terça-feira, 30 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11885: Bom ou mau tempo na bolanha (22): O típico emigrante do século passado (Tony Borié)

Vigésimo segundo episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66.



Nós, que nascemos na Península Ibérica, portanto descendentes de fenícios, cartagineses, sarracenos da bretanha e talvez vikingues, éramos aventureiros, tão aventureiros que fomos para uma guerra a milhares de quilómetros das nossas vilas e aldeias, mas nem que essa experiência de guerra não servisse para mais nada, ajudou na vida de um futuro emigrante, pois nos anos sessenta e setenta do século passado, a vida de um emigrante, era uma vida de aventura, de alguma coragem, de sobrevivência e de uma força interior, um pouco fora do normal.
Era uma vida muito parecida com a que vivemos na guerra da então província da Guiné, só com a diferença de que não estávamos sujeitos aos tiros e às emboscadas.

O emigrante fazia de tudo, improvisava, nunca estava doente, se estivesse, dizia que não, se isso fosse pôr em causa o seu posto de trabalho. Se houvesse horas extraordinárias, trabalhava, um ou dois turnos seguidos, e não trabalhava três, porque era proibido, tudo isto, com o mínimo de alimentação. Não compreendia o idioma, mas por gestos e com alguns mínimos erros, fazia todo o tipo de trabalho, o importante era ver alguém fazer o trabalho antes, depois já ninguém o parava.

Contam-se dezenas de histórias de emigrantes, que na ânsia de trabalhar, e sem a mínima instrução, e perante uma possível oferta de emprego, diziam que sabiam de pintura, de mecânica, arranjar relógios, assentar tijolos, conduzir camiões e escavadoras, pilotar barcos e aviões, soldar, etc. Eram electricistas, cozinheiros, enfim, só não diziam que voavam, porque não tinham asas. Tudo isto, era na ânsia de trabalharem e ganharem dinheiro, não com a intenção de prejudicarem alguém, a não ser eles mesmos.

O emigrante, nos anos sessenta e setenta do século passado, que conseguia sair de Portugal e atravessar o Atlântico, era porque queria vencer na vida. Normalmente a sua falta de instrução escolar era compensada com a sua força física e moral. Nesses tempos, o emigrante, salvo raras excepções, era uma pessoa com o mínimo de escola, com alguma visão de prosperidade, espírito aventureiro, geralmente novo e com alguma saúde física e moral, desejoso de ter algo a que pudesse chamar seu.

Quando um emigrante abandonava o seu País, o seu lugarejo, deixava de ver as pessoas que lhe eram queridas e com quem tinha convivido, deixava de beber a água da sua fonte, deixava de ver a paisagem, que só com a ausência da mesma é que começava a notar, o maravilhoso que tinha deixado para trás. Era quase como quando chegámos à Guiné, quase tudo era diferente, mas falávamos a nossa língua e lá nos íamos compreendendo, mas num país estrangeiro era um pouco diferente, em princípio não compreendíamos a linguagem, nessa altura, começava a sangrar por dentro, ficava triste e chorava perante qualquer contacto com algo que lhe mostrasse a sua Pátria. A palavra saudade começava a ter um significado muito importante, nessa altura tinha que ser muito forte, moral e fisicamente.


Os primeiros anos eram terríveis, o idioma, os costumes, o clima e alguma discriminação, eram quase insuportáveis. Demorava alguns anos até tornar-se um natural habitante do País que escolhera para emigrar. Nesse período de tempo, se não tinha algum suporte humano, motivação interior e alguma sorte nos seus contactos, o emigrante não resistia e a sua maior alegria era arranjar dinheiro para comprar um bilhete de passagem para regressar definitivamente ao seu País.

Dada a sua pouca instrução escolar, tinha que se sujeitar aos trabalhos mais pesados e sujos, enfim, tinham que fazer aquilo que os naturais não queriam fazer. Se a fase dos três ou quatro anos passasse, iríamos ter um emigrante com algum sucesso. Os filhos iriam estudar, pois queriam dar-lhe aquilo que eles próprios não tiveram, geralmente construíam casa no seu País de origem, iriam ver essa casa nas férias, mas definitivamente nunca regressariam, pelo menos os que tivessem atravessado o Atlântico.

O combatente que despendeu dois anos na guerra do então Ultramar Português, teve menos dificuldade em tornar-se emigrante, as dificuldades então vividas em cenário de guerra, foram quase como um treino para a emigração, pois quando chegou a outro país, todas as dificuldades de adaptação se tornaram mais fáceis de resolver, já que vinha com um certo traquejo, vinha vivido, e se passasse um ou dois dias sem comer, pouca diferença lhe fazia. Qualquer trabalho lhe servia, logo que lhe pagassem, fazia, adaptava-se, era humilde, procurava sempre fazer sempre o seu melhor, a sua técnica por vezes, era a força física e as primeiras palavras que aprendia, eram para dizer: “sim, não tem problemas, eu faço”.

Tony Borie,
Julho de 2013
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Nota do editor

Último poste da série de 23 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11862: Bom ou mau tempo na bolanha (21): O medo na guerra (Toni Borié)

Guiné 63/74 - P11884: Parabéns a você (604): Amaral Bernardo, ex-Alf Mil Médico do BCAÇ 2930 (Guiné, 1970/72); Júlio Costa Abreu, ex-1.º Cabo Comando do Gr Comandos Centuriões (Guiné, 1964/66) e Victor Tavares, ex-1.º Cabo Paraquedista da CCP 121 (Guiné, 1972/74)

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Nota do editor

Último poste da série de 19 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11854: Parabéns a você (603): José Santos, ex-1.º Cabo Aux. Enf.º da CCAÇ 3326 (Guiné, 1971/73)

segunda-feira, 29 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11883: Filhos do vento (18): Em Portugal, temos os "filhos da borda", era assim que eram conhecidos, na minha aldeia e na minha infância, os filhos de mães solteiras (José Teixeira)

1. Mensagem do José Teixeira, com data de 25 de julho passado...

Luís.

Espero que já tenhas descansado um pouco [, da estadia em Luanda]-.

Se vires que este texto tem interesse para alimentar a "fogueira" podes colocá-lo no blogue. Abraço fraterno do Zé Teixeira


2. Creio que o tema "Filhos do Vento", trazido à ribalta pela [ jornalista do Público,] Catarina Gomes , deve ser analisado sem paixões, complexos ou sentimentos de culpa. Foi e é uma realidade à qual não devemos fugir.

Na pretensão de contribuir para a discussão fui ao "meu Diário" buscar mais uma acha para a fogueira. Vejamos o que eu escrevi em 21 de Novembro de 1968


Novembro 69, Empada 21
É uma família muito simpática. Ela Bijagó, ele Cabo Verdiano. Têm quatro filhos; Marcos, Lucas, Júlia e Victória. Muito trabalhadores aproveitam o terreno cultivável, na impossibilidade de se dedicarem à pesca, a sua profissão, por medo da guerra. A Júlia está muito marcada pelo ambiente militar que a rodeia, tem até um filho de branco e creio que foi prostituta em tempos em Bissau. Tem três filhos,  todos de tenra idade e é uma tentação cá para a malta. A sua liberdade de linguagem é um dos factores para qualquer homem se sinta tentado a persegui-la e receber as benesses, por troca de umas moedas. A Victória, essa tem porte digno, alguns de nós já se lançaram ao engate, mas ela troca-lhe as voltas.

Até há pouco tempo, toda esta gente, três homens três mulheres e três crianças dormiam no mesmo compartimento da morança., Com os ataques seguidos de há dias, o medo aumentou, o que se compreende, pois na mesma noite tiveram de pegar por duas vezes nas crianças e fugir para o abrigo rasgado na terra e coberto com "cibos", tendo caído duas granadas muito perto da sua casa

Na luta pela sobrevivência, decidiram passar a dormir no minúsculo abrigo, pondo lá dois pequenos colchões, tendo como companheiros lagartos, formigas cobras, etc. Os dois velhos da família,  por falta de lugar no abrigo, continuam a dormir na morança.

Um clima muito quente e húmido, a terra é muito húmida, uma pequena abertura para entrar, a enorme quantidade de bichos, a urina das crianças, o suor dos corpos . São estas as condições desta família. Quantas famílias, quantas Júlias, haverá por esta terra !?



O "puto",  filho de branco, chamava-se Mário. Era fruto de uma relação que a mãe manteve em Bissau com um fuzileiro. A comissão deste acabou, ele voltou a Portugal e ela ficou com um filho nos braços. Os outros dois negros, filhos de pai africano que não vivia em Empada. A família aceitou de novo a Júlia e deu-lhe o apoio e estímulo para educar o seu filho de cabelo louro.

Em Bissau era comum os militares, pelo menos conheci dois casos, "juntarem-se" com uma mulher africana e viverem com ela durante a comissão. Depois,  quando a Comissão acabava,  acabava a "romaria",  com os eventuais resultados de uma relação natural de dois seres que viviam acasalados. Num dos casos conhecidos, uns anos depois, a ex-companheira bateu-lhe à porta, estando ele casado com a mulher que à data era a sua namorada e tendo dois filhos desta. Não sei o que resultou deste encontro, mas abalou profundamente a vida do casal.

Mas não precisamos de ir à Guiné, buscar casos de pais que não assumem os seus atos. Temos tantas situações idênticas em Portugal.

Temos os "filhos da borda". Assim eram conhecidos,  na minha aldeia,  os filhos de mães solteiras, na minha infância. Referenciavam-se assim as crianças que não foram gerados no leito sagrado do casal mas em qualquer borda de um campo de milho

Conheci um "pai" que envergonhadamente acompanhava de perto o seu "filho da borda",  sem ter a coragem de se afirmar e identificar como pai. Teve, sim, o cuidado de casar rapidamente com a outra namorada para tentar encobrir e negar a paternidade, só que o "puto" era a sua cara chapada.

Nos últimos anos de vida num rebate de consciência para alcançar o "céu", informou a família que ia perfilhar o bastardo, felizmente bem colocado na vida. Como resposta , a mulher ameaçou sair de casa e os filhos logo lhe disseram que o abandonavam. Morreu pouco depois com esta espinha enterrada na garganta.

Isto passava-se cá em Portugal.

Casos como o da Júlia, creio que houve muitos. Era uma relação a dois consentida, que deram como resultado, tanta criança sem pai. Nestes casos creio que devia ter havido algum cuidado por parte das autoridades militares, o que não aconteceu.

Quanto ao assumir da paternidade,  é uma questão de consciência do presumível pai, que duvido venha a dar frutos, não só pelo tempo que já passou, mas também pelos eventuais conflitos que iriam gerar na família constituída. Nos dois casos que conheço ambos recusam assumir a paternidade:  num dos casos alega que a jovem andava também com outros militares.

Que fazer então?

Não se perde nada em continuar a explorar esta temática de forma cuidada para não ferir, pelo contrário, pode "abrir" consciências e ajudar a encontrar algumas soluções para estes "gritos" de quem se sente "filho de ninguém".

Zé Teixeira
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Nota do editor:

Último poste da série > 24 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11867: Filhos do vento (17): Comentário: "Não quero nada dele, [do meu pai], apenas o nome" (José Teixeira)

Guiné 63/74 - P11882: Blogpoesia (351): "Conversas sem pressas", por Maria de Lourdes dos Anjos (Francisco Batista)

1. Mensagem datada de 25 de Julho de 2013 do nosso camarada Francisco Maria Magalhães Batista, ex-Alf Mil, integrado na CART 2732 em Setembro de 1971:

Ao meu amigo Vinhal e camaradas,
À vossa consideração.

Uma senhora, alma sensível, poetisa com livros publicados, natural do Porto que um dia, em 2010, conheci num espaço cultural, ofereceu-me este poema lindo que vos deixo, que ela dedicou ao marido, ex-combatente e aos netos.
Para ela se reler o seu poema neste blogue um beijo de agradecimento.

Um abraço
Francisco Baptista


Conversas sem pressas

Oh vó, o avô andou, de verdade, na guerra?
Era muito longe? Como se chamava a terra?
Demorou mais que uma semana a lá chegar?
Ele não teve medo de ir, tantos dias, no mar?
Não podia discordar, dizer que não queria ir?
Se ele se revoltasse ou até tentasse fugir?
O avô era tão magrinho! Quantos anos tinha?
A mãe dele deve ter chorado muito quando ficou sozinha
Era muito longe. Dois anos, dois anos e tal
Iam só soldados nossos, só daqui de Portugal?
Nessa altura ele já era teu namorado?

Deve ter tido tantas saudades, tantas saudades coitado!

Avô tinhas roupas de tropa? E metralhadora também?
Sabes, mas eu acho que tu nunca mataste ninguém
Viste alguns dos teus amigos morrer ou ficar deficiente
E depois ficavam lá? Que faziam a essa gente?
Olha avô, sei que não foste feliz. Tenho a certeza
Porque na terra da guerra, há dor, há fome e tristeza

Assim questionam os netos para tentar perceber
As lágrimas de recordar o tempo que faz sofrer
Se para mais não serviu esta dura realidade
Que ao menos os jovens saibam o preço da liberdade
Aproveitem a alegria e a força de ser capaz
De ter voz neste país e encher as ruas de Paz
E não esqueçam que a vida corre tão rapidamente
Que Abril é o Sol de um dia, numa primavera ausente

Maria de Lourdes dos Anjos
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Nota do editor

Último poste da série de 27 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11874: Blogpoesia (350): Uma calda feliz (J. L. Mendes Gomes)

Guiné 63/74 - P11881: Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau: de 30 de abril a 12 de maio de 2013: reencontros com o passado (José Teixeira) (10): A caminho de Varela, chão felupe, passando por João Landim, Antonina, Ingoré, S, Domingos e Susana



Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Ingoré > 7 de maio de 2013 > Aspeto exterior do Jardim de Infância Flor de Arroz em Ingoré (1)



Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Ingoré > 7 de maio de 2013 > Aspeto exterior do Jardim de Infância Flor de Arroz em Ingoré (2)



 Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Ingoré > 7 de maio de 2013 >  Aspeto imterior do Jardim de Infância Flor de Arroz em Ingoré (1)


Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Ingoré > 7 de maio de 2013 >  Aspeto imterior do Jardim de Infância Flor de Arroz em Ingoré (2)


 Guiné-Bissau > Região de Cacheu > Ingoré > 7 de maio de 2013 >  Aspeto imterior do Jardim de Infância Flor de Arroz em Ingoré. (3)

Fotos (e legendas): © José Teixeira (2013). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: LG]


1. Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau (30 de Abril - 12 de maio de 2013) - Parte X

por José Teixeira

O José Teixeira é membro sénior da Tabanca Grande e ativista solidário da Tabanca Pequena, ONGD, de Matosinhos; partiu de Casablanca, de avião, e chegou a Bissau, já na madrugada do dia 30 de abril de 2013; companheiros de viagem: a esposa Armanda; o Francisco Silva, e esposa, Elisabete.

No dia seguinte, 1 de maio, o grupo seguiu bem cedo para o sul, com pernoita no Saltinho e tendo Iemberém como destino final, aonde chegaram no dia 2, 5ª feira. Ba 1ª parte da viagem passaram por Jugudul, Xitole, Saltinho, Contabane Buba e Quebo.

No dia 3 de maio, 6ª feira, visitam Iemberém, a mata di Cantanhez e Farim do Cantanhez; no dia 4, sábado, estão em Cabedú, Cauntchinqué e Catesse; 5, domingo, vão de Iemberém, onde estavam hospedados, visitar o Núcleo Museológico de Guileje, e partem depois para o Xitole, convidados para um casamento ] (*)... 

É desse evento que trata a 8ª crónica: os nossos viajantes regressam a Bissau, depois de uma tarde passada no Xitole para participar na festa de casamento de uma filha de um fula que, em jovem, era empregado na messe de sargentos e que tinha reconhecido o Silva, no seu regresso ao Xitole. A crónica nº 7 foi justamente dedicada ao emocionante reencontro [, em 1 de maio, ] com o passado, por parte do ex-alf mil Franscisco Silva, que esteve no Xitole, ao tempo da CART 3942 / BART 3873 (1971/73), antes de ir comandar oPel Caç Nat 51, Jumbembem, em meados de 1973,

A crónica anterior a nº 9, corresponde ao dia 6 de maio: os nossos viajantes foram até Farim e regressaram a Bissau. já que o Francisco Silva, mesmo de férias, teve de fazer uma intervenção cirúrgica, a uma criança que esperava um milagroso ortopedista há mais de um ano! Na crónia nº 10, descreve-se a viagem até Varela, em 7 de maio.

Próximas crónicas: 8 maio – visita a Elalab; 9 maio- Visita a Djufunko e um cheirinho de praia em Varela; 10 maio – Descanso em Varela; 11 maio – Regresso a Bissau e embarque de madrugada, de regresso a casa.

2. Parte X > 7 de maio de 2013: de Bissau a Varela...

Eis-nos de novo na estrada a caminho de Varela, nesta tarde de fim da época seca. O aspeto dourado da planície lembra-nos que o fim da época de verão se aproxima. Os mangueiros vergam-se com o peso dos seus frutos. Em conjunto com cajueiros pintalgados de botões vermelhos dão vida e cor às planícies que bordejam as picadas afastando de vez o fantasma de um hipotético inimigo à espreita, que por vezes insiste em permanecer na nossa mente.

As pessoas caminham num vai e vem permanente, alheias à nossa passagem, ou então miram-nos com um olhar, por vezes interrogativo, por vezes sorridente,  como que a dizer-nos: bem-vindo. Começam a surgir no ambiente os primeiros sinais de que a chuva está a chegar. Algumas nuvens, calor seco e sufocante, e, as pequenas moscas, teimosas e incomodativa.

As secas bolanhas, algumas, já queimadas e prontas para receber a semente que irá produzir em cêntuplo o arroz, assim o esperam as gentes da Guiné. Outras a servir de pasto, onde os bovinos se alimentam, em grandes manadas, sem pastor por perto.

Lá fomos fazendo caminho, passando a ponte em João Landim e um pouco mais a norte a ponte de S. Vicente, exatamente no local onde em Maio de 1968 este vosso amigo escrivão desembarcou a caminho de Ingoré, tal como hoje, só que agora, como voluntário em gozo de todas as suas liberdades, o que não aconteceu naquele tempo. Na realidade, a farda que me obrigaram a vestir por ser um mancebo,  filho de Portugal,  condicionou a minha liberdade e atirou-me para uma guerra que eu não queria fazer.

Ao passar de novo naquele lugar, vieram-me à memória os momentos da chegada, sem ninguém à nossa espera e o barco (LDM) a partir de imediato por causa das marés. Depois, uma ou duas horas atrasada chegou a Maciel, carro de combate, uma Daimler,  que eu nunca tinha visto, na frente da coluna, ao longe na picada deixando atrás de si uma nuvem de terra que nos impediu de ver numa primeira fase, as viaturas que vinham na retaguarda. Um susto para alguns logo a começar, no primeiro dia em que pisamos a terra da Guiné.

Recordei, só para mim, o espanto sentido quando vi logo à frente os primeiros africanos, balantas, semi-nus a trabalhar na bolanha e perguntei na minha ingenuidade se aqueles é que erem os turras. O resto do caminho, nem viva alma havia para nos desejar boa sorte. Mas ao chegar a Ingoré, para nosso espanto e arregalo doa olhos, logo um grupo de bajudas de “mama firma” espreitavam sorridentes esperançosas em encontrar forma de ganhar mais uns patacões na lavagem da roupa dos periquitos.



Guiné > Região de Cacheu > Ingoré > CCAÇ 2381 (1968/70) > A famosa Daimler Massiel





Guiné > Região de Cacheu > Ingoré > CCAÇ 2381 (1968/70) > O 1º cabo aux enf Teixeira, convivendo com duas crianças da Mocidade Portuguesa em Ingoré em 1968, no início da sua comissã. Foram dias, em geral, alegres e descontraídos, os dias de Ingoré, com o pessoal da CCAÇ 2381 em treino operacional antes de ser colocado no sul (Buba, Empada, região de Quínara)..



Guiné > Região de Cacheu > Ingoré > CCAÇ 2381 (1968/70) > Antotinha > Recordando os tempos de enfermagem na tabanca em construção de Antotinha

Fotos (e legendas): © José Teixeira (2006). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: LG]


A tabanca de Antotinha, uma aposta na altura para juntar os povos perdidos no mato e que tanto sofrimento provocou nas pessoas que eram obrigadas a deixar as suas raízes, as suas moranças, campos e sonhos para à força das armas para se juntarem nesta tabanca que o exército estava a construir. Esta tabanca é hoje um mundo de gente, perdida pela estrada fora.

Ingoré cresceu. Desenvolveu a agricultura e o comércio. Talvez tenha uns milhares de habitantes. Tem escolas, dois infantários, um dos quais da responsabilidade pedagógica da AD - Acção para o Desenvolvimento, que a Tabanca Pequena tem apoiado com livros, brinquedos mesas e cadeiras. Tem uma feira semanal bem apetrechada com produtos da terra e bem concorrida de clientela, incluindo do Senegal, ali ao lado.

Foi em Ingoré que fizemos a nossa primeira paragem para visitar o infantário “Flor de Arroz” e conviver com o pessoal que o serve e alguma população que logo apareceu, incluindo um velho combatente do Exército Português, curvado pelo peso dos anos, de uma magreza impressionante, agarrado ao seu arco e flecha com os quais se serve para obter alguma caça para sobreviver. Como em todo o lado, desfiam-se as contas da saudade do tempo que foi tempo de guerra e dor. A guerra acabou, mas a dor, essa ficou, se não outra, a da saudade, mas muito maior é a sensação, lá como cá, do abandono da pátria, para este velhinho que se diz português, com o corpo cheio de maleitas.

Sem grande tempo para paragens, seguimos em direção a S. Domingos, onde chegamos ao cair da noite. Ainda a tempo de visitar o CENFOR – Centro de Formação de S. Domingos e jantar, já acompanhados pelo “Velho” Kissimá,  da etnia saracolé,  que escolheu para esposa um bela felupe e foi viver para Varela.

Depois de passarmos Susana e quando já estávamos às portas de Varela, já a noite ia alta, deparamos com uma cena no mínimo caricata. Uma barreira na estrada que não era mais que uma corda feita de farrapos velhos impedia-nos a passagem. Ao lado, a casa onde deviam estar os militares encarregados de controlar o que se chama pomposamente a barreira de controlo de fronteira. Se estavam, dormiam a sono solto, talvez agitado pelos vapores do álcool que lhe tapou os ouvidos de tal maneira que não houve meio de os acordar, para nosso prazer em viver estes cenas e desespero do motorista que se farou de chamar e bater, bater… sem resposta.

Tal como no tempo da guerra, este homem, soldado português de outros tempos, também ele esquecido, há que desenrascar. Inversão de marcha rápida, murmurando- Se não há estrada (picada) há o caminho da mata.

Demos uma grande volta, internados na mata de Varela. Parece que até a viatura sabia o caminho, por caminhos nunca dantes percorridos. Só o “faro” do condutor e do Kissimá nos permitiu chegar a Varela em tempo para descansar, depois desta pequena aventura que nos transportou a outros tempos bem mais difíceis.

Zé Teixeira

(Continua)
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Nota do editor:

Último poste da série > 16 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11845: Crónicas de uma viagem à Guiné-Bissau: de 30 de abril a 12 de maio de 2013: reencontros com o passado (José Teixeira) (9): Uma visita ao cais do Pidjiguiti e à baixa de Bissau da nossa tristeza, enquanto o Franscisco Silva operava na clínica de Bor uma menina que esperava este milagre há mais de um ano

Guiné 63/74 - P11880: Notas de leitura (506): A imprensa esquerdista e a luta anticolonial: A Guiné (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 12 de Abril de 2013:

Queridos amigos,
Temos aqui o vastíssimo repertório da imprensa clandestina oriunda da esquerda radical.Estudantes, desertores, refratários, católicos progressistas, exilados mais antigos, entre outros, deixaram um legado com várias variedades ideológicas onde avultaram o maoismo, o trotskismo, o marxismo-leninista dissidente do PCP. Predominaram o MRPP, o PCP (ML), os dissidentes do PCP.

Um dos olhares que esta imprensa oferece tem a ver com a luta anticolonial onde facilmente se percebe o charme de Cabral e a forte atração do seu ideário revolucionário. Mas também é possível analisar-se estes universos ideológicos, ver os nomes de antanho e conferir os postos que eles atualmente ocupam…

Um abraço do
Mário


A imprensa esquerdista e a luta anticolonial: A Guiné

Beja Santos

“As armas de papel”, por José Pacheco Pereira (Círculo de Leitores e Temas e Debates, 2013) é um rigoroso e importantíssimo inventário da imprensa clandestina e do exílio ligada a movimentos radicais de esquerda cultural e política (1963-1974). Trata-se de um segmento muito importante de imprensa da responsabilidade da extrema-esquerda e neste estudo aparecem 158 títulos ligados a organizações de esquerda radical. 

Como escreve o autor, “A classificação de ilegal e clandestina não oferece dúvidas para a maioria da imprensa publicada no interior de Portugal, mas é igualmente válida para certas publicações produzidas ora do país. Classificaram-se como clandestinas todas as publicações realizadas fora de Portugal que não seguiam as regras legais para a sua publicação no respetivo país”

O conjunto da imprensa em análise foi organizado nas seguintes tipologias: órgãos oficiais de organizações; publicações também oficiais, mas de índole interna, de organizações políticas; órgãos temáticos de organizações ligados a uma questão única (é o caso do colonialismo); órgãos oficiais de organizações frentistas; jornais de causas (é o caso da luta anticolonial); jornais de “massas”, cuja ligação a organizações políticas é de um modo geral não enunciada explicitamente; órgãos de associações que exprimem a posição de organizações políticas que eram maioritárias no seu seio; órgãos semilegais publicados no âmbito do movimento estudantil, órgãos de “orientação” no movimento associativo operário e estudantil; órgãos de grupos cujo elo de ligação é a própria publicação e que não têm qualquer organização para além da sua produção e distribuição; publicações de grupos ad hoc de carácter cultural contestatário.

Predomina, na sua generalidade, o modelo leninista, estas organizações, a despeito de todas as divergências que eram conhecidas (maoistas, trotskistas, marxistas-leninistas e antirrevisionistas…), apresentavam-se contra o colonialismo, algumas apelavam declaradamente à deserção, outras à convergência políticas dos desertores do exílio. Como é igualmente sabido, muitos dos colaboradores destas publicações vieram, depois do 25 de Abril, a ter um papel central nas universidades, na renovação dos estudos históricos e da filosofia, outros vieram a militar em partidos políticos, fundaram editoras, aparecem hoje à frente de diferentes causas. O auge desta imprensa situa-se particularmente nos de 1972 e 1973 (convém recordar que 1974 ficou reduzido ao primeiro quadrimestre). Tem o maior interesse o estudo feito às tecnologias da imprensa clandestina, caso dos duplicadores, mimeógrafos, tipografias, grafismo e iconografias utilizadas.

Passa-se agora em revista algumas dessas publicações quanto à luta anticolonial. 

  • “Ação Comunista” era um órgão da corrente trotskista e afirmava-se lutar pelo “transcrescimento proletário e socialista da revolução em Angola, Guiné-Cabo Verde e Moçambique”
  • de igual modo, “Ação Popular”, dirigido por dissidentes do PCP tinha o noticiário centrado na situação internacional, na guerra do Vietnam e na luta das colónias portuguesas; 
  • “Alavanca” era publicada em França por elementos da LUAR, incluía no seu objetivo informar sobre as lutas do povo português e as lutas de libertação nacional dos povos das colónias; 
  • “Anticolonialismo” era publicado em Londres para ser distribuído no interior do país por um “Grupo Anticolonialismo”, os seus fundadores eram militantes estudantis portugueses no estrangeiro, Basil Davidson era um colaborador do jornal, importa realçar que em finais de 1971, Pedro George, representado o Anticolonialismo, e Medeiros Ferreira, a Polémica, fazem em Londres uma entrevista comum a Amílcar Cabral, publicada no segundo número da revista, trata-se de uma importante entrevista, Cabral mostra abertura e vontade de negociação com o governo português, a publicação divulgava os endereços de várias organizações de desertores na Europa, mormente radicados na Suécia; 
  • “O Anti-Colonialista” foi uma publicação clandestina mimeografada produzida no interior do país, era o jornal da organização anticolonial do MRPP, MPAC; 
  • “BAC”, boletim anticolonial era editado por um grupo de católicos progressistas, caso de Nuno Teotónio Pereira, Luís Moita e padre José de Sousa Monteiro, o grupo pretendia “desenvolver atividade anticolonial” na clandestinidade, graças à cumplicidade do padre Ismael Nabais Gonçalves usava um copiógrafo da paróquia da freguesia da Igreja Nova, em Mafra, a rede de informação nacional incluía o escritor Nuno Bragança, que trabalhava no Ministério dos Negócios Estrangeiros e que dava conhecimento de uma série de documentos confidenciais sobre a guerra colonial, algum desse material foi por ele ficcionado no romance Square Tolstoi (1961); 
  • o boletim “CLAC Ho Chi Minh” afirmava-se contra a guerra colonial imperialista, aparece insistentemente associado à Guiné-Bissau referindo os nomes de Amílcar Cabral e Domingos Ramos;
  • a favor da luta do povo português contra a guerra colonial era também o “Bulletin du Comité de Soutien aux Déserteurs et Réfractaires Portugais”, ligado ao PCP (ML);
  • “Contra a Guerra Colonial” era outra publicação clandestina associada ao MRPP, o seu conteúdo era de pura agitação anticolonial:
  • “Guerra à Guerra” era bilingue (português e inglês), estava ligado ao Comité de Desertores Portugueses, o responsável era Fernando Cardeira; 
  • “Luta” era um boletim legal publicado em Paris, sob a direção de Pierre Sorlin, sociólogo, estava dirigido aos desertores portugueses em França; 
  • “Os Povos em Armas” era o boletim informativo anticolonial do comité de 4 de Fevereiro… a lista destas publicações é enorme. 

Folheando-as, fica-se com a ideia de que os seus autores conheciam melhor o que se passava na Guiné do que em Angola e Moçambique. A razão será simples: PAIGC Actualités, redigido em Conacri, e até 1971 sob a direção do próprio Cabral, era largamente difundido junto dos comités de desertores e outros grupos oposicionistas, Cabral quando vinha à Europa fazia questão de se relacionar com estes diferentes grupos. 

Não é por acaso que o seu assassinato teve ampla repercussão nesta imprensa clandestina. Ficou dito atrás que a revista Polémica colaborou numa entrevista a Amílcar Cabral em 1971, de colaboração com Anticolonialismo. Medeiros Ferreira foi o entrevistador e considerou-o um momento alto da sua participação na Polémica. Na entrevista, Amílcar Cabral afirmava: 

"Se porventura em Portugal houvesse um regime que estivesse disposto a construir não só o futuro e o bem-estar do povo de Portugal, mas também o nosso, nós não veríamos nenhuma necessidade de estar a fazer a luta pela independência. Mas em pé de absoluta igualdade. Quer dizer, se o presidente da república pudesse ser quer de Cabo Verde, da Guiné, como de Portugal; se todas as funções estatais, administrativas, etc, fossem igualmente possíveis para toda a gente, nós não veríamos nenhuma necessidade de estar a fazer a luta pela independência, porque já seríamos independentes, num quadro humano muito mais largo e talvez muito mais eficaz do ponto de vista da História".

“As Armas de Papel” esclarecem quem era quem na imprensa clandestina oriunda da extrema-esquerda. Estão por ali vários propósitos, mas uma das principais transversalidades era a luta anticolonial onde a Guiné tinha tratamento preferencial, sabe-se lá se pela capacidade de comunicar os termos da própria luta, sabe-se lá se pela própria sedução do seu líder revolucionário.
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Nota do editor

Último poste da série de 26 de Julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11872: Notas de leitura (505): "Coisas de África e a Senhora da Veiga" por José Pais (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P11879 Os nossos enfermeiros (10): Tenho uma dívida de gratidão para com o fur mil enf Moita, da CART 1745, que tratou do corpo do meu infeliz 1º cabo enf Louro, o João Batista da Silva, o Louro, natural de Louro, Vila Nova de Famalicão, morto em combate em 21/9/1968, em Talicó, Sambuiá (Adriano Moreira)

Guiné > Região do Cacheu > Barro > CART 2412 (1968/70) > Pormenor onumento erigido à memória do 1º cabo enf João Batista da Silva, o Louro,  e que foi destruído a seguir à independência.

Fotos (e legenda): © Afonso M.F. Sousa (2006). Todos os direitos reservados.

1. Comentário do Adriano Moreiro (nome de guerra, Admor), com data de hoje, ao poste P11869

Agora digo eu: Porra Armando, Porra Luís!

Depois do Armando atirar aos olhos de toda a gente o nosso prestimoso e insignificante papel de enfermeiros e até de médicos nestas situações, ainda vem o Luís atirar-me aos olhos com o antigo poste do meu camarada Afonso Sousa e com o monumento lapidar do meu melhor e infeliz cabo enfermeiro,  morto numa emboscada em Talicó, Sambuiá [, vd. carta de Binta],  pelos guerrilheiros do PAIGC,  passado cerca de mês e meio de termos chegado à Guiné.

Sabem o que eu vejo naquele monumento erigido à sua memória? A cabeça do Louro,  só presa ao corpo pela cervical, quase decepada.

Sabem como o nosso malogrado camarada se chamava? JOÃO BAPTISTA da Silva [, de alcunha, Louro]

Só não acabo aqui o meu comentário, porque tenho uma dívida de gratidão muito grande em relação ao corpo de enfermeiros da CART 1745.(**)

O meu camarada Fur Enf Moita viu como eu estava e só me disse estas palavras:
─ Moreira vai para o bar ou para onde quiseres, eu e os meus enfermeiros vamos tratar do Louro e, quando ele estiver pronto,  eu mando-te chamar,  a ti e aos teus enfermeiros

E realmente assim se cumpriu. Foi uma autêntica escritura. Ainda bem que eu não tive de fazer o mesmo por mais ningúem.

Eu depois volto. (***)

Um grande abraço para todos.

Adriano Moreira
ex-fur mil enf, 
CART 2412, 
Bigene, Binta, Guidaje e Barro, 
1968/70
 ________________

Notas do editor:

(*) O João Batista da Silva era natural de Gandra, Louro, Vila Nova de Famalicão; 1º cabo enf, CART 2412, foi morto em combate em 21/9/1968. Está sepultado no cemitério da sau freguesia natal, Louro, concelho de Vila Nova de Famalicão.

(**) Unidades que passaram por Barro (nota de A. Marques Lopes)

(...) Companhia de Artilharia n.° 2412

Divisa: "Sempre Diferentes"

Partida: Embarque em 11 de Agosto de 1968; desembarque em 16 de Agosto de 1968;
Regresso: Embarque em de 4 de Maio de 1970

Síntese da Actividade Operacional

Em 28 de Agosto de 1968, seguiu para Bigene, a fim de efectuar o treino operacional com a CART 1745, sob orientação do COP 3 e seguidamente actuar nesta zona de acção em operações realizadas nas regiões de Talicó [, carta de Binta,]  e Farajanto [, carta de Bigene], entre outras.

Em 14 de Outubro de 1968, rendendo a CART 1648, assumiu a responsabilidade do subsector de Binta, com um pelotão destacado em Guidage, ficando integrada no dispositivo e manobra do COP 3. Em 17 de Outubro de 1968, a sede do subsector passou para Guidaje, ficando então com dois pelotões destacados em Binta, sendo a subunidade especialmente orientada para a contrapenetração no corredor de Sambuiá; a partir de 8 de Fevereiro de 1969, após troca de sectores, passou à dependência do BCAÇ 1932.

Em 9 de Março de 1969, por troca com a CCaç 3, assumiu a responsabilidade do subsector de Barro, ainda com um pelotão em Binta em reforço da guarnição local até finais de Abril, mantendo-se integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 1932, mas agora orientada para a contrapenetração nos corredores de Canja e Sano; em 1 de Agosto de 1969, após novo reajustamento das zonas de acção dos sectores, passou à dependência do BCAV 2876 até 7 de Fevereiro de 1970, data em que o subsector de Barro foi incluído na zona de acção do COP 3.

Após deslocamento de dois pelotões para Bissau, em 17 de Abril de 1970, a fim de substituírem, transitoriamente, a CART 2411 no dispositivo de segurança e protecção das instalações e das populações da área, foi rendida no subsector de Barro pela CCAÇ 2725 e recolheu seguidamente a Bissau, a fim de efectuar o embarque de regresso. (...)

(***) Último poste da série > 24 de julho de 2013 > Guiné 63/74 - P11866: Os nossos enfermeiros (9): No caso dos furriéis enfermeiros iam para a Escola do Serviço de Saúde Militar, em Campo de Ourique, tirar o seu curso de enfermagem do qual faziam parte as seguintes disciplinas: Primeiros Socorros, Enfermagem, Profilaxia Tropical, Higiene, Guerra Química e Táctica Sanitária (Adriano Moreira, ex-fur mil enf , CART 2412, Bigene, Binta, Guidaje e Barro, 1968/70)

domingo, 28 de julho de 2013

Guiné 63/74 – P11878: Visita à Guiné e Briefing ao General Chefe do Estado Maior do Exército, general Paiva Brandão -Bissau, 26 de Janeiro de 1974 -, (CONTINUAÇÃO – Parte II) (Luís Gonçalves Vaz)


1. O nosso amigo Luís Gonçalves Vaz, membro da Tabanca Grande e filho do Cor Cav CEM Henrique Gonçalves Vaz (último Chefe do Estado-Maior do CTIG - 1973/74), enviou a segunda parte da mensagem postada em P11871.
  
Comando Territorial Independente da Guiné
QUARTEL GENERAL 

Visita à Guiné e Briefing ao Senhor General Chefe do Estado Maior do Exército, general Paiva Brandão (Bissau, 26 de Janeiro de 1974) 

(CONTINUAÇÃO – Parte II) 


General João Paiva Leite Brandão (CEME 1972 - 1974) e Chefe do Estado Maior do QG / CTIG, coronel Henrique Gonçalves Vaz (CEM/CTIG 1973 – 1974). 


GUINÉ – QG/CTIG/ 11 de Julho de 1973 - 

Oficiais a prestarem seviço no Q.G./CTIG no ano de 1973, assistem à cerimónia de transmissão de funções do CEM/CTIG. O coronel do CEM, Henrique Vaz substitui o coronel do CEM Duque.




GUINÉ – Sala de operações do QG/CTIG/ 11 de Julho de 1973  - 

Da esquerda para a direita; Brigadeiro Banazol, comandante do CTIG; Coronel Galvão de Figueiredo, 2º comandante do CTIG e o  Chefe do Estado-Maior/CTIG, Coronel do CEM Henrique Gonçalves Vaz. Este último responde, na sala de operações do Q.G.,  ás palavras do CMDT do CTIG, numa cerimónia de transmissão de funções do CEM/CTIG.


Comando Territorial Independente da guiné
QUARTEL GENERAL

Briefing a sua Excelência o Senhor General Chefe do Estado Maior do Exército
(exposição do Chefe de Estado Maior do CTIG, coronel do CEM Henrique Vaz)
Continuação…. 

1 - MISSÃO DO CTIG 

“ … A missão fundamental do CTIG é apoiar administrativa e logisticamente as forças do Exército que combatem no T.O. da Guiné. 

Esta porém, é uma missão muito simplista pois, na realidade, a sua missão está muito aumentada. 

Desde o apoio prestado, em muitas circunstâncias, aos restantes Ramos das Forças Armadas, que combatem neste T.O., até ao apoio à chamada “manobra sócio-económica”, em que tanto está empenhado o Comando Chefe das Forças Armadas da Guiné, ao apoio das infra-estruturas, muito rudimentares, da administração provincial, são alguns dos aspectos que ampliam substancialmente a missão do CTIG, com dispêndio substancial de pessoal, de material e de aumento tremendo de esforço pedido quer aos comandos quer às tropas e, sem dúvida, com desvio da sua missão primordial, embora, è certo, por imposição do condicionalismo próprio deste T. O. 

Mapa da Guiné “esboço de uma divisão segundo formas de relevo.”

2 - CARACTERÍSTICAS GERAIS DO T.O.

a) DIMENSÃO

Como V. Exª. Bem sabe, a Guiné è uma baixa planura em que se destaca uma parte litoral, favorável ao tráfego fluvial, bastante recortada e sulcada por diversos rios e outros cursos de água, em que as marés têm bastante amplitude e, uma zona interior, ligeiramente mais elevada, para Leste da linha definida por FARIM – MANSOA e ALDEIA FORMOSA, em que predomina a extensão territorial favorável ao trânsito rodoviário. 

A penetrante principal e única, para Leste, é o rio Geba até ao XIME – BAMBADINCA, por onde se realizam todos os transportes de pessoal e material para a zona do interior da província. 

Esta compartimentação geral define três áreas  com características diferenciadas: 

- O Oeste – Sulcado por alguns rios, permitindo o movimento fluvial de transportes, mas também, permeável ao escoamento rodoviário, pela existência de boas estradas asfaltadas, na área compreendida entre os rios CACHEU E MANSOA; 

- A ZONA SUL – Profusa e profundamente sulcada por vários cursos de água em que os movimentos de tropas e materiais se fazem, quase exclusivamente, por via fluvial; 

- A LESTE – Zona nitidamente apropriada ao tráfego rodoviário, dispondo de uma estrada penetrante, asfaltada, que vai de BAMBADINCA a BURUNTUMA, já na fronteira, passando por BAFATÁ e N. LAMEGO. 

Todas estas áreas são acessíveis aos meios aéreos, quer da FAP, quer dos TAGP, dada a profusão de boas pistas e aeroportos, que a província dispõe. É de resto, muito intenso o tráfego, de transporte em sobreposição aos meios fluviais e rodoviários.


Guiné – CUMERÉ / 1973  INSTRUÇÃO DE MILÍCIAS 

No grupo dos cinco militares do lado direito da fotografia, Major Aragão, Capitão Teixeira, Major Pinheiro – comandante geral das Milícias, coronel Henrique Vaz – CEM/CTIG e o Tenente-coronel de artilharia O´ Neto – comandante do CIMC (Centro de Instrução  militar do Cumeré)

b) CLIMA

É um factor importante, a ter em conta na Guiné, condicionante dos transportes a realizar na província e até fortemente limitativo da “actividade operacional”. 

Com duas estações: a sêca, que atravessamos, é a mais agradável, em amenidade climática, a mais favorável à realização dos diversos tipos de transporte mas, também a mais propícia à “actividade operacional”, em que o IN mais forte e insistentemente ataca. 

Neste período não há chuvas e a temperatura não atinge valores elevados, sendo o grau de humidade muito aceitável. Ao contrário, a “estação das chuvas”, que tem início em cerca de meados de Maio, prolongando-se até meados de Novembro, é a época das grandes precipitações, das temperaturas e grau higrométrico bastante elevados. 

No conjunto de todos os seus factores, o Clima é um elemento “altamente desgastante” do pessoal e do material.

c) POPULAÇÃO 

( já aqui publicado, consultar e ler na “Parte inicial) clicar em:
http://blogueforanadaevaotres.blogspot.pt/2013/07/guine-6374-p11871-visita-guine-e.html#links

d) RECURSOS LOCAIS

Praticamente não existem! Tudo tem de vir da Metrópole ou do estrangeiro.
A maior contribuição da Guiné neste aspecto, é a carne que no entanto não chega de forma alguma para as necessidades do Exército, pelo que o CTIG tem de receber carne congelada vinda de Lisboa.
O arroz é outro produto muito cultivado na Província mas que não chega para as necessidades da própria População. Esta mesma, tem de ser abastecida com recurso à importação.
A madeira, que existe em abundância na Guiné é um dos materiais utilizados pelo Exército para a satisfação das necessidades de construção e outras afins.

Coronel do CEM Henrique Gonçalves Vaz in: Exposição do Chefe de Estado Maior do CTIG, no Briefing a sua Excelência o Senhor General Chefe do Estado Maior do Exército

Nota do autor: No próximo artigo serão transcritos os pontos em falta;  “Condicionamentos Gerais do T.O. e Meios ao dispor do Q.G./C.T.I.G.”. 

Braga, 28 de Julho de 2013
Luís Gonçalves Vaz
(filho do Coronel Henrique Gonçalves Vaz, então Chefe do Estado-Maior do CTIG) 

Fotos (e legendas): © Luís Vaz Gonçalves (2013). Todos os direitos reservados.
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Nota de MR:

Ver a primeira parte deste poste em:


Guiné 63/74 - P11877: Memória dos lugares (240): Xime (macaréu), Bambadinca e Bafatá (José Rodrigues)

1. Mensagem do nosso camarada José Martins Rodrigues (ex-1.º Cabo Aux Enf da CART 2716/BART 2917, Xitole, 1970/72) enviada ao nosso Blogue:

Caro Editor do Blogue, Camarada e Amigo Carlos Vinhal:

Entendi ter chegado o momento de dar resposta positiva ao desafio, que há tempos atrás me colocaste, de publicar as minhas oito crónicas “Conversas à mesa com Camaradas Ausentes” (Estórias da História da Guerra Colonial na Guiné-Bissau) e das oito crónicas “A minha primeira viagem à Guiné – 1998”.

Deixo à consideração dos Editores do Blogue, o momento e a periodicidade da publicação das mesmas.

Para os camaradas que andaram por Bafatá, Bambadinca e Xime, envio para publicação um vídeo (de 2001) com pequenos apontamentos dessas zonas e que inclui ainda imagens da passagem do Macaréu no rio Geba, recolhidas no local do que resta do antigo cais do Xime.

De salientar que as imagens se referem à época seca.

Com um Cordial Abraço de Amizade e Camaradagem
José Rodrigues
Ex-1.º Cabo Aux. Enfermeiro
CART 2716
XITOLE
1970/72


2. Comentário do editor:

Caro camarada e amigo José Rodrigues,

De acordo com o combinado, vamos publicar as tuas estórias e as crónicas da tua primeira viagem de saudade à Guiné-Bissau. Fá-lo-emos com periodicidade semanal, em princípio às quartas-feiras.

Hoje, para começar, deixamos os links para o sempre espectacular macaréu, que em boa hora registaste no Xime, e para o filme (completo) que fizeste a caminho do Xime, Bambadinca e Bafatá, que irá lembrar boas e más horas a quem por lá passou.

Fica aqui um abraço dos editores para ti.
Carlos Vinhal




Vídeo, de 2001, com o macaréu no Rio Geba, no Xime, filmado a partir do antigo cais...



Viagem, en 2001, à Guiné-Bissau, com passagem pelo antigo setor L1, zona leste. Neste vídeo, há cenas filmadas no Xime, Bambadinca e Bafatá [No vídeo, aparece por diversas vezes o Dr. António Rodrigues Marques Vilar, hoje médico psiquiatra reformado, residente em Aveiro. Aparece no vídeo de pera e chapéu de palhinha.  Era carinhosamente conhecido, entre a malta, pela alcunha Drácula... Foi alf med na CCS/BART 2917, unidade que esteve sediada em Bambadinca (1970/72]. 

Neste vídeo, são  revisitados vários sítios que nos são familiares, àqueles de nós que passaram por Bambadinca, desde o Bataclã de Bambadinca (discoteca...) até à casa do Rendeiro, o comercaiante da Murtosa, que morreu ainda há pouco tempo... O outro comerciante, o José Maria, já não era vivo em 2001. Nesta viagem também participou o David Guimarães, ex-fur mil, CART 2716 (Xitole, 1970/72). A voz "off" deve ser do José Rodrigues, o autor do vídeio. (LG).

Vídeos: © José Ridrigues (2001). Todos os direitos reservados

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Nota do editor

Último poste da série de 23 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11863: Memória dos lugares (239): Canjambari 1972 (2) (Manuel Lima Santos)

sábado, 27 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11876: Contraponto (Alberto Branquinho) (50): A Batalha do Umbigo

1. Em mensagem de 25 de Julho de 2013, o nosso camarada Alberto Branquinho (ex-Alf Mil de Op Esp da CART 1689, CatióCabeduGandembel e Canquelifá, 1967/69) enviou-nos o seu contraponto número 50.


CONTRAPONTO

50 - A batalha do UMBIGO

Batalha?!
Então, em guerrilha e contra-guerrilha, havia (há) aquelas lutas a que se chama uma “batalha”? Assim, por exemplo, conquistando ou reconquistando terreno, empurrando o inimigo para as suas terras de origem?
Ao que parece... (parece que) sim. Há quem fale de “batalhas” com respeito às suas experiências de contra-guerrilha.

Quando foram transportados para UMBIGO já havia guerra por aquelas bandas, mas eram coisas de outros, coisas sem importância...
Quando saíram do UMBIGO continuou a haver guerra, mas eram coisas menores, porque eles... já não estavam no seu UMBIGO. A sua batalha do UMBIGO é que foi uma verdadeira batalha!
Só eles tiveram guerra!
Eles é que estiveram “na linha da frente da batalha do UMBIGO”!

Mas: em guerrilha e contra-guerrilha há “linha da frente”?

Não interessa, eles sim, eles é que estiveram na frente de batalha do UMBIGO!
Vocês não fazem ideia dos riscos e trabalhos que passaram na batalha do seu UMBIGO! Estavam cercados de inimigos! Por todos os lados (menos pelo lado de cima, porque o inimigo não tinha força aérea...)
A sul havia as matas de Pubisseco, a norte as matas de Peitassa, não esquecendo as outras, embora mais pequenas, situadas a nordeste e a noroeste: as matas de Bissovaco.
Eram matas impenetráveis e só à catanada se conseguia abrir caminho. Bom, bom, teria sido usar napalm, mas nem sempre era possível... ou aconselhável. Tentaram facilitar... essas dificuldades fazendo desmatação. Assim, tiveram guerra e mais guerra. Batalhas!

Por todas essas razões, sentem esta necessidade de escrever, escrever sobre a batalha do UMBIGO para que os outros e as gerações vindouras os louvem (a eles, sim!), os que travaram a batalha do seu UMBIGO!

(Nada mais tem interesse para o entendimento da História do que essas pequeninas coisas.)
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Nota do editor

Último poste da série de 26 DE FEVEREIRO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11158: Contraponto (Alberto Branquinho) (49): O Spínola que eu... entrevi

Guiné 63/74 - P11875: Humor de caserna (38): Estou a fazer voar o meu pensamento (Tony Borié) (11): As ovelhas e a cabra do senhor Aniceto

1. Em mensagem do dia 14 de Julho de 2013, o nosso camarada Tony Borié (ex-1.º Cabo Operador Cripto do Cmd Agru 16, Mansoa, 1964/66), enviou-nos mais este pensamento voador... 




Seguindo o ditado que diz:
- Vale mais uma boa foto, do que mil palavras, o Cifra, continuando a contar as histórias do senhor Aniceto, dirigindo-se não só aos antigos combatentes, mas também às pessoas que não acreditam no que lhe dizem, aquelas que andam sempre desconfiadas, que só o que vêm é que é verdade, como se explicou no princípio, vale mais uma boa foto do que mil palavras, portanto vamos primeiro “falar a tal mentira”, que é todo aquele blá, blá, blá, onde diz que, para os que vivem no mundo onde se fala inglês, vão dizer, com toda a certeza:
- Mr. Aniceto, has a flock of sheep with different colors!

No mundo onde se fala francês, dizem:
- M. Aniceto, possède un troupeau de moutons avec des couleurs différentes!

Onde se fala germânico, friamente dizem:
- Mr. Aniceto, hat eine Schafherde mit verschiedenen Farben!

No mundo que se fala espanhol, entre dois ou três “zzz”, dizem:
- El señor Aniceto, tiene un rebaño de ovejas con varios colores!

Os chineses, põem os pauzinhos de parte, se estiverem a comer, e depois dizem:


Perceberam? Não?
Deixem lá, pois o Cifra, também não percebeu, pois tem alguma dificuldade em pronunciar, os pontos e as vírgulas!

E nós portugueses, dizemos: -
O senhor Aniceto, tem um rebanho de ovelhas com diferentes cores!

Sim é verdade, como anteriormente aqui falamos, e nunca é demais repetir, porque foi verdade, o senhor Aniceto, quando era novo, percorreu todas aquelas savanas e bolanhas da Guiné, sempre de G-3 em posição de tiro, carregado de granadas, às vezes sem comer, e com o camuflado roto e todo molhado. Claro que na altura não lhe fazia grande diferença, mas hoje o reumatismo e não só, não lhe dão descanso e tem que visitar o doutor mais vezes do que o normal.

Presentemente vive com a filha, o genro e três netos, que são dois rapazes e uma rapariga, na vila, mas também passa algum tempo na companhia da sua esposa Etelvina, a quem carinhosamente chama “patroa”, na casa que era de seus pais, lá nas Beiras, onde tem um pequeno rebanho de ovelhas e uma cabra, que ele não sabe se é da carqueija, dos pampilhos, ou das papoilas, que elas comem lá na montanha, começaram a ter diferentes cores na lã, algumas são azuis, outras cor de rosa, outras amarelas e até tem algumas verdes, e ele como bom combatente que foi, treinou a referida cabra, para guardar as ovelhas, dos lobos, e até de alguns ladrões, que os há lá na montanha.

Um destes dias, o senhor Aniceto, na sua inocência, quando visitou o doutor, na vila, contou à Lola, a empregada do doutor que está a atender as pessoas, depois de lhe dar os bons dias, e responder a todas aquelas perguntas de “chacha”, que é normal as empregadas de doutor fazerem sempre que se vai a uma consulta, ele diz-lhe:
- Não estou a brincar, mas tenho um rebanho de ovelhas lá na montanha, que são de diferentes cores, algumas são azuis, outras cor de rosa...!


Não o deixaram acabar de falar, pois não só a Lola, como os presentes, se começaram logo a rir, mas a bom rir, como é costume dizer-se! Claro, a muito custo acabou de falar, e contou o resto da história, e todas essas pessoas que estavam no consultório, além de darem uma grande gargalhada, vendo a sua cara de pessoa séria, calaram-se, mas a Lola com aquela cara de malandrice, logo lhe diz:
- Como diziam lá na Guiné, o senhor Aniceto, deve de “estar apanhado pelo clima”!

Um dos presentes, riu-se, encolheu os ombros, e até disse:
- Coitado, vê-se logo que foi combatente, continua a sonhar com a guerra, vejam lá uma cabra treinada para defender as ovelhas, deve de ser alguma guerrilheira! Será que é stress de guerra?

Então o senhor Aniceto, como já sabia que as pessoas se iam rir, e não iam acreditar em tamanho disparate, tinha pedido ao seu genro, que tinha uma Kodac das modernas, e tirou uma fotografia não só às ovelhas, como à cabra, esta armada com duas grandes espingardas, e tirando o chapéu e o casaco, que como sempre trazia vestido, e mostra as ditas fotografias.



A Lola, e todas as pessoas presentes, ficaram a saber que era verdade!
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Nota do editor

Último poste da série de 13 DE JULHO DE 2013 > Guiné 63/74 - P11836: Humor de caserna (37): Estou a fazer voar o meu pensamento (Tony Borié) (10): Morangos azuis

Guiné 63/74 - P11874: Blogpoesia (350): Uma calda feliz (J. L. Mendes Gomes)

Uma calda feliz...

por J. L. Mendes Gomes


Misturei minhas mágoas de trás

com as alegrias de hoje,
são tantas,
fiz uma calda e bebi.
Sabe-me a mel com picos de dor,
raiada de esperança.
Matei minha sede
e continuei a viver.
O caminho tem pedras,
lisas, agrestes...
Por vezes, podem doer.
Mas se todo lisinho,
sem pregas,
escorregam os pés,
quem é que não cai?...


Se fosse tudo brilhante,
sem sombras,
desapareceria
a beleza das formas,
e a profundeza das cores.

A terra seria uma esfera,
fria e luzente,
sem rios e vales profundos,
escorrendo das alturas das serras.

Por isso, há o dia e a noite,
tecido de horas alegres e tristes,
numa calda perfeita e exacta.
É o coração quem a faz
e o diz...

Ouvindo o tema de Lara

Berlim, 25 de Julho de 2013

10h15m

Joaquim Luís Mendes Gomes

______________

Nota do editor:

Último poste da série > 10 de julho de 2013 >  Guiné 63/74 - P11823: Blogpoesia (349): O milagre do pão (J. L. Mendes Gomes)

sexta-feira, 26 de julho de 2013

Guiné 63/74 - P11873: O Nosso Livro de Visitas (167): Francisco Maria Magalhães Batista, ex-Alf Mil, integrado na CART 2732 em Setembro de 1971 (Carlos Vinhal)

1. Mensagem datada de 6 de Junho de 2013 do nosso camarada Francisco Maria Magalhães Batista, ex-Alf Mil, integrado na CART 2732 em Setembro de 1971:

Tendo ido para a Guiné em rendição individual, já em final de comissão fui recambiado para a CART 2732, em Mansabá.
Recordo que no geral todos os camaradas, graduados ou não, eram simpáticos e educados, embora eu já estivesse um pouco cacimbado ou "apanhado pelo clima" como se dizia na Guiné, mas hoje faço um esforço tremendo para os recordar e recordo muito poucos. Parece que também eu passei o rio do esquecimento.

Lembro-me de encontrar no bar o major Gaspar, comandante do COP, bom conversador e bom homem. Bebia mais whisky do que eu. Li que já morreu há anos. Paz à sua alma.
Recordo o furriel enfermeiro que tinha um feitio folgazão, não recordo o nome, sei que era de Braga, e um dia dos últimos passados em Mansabá, lhe roubei uma garrafa de whisky e o convidei para ajudar a bebe-la, não gostou.
Recordo uma emboscada que um pelotão nosso, reforçado por uma secção do meu pelotão, sofreu entre o quartel em Mansoa, em que tivemos feridos com bastante gravidade, entre eles um cabo do meu pelotão que mesmo bastante ferido estava furioso por não ter dado uma grande sova aos "outros".

Houve também uma tarde em que o quartel sofreu uma flagelação de morteiros e eu com algum medo andei à procura de valas ao abrigos a que estava habituado no outro quartel, tendo por isso ouvido uma piada de um oficial que não era propriamente um louvor.

Gostaria de me libertar um pouco deste nevoeiro que cobre o meu passado na Guiné eis a razão que me leva a escrever a todos os que conviveram comigo ou outros porque a todos devo uma palavra de solidariedade, de amizade, enfim de boa camaradagem.

Só agora me apercebo, porque eu andava longe da internet, do imenso e útil trabalho desenvolvido pelo nosso camarada Carlos Vinhal, Luís Graça e outros bloguistas. Para eles o meu reconhecimento e o meu louvor.

Passem bem.
Um abraço a todos
Francisco Batista


2. Comentário de CV:

Caro camarada Francisco Batista
Muito obrigado pelo seu contacto.
Se bem me lembro, foi Comandante do 4.º Pelotão em substituição do Alf Mil José Manuel C.C. Meneres que por sua vez tinha ido substituir na CART o malogrado Alferes Couto ferido mortalmente por uma mina antipessoal IN, em Outubro de 1970.

Da História da Unidade (CART 2732) na secção de recompletamentos, em Setembro de 1971, consta:
"Sr. Alf. Mil. n.º 11700368 - Francisco Maria Magalhães Baptista, destina-se a substituir o Sr. Alf. Mil. José Manuel C.C. Meneres, transferido para o Comando-Chefe".

Não tendo estado muito tempo connosco, passou por momentos bem difíceis, como todos sabemos.
Se quiser deixar aqui algumas das suas memórias, enquanto operacional da CART 2732, registá-las-emos com agrado.

Fica desde já convidado a aderir à tertúlia deste Blogue, bastando para tal que nos envie uma foto actual e outra do tempo de Guiné, nos diga com mais pormenor quando foi e quando regressou daquele TO, as unidades que integrou e os locais onde desenvolveu a sua actividade operacional.

Pode depois, se tiver algumas memórias daquele tempo, fazê-las chegar ao Blogue para publicação, acompanhadas ou não de fotos que ainda guarde.

Para satisfazer a sua curiosidade, publico duas fotos com malta de quem talvez ainda se lembre.

Fica aqui um abraço
Carlos Vinhal

Na foto, da esquerda para a direita: Fur Mil Fonseca (4.º Pelotão), Fur Mil Vinhal (3.º Pelotão), 1.º Cabo João Carlos (impedido na messe dos oficiais) e Fur Mil Sousa (4.º Pelotão)
Foto: Carlos Vinhal

Na foto, a partir da esquerda: Alf Mil Rodrigues, Fur Mil Mendonça, Alf Mil Casal, Fur Mil Enf.º Marques, Fur Mil Correia e Fur Mil Fonseca
Foto: José Manuel Mendonça
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Nota do editor

Último poste da série de 3 DE JULHO DE 2013 Guiné 63/74 - P11793: O Nosso Livro de Visitas (166): António Madeira, ex-militar do BCAÇ 2912, trazido até nós pelo nosso camarada Juvenal Amado