segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3900: Expedição Humanitária 2009 (1): Já se fez à estrada a expedição da Humanitarius, com o J. Almeida, o A. Camilo e outros

Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Saltinho > 1 de Março de 2008 > O António Camilo, empresário, algarvio, natural de Lagoa, na morança que construiu, no Clube de Caça do Saltinho, na margem direita do mítico e sempre deslumbrante Rio Corubal. Ei-lo aqui à porta de casa, e com seu/nosso amigo Carlos Silva (em primeiro plano). Pelo li, o Camilo volta este ano (2009) à Guiné, na sua 8ª expedição. O ano passado encontrámo-nos por ocasião do Simpósio Internacional de Guiledje (1-7 de Março de 2008).

Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.

1.
Todos os anos por esta altura, há grupos de antigos combatentes portugueses, que passaram pela Guiné, no tempo da guerra colonial (1963/74), que lá regressam, de jipe ou de avião, levando amizade, saudade e ajuda humanitária. Este ano identificámos quatro núcleos organizadores:


(i) um núcleo algarvio, que teve (e ainda tem como referência) o nome do António Camilo, ex-Fur Mil da CCAÇ 1565 (1966/68); a expedição deste ano é organizada pela Humanitarius, uma associação de apoio social internacional, recém criada, dirigida por João Almeida (que julgo não ter sido combatente), e que tem a sede em Portimão; a equipa da Expedição 2009 é composta por João Almeida, Helena Duarte, Vanda Germano, André Cadete e Jorge Baptista, e tem como "colaborador no terreno: António Camilo Baptista"; já partiu de Portimão em 10 de Fevereiro último;



Página principal do sítio da Ajuda Amiga – Associação de Solidariedade e de Apoio ao Desenvolvimento, com sede na Rua do Alecrim, 8, 1º Dto, 2770 - 007 Paço de Arcos.

(ii) Há um núcleo lisboeta, à volta da ONGD Ajuda Amiga, representada pelos nossos camaradas Carlos Fortunato, consultor informático, ex-Fur Mil da CCAÇ 13 (Bissorã, 1969/71) e Carlos Silva, advogado, ex-Fur Mil da CCAÇ 2548 / BCAÇ 2879 (Farim, 1969/71); esta pequena equipa deve chegar de avião a Bissau, em 25 de Fevereiro de 2009. Vd. poste de 9 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3860: Ser solidário (27): Mais de 320 caixas da Ajuda Amiga seguiram ontem para Bissau em contentor da Portline


Página da Associação Humanitária Memórias e Gentes, que vai organizar este ano mais uma Expedição Humanitária à Guiné-Bissau. (iii) um núcleo coimbrão, à volta da Associação Memória e Gentes, de que é presidente, ou melhor, a alma, o José Moreira, ex-Fur Mil da CCAÇ 1565 (1966/68) Vd. postes de: 22 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2671: Ser solidário (8): O regresso da expedição humanitária a Bissau (Diário de Coimbra)

9 de Novembro de 2008 > > Guiné 63/74 - P3428: Ser solidário (24): Em marcha a expedição de ajuda humanitária de 2009 (José Moreira / Pepito / Carlos Silva / Xico Allen)


Vd. poste de 20 de Novembro de 2008 >Guiné 63/74 - P3489: Blogues da nossa blogosfera (4): Nasceu o bloguinho, o blogue da Tabanca de Matosinhos (Álvaro Basto)

(iv) e, por fim, um núcleo nortenho, à volta da Tabanca de Matosinhos, de que é justo destacar o nome do Xico Allen (na foto à esquerda: Guileje, 1 de Março de 2008) que, com o António Camilo e o José Moreira, são de facto os três históricos das viagens por terra à Guiné (seja em turismo de saudade seja em expedições humanitárias). Este ano vão à Guiné, por terra, devendo juntar-se à Expedição de Coimbra, uma dúzia de camaradas ligados, de uma maneira ou de outra, à Tabanca de Matosinhos e ao nosso blogue. Ainda não tenho a lista completa, mas de entre eles destaco, além do chefe, Xico Allen, o António Pimentel, o João Rocha, o José Manuel Lopes, o António Carvalho e o Nina (estes três últimos , pela primeira vez, e tendo feito parte da CART 6250, Mampatá, 1972/74).


  2. II Expedição Algarve-Guiné: já se fez à estrada a 10 de Fevereiro de 2009 

  Notícia extraída, com a devida vénia, do Barlavento - Semanário Regional do Algarve , 10 de Fevereiro de 2009 / Texto: ana sofia varela / Foto: armindo vicente (Na foto, à esquerda: Helena Duarte, João Almeida, Jorge Baptista e André Cadete. Na foto só falta António Camilo"). 

(...) "A Associação Humanitarius, constituída por um grupo de algarvios que, no ano passado, organizou uma expedição à Guiné-Bissau, em África, volta a enfrentar os [cerca de cinco] mil quilómetros que separam Portugal daquele país, para ajudar as populações com diversos projectos sociais. 

"Na bagagem levam 43 toneladas de donativos em material escolar, roupas, equipamento médico, calçado e brinquedos, para a cidade de Buba, na Guiné-Bissau. (...) A missão do grupo algarvio é requalificar o centro de saúde pública de Buba, acabar um pavilhão escolar naquela cidade, apadrinhar uma escola em Bambadinca, bem como criar uma biblioteca e videoteca num dos espaços comunitários. 

"Mas, para que a concretização dos projectos «Saúde Alerta» e «Escola para Todos» seja uma realidade em Buba, muita da ajuda que a Humanitarius leva partiu da solidariedade de quem cá fica. Cidadãos anónimos, muitos alunos de diversas escolas portuguesas, empresários e autarquias contribuíram com os donativos. "Por isso, esta terça-feira [, dia 10 de Fevereiro,] , data da partida da II Expedição Algarve-Guiné por via terrestre, os expedicionários ainda tiveram tempo de passar em Portimão, Lagos, Lagoa e Albufeira, em paragens de cortesia para com as autarquias algarvias apoiantes. Por via aérea, seguirão depois dois técnicos da equipa, enquanto por via marítima já seguiu o contentor com os donativos, no fim-de-semana passado. 

3. Comentário de L.G.: 

 Saúdo todos os ex-combatentes que neste mês se delocam à Guiné, em turismo de saudade ou integrados em expedições humanitárais. Um abraço ao António Camilo, o primeiro a partir (com a equipa da Humanitarius): tive o prazer de conhecer pessoalmente, o ano passado na Guiné-Bissau, por ocasião do Simpósio Internacional de Guiledje, 1-7 de Março de 2008; estive inclusive com ele no Saltinho onde tem uma morança de fazer inveja a qualquer turista, no Clube de Caça, na margem direita do Rio Corubal, junto à ponte do Saltinho).

Esse abraço é também extensivo ao João Almeida, coordenador da Humanitarius, e restantes companheiros desta aventura solidária. Bons ventos os levem e bons ventos os tragam. O nosso blogue fica disponível para divulgar as notícias e as fotos que nos queiram enviar. (LG).

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3899: Os nossos médicos (1): Alf Mil Médico José Alberto Machado (Nova Lamego)

1. Mensagem de Carlos Marques Santos, ex-Fur Mil da CART 2339, Fá Mandinga e Mansambo, 1968/69, com data de 14 de Fevereiro de 2009:

Um abraço.

Mais uma vez lanço pedido de informações sobre o percurso de um cunhado, médico (*), já falecido, mas do qual não se têm informações do seu percurso militar na Guiné.

Presumo ter andado na área de Nova Lamego, mas são presunções.

Obrigado,
CMSantos


2. Este é um texto de pedido de ajuda em relação a um Cunhado meu, já falecido, mas do qual, por várias razões, nada se sabe do seu percurso na Guiné.

Nova Lamego e os dados do José Martins apontam para aí. Quem conheceu??? Teve a mulher e um filho pequeno a viver lá.

Agradecem-se informações.
CMSantos
CART 2339
Mansambo
1968/69



José Alberto Machado. Alferes Miliciano Médico


3. Dados coligidos por José Martins

BATALHÃO DE CAVALARIA N.º 705 (BCAV 705, 1964/66)

Mobilizado no Regimento de Cavalaria 7, em Lisboa, desembarcou em Bissau em 24 de Julho de 1964, ficando nesta cidade como força de intervenção às ordens do Comando - Chefe, sendo as suas Companhias atribuídas como reforço e para realização de operações noutros sectores.

Em 15 de Fevereiro de 1965 foi deslocado para Bafatá, onde comandou a actividade operacional das suas Companhias e preparou a rendição do Batalhão de Caçadores n.º 512.

Em 1 de Junho de 1965, rende o Batalhão de Caçadores n.º 512, estacionado em Nova Lamego e assume a responsabilidade do Sector L3, que inclui os subsectores de Pirada, Bajocunda, Canquelifá, Buruntuma, Piche, Madina do Boé e Nova Lamego.

Em 1 de Maio de 1966, rendido pelo Batalhão de Caçadores n.º 1856, regressa a Bissau, embarcando de regresso à Metrópole em 14 de Maio de 1966.


BATALHÃO DE CAÇADORES N.º 1856 (BCAÇ 1856, 1965/67)

Mobilizado do Regimento de Infantaria n.º 1, na Amadora, desembarcou em Bissau em 6 de Agosto de 1965, ficando aquartelado em Brá (Bissau), às ordens do Comando – Chefe, orientado para a zona Leste, sendo as suas subunidades atribuídas de reforço a outros Batalhões para diversas operações.

Em 2 de Março de 1966 o comando instalou-se em Nova Lamego, enquanto a Companhia de Comando e Serviços era instalada em Piche até 23 de Abril de 1966.

A 1 de Maio de 1966 e substituindo o Batalhão de Cavalaria n.º 705, assumiu a responsabilidade do Sector L3, que englobava os subsectores de BAJOCUNDA, Canquelifá, Piche, Buruntuma, Madina do Boé e Nova Lamego.

Rendido pelo Batalhão de Cavalaria n.º 1915, tendo embarcado para a Metrópole em 15 de Abril de 1967.

José Martins
ex-Fur Mil Trms
CCAÇ 5, Gatos Pretos
Canjadude
1968/70
__________

Nota de CV:

(*) Vd. poste de 26 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2887: Em busca de...(27): José Alberto Machado, Alf Mil Médico (Carlos Marques Santos)

Guiné 63/74 - P3898: A história dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (8): Maio de 1973 na vida da CCAV 8351 - (Parte I)

1. Em mensagem com data de 13 de Fevereiro de 2009, Vasco da Gama, ex-Cap Mil da CCAV 8351, Cumbijã, 1972/74, enviou-nos para publicação a primeira de três partes de "Maio de 1973 na vida da CCAV 8351" - Os Tigres do Cumbijã.





MAIO DE 1973 NA VIDA DA CCAV 8351 - OS TIGRES DO CUMBIJÃ

Em memória dos meus queridos camaradas, mortos em combate neste mês de Maio:

ANTÓNIO BENTO BÔA , soldado n.º 06261872, morto a 12 de Maio de 1973

VICTOR MANUEL SILVA COELHO, soldado n.º 06472772, morto a 18 de Maio 1973

A vida tem destas coisas. Maio tinha tudo para ser um lindo mês, já que e em definitivo a Companhia tinha juntado os seus quatro GCOMB, as obras de construção continuavam a um ritmo muito grande, o pessoal andava contente pois as casernas começavam a tomar forma e consequentemente as condições de vida melhorariam a muito curto prazo e íamos receber logo na primeira semana um Pelotão de Artilharia, que nos dava uma outra alma.

Como sabem, a resposta, em termos de artilharia aos ataques que o meu aquartelamento sofria, era dada pelos nossos camaradas de Mampatá. Era impressionante para nós, pois para além das canhoadas e das morteiradas do I.N., passavam por cima das nossas cabeças em direcção às prováveis bases de onde os turras nos atacavam, as ameixas com que os nossos camaradas tugas de Mampatá os presenteavam.

Maio começou com uma flagelação, pois logo no dia três sofremos um ataque de duração curta, cerca de dez minutos, de morteiro 82. No relatório dessa flagelação assinalámos que o In havia sofrido duas baixas confirmadas. Recordo-me de no dia seguinte termos saído com três Pelotões e descoberto o local de onde nos haviam flagelado e verificado sinais de corpos arrastados. Deixámos as nossas assinaturas; restos de ração de combate, pontas de cigarro, latas de conserva e de leite com chocolate e os que sofriam de maior aperto intestinal, aproveitavam também para diversificar os vestígios.

No dia 8 de Maio chega até nós o tão ansiosamente esperado Pelotão de Artilharia. Em tempo recorde se construíram os espaldares e se elaboraram as cartas de tiro. Durante três dias andámos numa azáfama enorme, mas a confiança enchia-nos o peito, pois com a presença da Artilharia iríamos impor com ainda mais força a nossa presença. Enfim ilusões de sonhadores.

No dia 11 de Maio fui a Aldeia Formosa tratar da parte burocrática da minha Companhia, já que a Secretaria, o Cripto e os encarregados dos géneros ainda estavam na Sede do Batalhão. Reuni-me com o 1.º Sargento António Joaquim Redondeiro, grande homem, que já nos deixou. Faleceu em Portugal, mas só tive conhecimento do sucedido muitos anos após ter partido. Paz à sua alma! Ajudou-me muito na burocracia que também era imposta às Companhias que davam o corpo ao manifesto no meio do mato, aconselhou-me bastas vezes e sofria, lá em Aldeia, com os ataques de que o Cumbijã era alvo. (Abraçou-me a chorar depois do assalto a Nhacobá). A reunião ia longa e o tempo começou a ficar muito feio, com as rajadas de vento a aumentarem de grande intensidade de forma que combinámos que ele, no dia seguinte, iria integrado na coluna da Engenharia ao Cumbijã onde prosseguiríamos a reunião.

Regressei com a minha malta ao Cumbijã debaixo de um temporal imenso e fiquei desolado com o espectáculo que se me deparou: um tornado violento havia passado no quartel e arrancado dois telhados das instalações em fase de construção mais adiantada. É daqueles momentos em que nos dá vontade de desistir de tudo, mas não o podia demonstrar. Exteriorizei para os meus camaradas que quanto maiores fossem os obstáculos maior teria de ser a nossa firmeza e a nossa determinação e que no dia seguinte teríamos de trabalhar a dobrar.
Mas o tornado era um aviso e o dealbar do período negro.

No dia 12 de Maio, já da parte da tarde um grupo de combate desfalcado foi a Aldeia levar o Sargento Redondeiro. No regresso e na zona de Colibuia, portanto já pertinho de casa, sofrem uma emboscada de um pequeno grupo avançado do IN, que tinha vindo com o objectivo de dar protecção aos indivíduos que minavam os pontões, pois na frente de trabalhos não andavam tão à vontade dada a presença quase diária de um GCOMB que os esperava quase até ao anoitecer.
No Cumbijã toda a gente adivinhou o que se estava a passar. Via rádio soube de imediato que o Bôa tinha morrido instantaneamente. Eu estava em tronco nu, calções de banho e sapatilhas. Gritei para que preparassem de imediato duas Berlietts para irmos atrás dos gajos. No espaço de minutos estávamos a arrancar, enquanto os obuses disparavam para a orla da mata. Chegámos ao local e para além do BÔA tínhamos mais dois feridos com escoriações provocadas pela queda ao atirarem-se da viatura para o solo. Alguém de Mampatá ou Aldeia veio buscar as nossas baixas, as Berlietts regressaram ao quartel e eu e os meus voluntários embrenhámo-nos na mata e todas as dúvidas foram dissipadas: vinham mesmo minar os pontões! A assinatura do Pata Grande ou Patudo estava bem expressa, pois o sujeito tinha um pé tão grande que o distinguia de qualquer outro. A malta de Mampatá também o conhecia bem. Não consegui nada e a noite a cair levou-nos de volta ao Cumbijã.

Tinha no entanto aprendido uma lição: por muita racionalidade e serenidade que se peça ou que se exija a quem comande, permitira que o meu espírito fosse invadido pela dor, pelo sofrimento, pela angústia e pela raiva. Pela primeira vez havia sentido ódio. Ao olhar para esse dia e ao rever o que se passou, basta-me fechar os olhos, julgo que hoje teria feito o mesmo e teria actuado de imediato. O In tinha feito o seu papel e nós não poderíamos responder com indiferença ao sucedido, mesmo sabendo que já não havia nada a fazer; mostrar resignação ou indiferença era o pior que me poderia ter acontecido a mim e aos meus.

O traje com que saí para o mato rotulou imediatamente o meu estado de espírito. Amigo meu em Bissau ouviu dizer que o cacimbo me tinha atingido e que já saía nu para o mato. Enfim, os exageros que depois se transformam em mentiras, mas que por vezes também constroem heróis. Quem andou na luta e ouve este ou aquele dizer que reagiu assim ou assado que matou frito e cozido, topa logo que o gajo está a mentir ou fez a comissão perto de Bissau.

Também em princípios de Maio fui avisado de que em tal dia, a tal hora um grupo de Comandos Africanos passaria pelo Cumbijã, vindo de uma operação, e seria depois levado para Aldeia. Assim, seco sem mais informação nenhuma. Em conversa nos dias de hoje com os meus camaradas as opiniões divergem: uns dizem que o grupo era comandado pelo mais famoso guerrilheiro da Guiné, outros afirmam que eram elementos de uma Companhia de Comandos heli transportados.

Tenho de ser cuidadoso, tanto mais que esses elementos vindos da zona de Nhacobá, não haviam vislumbrado quaisquer vestígios do que quer que fosse, ou teriam e não fizeram nada ou não era tarefa para eles, ou apenas teriam ordens para reconhecer o terreno… não sei o que vos diga.

Este vosso amigo nasceu a 16 de Maio e tinha pensado arranjar uma vaca em Aldeia para fazermos um petisco diferente e pagar uns copos à malta. Está bem, abelha! Dia 15 à noite recebo ordens para me apresentar em Aldeia Formosa pela manhã do dia seguinte, o mais cedo possível. Como era o que estava mais longe, embora cedo, fui o último a chegar. Estava toda a malta calada, expectante, com ar de caso. Só saí da reunião pelas 16 horas, pois estivemos a preparar a operação “BALANÇO FINAL”, que se resumia apenas e só no assalto a Nhacobá, pois parece que por aí passavam as colunas de reabastecimento vindas pelo corredor de Guileje acima. A Companhia de Cavalaria 8351 seguiria em primeiro escalão, reforçada com um GCOMB da 3398, e na referida operação participariam uma outra Companhia do Batalhão dos velhinhos (a 99), mais a CCaç 18 mais a Cart 6250 de Mampatá reforçada com dois GCOMBs do Batalhão de periquitos (4513), mais a 3.ª Companhia do 4513 mais os Pelotões dos Sapadores dos dois Batalhões, mais dois Pelotões de Artilharia etc.

Estou com todos estes pormenores, pois no meu próximo texto vou necessitar da ajuda da malta de Guileje, para compararmos no tempo o decurso das diferentes actividades das nossas Companhias pois, ou muito me engano, ou estava em curso algo de muito importante na cabeça dos comandantes da guerra que embora nunca me tenham referido coisa nenhuma, à boa maneira militar, me levavam a desconfiar de algo. A ver vamos se o meu raciocínio terá ou não alguma lógica.

Embora nem todas as forças estivessem no terreno ao mesmo tempo, constatem que estavam disponíveis nesta operação malta que dava para fazer sete Companhias completas mais os Sapadores e Artilharia.

Cheguei triste ao Cumbijã! Tinha passado um rico dia de aniversário e a operação tinha início na manhã do dia seguinte. Tiraram-me uma fotografia na chegada ao aquartelamento que junto.

Cumbijã > Dia de aniversário do Cap Mil Vasco da Gama

Não me deitei. Falei com o pessoal, sem ter a certeza do que iria encontrar. Do objectivo apenas e só hipóteses. Conversei horas a fio com o guia que eu havia exigido: O Padé Nambatcha (refiro a fonética, não sei se a grafia é esta).

Curiosamente, a noite passou com grande rapidez. De manhã, ainda noite, a malta num silêncio sepulcral, ia-se juntando no meio do aquartelamento. Dois ou três tinham adoecido e a outros tantos haviam-se-lhes encravado as unhas.

Saímos num silêncio absoluto e à medida que íamos caminhando redobrávamos a atenção. De quando em vez o Padé mandava parar a coluna e debruçando-se sobre o chão analisava mais atentamente vestígios que só ele descortinava. Fazia-me sinal perguntando-me por gestos se eu não ouvia nada. Eu que ainda hoje tenho um ouvido de tísico dizia-lhe que não. O sorriso maroto que sempre afivelava ia-se desvanecendo e então começaram a aparecer trilhos cada vez maiores e bem calcados que pareciam autênticas picadas. Lá, muito ao longe, ouvia-se o ladrar dos cães e começámos também a divisar colunas de fumo em direcção ao céu provenientes de fogueiras. Continuámos mais duzentos, trezentos metros, abri a Companhia em linha e cerquei uma tabanca enorme, sem que ninguém tivesse dado por nós. O meu grupo de assalto de quinze ou vinte pessoas correu repentinamente seguindo o Padé e, sem termos dado um único tiro, tínhamos apanhado dezasseis elementos da população (oito homens, três mulheres e cinco crianças), que tentaram numa primeira fase a fuga, depois gritavam Comando, Comando, Comando.

Passámos revista a todas as moranças, em número muito elevado, e rapidamente nos apercebemos que Nhacobá era um importantíssimo centro de armazenamento de arroz. Palhotas cheias até ao tecto de arroz ainda com casca eram mais de uma dezena. Obviamente que esta quantidade enorme de arroz não se destinava a alimentar os dezasseis elementos da população que tínhamos capturado, antes constituía um ponto de passagem obrigatório das colunas do PAIGC que aí se abasteciam. Quantidades enormes de peixe a secar apareciam mais junto ao enorme lençol de água situado mesmo em frente a Nhacobá.

Rapidamente os elementos civis, em quem ninguém tocou, foram transportados por dois Pelotões que cobriam a nossa retaguarda, julgo que a Cart 6250, para os unimogs situados no fim da picada aberta, talvez a dois quilómetros de distância.

Por volta do meio dia, rebenta sobre nós um primeiro fogachal proveniente do flanco direito da minha Companhia, que supostamente devia estar protegida desse lado, que nos causou 3 feridos graves e seis ligeiros.

Pedi evacuação aérea para o Cumbijã onde estavam os graduados do Batalhão que me informaram não ser possível. Aí, mais uma vez, a malta de Mampatá veio em nosso apoio para transportar os feridos.

Um parêntesis para o nosso querido Josema, que vai no sentido de lhe corrigir o poste número 2757 enviado em 14 de Abril de 2008. Os soldados feridos, meus camaradas e teus camaradas, são da minha Companhia e resultaram do contacto que agora mesmo descrevi.

- O que tem o pano sobre a perna é o José Carlos Lopes, que vive para os lados de Lisboa. Está completamente careca, mas rijo. É frequentador assíduo dos nossos convívios.
- Não me recordo do nome do moço que está de barriga para o ar, mas era um dos rapazes das Transmissões.
- O da direita é o Lino Castro e Sá . Estive com ele há dois ou três meses em Coimbra e é também ferrenho dos nossos encontros.


Foto: © José Manuel (2008). Direitos reservados.

Por esta altura ainda não havia estrada até Nhacobá.

A seguir a este contacto flecti com a Companhia para a direita, pois Nhacobá tinha demasiadas árvores que atraem os RPGs e provocam chuveiradas de estilhaços e… outro contacto, este mais violento que o anterior. O In fugiu e recordo-me que, para além de material de guerra, apanhámos centenas de maços de cigarros russos, cadernos escolares, caixas de fósforos e um livro escolar do PAIGC impresso na Suécia.

Alonguei-me mais do que o previsto, continuo ainda por mais dois episódios sobre Nhacobá.

Vasco da Gama

Nhacobá > Entrada norte

Nhacobá

Nhacobá > Armazém de arroz

Nhacobá > Furriéis Azambuja Martins e Costa

Nhacobá > Fur Mil Azambuja Martins, o sorriso do dever cumprido

Foto: © Vasco da Gama (2009). Direitos reservados.

__________

Nota de CV:

Vd. último poste da série de 20 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3765: A história dos Tigres de Cumbijã, contada pelo ex-Cap Mil Vasco da Gama (7): A visita do General Spínola

Guiné 63/74 - P3897: Dando a mão à palmatória (19): O meu amigo ex-Fur Mil Pil Ramos, de Vila Nova Famalicão (Humberto Reis)

Guiné > Zona Leste > Sector L1 (Bambadinca) > Fá Maninga > 1970 > O Fur Mil Pil Ramos deixa-se fotografar com o Major Leal de Almeida, e mais oficiais (graduados) da recém criada Companhia de Comandos Africanos (embrião do futuro Batalhão). Houve um erro, involuntário, da nossa parte, ao idenficar o piloto. O seu amigo, Humberto Reis, membro fundador da nossa Tabanca Grande, e meu antigo camarada da CCAÇ 12 (Contuboel e Bambadinca, 1969/71). A foto é do Jorge Caiano, ex-1º Cabo Especialista, Melec/AV (Bissalanca, BA12, 1969/70), a residir desde 1974 no Canadá.

Foto: © Jorge Caiano (2009). Direitos reservados.


1. Mensagem do Humberto Reis, com data de 13 do corrente:

Luís:

Como sabes, sou mais dado a ler e fazer do que a escrever, além de que não sei, nem perguntei a ninguém como se faz, para escrever directamente no blogue.

Posto isto, façam lá uma correcção no Post 3879 (*). O piloto que está na foto é o meu grande amigo, com quem voei muitas vezes, ex-Fur Mil Pil Ramos, de Vila Nova de Famalicão, e na vida civil piloto de aeronaves no Alentejo.

Não é que o ofenda, ou a qualquer outro, terem lá escrito alferes, mas quem não o conheceu bem, como foi o meu caso, fica a olhar para a foto e a imaginar quem seria o alferes Ramos. O [Jorge] Félix conheceu-o bem pois ambos são do nosso tempo, apesar do Ramos ser mais novo que ele.

Aquele abraço

Humberto

2. Comentário de L.G.:

Meu caro Humberto:

Tens toda a razão. Estes pequenos lapsos estão sempre a acontecer. Não sei se o erro foi nosso ou do Jorge Caiano, que identificou o piloto. Julgo que foi nosso. Daí eu fazer questão de publicar o teu reparo nesta série, que serve para isso mesmo, dar a mão à palmatória (**), como no tempo da nossa escolinha. O Ramos, se nos estiver a ler, também vai aceitar, de mão grado, os nossos pedidos de desculpa.

Quanto à inserção (directa) de comentários no nosso blogue, tens as instruções, aqui mesmo à mão, na coluna do lado esquerdo do nosso blogue, logo a seguir à indicação do nº de visitantes... No caso do poste em questão, poderías apor directamente o te comentário: bastava clicares duas vezes no link "comentários", que vem no final do texto. De qualquer modo, assim tive eu o prazer de comunicar directamente contigo através do blogue.

Um bom resto de fim de semana para ti. Um beijinho à Teresa, com votos de boa saúde. Luís
__________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 12 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3879: FAP (9): Jorge Caiano, ex- 1º Cabo Esp Melec, BA12, 1969/70, no Canadá desde 1974

(**) Vd. último poste desta série > 16 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3633: Dando a mão à palmatória (18): O meu reparo (Belarmino Sardinha)

Guiné 63/74 - P3896: Do purgatório de Bissum / Nagal ao infermo de Cafal Balanta / Cafine (Manuel Maia, 2ª CCAÇ / BCAÇ 4610, 1972/74)

1. Mensagem de Manuel Maia, ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine (1972/74):


Assunto - Do purgatório de Bissum Nagal ao infermo de Cafal Balanta / Cafine



Para alguém ligado à história [ como eu], a preocupação com as fontes deverá ser de primordial importância...

Não foi exactamente assim que se passou comigo relativamente à informação que passo a debitar, dado que estou a confiar demasiado na memória, que obviamente não é de elefante...

De qualquer forma, não estarei muito longe da realidade se apontar estes dados:

13 Junho 72

Embarque em avião das Forças Armadas para Bissau. De imediato rumamos ao CUMERÉ onde tiraríamos o chamado IAO que deveria ser um período de aclimatação e aprendizagem sobre a temática de guerra ,mas não foi conseguido (creio que para a esmagadora maioria dos formandos a nível de todos todos batalhões)... E porquê? Quem ministrava o ensino já não queria arriscar – milicianos - e a generalidade dos indivíduos do quadro nada percebia do assun ...

Finais de Junho 72

Chegada a BISSUM/NAGA para o necessário período de sobreposição com quem estava de partida.

Dezembro 72

Partida dos 1º e 3º grupos para CAFAL BALANTA ( CANTANHEZ) onde ficaríamos adstritos até à chegada do resto da companhia.


15 de Março 73

Chegada do resto da companhia ao Cantanhez (CAFINE) com a consequente mudança dias depois (2 semanas?) dos grupos já referenciados por forma a ter a companhia de novo toda junta.

Convirá referir que a distância quilométrica entre as duas localidades não ultrapassava os dois quilómetros( passávamos o dia de um lado para o outro, ora na função de reordenamentos na segunda localidade, ou tão somente para gastar o tempo...

A estrada era uma recta enorme com apenas uma ligeira curva. Mesmo assim, o IN colocou uma mina anticarro que vitimou um soldado de Cafal e feriu gravemente outro.

Obviamente que o objectivo do engenho fora destinado para uma situação de mais vitimas ( quatro vezes ao dia uma Berliet com vinte ou trinta militares fazia aquele trajecto de manhã e de tarde levando pessoal dos grupos 1º e 3º para o trabalho de feitura de habitações para a população em CAFINE) durante as tais duas ou três semanas que mediaram entre a chegada do resto da malta e a necessária reunificação...

15 de Junho 73

Partida dos 2º e 4º grupos para COBUMBA.

25 de Setembro 73

Chegada ao Dugal e seus destacamentos de FATIM e CHUGUÉ.


5 de Julho 74

Chegada ao Cumeré.

13 de Julho 74

Embarque para Lisboa.

Se me fosse perguntado em termos religiosos como classificaria as várias localidades por onde passei naquele périplo de vinte e cinco meses, ao reportar-me a BISSUM, poderia, usando a expressão "saudade apesar de tudo..." , apelidá-la de purgatório, atendendo a que os cerca de seis meses ali passados, apesar de isolados de tudo, não foram aquilo que se pintava em Bissau, (quando chegamos bviamente inquirimos "meio mundo" sobre o local para onde íamos e a resposta, invariavelmente, apontava para um sítio onde o verbo "embrulhar" se conjugava com inusitada repetição...)

Não foi isso que aconteceu...

De forma perspicaz, o capitão da unidade que nos antecedeu, atribuía aos muitos e contínuos êxitos obtidos fora de portas - pelo grupo de milícia nova em que a apreensão de armamento IN acontecia com bastante frequência - um comando de pessoal branco em operação provavelmente conjunta...

Ora o timoneiro da minha companhia como homem inteligente, utilizando a badalada expressão futebolística de que em equipa que vence não se mexe, deu continuidade à fórmula ganhadora, e continuou a somar pontos para um campeonato em que foi guindado aos lugares cimeiros em termos de operacionalidade...

A juntar a isto, o próprio nome do líder, Terrível, ( daí a designação da companhia...), serviria para obrigar o HOMEM GRANDE a pensar na solução para o sul usando a lógica do raciocínio: "Se ele pacifica uma zona complicada como BISSUM/NAGA, será o homem indicado para me resolver a questão lá em baixo..."

Se bem pensou, "mal o fez", diria eu ...

É que mercê desse raciocínio algo simplista obrigou-me a conhecer o inferno, que
posso, sem quaisquer sombras de dúvidas, localizar como sediado no eixo CAFAL BALANTA-CAFINE (infelizmente não vos posso fornecer as coordenadas...) .

Dentro de dias tentarei, (se para isso tiver o engenho e a arte...) enviar-vos algumas fotografias das casas/covas de CAFAL onde não nos faltava o envio aéreo por parte do PAIGC de metal quente sob a forma de RPG, canhoada, ou simples bala de Kalash, em substituição dos frescos de pára-quedas que o homem do monóculo prometera...

Acabaria por conhecer o céu quando em Setembro de 73, mercê do excelente serviço de reordenamentos e porque não dizê-lo, do qualificado trabalho operacional, o madeirense (não, não é esse em que estão a pensar...) Bettencourt Rodrigues (o homem que fazia as vezes de Spínola...) num rasgo de inteligência e de justiça decidiu conceder-nos o céu, (é certo que sem as virgens como propicia Alá...) para que pudéssemos enfim saborear as coisas boas da vida ...

Até lá, um abraço a toda a malta.

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Nota de L.G.:

(*) Vd. postes anteriores:

14 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3890: Tabanca Grande (119): Apresentação de Manuel Maia ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610 (Guiné, 1972/74)

13 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3886: Tabanca Grande (118): Manuel Maia, ex-Fur Mil, o poeta épico da 2ª Companhia do BCAÇ 4610/72 , o Camões do Cantanhez

Guiné 63/74 - P3895: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (3): Governo entrega antigo quartel de Guileje e o Pepito chega hoje a Lisboa


Guiné-Bissau > Bissau > 2009 > O Pepito, avô babado, com a sua neta Sara, filha de Cristina Silva (*). Tem uma outra neta, do seu filho Ivan, que vive em Portugal. A foto foi me enviada recentemente. Pelo que vejo, o nosso amigo Pepito está agora muito mais elegante, em resultado de um programa de saúde que está a seguir, e da sua vontade de ferro... Sei que agora os pastelinhos de Belém acabaram-se... Bem vindo, Pepito, a Lisboa, a tua segunda casa... (LG)


Foto: © Pepito / Luís Graça & Camaradas da Guiné (2008). Direitos reservados.(2009).






Transcrição do teor do documento:

"República da Guiné Bissau > Gabinete do Primeiro Ministro > À AD - Acção para o Desenvolvimento, Bissau > Bissau, 17 de Dezembro de 2008 > N/ Refª 410 / GPM / 08 > Encarrega-me Sua Excelência o Primeiro-Ministro de informar Vossas Excelências que essa ONG está autorizada a recuperar o antigo quartel de Guiledje, visando a instalação de um Museu, Escola Profissional e Infra-Estruturas para o Ecoturismo, conforme fora solicitado.



"Sem outro assunto de momento, queiram aceitar a expressão da nossa mais elevada consideração. O Director do Gabinete, Carlos Lineu Tolentino Ribeiro.


"C/C: Sua Excelência o Primeiro-Ministro / UICN"


1. Mensagem de 7 de Janeiro último, do nosso amigo Pepito (*):


Luís: Mais uma vez os votos de Feliz Ano Novo para ti, Alice, teus filhos e todo o pessoal amigo da Tabanca Grande.Tenho uma boa notícia a dar: o governo da GB decidiu oficialmente, no final do ano, entregar o antigo quartel de Guiledje à AD para a sua reabilitação como Museu, Escola Agrícola, polo de ecoturismo e sede do Parque Natural transfronteiriço.


Estou convicto que esta decisão foi o resultado do nosso Simpósio. Por isso obrigado a todos vocês que contribuiram decisivamente para que ele se realizasse. Vamos imediatamente (ainda este mês) começar a construção do Museu que contará com o apoio da Fundação Mário Soares na concepção e organização interior. A ONG portuguesa IMVF - [Instituto Marquês Valle Flôr]assegurará parte das despesas com a construção.


A nossa Tabanca tem vindo a contribuir com muito material e documentos que o enriquecerão.


Um grande abraço


pepito


2. Comentário de L.G.:


Congratulamo-nos com esta notícia que nos chegou de Bissau, há mais de mês, e que quisemos agora partilhar, no blogue, com todos os amigos e camaradas da Guiné, no dia em que chega a Lisboa o nosso querido amigo Pepito. Ele vem para tratar de problemas (pessoais) de saúde e espera voltar a Bissau a tempo de receber, na última semana de Fevereiro, os nossos camaradas que partem no dia 20 para a Guiné-Bissau, em mais um missão humanitária e mais uma viagem de turismo de saudade. Espero poder estar esta semana com o Pepito e obter mais informações sobre o andamento do projecto Guiledje. LG


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Notas de L.G.:


(*) Cristina Ribeiro Schwarz da Silva (Pepas, para os amigos e familiares), filha mais mais velha de Carlos Schwarz da Silva, guineense, e Isabel Levy Ribeiro, portuguesa.Tem 35, é licenciada em biologia marinha. Trabalha no IBAP- Instituto da Biodiversidade e das Áreas Protegidas da Guiné-Bissau. É Coordenadora para o Seguimento das Espécies.


Vd. poste de 23 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2977: Recortes de imprensa (6): a cidadã portuguesa, Cristina Silva, expulsa da Embaixada de Portugal em Bissau no 10 de Junho


(**) Vd. poste de 31 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3822: Notícias dos nossos amigos da AD - Bissau (2): Segurança alimentar (o mangal que dá de comer...) e turismo de saudade

Guiné 63/74 - P3894: O cruzeiro das nossas vidas (13): S.O.S., fogo a bordo do Carvalho Araújo (Luís F. Moreira)

1. Mensagem de Luís F. Moreira (*), ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 2789/BCAÇ 2928, Bula, 1970/72, com data de 13 de Fevereiro de 2009: Complemento do escrito do António Matos e a sua viagem para a Guiné, com todo o respeito e consideração por tudo quanto tem escrito. Obriga-nos a retirar das gavetas das nossas memórias recordações envelhecidas. A nossa atribulada viagem para a Guiné Dia 25 de Novembro de 1970, cerca das 10.00 horas, tudo a postos para embarcar mais uma carga para a Guiné. Todas as cerimónias habituais, ninguém ligou nada. Portaló colocado ao navio e começaram a entrar os militares que pertenciam às Companhias, em seguida aqueles que iam em rendição individual, (era o meu caso), e quando toda a gente pensava que íamos seguir viagem, começaram a chegar carrinhas militares, mas celulares. Imediatamente surgiu um boato, constava que tinha havido distúrbios a bordo e que os tropas envolvidos já não iam seguir connosco, mas iriam presos. Passado algum tempo tudo se clarificava, as carrinhas começaram a encostar ao navio e a descarregar os presos que transportavam, eram militares que iam de facto para a Guiné de castigo e com a indicação de serem colocados em locais de maior porrada. Recordo apenas um ou outro pormenor. Vinham de diversos quartéis; um deles tinha a alcunha do gaiolas e o seu crime tinha sido pegar num jeep do Quartel do Batalhão Caçadores 9, em Viana do Castelo e num fim-de-semana que não tinha passaporte foi para casa e só veio quando o foram buscar. Posto isto, o Carvalho Araújo zarpou barra fora. Nos primeiros dias os enjoos do costume e quase toda a gente a não conseguir comer, por isso a não preservar os instrumentos que lhe iriam fazer falta nos dias que a fome apertasse e o enjoo passasse. Era ver pelo convés garfos, facas copos e pratos abandonados, houve até quem os atirasse ao mar. No terceiro dia, houve simulacro de incêndio, para cada um saber o que fazer em caso de emergência e qual a baleeira que lhe era atribuída em caso de evacuação. Todos ficámos espantados com as camadas de tinta que tinham os cabos das roldanas que deveriam estar soltos para levarem as mesmas para a água. No quarto dia, cerca das 4.00 horas, foi dado o alarme de incêndio a bordo e que cada um deveria ocupar os lugares previamente distribuídos, todos pensamos que seria mais um simulacro e portanto não tínhamos nenhuma pressa, ainda por cima de madrugada. Tomámos consciência da realidade quando vimos a tripulação já de coletes vestidos, atrapalhados e a não saber o que fazer. Verificou-se que existia uma fuga de fuel na cozinha e que ia escorrendo a arder para dentro dos porões, local onde eram acomodados os soldados, em beliches feitos em madeira. Estava o pânico instalado, os que estavam dentro dos porões queriam sair, e quem queria apagar o fogo tinha que entrar. O acesso era apenas uma mísera escada de madeira com um corrimão. Eis que surgem os nossos salvadores, autênticos bombeiros de primeira qualidade, eram os militares que tinham chegado nas carrinhas celulares, que pondo em perigo as suas próprias vidas se lançaram heroicamente contra tudo e contra todos a apagar o incêndio que já estava a tomar proporções incontroláveis. Ao fim de pouco tempo tudo estava resolvido, mas sem nenhuma dúvida graças a esses corajosos companheiros, que com a sua generosidade e alguma loucura resolveram a situação. Reunidos os comandantes das tropas e do navio, decidiram de imediato propor um louvor a todos esses presidiários. De novo eles tornaram a surpreender. Todo o equipamento que havia na parte exterior do navio foi por eles atirado ao mar, e não mais houve cadeiras ou bancos para alguém se sentar a apanhar um pouco de sol. Escusado será dizer que o louvor ficou apenas pela proposta. O Carvalho Araújo estava mesmo muito mal e ao sétimo dia voltou a incendiar, desta vez com menos violência e a tripulação resolveu o problema. Toda a gente queria era chegar depressa à Guiné, pois morrer por morrer que fosse em terra. Finalmente chegámos em 04 de Dezembro de 1970. Regressou a Lisboa e penso que aí sim foi dado por incapaz e não mais voltou a navegar. Muito ele durou, pois falava-se que o mesmo já estava arrumado para abate, mas foi recuperado para transporte de tropas. Carvalho Araújo, N/M da Empresa Insulana de Navegação. Tinha lotação para 354 passageiros. Foi abatido em 1973. Imagem extraída de navios porugueses. Com a vénia devida. Frente e verso da Ementa do primeiro jantar servido a bordo do Carvalho Araújo A bordo do Carvalho Araújo > Saida da Barra de Lisboa > Da Esq para a Dta. > ???, Luís Moreira, ??? e ex-Fur Vaguemestre Cameiro da CCAÇ 2789 que esteve em Bula de 5 de Dezembro de 1970 a 29 de Setembro de 1972, natural de Rio Maior, penso que, infelizmente, já falecido. Um abraço a toda a caserna. Luís Moreira __________ Notas de CV: (*) Vd. poste de 12 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3876: Tabanca Grande (116): José F. Moreira, ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 2789/BCAÇ 2928 (Bula, 1970/72) Vd. último poste da série de 23 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3345: O cruzeiro das nossas vidas (12): Uíge, 5 de Fevereiro de 1969, destino Guiné (António Varela)

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Guiné 63/74 - P3893: Tributo aos nossos Sargentos do QP que mantinham as contas em dia (TCor José Francisco Robalo Borrego)

1. Mensagem do nosso camarada José Francisco Robalo Borrego (*), Ten Cor que pertenceu ao Grupo de Artilharia n.º 7 de Bissau e ao 9.º Pel Art, Bajocunda, Guiné 1970/72, com data de 12 de Fevereiro de 2009:

Camarada e amigo Carlos Vinhal,

Envio-te, para publicação, por favor, mais um contributo da Guiné para o prestígio da nossa Tabanca Grande, fazendo um pouco de justiça ao saber e experiência da classe de Sargentos do Quadro Permanente que se revelou no apoio dado aos Oficiais e Sargentos Milicianos (Quadro Complemento), principalmente àqueles Oficiais que tiveram a enorme responsabilidade de comandarem Companhias e cuja experiência de comando era muito incipiente no que respeitava à vertente administrativa.

Os Primeiros-Sargentos que respondiam pelas Companhias eram responsáveis, perante o Comandante, de toda a administração, incluindo a panóplia dos materiais, sendo coadjuvados por um ou mais Segundos-Sargentos. Pertenciam às Armas Combatentes, mas como tinham formação administrativa e a média das idades andava pelos 40 anos eram nomeados (mobilizados) para tarefas administrivas e não operacionais. Era uma prática que estava institucionalizada no Exército.

Recordo que, em 1972, o senhor Capitão Miliciano que comandava a Companhia de Bajocunda me ter relatado que não tinha experiência nenhuma de comando. Que tinha embarcado para a Guiné como Alferes e desembarcado como Capitão, Comandante de Companhia, mas tinha tido a sorte de ter a seu lado um Primeiro-Sargento muito competente e fiável, que já estava na terceira comissão e que orientava com mestria toda a máquina administrativa sem ser necessário a sua intervenção era, por assim dizer, um descanso!

O mesmo senhor Oficial de quem guardo as melhores recordações, por ser um homem culto e muito humano no relacionamento, confidenciou-me que se tivesse algum problema administrativo na Companhia, resultante de má administração, que o pudesse afectar, quando fosse de férias à Metrópole já não regressava à Guiné, porque provavelmente desertaria para o estrangeiro, mas que tal não era necessário, porque tinha a certeza que o seu Adjunto Administrativo tinha tudo em boa ordem. É evidente que ninguém é perfeito e houve, com certeza, casos menos bons, mas na generalidade penso que estes combatentes não operacionais foram úteis no apoio que prestaram aos combatentes operacionais, aliás considerados, por muitos, como peças importantes na engrenagem militar.

Quero também dedicar uma palavra de apreço e estima a todos os outros Sargentos que não pertencendo às Armas Combatentes deram o seu generoso contributo para o esforço de guerra na Guiné e nos outros Teatros de Operações.

Caro Carlos Vinhal,
já que estou a falar de Bajocunda, aproveito para contar uma pequena história que me veio à memória e tem a ver com um comerciante branco que tinha o monopólio do negócio da mancarra (amendoim). Quando o dito comerciante saía do Aquartelamento para tratar dos seus negócios algures no Senegal (segundo se dizia), o Comandante da Companhia ficava preocupado, porque de certeza que nessa noite havia flagelação ao Quartel.

É espantoso como um único homem, ainda por cima civil, punha uma Companhia de militares com os nervos à flor da pele! o homem circulava à vontade entre Bajocunda e Pirada com o seu veículo sem que nada lhe acontecesse, contrastando com o azar das NT que, de vez em quando, sofriam emboscadas e detectavam minas. Mera coincidência? Ou algo mais...? Enfim, coisas da guerra!

Um abraço amigo e fraterno do
José Borrego


2. Comentário de CV:

Quero aproveitar este poste do Ten Cor José Francisco Borrego, para prestar a minha homenagem ao (no início da Comissão da CART 2732) Segundo-Sargento João da Costa Rita, homem competente e honesto que desempenhou as funções de Primeiro-Sargento da Companhia na ausência de um Primeiro que não chegou a embarcar.
Acabou por ser promovido a meio da comissão, continuando a desempenhar o seu cargo até à Comissão Liquidatária, já depois do nosso regresso.

Deixo uma transcrição da última página da História da Unidade CART 2732:

CITAÇÃO

Pela correcta elaboração das contas e ainda pelo respeito aos prazos superiormente determinados para o seu envio, verifica-se a boa colaboração prestada à CSCA/QG/CTIG por algumas subunidades.
Este procedimento, por prestigiante para essas subunidades e para o próprio CTIG, merece ser citado, motivo pelo qual se referem as seguintes:

.................................
.................................
Companhia de Artilharia n.º 2732
.................................
__________

Nota de CV:

(*) Vd. poste de 12 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3445: Tabanca Grande (96): Ten Cor José Francisco Robalo Borrego, ex-1.º Cabo do Gr Art 7 e Furriel QP do 9.º PELART (1970/72)

Guiné 63/74 - P3892: FAP (12): O Fur Mil Pil Mota, e as Enf páras Giselda e Natália, caídos no Como em 1973 e salvos pelos fuzos (Miguel Pessoa)

Sequência de fotos da recuperação da avioneta DO-27, acidentada na Ilha do Como, em 17 de Novembro de 1973... Caídos em território inimigo, o Fur Mil Pil Ivo Mota, e as enfermeiras pára-quedistas Giselda Antunes e Natália Santos, tiveram a sorte de serem socorridos, com rapidez, por uma unidade da Marinha que passava ali perto, a LDG 102... Nas fotos a preto e branco, está documentado o regresso da DO-27, nº 3458, à base - Bissalanca, BA12.

Fotos: © Miguel Pessoa (2009). Direitos reservados.


1. Texto do Miguel Pessoa (ex-Ten Pilav, Bissalanca, BA12, 1972/74, hoje Cor Pilav Ref, casado com a Srgt Pára-quedista Giselda Antunes, seguramente o único casal do mundo atingido - cada um deles, separadamente, ocasiões diferentes, e em areonaves diferentes - , por um míssil SAM 7 Strela...

Acho que mereciam figurar no Guiness Book! Mas na nossa Tabanca Grande ficam seguramente melhor, e sobretudo melhor acompanhados pelos amigos e camaradas da Guiné. Giselda, sê bem vinda! Morcões, abram alas para receber, no nosso blogue, a primeira camarada da Guiné, tão combatente como qualquer um de nós!

É um privilégio para todos nós, Giselda, receber-te neste dia, 14 de Fevereiro, que por sinal até é dia dia dos Namorados... Jocastas chamava eu às enfermeiras pára-quedistas que conheci, de relance, no mato, no Vietname, longe de Bissau... Não aceitava que não levassem os nossos mortos, mas apenas os feridos. Hoje percebo porquê... E reconheço que não terei sido tão justo quanto o deveria ser, na minha apreciação do seu papel no TO da....

Também reconheço que todos nós temos uma dívida para com estas mulheres que, corajosamente, foram os anjos da guarda dos nossos camaradas, caídos ao nosso lado... Uma evacução Y na Guiné, em tempo recorde (20/30 minutos), podia significar a diferença entre a vida e a morte.

Foram também as primeiras mulheres a ingressar, contra tudo e contra todos os preconceitos, nas nossas Forças Armadas. Acho que o país não lhes fez ainda a homenagem que lhes é devida, em tempo útil. Aceita, Giselda, este pequeno gesto como um reparação de uma pequena injustiça (da minha parte) e sobretudo uma homenagem (da nossa Tabanca Grande), a ti, e às restantes camaradas enfermeiras pára-quedistas que serviram na Guiné e nas demais frentes da guerra do Ultramar.

(...) Esquecer a Guiné... por uma noite!
O Escriturário que toca acordeão
E faz tatuagens
Em troca de umas bazucas.
O terror das crianças balantas,
Nascidas no mato,
Ao ouvirem pela primeira vez
O roncar das GMC.
O soro correndo nas veias exangues,
Aos borbotões,
Enquanto a gente aguarda a evacuação Y
E o helicóptero
Com um anjo salvador, lá dentro,
Que tem um rosto de mulher.
A Jocasta que vem reclamar os seus filhos,
Os feridos, não os mortos.
O médico que manda receitar Valium 10
Para os cacimbados
E aspirina
Para os pretos.
As lâminas de aço dos rockets,
Esventrando os corpos.
O braço decepado, com a tatuagem
Em que ainda se podia ler
... Amor de mãe.
O nosso cabo, casado e pai de filhos,
Que há meses enfia no bucho,
Ao mato-bicho,
Uma bazuca e uma banana
Com a secreta esperança de,
Um dias destes,
Ainda poder ser evacuado a tempo,
Para Lisboa
Com uma hepatite qualquer
(A, B, C ou Z, tanto faz).
E quanto mais amarelo melhor,
Desde que apanhes uma doença,
Transmissível,
Infecto-contagiosa,
Irreversível,
Horrível,
Daquelas que vêm no cardápio
Dos serviços de saúde militar.
Que o hospital militar
De doenças infecto-contagiosas,
Em Lisboa,
E coisa boa,
É a melhor estância de férias do mundo!,
Garante o safado
Do nosso cabo enfermeiro Faleiro,
Num postal ilustrado da capital do Império.
Foi a nossa primeira baixa oficial,
Se não me engano.
Um herói, pouco ortodoxo,
Vítima da hepatite! (...)



Caro Luís:

Segue a história da queda da Giselda no Como (de que já tínhamos falado).

Junto umas fotos que poderão amenizar o texto - escolhe as que quiseres. Duas delas apresentam o piloto - Fur Ivo Mota - junto dos restos do avião.

Não tenhas pressa em publicar. Já sabes o fim da história - ela safou-se... E eu não gostaria de "ficar com a imagem desgastada" (como é costume dizer-se) e com o pessoal farto de ler os meus alinhavos, por serem seguidos (e provavelmente de qualidade duvidosa...)

Um abraço
Miguel Pessoa

2. UMA DO-27 NO CHARCO DO COMO
por Miguel Pessoa

Na manhã do dia 17 de Novembro de 1973 o Centro de Operações do Go1201, na BA12, recebe um pedido de evacuação, vindo de Catió, tendo de imediato destacado um DO-27 para efectuar essa missão. A equipa de alerta era constituída pelo Fur Ivo Mota, da Esq 121, e pela Enfª Paraquedista Giselda Antunes, e a eles se juntou a Enfermeira Paraquedista Natália Santos, acabada de chegar à Guiné e que, por ser pira, acompanhava as veteranas nas evacuações, para ganhar calo.

Estava-se já na época pós-Strela, que tinha trazido diversas restrições à navegação aérea. Entre a opção de subir para 10.000' [c. 3000 m], descendo depois à vertical do destino, o piloto optou pela outra opção possível, que era a de efectuar todo o voo a baixa altitude (50' a 100' sobre o terreno - o correspondente a 15 a 35 metros).

Para evitar zonas mais perigosas o Fur Mota decidiu então seguir ao longo da linha de costa, sobre a água, contornar a ilha de Como (refúgio do PAIGC), subir o rio Cumbijã e, atingido Cufar, dirigir-se em linha recta para Catió.

O voo decorria normalmente a baixa altitude; à passagem por Bolama tiveram a oportunidade de ver o navio que fazia o transporte de víveres e material, que se dirigia para sul. O DO-27 não parecia ressentir-se de qualquer problema resultante do incidente da véspera. O avião sofrera um choque com um pássaro que lhe tinha acertado no hélice, mas a inspecção feita ao avião no intervalo dos dois voos não tinha detectado qualquer anomalia.

Quando sobrevoavam os tarrafos ao lado da ilha de Como, o avião resolveu apagar-se - o motor parou repentinamente, obrigando o piloto a uma reacção rápida para preparar uma aterragem de emergência. Dada a baixa altitude a que seguiam, a única solução era poisar o estojo na direcção em que seguiam, em pleno tarrafo, o que o piloto fez - diga-se - com bastante êxito, pois o avião ficou atolado no lodo, mais ou menos direito, tendo os ocupantes saído ilesos desta aterragem (ou mais propriamente alodagem).

Quem esteve na Guiné sabe bem as diferenças no contorno das margens (no mar ou nos rios) entre a maré cheia e a maré vazia. Neste caso era hora da maré baixa e a água, tendo descido, deixara o tarrafo coberto de uma espessa camada de lodo.
Rapidamente, os ocupantes abandonaram o avião procurando, atascados no lodo, alcançar uma zona de águas mais profundas, onde pudessem, mergulhados, ficar menos expostos a olhares da margem e ser eventualmente pescados pelo navio que pouco antes tinham visto a navegar naquela direcção.

Ter-se-iam passado duas horas desde a aterragem forçada no local quando detectaram uma embarcação do tipo Zebro que se aproximava do local, atraída pela silhueta do DO-27 atolado. Desconfiados, continuaram metidos na água pois a distância não permitia uma identificação eficaz do pessoal que se aproximava. Com a aproximação do zebro puderam verificar que os tripulantes eram brancos, o que os levou a chamar a sua atenção. Rapidamente foram recolhidos e levados para o navio de guerra a que o zebro pertencia e que se aproximava entretanto do local.

Na BA12, entretanto, alertados pela falta de reportes do DO-27, tinham mandado descolar um Fiat G-91 que, seguindo o percurso mais provável voado pelo DO, veio rapidamente a localizá-lo no tarrafo. Imediatamente a Força Aérea pediu a colaboração da Armada, que deslocou uma segunda embarcação para o local.

Terá então havido aqui alguma falta de comunicação pois o segundo navio atarefava-se na busca do piloto no local quando este já se encontrava no primeiro navio. Mas mais vale a mais do que a menos...

O facto é que, depois de recuperada pela Armada, mesmo sem dispôr de material (perdido no acidente), a enfermeira Giselda ainda foi fazer a evacuação a Catió, num outro avião entretanto disponibilizado, que serviço é serviço...

No dia seguinte, uma LDG da Armada iniciou os trabalhos de recuperação do avião, aproveitando a fase da maré alta, que permitiu a aproximação ao local. A içagem do avião infelizmente não correu tão bem como se pretendia. Na primeira tentativa o DO acabou por cair novamente na água, ficando ainda mais danificado... Provavelmente foram maiores os estragos nessa altura do que na altura da queda! Não foi no entanto importante, pois o destino dele seria sempre a sucata. A deformação da estrutura e a corrosão da água do mar tinham provocado danos irreparáveis no avião.

Podemos imaginar que o fim feliz deste acontecimento se deveu a um conjunto de factores favoráveis que podiam muito bem não ter acontecido:

(i) O facto de o avião voar bastante baixo, não sendo observável das tabancas existentes;

(ii) A aproximação final do avião ao ponto de queda com o motor parado, não tendo, pelo seu silêncio, alertado ninguém próximo (detectou-se depois uma tabanca com população presumivelmente hostil a cerca de 700 metros);

(iii) A existência de um navio da Armada, em missão de vigilância próximo do local, o que permitiu a rápida recuperação dos ocupantes do DO-27.

Miguel Pessoa
_________

Nota de L.G.:

(*) Vd. último poste da série > 14 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3891: FAP (11): Jorge Caiano, ex-Melec/AV, BA12, 1969/70, reconhecido por Augusto Ferreira

Guiné 63/74 - P3891: FAP (11): Jorge Caiano, ex-Melec/AV, BA12, 1969/70, reconhecido por Augusto Ferreira



1. Reprodução do poste de 13 de Fevereiro de 2009 > 786 JORGE CAIANO. do blogue do Victor Barata Especialistas da BA 12, Guiné 1965/74 (com a devida vénia...):


Augusto Ferreira
2º Srgt Melec/Av Tete
Coimbra

Assunto - O Jorge Caiano


(...) Amigo Victor, ao ler no nosso blog as notícias relacionadas com o acidente que vitimou, na Guiné, o nosso companheiro piloto Francisco Manso, pelo CAIANO (*), parei por uns momentos, pois o nome era-me familiar.

Mas inicialmemte era MMA pensei, não deve ser o mesmo que conheci. Mas quando foi feita a correcção pelo Luís Graça, de que era MELEC/AV, concluí que não estava errado. Estive com ele.

Em 1971 pertencemos á mesma secção eléctrica da BA7 – S. Jacinto-AVEIRO. Tanto quanto me lembro, ele vivia em Quintãs, na zona de Aveiro.

Era um jovem alto e bem constituído fisicamente. Estávamos lá na altura na secção, com 1º Srgt Agostinho, com o Lapa e eu, todos de Coimbra, juntamente com ele.

Cheguei a esta base (na altura de instrução de pilotagem ), no final de Maio de 1971, acabadinho de concluir, na BA2-Ota, a especialidade de Electricista de Aviões e Instrumentos e foi aí que utilizei, pela primeira vez, os meus conhecimentos da especialidade, nas dezenas de aviões T6G que lá estavam estacionados, também na companhia do nosso companheiro CAIANO.

Não sei se ele se recorda de mim, e espero não estar errado. De qualquer modo, de aqui lhe envio um forte abraço e o desejo de que seja muito feliz, no país que escolheu para viver e trabalhar. (...).

Até breve
Augusto Ferreira

_________

Nota de L.G.:

(*) Vd. poste de 12 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3879: FAP (9): Jorge Caiano, ex-1º Cabo Esp Melec, BA12, 1969/70, no Canadá desde 1974

Guiné 63/74 - P3890: Tabanca Grande (119): Manuel Maia, ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610 (Guiné, 1972/74)

1. Mensagem de Manuel Maia, ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, com data de 10 de Fevereiro de 2009:

Foi com enorme satisfação que recebi o teu mail dando-me conta da necessidade de voltar a escrever para luisgraçaecamaradasdaguine@gmail.com o que acabei de fazer mas... quase instantâneamente foi-me devolvida à guiza do que acontecia sempre...

Nesta conformidade vou aproveitrar esta via para fornecer os dados que me foram solicitados.

Fui Furriel Miliciano da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610 que rumou depois do necessário IAO do CUMERÉ, para BISSUM/NAGA.
Aí nos mantivemos uns sete a oito meses para sermos apanhados na famosa operação do Cantanhez que implicou a ida de dois Grupos de Combate, (entre os quais o meu...) para CAFAL - BALANTA ficando adstritos à Companhia residente (que ali se encontrava apenas há dias...) vivendo em condições infrahumanas em buracos escavados no solo sem a possibilidade de protecção de "tecto" pois o homem do monóculo não autorizava senão panos de tenda e folhas de palmeira.

Esta parceria com Cafal durou uns três a quatro meses até à chegada do resto da minha Companhia que foi destacada para CAFINE (distando cerca de 2km dali...)

Então, já reunidos, passamos a viver em tendas de campanha até termos concluída a feitura dos reordenamentos consubstanciada em largas dezenas de habitações para a população. Só então procedemos à construção de mais algumas para serventia da companhia...

Foi um trabalho insano, mas que nos deu plena satisfação e que permitiu, estou certo, - a juntar ao episódio da captura algo fortuita de Rafael Barbosa, líder guinéu do PAIGC (em rota de colisão com os dirigentes caboverdeanos...) - a saída precoce da região, a título de prémio, creio bem...

Foram nove ou dez meses ali passados, naquela zona minguada de tudo menos de mosquitos e balas...

Dali fomos descansar para um local perto de Nhacra chamado DUGAL que dispunha de dois destacamentos, CHUGUÉ e FATIM onde aguardei até aos últimos quinze dias (de novo fomos para o Cumeré) antes do embarque final para Lisboa.

Sou licenciado em História e pretendo, se acaso me for facultado, óbviamente, enviar para a "tabanca" a história da minha Companhia em sextilhas (tenho-a também em prosa...) onde são respeitados os cânones desta vertente poética.

Relativamente ao envio das duas fotografias não me é possível fazê-lo
ainda, porquanto sendo debutante nesta tecnologia, terei ainda de colher informações que me levem ao cumprimentro do desiderato.

Um abraço.

2. Mas ainda no mesmo dia, o nosso novo camarada enviava as fotos da praxe.

Caro Vinhal

Graças ao meu filho foi possível enviar-te as fotografias.

Como temi que para o blog luisgraçaecamaradasdaguine@gmail, pudesse ser de novo devolvido tomei a liberdade de enviar para ti esperançado que seja possível fazeres o favor de as colocar no seu devido lugar.

Um abraço e o pedido de desculpas por usar o teu mail.


3. Comentário de CV

Caro camarada Manuel Maia, este poste é só para formalizar a tua apresentação à Tertúlia, porque já tens trabalho publicado no Blogue.

O texto que nos enviaste com o teu desejo de aderires à Tabanca Grande, é importante ser conhecido, para que te conheçamos melhor.

Justifico o meu destempo, dizendo que tinha um determinado alinhamento para apresentar dos diversos camaradas que tinha em espera, tendo o Luís entretanto publicado o teu trabalho do poste 3886(*).

Quanto ao utilizares o meu endereço, fizeste muito bem, porque ele está destinado aos assuntos do Blogue. Aliás se enviares as tuas mensagens para os dois endereços, mais certeza terás de que serão entregues. Tinhas um erro no endereço do Luís, (graça em vez de graca), não fosse teres recorrido a mim ainda não tinhas conseguido contactar o nosso Blogue.

Está tudo bem e isso é que é importante. Esperamos agora a tua colaboração na feitura da História da tua Unidade.

Deixo-te um abraço em nome da tertúlia.
__________

Nota de CV:

Vd. poste de 13 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3886: Tabanca Grande (118): Manuel Maia, ex-Fur Mil, o poeta épico da 2ª Companhia do BCAÇ 4610/72 , o Camões do Cantanhez

Guiné 63/74 - P3889: Dicionário fula / português (Luís Borrega) (5): Jubi, ala poren, iauliredu... / Miúdo, avião, tem medo...



1. Continuação da publicação do Dicionário Fula/Português, organizado pelo nosso camarada Luís Borrega, ex-Fur Mil Cav MA da CCAV 2749/BCAV 2922 (Piche, 1970/72).


V (e última) parte da lista de vocábulos em idioma fula (e respectiva tradução em português) (*), recolhidos em resultado de conversas com o seu amigo Cherno Al Hadj Mamangari, que vivia
em Cambor, a nordeste de Piche. Como já foi dito, o título Al Hadj é dado ao crente muçulmano, depois de regressar da sua peregrinação a Meca.

Obrigado, Luís Borrega, camarada e amigo! O teu esforço por tentar comprender o outro (neste caso, os fulas, que eram e são um dos principais grupos étnico-línguísticos da Guiné-Bissau) é, só por sim, um gesto de grande abertura de espírito, de recusa do etnocentrismo, e sobretudo de ternura. Bem hajas! Espero que a tua recolha (que não obviamente não tem a pretensão de ser um dicionário...) possa ser útil a muita gente, os nossos camaradas que voltam à Guiné em 'turismo de saudade', os nossos antigos camaradas fulas que vivem em Portugal, os seus filhos e netos, nascidos em Portugal (que estão em idade escolar, e que já não sabem ao idioma dos seus pais e avós)... Todos os idiomas do mundo fazem parte da riquíssima diversidade cutural da humanidade, diversidade que devemos conhecer, apreciar, manter e preversar... Por que só há uma terra, só há um raça humana... LG

___________

Nota de L.G.:


(*) Vd. postes anteriores desta série:

24 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3785: Dicionário fula / português (Luís Borrega) (1): Nafinda, nháluda, naquirda... Bom dia, boa tarde, boa noite...

24 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3786: Dicionário fula / português (Luís Borrega) (2): Gô, Didi, Tati, Nai, Joi.../ Um, Dois, Três, Quatro, Cinco...

26 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3798: Dicionário fula / português (Luís Borrega) (3): Jungo, neuréjungo, ondo... / Braço, mão, dedo, ...

1 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3827: Dicionário fula / português (Luís Borrega) (4): Nhamo, nano... / Direita, esquerda...