1. Mensagem do nosso camarada José da Câmara (ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Brá, Bachile e Teixeira Pinto, 1971/73), enviada ao nosso Blogue no dia 23 de Setembro de 2013:
Bom dia Carlos,
Recentemente o Beja Santos fez uma recenção sobre o livro do Fur Mil José Silveira da Rosa.
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Li o livro e só posso dizer que senti asco, para não dizer pior. O que lá está escrito é gravíssimo. Conheci o Rosa, mas não o Rosa que escreveu o livro. Quando escreveu o livro já era doente do foro psicológico.
Recentemente, nesta minha última deslocação à Horta, fui informado que o Rosa falecera numa instituição para doentes mentais. Verdade ou não, veio mais que de uma pessoa.
Porque eu estive envolvido no processo futebolístico dele, ainda antes de eu ir para a tropa, as acusações que ele faz aos dirigentes do Faial são no mínimo aberrantes.
A verdade é que comentei o que ele escreve e mais alguns também o fizeram. Entre eles o nosso Hélder Sousa.
Agora aparece Mário Vitorino Gaspr, pela informação que tenho, talvez um furriel da mesma companhia ou especialidade, é boa pessoa, dizia, vem comentar mas é duro demais ao ponto de reclamar da veracidade do meu nome e da legitimidade do meu comentário. Esse que até é muito benovelente para com o Furriel Rosa, e até dou a entender que é bem possível que o livro já estando a ser escrito numa altura em que ele era acompanhado por um psiquiatra e psicologista podia conter inverdades que precisavam de esclarcimento. As acusações aos dirigentes do Faial Sport são inacreditáveis, mas isso seria uma longa história.
Eu junto o meu comentário aqui, mas não pretendo criar problemas no blogue, não é para isso que ele existe.
Abraço
José
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2. Para que o texto enviado pelo nosso camarada José Câmara seja comprendido pelos leitores, aqui ficam as (ex)citações:
i) Comentário do José da Câmara no Poste 13716:
Meus caros amigos,
Conheci o José Silveira da Rosa, o Káká dos Flamengos, natural da Ilha do Faial, jogador do Fayal Sport Club, que um dia tentou o profissionalismo no Belenenses, tendo passado por outros clubes. Após o serviço militar regressou ao Fayal Sport Club. Fui eu que fiz o processo da sua transferência de jogador profissional para aquele Clube amador, facto que julgo sem precedente na altura. O José Silveira da Rosa, foi extremamente exigente nas condições pedidas aos dirigentes daquele clube faialense, entre elas um emprego compatível com as suas habilitações literárias, o 2.° Ano dos Liceus.
O José Silveira da Rosa como jogador de futebol era dotado de uma grande técnica para o meio faialense. Civicamente bem educado, afável, simpático, jovial e brincalhão, fazia amigos com muita facilidade. Eu fui um deles.
Após o meu próprio cumprimento do serviço militar, voltei a encontrá-lo na Horta, era ele ainda jogador do Fayal Sport. Tanto quanto sei, ainda jogou futebol vários anos, sem limitações físicas visíveis. Levava o desporto muito a sério, mesmo no amadorismo puro da época. Era em tudo uma pessoa normal, ou pelo menos parecia. O seu estado traumático visível terá acontecido alguns anos após a sua experiência militar.
Foi numa das minhas deslocações ao Faial que li o livro
“Guiné, a cobardia ali não tinha lugar”. Fiquei enojado com o seu conteúdo. Chocou-me a contradição entre o homem amável que um dia conheci e o azedume da escrita. Na abordagem que faz ao seu regresso ao Fayal Sport é por demais ingrato, para não lhe chamar outra coisa, para com o Clube e os dirigentes que o ajudaram e que em minha opinião pessoal cumpriram com o que lhe prometeram, arranjando-lhe o emprego possível e com o qual ele concordou. Numa ilha pequena como o Faial não era tarefa fácil. Muitos outros, nas mesmas circunstâncias, viram-se obrigados a procurar noutras paragens o emprego que a ilha não tinha. Porque não vivi as experiências do Fur. Mil. José Silveira da Rosa não me debruçarei sobre algumas afirmações que faz no seu livro e que o Beja Santos muito bem sublinhou, mas a necessitarem de corroboração para serem credíveis. Até porque os camaradas do Furriel Rosa se inocentes merecem bem melhor que esta bofetada.
Fui recentemente informado que o José Silveira da Rosa passou os últimos anos da sua vida numa instituição de saúde. Que no seu eterno descanso ele encontre o profissionalismo futebolístico com que tanto sonhou em vida.
José Câmara
sábado, Outubro 11, 2014
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ii) Comentário de Mário Vitorino Gaspar no mesmo Poste:
Eu, Mário Vitorino Gaspar, Ex-Furriel Miliciano, Atirador com a Especialidade de Minas e Armadilhas da Companhia de Artilharia 1659 – CART 1659 (ZORBA), com o lema “Os Homens não Morrem”, e fiz a Comissão em Ganturé e Gadamael Porto, de JAN67 a OUT68.
Percorremos toda a zona do “corredor da morte”, ou “corredor de Guileje”; Sangonhá; Cacoca; Cameconde e Cacine.
Mais tarde veio a tragédia – mais para aqueles que lá ficaram destacados – de Gandembel.
Conheci, e bem o Ex-Furriel Miliciano José Silveira da Rosa e acompanhei de perto a evolução do Livro “Guiné - «a cobardia ali não tinha lugar», lendo-o inclusive, visto ter-me pedido uma opinião. Ao mesmo tempo ele quis que colaborasse com um capítulo da minha autoria e dei-lhe um texto já escrito sobre a “Operação Rinoceronte”, efectuada a 14 e 15 de Julho de 1967 no famigerado “corredor da morte”, tendo perdido o contacto com a NT o Soldado N.º 00458266, António Fernandes da Silva de Oliveira do Conde – Carregal do Sal e que após inúmeras operações nunca conseguimos localizar. Houve empenhos da Aviação e de todas as Companhias, e felizmente apareceu no fim de 11 longos dias.
A minha opinião sobre o Livro – e recordo-o como se fosse hoje – disse-lhe que ele tinha um Processo a decorrer para que fosse considerado Deficiente das Forças Armadas em Campanha – isto do Deficiente em Serviço e em Campanha é uma história que gostaria de abordar, ou se é ou não Deficiente, sendo Deficiente nunca pode existir este aborto, tem de ser Deficiente das Forças Armadas – e aquilo que denunciava era gravíssimo e lhe poderiam trazer danos.
Muito embora considerasse e considero que essas situações deveriam ser denunciadas. Ele contou até outras. Eu tinha sido um dos fundadores da APOIAR – Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vítimas do Stress de Guerra em 1994 (cargo de Vogal e Secretário); em Novembro de 1996 eleito como Vice-presidente, e de Dezembro de1998 até Janeiro de 2005 fui Presidente.
Além de ter estado com ele, julgo que na Escola Prática de
Engenharia em Vendas Novas, deve ter sido em 2002/3 que o reencontrei. Era acompanhado na APOIAR em Psiquiatria e Psicologia. Conversámos muito, e convidou-me para ir à cidade da Horta, no Faial ao Lançamento do Livro, talvez no Verão de 2003.
A APOIAR fez um Colóquio antes do Lançamento, que teve a presença da nossa Assistente Social, e Psicóloga Clínica, respectivamente Doutoras Sofia Pires e Susana Oliveira. Ainda houve um grande espectáculo, digno de se ver, antes do Lançamento, terminando com um beberete. Depois do Lançamento do Livro, foi poucas vezes à APOIAR e perdi o seu contacto.
Pelo que li, opiniões de camaradas, o Furriel Miliciano José Silveira da Rosa (trata-se de um Furriel Miliciano e não de um Furriel), não é mentiroso. Já passaram 11 anos desde o Lançamento do Livro, e ninguém se queixou.
Será que Portugal anda a dormir? Ninguém da CART 1688 falou. Agora é que se lembram de comentar o que desconhecem? Noto que nem todos, ou somente o Camarada Beja Santos e um
anónimo (apanho sempre com os anónimos em cima), embora diga que é José Câmara leram o livro. Verdade que faz acusações gravíssimas.
Percebi hoje que ele entretanto morreu, gostaria que me informassem se é verdade. Sei que publicou dois livros, este e outro da sua vida como futebolista. Até me pediu uma opinião sobre se deveria fazer só uma edição ou duas, mas já tinha ideia formada sobre isso.
José Silveira da Rosa denunciou situações de cobardia básica. Perdi a minha oportunidade porque fui censor do meu próprio Livro. Risquei com um lápis azul, cobardias e incapacidades, não fui vítima da censura, mas omiti. E ao omitir sou censor, embora de mim próprio.
Para acabar também querem que eu fale de situações de pôr as mãos à cabeça. E não se esqueçam, embora um qualquer Governo tenha acabado com os Furriéis Milicianos eles existem, não são Furriéis.
Quando éramos Cabos Milicianos, éramos Cabos no pré e Sargentos no serviço. Queríamos ser tratados pelo nosso posto. Agora é mais grave, sou Furriel. Repito, sou Furriel.
Um abraço ao José Silveira da Rosa.
segunda-feira, Outubro 20, 2014
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Anotações do editor:
- Em Vendas Novas a Escola Prática era de Artilharia e não de Engenharia. Esta estava sediada como toda a gente sabe, principalmente quem andou em Minas e Armadilhas, em Tancos.
- Para evitar mal entendidos, quem não tem conta no Google, sempre que faz um comentário aparece como anónimo, situação que se resolve escrevendo no fim o nome, o ex-posto militar e/ou residência.
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3. Passemos à "carta aberta ao camarada Mário Vitorino Gaspar", enviado ao Blogue pelo camarada José Câmara para publicação:
Camarada Mário Vitorino Gaspar,
Se me permite, vou por partes.
Depois de oitenta e duas intervenções neste blogue onde sempre me assinei por José Câmara, jamais pensei ser um anónimo nestas páginas. Nesse aspecto, para além da minha apresentação, de acordo com as regras ao blogue, aqui fica para que conste:
José Alexandre da Silveira Câmara, natural da Fazenda, concelho das Lajes, Flores, Açores.
Com a idade de dez anos fui morar para a ilha do Faial.
Fui Fur Mil na CCaç 3327/BII17 e no Pel Caç Nat 56, com comissão na Guiné entre Janeiro de 1971 e Janeiro de 1973.
Sou emigrante desde Julho de 1973, facto que, culpa minha e só minha, me impede de expressar com a fluidez linguística desejada.
Atesto não ter identificação no Google, daí o cabeçalho aparecer sempre como anónimo. E assim continuará.
Conheci muito bem o jovem cidadão José Silveira da Rosa, mas não conheci o Furriel Miliciano que ele foi. Tão pouco comentei o que desconhecia e desconheço da sua vida militar. Comentei, melhor questionei, algumas das acusações inseridas no livro que ele escreveu. Tenho toda a legitimidade para o fazer.
Fui seu amigo pessoal, jogámos futebol no mesmo clube, quase sempre em escalões diferentes, o Fayal Sport, da pequenina cidade da Horta. Ele era bem melhor atleta que eu. Pelo menos enquanto jovem, as mazelas físicas que ele afirmava terem sido impeditivas de uma carreira profissional, não o impediram de ter uma vida normal e de ser um desportista amador, diria o melhor do seu tempo. No amadorismo, o José Silveira da Rosa trabalhava como se fosse um profissional. Era um bom exemplo para todos nós.
Ao tempo, todo jogador do Fayal Sport era inscrito na FPF como amador e, como tal, ficava desvinculado do Clube no fim da época. O José Silveira só mudou de Clube anos mais tarde quando o Clube da sua terra, o F C dos Flamengos, se associou na Associação de Futebol da Horta.
Tão pouco acusei o José Silveira da Rosa de ser mentiroso, não o conheci por ser, ou de não sofrer de traumatismo provocado pela guerra. Apenas alertei que a visibilidade daquele traumatismo aparecera mais tarde na vida dele, situação que julgo ser normalíssima. E acrescentei as suas qualidades humanas e cívicas.
Tudo isso para fazer a clivagem entre o José Silveira da Rosa, o homem bom que eu conheci e atestarei em qualquer parte, e um irreconhecível, pelo menos para mim, José Silveira da Rosa, Furriel Miliciano com comissão militar na Guiné, Deficiente das Forças Armadas, que escreveu o livro em causa.
Os exércitos não são feitos propriamente de meninos de coro. São feitos por todo o tipo de jovens, com todas as consequências possíveis. Por isso mesmo, em todas as guerras sempre houve exageros em momentos pontuais de pouca lucidez, que normalmente a imaturidade ou mal formação ditava. E se é certo que todos os exageros são condenáveis, julgo que nenhum militar que se preze duvida disso, as acusações do Furriel Miliciano José Silveira da Rosa são gravíssimas, de acções premeditadas, de tortura, de fuzilamento em massa, de abusos sexuais em grupo. Põem em causa toda uma Companhia, a condecoração por ela recebida, o próprio Exército de Portugal.
Pedir credibilidade às acusações feitas pelo Furriel Miliciano José Silveira da Rosa, infelizmente um Deficiente das Forças Armadas Portuguesas, que estava a receber acompanhamento psiquiátrico e psicológico na altura em que o livro foi escrito, factos que o Mário Vitorino Gaspar reconhece e eu, pormenores aparte, não desconhecia, é um acto da mais elementar justiça. De qualquer justiça. Com todas as consequências que daí possam advir, não estão em causa as acusações, essas foram feitas, ou mesmo o bom nome do acusador, mas sim a presumível inocência dos acusados.
É verdade, eu li o livro numa das deslocações que fiz ao Faial, cerca de dez anos depois da sua publicação. Eu não julguei ou julgo as acusações do Fur Mil José Silveira da Rosa. Porém, como cidadão português que ainda sou, que fiz os possíveis para honrar o uniforme que um dia enverguei com dignidade, sem vergonha, julgo que tenho toda a legitimidade para pedir a verdade dos factos e não mais que isso.
Para que não restem dúvidas sobre a minha forma de pensar e estar na vida, é-me muito mais fácil engolir a inocência de um culpado do que a culpa de um inocente.
Cumprimentos.
José Câmara
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Notas do editor
(*) Vd. poste (e respectivos comentários) de 10 de Outubro de 2014 >
Guiné 63/74 - P13716: Notas de leitura (640): “Guiné, a cobardia ali não tinha lugar”, por José Silveira da Rosa, edição de autor, 2003 (Mário Beja Santos)
Último poste da série de 20 de Outubro de 2014 >
Guiné 63/74 - P13766: (Ex)citações (240): Água da bolanha... quem a não bebeu ?!... Recordando aqui o pesadelo que foi a Op Jaguar Vermelho, no Morés, em 9 de junho de 1970... (Carlos Fortunato. ex-fur mil trms. CCAÇ 13, Bissorã, 1969/71, e presidente da direção da ONDG Ajuda Amiga)