as suas pernas eram arqueadas, e, segundo o Piu, bastante feias! Por essa razão, andava sempre de calças e só tomava banho à noite e sozinho! Salvo quando o Vicente lhe colocava baldes de água em cima das portas por onde ele ia passar!
Era o homem sempre pronto a pregar partidas aos camaradas!
O Vasconcelos, Furriel de Artilharia em Cameconde, homem dos obuses 14, era uma das suas principais vítimas! Pequenino e bom de bola, fazia inveja ao Garrincha, de tal modo as suas pernas eram arqueadas, e, segundo o Piu, bastante feias! Por essa razão, andava sempre de calças e só tomava banho à noite e sozinho! Salvo quando o Vicente lhe colocava baldes de água em cima das portas por onde ele ia passar!
O Vasconcelos veio à Metrópole de férias e terá conhecido, numa festa, uma miúda por quem se apaixonou! Quem escolheu para confessar a sua paixão? Exactamente o Piu, que explorou exaustivamente a situação, obtendo informação detalhada! Estava em marcha mais uma partida!
O correio enviado diariamente por Cameconde aguardava transporte em Cacine. A correspondência chegava e partia de Cacine, na melhor das hipóteses uma vez por semana, em avioneta Dornier 27. O pessoal que estava destacado em Cameconde recebia o correio no dia seguinte, através da coluna auto que todas as manhãs ligava os dois aquartelamentos.
Com alguém em Cacine feito com o Piu, o Vasconcelos começou a receber correspondência da sua paixão, aerogramas que eram escritos e falsificados em Cameconde pelo Piu, vinham a Cacine e voltavam a Cameconde, sempre que havia correio geral a distribuir. Naturalmente que as respostas do Vasconcelos nunca passavam de Cacine, voltando a Cameconde, onde eram entregues ao Piu.
O detalhe da tramóia incluía carimbos e restantes pormenores que faziam acreditar no realismo da correspondência! O conteúdo, inicialmente erótico, posteriormente pornográfico, com inclusão de sexo virtual, era do conhecimento de todos, apenas o Vasconcelos desconhecia a partida! Estava cada vez mais apaixonado… e continuava a confessá-lo ao Piu com quem, ainda por cima, comentava o correio que recebia da sua paixão!
A partida durou as semanas que o Piu entendeu e quando se fartou… escreveu uma última missiva, identificando-se, descompondo o Vasconcelos e chamando-lhe alguns nomes que pouco abonavam a sua masculinidade!
Acabou, assim, deste modo abrupto, um passatempo que animou, durante algum tempo, o destacamento de Cameconde, buraco do… cú do mundo, onde nada existia e nada acontecia, para além de umas bazucadas com maior frequência que a desejada! (...)
A partida durou as semanas que o Piu entendeu e quando se fartou… escreveu uma última missiva, identificando-se, descompondo o Vasconcelos e chamando-lhe alguns nomes que pouco abonavam a sua masculinidade!
Acabou, assim, deste modo abrupto, um passatempo que animou, durante algum tempo, o destacamento de Cameconde, buraco do… cú do mundo, onde nada existia e nada acontecia, para além de umas bazucadas com maior frequência que a desejada! (...)
(iv) Sobre esta região, o Quitafine, leia-se o excelente enquadramento feito pelo Juvenal Candeias [, foto à direita, então alf mil da CCAÇ 3520] (***):
(...) A região do Quitáfine, a Sul de Cacine, era considerada o santuário do PAIGC, que aí estava fortemente instalado e provido de dispositivos de segurança, que tornavam os nossos movimentos impossíveis, salvo com utilização de meios excepcionais. Trilhos minados e sentinelas avançadas, permitiam-lhes uma tranquilidade apenas quebrada pelos obuses de 14 cm, disparados do nosso destacamento de Cameconde!
Os efectivos de que dispunham com um grupo especial de 20 lança-granadas, responsável pelas constantes flagelações a Cameconde, apoiado por um bigrupo disperso pela zona de Cassacá e Banir (onde se supunha estar o comando), eram reforçados por uma vasta população armada em auto-defesa, distribuída, entre outras, pelas tabancas de Ponta Nova, Bijine, Dameol, Cassacá, Banir, Campo, Cassebexe e Caboxanque.
O PAIGC furtava-se sistematicamente ao contacto, optando por uma estratégia defensiva de protecção às populações que controlava, privilegiando as flagelações e a colocação de engenhos explosivos! Quem circulava a Sul de Cambaque (que distava cerca de 3 Km de Cameconde) tinha como certo algumas surpresas no trilho! Provavelmente um campo de minas e a seguir (algum humor-negro), munições de Kalash espetadas no chão formando a palavra PAIGC!
O Quitáfine permitia ainda, ao PAIGC, um reabastecimento regular e seguro, processado a partir da República da Guiné, através de vários rios, em especial o Caraxe e o Camexibó! Ao dispositivo militar juntava-se uma mata densa intransponível!
Os pára-quedistas, após uma operação no Quitáfine, só à noite conseguiram chegar a Cameconde, com grande dificuldade e orientados pelo clarão da queima de cargas de obus, em cima dos abrigos! O grupo de Marcelino da Mata, largado de helicóptero, fez um golpe de mão a Cabonepo, a base do PAIGC mais a Norte do Quitáfine, onde estaria instalado um posto transmissor. Quando chegou, após lenta progressão através da mata… não havia lá nada… a base tinha sido abandonada momentos antes!
O Quitáfine era, efectivamente, o santuário do PAIGC, desde o início da guerra! Foi ali que se realizou, na tabanca de Cassacá – a 15 Km de Cacine e a 8 Km de Cameconde -, em meados de Fevereiro de 1964, o 1º Congresso do PAIGC, com a presença de Amílcar Cabral, Luís Cabral, Aristides Pereira e outras individualidades do Partido!
O PAIGC furtava-se sistematicamente ao contacto, optando por uma estratégia defensiva de protecção às populações que controlava, privilegiando as flagelações e a colocação de engenhos explosivos! Quem circulava a Sul de Cambaque (que distava cerca de 3 Km de Cameconde) tinha como certo algumas surpresas no trilho! Provavelmente um campo de minas e a seguir (algum humor-negro), munições de Kalash espetadas no chão formando a palavra PAIGC!
O Quitáfine permitia ainda, ao PAIGC, um reabastecimento regular e seguro, processado a partir da República da Guiné, através de vários rios, em especial o Caraxe e o Camexibó! Ao dispositivo militar juntava-se uma mata densa intransponível!
Os pára-quedistas, após uma operação no Quitáfine, só à noite conseguiram chegar a Cameconde, com grande dificuldade e orientados pelo clarão da queima de cargas de obus, em cima dos abrigos! O grupo de Marcelino da Mata, largado de helicóptero, fez um golpe de mão a Cabonepo, a base do PAIGC mais a Norte do Quitáfine, onde estaria instalado um posto transmissor. Quando chegou, após lenta progressão através da mata… não havia lá nada… a base tinha sido abandonada momentos antes!
O Quitáfine era, efectivamente, o santuário do PAIGC, desde o início da guerra! Foi ali que se realizou, na tabanca de Cassacá – a 15 Km de Cacine e a 8 Km de Cameconde -, em meados de Fevereiro de 1964, o 1º Congresso do PAIGC, com a presença de Amílcar Cabral, Luís Cabral, Aristides Pereira e outras individualidades do Partido!
A CCaç 3520 tinha chegado ao porto de Cacine, a bordo da LDG Montante, em 24 de Janeiro de 1972, para render a CCaç 2726 – companhia açoriana comandada pelo Capitão Magalhães -, o homem que retorcia as pontas do bigode com cera e a quem o tabaco nunca faltava! Dizia-se mesmo, à boca pequena, que, quando o tabaco acabava em Cacine, o PAIGC deixava, no mato, uns macitos para o Capitão! Rumor ou realidade… ninguém sabe! Ficou por provar!
Decorria ainda o período de sobreposição, que se prolongou até 22 de Fevereiro, quando foram recebidas instruções de Bissau, para ser preparada uma operação ao Quitáfine – Cabonepo e… Cassacá! (...)
Plano de retração das guarnições militares portuguesas, no pós-25 de abril. Região sul. Cameconde e Gadamael foram desativados no mesmo dia, 19 de julho de 1974. Cacinbe, uns dias mais tarde, a 12 de agosto. Nesta lista há 3 aquartelamentos que pertenciam ao leste, não ao sul: Bambadinca, Mansambo e Xime. Reprodução (parcial) da página 54 (de um total de 74) do relatório da 2ª rep/CC/FAG, publicado em 28 de fevereiro de 1975, e na altura classificado como "Secreto".
Sangonhá e Cacoca já tinham sido abandonados no início do consulado de Spínola, no 2º semester de 1968, como conta aqui o António J. Pereira da Costa, numa das histórias da sua "guerra a petróleo", e quando ele foi alferes QP da CART 1692.
[ Digitalização do documento: Luís Gonçalves Vaz (2012) / Edição das imagens: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2012) ]
________________
Notas do editor:
(*) Último poste da série > 17 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11107: Memória dos lugares (213): Gadamael Porto, vestígios da presença das NT (CART 1659, CART 6252...). Fotos de 2011 (Carlos Afeitos, professor, cooperante)
(*) Último poste da série > 17 de fevereiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11107: Memória dos lugares (213): Gadamael Porto, vestígios da presença das NT (CART 1659, CART 6252...). Fotos de 2011 (Carlos Afeitos, professor, cooperante)
(**) Vd. poste de 16 de outubro de 2009 > Guiné 63/74 - P5113: Histórias de Juvenal Candeias (5): Vicente, o Piu
(***) Vd. poste de 16 de setembro de 2009 > Guiné 63/74 - P4961: Histórias de Juvenal Candeias (4): Há periquitos no Quitáfine-