1. Mensagem de Manuel Maia* (ex-Fur Mil da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4610, Bissum Naga, Cafal Balanta e Cafine, 1972/74), com data de 14 de Dezembro de 2010:
Caro Carlos,
Aqui vão umas fresquinhas.
abraço
manuelmaia
CONTRATO COM O EXÉRCITO
Marmita de alumínio reluzente,
que leva o mau "conduto" e sopa quente,
lavada é logo após a refeição...
Na guerra Cantanhez, com tudo errado,
senti-me figurante algo enganado,
num filme série B de mau guião...
Contrato então firmado (ai se era agora...)
p`lo Estado regulado, sem demora,
impunha vinte e quatro horas/serviço...
Dinheiro p`ra uns copitos e tabaco,
diária a trinta escudos, em buraco,
e fogachal do IN sem sumiço...
É certo que houve casos mais marcantes
que o nosso, meros bandos figurantes,
no bem-bom d`aramadas posições...
Que o diga AB, herói tão esforçado,
sujeito a falhas de ar condicionado,
aquando da investida a refeições...
Nos bolsos da camisa camuflada,
latinha "coração", bem arrolhada,
e pano de flanela/polimento...
Nas calças, palha d`aço e detergente,
repõem brilho bem resplandecente,
à lataria exposta "no evento"...
Contrato pela malta foi cumprido,
no tabaco e no álcool consumido,
o curto patacão, dito ordenado...
Dois anos média o tempo/comissão,
Falharam só chefias da Nação,
ao impedir ao tropa ser tratado...
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 11 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7421: Blogpoesia (95): Malefícios da água não potável (Manuel Maia)
Blogue coletivo, criado e editado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra col0onial, em geral, e da Guiné, em particular (1961/74). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que sáo, tratam-se por tu, e gostam de dizer: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quinta-feira, 16 de dezembro de 2010
Guiné 63/74 - P7446: Blogando e andando (José Eduardo Oliveira) (11): Os Pequenos Nadas da vida
1. Mensagem do nosso camarada José Eduardo Oliveira* (JERO) (ex-Fur Mil da CCAÇ 675, Binta, 1964/66), com data de 14 de Dezembro de 2010:
Meu Caro Amigo Luís
Vivia numa zona rural e depois da “escola” ajudava nas tarefas caseiras. Na fazenda, que circundava a casa dos seus pais e avós, pegava na sachola ou no ancinho dia sim, dia sim e ia aprendendo o que a vida custa. Os trabalhos agrícolas eram duros e as idas à taberna com o seu pai eram sempre momentos bem-vindos.
Fascinavam-no as conversas do seu pai com os mais velhos, nomeadamente, quando essas conversas evocavam recordações da guerra do Ultramar. Se tentava meter a sua “colherada” não lhe davam grande atenção. Era ouvir e calar. Quando o seu pai bebia o seu copo de vinho soltava um “ah” de satisfação, que parecia ficar a pairar algum tempo no ambiente acolhedor da taberna. “Ouvia-se” o silêncio entre conversas dos amigos de seu pai.
Aqueles “aaahh” de satisfação eram momentos “únicos”… Pareciam fazer parte de um ritual monástico, salvaguardadas as devidas proporções. Quando o pai esvaziava o copo e batia com ele, já vazio, no balcão o “aaahh”, já tantas vezes ouvido, surpreendia sempre o Pedro que seguia com olhar o momento de prazer do seu pai. Que bom devia ser beber um copo. Quando é que ele teria direito a um “aaahh”!?
O tempo ia passando e o Pedro um dia atreveu-se a pedir ao pai:
- Quando é que eu posso beber um “aaahh”?
O olhar que o seu pai lhe deitou antecipou a resposta que bem lhe custou a ouvir:
- Ainda és muito novo para um “aaahh”.
Passou o Verão, chegou o Outono e o Pedro pensou que já tinha acumulado “créditos” para mais um pedido. E num dia em que tudo tinha corrido especialmente bem nos trabalhos da escola e da fazenda arriscou:
- Oh pai, quando é que eu posso beber um “aaahh”?
Teve direito a mais resposta negativa mas, desta vez, pareceu-lhe que o Pai tinha feito um compasso de espera antes de proferir o “não”. Saiu chateado da taberna e voltou sozinho para casa.
No dia seguinte o Pedro fez mais uma tentativa.
- Oh Pai quando é que eu…
Para sua surpresa o pai disse para o taberneiro.
- Oh Grazina dá lá um copo ao rapaz.
Pareceu-lhe que tinha havido um piscar de olhos entre ambos mas… o seu copo finalmente “aterrou” no balcão.
O Pedro pegou-lhe com o coração a palpitar e com os olhos a brilhar preparou-se para soltar o seu primeiro “aaahh”.
Bebeu o primeiro golo e arrepiou-se todo. Soltou um “iiiihh” prolongado… Tentou um segundo golo e o seu “iiiiiiihhh” foi ainda mais prolongado. Olhou para o copo com asco… e sentiu a mão do pai nas suas costas.
- Como vês ainda não tens idade para um “aaahh”.
O Pedro teve que reconhecer que sim e saiu para a rua para apanhar ar. O pai ficou um pouco trás e, bem disposto, disse ao Grazina:
- Eh pá não poupaste no vinagre. Fico-te a dever uma.
Só muito mais tarde o Pedro soube da “marosca” e... percebeu como o seu Pai tinha sido sábio.
De facto o vinho não deve ser bebido por gente nova… e que há idade para tudo…
Esta história é verdadeira e passou-se numa freguesia perto de Alcobaça.
Infelizmente os pais dos miúdos da cidade nem sempre têm tempo para estar tão presentes nas vidas dos seus filhos. Nomeadamente nas suas saídas nocturnas, quando consomem “aaahh’s” antes de tempo…
Os tais “pequenos nadas” da vida que podem vir a fazer toda a diferença!
É ou não “eeehh”!?
JEROOO…
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 8 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7246: (Ex)citações (107): Mininus di praça e “O Fascínio” (José Eduardo Oliveira)
Vd. último poste da série de 26 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6899: Blogando e andando (José Eduardo Oliveira) (10): Revisitando o passado de Alcobaça, dos anos 40, na Tabanca de São Martinho do Porto
Meu Caro Amigo Luís
Com a aproximação do Natal queria dar-te uma prova de respeito e amizade. Ou vice-versa.
Voltar ao "Blogando e andando", que comecei no nosso blogue com o teu "alto patrocínio", é simbolicamente essa prova. É raro o dia em que não me surpreende a força e dinamismo do nosso blogue. É simplesmente notável.
Nos últimos tempos devido ao envolvimento pessoal que tenho no jornal da terra não tenho tido tempo para nada. Depois... estou metido em dois livros. Um está pronto - falta apenas inseriras imagens - e outro se seguirá.
Quando se chega aos "setenta" sentimos que o tempo nos pode faltar e alguma ansiedade nos assalta para "deixar" testemunhos... antes que seja tarde...
Estou nessa fase.
Alguma remorso me acompanha por não ter mais tempo para colaborar no nosso blogue mas espero que o Editor e seus colabores mais próximos me possam perdoar...
Entretanto é tempo de votos. Para ti e para os teus votos de um Feliz e Santo Natal.
Um abraço fraterno de Alcobaça,
JERO
PS-Segue um pequeno texto com o simbolismo dos "pequenos nadas" que fazem a diferença na vida.Digo eu.
BLOGANDO E ANDANDO (11)
OS ”PEQUENOS NADAS” DA VIDA…
O Pedro, um jovem de 13 anos, acompanhava habitualmente o pai nas idas à taberna da aldeia.
Voltar ao "Blogando e andando", que comecei no nosso blogue com o teu "alto patrocínio", é simbolicamente essa prova. É raro o dia em que não me surpreende a força e dinamismo do nosso blogue. É simplesmente notável.
Nos últimos tempos devido ao envolvimento pessoal que tenho no jornal da terra não tenho tido tempo para nada. Depois... estou metido em dois livros. Um está pronto - falta apenas inseriras imagens - e outro se seguirá.
Quando se chega aos "setenta" sentimos que o tempo nos pode faltar e alguma ansiedade nos assalta para "deixar" testemunhos... antes que seja tarde...
Estou nessa fase.
Alguma remorso me acompanha por não ter mais tempo para colaborar no nosso blogue mas espero que o Editor e seus colabores mais próximos me possam perdoar...
Entretanto é tempo de votos. Para ti e para os teus votos de um Feliz e Santo Natal.
Um abraço fraterno de Alcobaça,
JERO
PS-Segue um pequeno texto com o simbolismo dos "pequenos nadas" que fazem a diferença na vida.Digo eu.
BLOGANDO E ANDANDO (11)
OS ”PEQUENOS NADAS” DA VIDA…
O Pedro, um jovem de 13 anos, acompanhava habitualmente o pai nas idas à taberna da aldeia.
Vivia numa zona rural e depois da “escola” ajudava nas tarefas caseiras. Na fazenda, que circundava a casa dos seus pais e avós, pegava na sachola ou no ancinho dia sim, dia sim e ia aprendendo o que a vida custa. Os trabalhos agrícolas eram duros e as idas à taberna com o seu pai eram sempre momentos bem-vindos.
Fascinavam-no as conversas do seu pai com os mais velhos, nomeadamente, quando essas conversas evocavam recordações da guerra do Ultramar. Se tentava meter a sua “colherada” não lhe davam grande atenção. Era ouvir e calar. Quando o seu pai bebia o seu copo de vinho soltava um “ah” de satisfação, que parecia ficar a pairar algum tempo no ambiente acolhedor da taberna. “Ouvia-se” o silêncio entre conversas dos amigos de seu pai.
Aqueles “aaahh” de satisfação eram momentos “únicos”… Pareciam fazer parte de um ritual monástico, salvaguardadas as devidas proporções. Quando o pai esvaziava o copo e batia com ele, já vazio, no balcão o “aaahh”, já tantas vezes ouvido, surpreendia sempre o Pedro que seguia com olhar o momento de prazer do seu pai. Que bom devia ser beber um copo. Quando é que ele teria direito a um “aaahh”!?
O tempo ia passando e o Pedro um dia atreveu-se a pedir ao pai:
- Quando é que eu posso beber um “aaahh”?
O olhar que o seu pai lhe deitou antecipou a resposta que bem lhe custou a ouvir:
- Ainda és muito novo para um “aaahh”.
Passou o Verão, chegou o Outono e o Pedro pensou que já tinha acumulado “créditos” para mais um pedido. E num dia em que tudo tinha corrido especialmente bem nos trabalhos da escola e da fazenda arriscou:
- Oh pai, quando é que eu posso beber um “aaahh”?
Teve direito a mais resposta negativa mas, desta vez, pareceu-lhe que o Pai tinha feito um compasso de espera antes de proferir o “não”. Saiu chateado da taberna e voltou sozinho para casa.
No dia seguinte o Pedro fez mais uma tentativa.
- Oh Pai quando é que eu…
Para sua surpresa o pai disse para o taberneiro.
- Oh Grazina dá lá um copo ao rapaz.
Pareceu-lhe que tinha havido um piscar de olhos entre ambos mas… o seu copo finalmente “aterrou” no balcão.
O Pedro pegou-lhe com o coração a palpitar e com os olhos a brilhar preparou-se para soltar o seu primeiro “aaahh”.
Bebeu o primeiro golo e arrepiou-se todo. Soltou um “iiiihh” prolongado… Tentou um segundo golo e o seu “iiiiiiihhh” foi ainda mais prolongado. Olhou para o copo com asco… e sentiu a mão do pai nas suas costas.
- Como vês ainda não tens idade para um “aaahh”.
O Pedro teve que reconhecer que sim e saiu para a rua para apanhar ar. O pai ficou um pouco trás e, bem disposto, disse ao Grazina:
- Eh pá não poupaste no vinagre. Fico-te a dever uma.
Só muito mais tarde o Pedro soube da “marosca” e... percebeu como o seu Pai tinha sido sábio.
De facto o vinho não deve ser bebido por gente nova… e que há idade para tudo…
Esta história é verdadeira e passou-se numa freguesia perto de Alcobaça.
Infelizmente os pais dos miúdos da cidade nem sempre têm tempo para estar tão presentes nas vidas dos seus filhos. Nomeadamente nas suas saídas nocturnas, quando consomem “aaahh’s” antes de tempo…
Os tais “pequenos nadas” da vida que podem vir a fazer toda a diferença!
É ou não “eeehh”!?
JEROOO…
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 8 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7246: (Ex)citações (107): Mininus di praça e “O Fascínio” (José Eduardo Oliveira)
Vd. último poste da série de 26 de Agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6899: Blogando e andando (José Eduardo Oliveira) (10): Revisitando o passado de Alcobaça, dos anos 40, na Tabanca de São Martinho do Porto
Guiné 63/74 - P7445: Operação Tangomau (Álbum fotográfico de Mário Beja Santos) (4): Dia 22 de Novembro de 2010
1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Dezembro de 2010:
Meus queridos amigos,
Se bem que eu tivesse preparado para as emoções, foi um dia tumultuoso, ninguém regressa às origens sem um estremeção.
Falei com os professores de Bambadinca, visitei a escola da missão, encontrei gente que fez questão de se anunciar: “Chamo-me João Coré Baldé, do Pel Caç Nat 54". Quando acabei esta visita a Bambadinca, estava sem fala.
Da parte da tarde, foi tudo muito mais ameno, estive em Samba Juli e em Fá.
Depois eu vou contar. Um abraço do
Mário [, foto em cima, à direita, Bambadinca, 1970]
DIA 22 DE NOVEMBRO DE 2010
Antes de pedir autorização para entrar no quartel a visita que o Tangomau efectuou na companhia do tenente-coronel Seco Mané, decidiu ir ver a rampa que dá acesso à tabanca de Bambadinca. Imprevistamente, desatou a chorar, a rampa da sua vida transformara-se numa inclinação de terra, com gretas que se aprofundam na época das chuvas.
A nova estrada que vem da Bantajã, que flanqueia a bolanha de Finete, alterou profundamente a relação espacial de Bambadinca e o Bambadincazinho. Agora a estrada alcatroada sobe em paralelo a esta rampa em vias de extinção, só frequentada pelas crianças que vão para a escola, junto ao rio, ou outros passantes que habitam perto, por exemplo junto da antiga casa do comerciante Rendeiro.
A rua principal de Bambadinca vai-se desmoronando, já caíram a loja do José Maria Tavares, os armazéns da Casa Gouveia e Ultramarina. Veremos noutra fotografia um outro interior de armazém em derrocada. Questiona-se, em todas as circunstâncias, o que é que leva um país paupérrimo a não reaproveitar edifícios que tinham solidez, que podiam ter sido aproveitados para habitação, por exemplo. O Tangomau subiu e desceu esta rampa vezes sem conta. Em sinal de penitência, desceu até ao edifico dos CTT que também fotografou, e a seguir dirigiu-se ao quartel. De facto, o Exército guineense tem aqui o seu quartel .
Trata-se de um local mágico para o Tangomau. Era aqui que se tentava falar para Lisboa. A porta e as janelas estavam sempre abertas. Atendia a D. Leontina, uma gentil senhora com quem se apalavrara o dia e a hora para telefonar para Lisboa. De todos os edifícios em derrocada, este é o que ainda está em melhor estado.
Aqui o Tangomau foi-se definitivamente abaixo, começou a uivar, primeiro um choro morno, umas lágrimas de fel e saudade. Há fotografias suas nesta sala, não havia luxos, havia o indispensável para se estar sentado, uns sofás com napa, cadeiras e bancos. Havia um balcão e bancos. O que se vê é o aviltamento.
O tenente-coronel Seco Mané pedia: “Não chora, não chora, senão eu também chora!”. O Tangomau justificou-se: “Deixe-me chorar, o meu choro chama-se melancolia, tristeza e aflição pela maneira como os senhores tratam o património. Nesta porta entrei em dias de tormento e aflição, por esta porta vi matar a fome e a sede. Este espaço é um lugar importante da minha vida. O que mais me dói é estar irreconhecível, aos meus olhos e aos seus olhos. Choro não pelo passado mas pelo presente, Sr. tenente-coronel”. E continuei a cirandar pela messe.
É o que resta da messe de oficiais. Oxalá tivesse sido um tornado, uma fúria da natureza que os homens não pudessem suster. Mas não, o que se avista é pura destruição, o abandono de equipamento que podia estar ao serviço daquela comunidade. Aqui se comia, se jogava às cartas, havia quem se sentasse a escrever e a conversar. Não se faz esta maldade a um aprazível espaço de convívio. E o Tangomau continuava a chorar e o Sr. tenente-coronel replicava: “Não chora, não chora, senão eu também chora!”.
Era aqui que o soldado Simões dava a última demão à comida, antes de a trazer para a sala de jantar. Aqui se faziam ovos estrelados e alguns acepipes. Aqui a Sr.ª D. Maria Alzira Pimentel Bastos frigiu rissóis, dando um pontapé na rotina da chamadas ementas da tropa. Resta este buraco, este abandono. O Tangomau só se interrogava para onde fora o equipamento de cozinha onde, outrora, se tinham operado milagres de improvisada culinária.
Na companhia do tenente-coronel Seco Mané, o Tangomau foi percorrendo o corredor do edifício dos oficiais, porta a porta: indicava o quarto do tenente da secretaria, do médico, dos oficiais de transmissões e das viaturas, ali era a casa de banho, logo a seguir o seu quarto. O que ia vendo era, pura e simplesmente, falta de manutenção, desleixo. Mas quando chegou à casa de banho foi-se abaixo…
Arrancaram os lavatórios e as sanitas, os duches estão imprestáveis. Isto não é uma casa de banho, é uma habitação assombrada, andou por aqui um demente com sanha destruidora. Esta casa de banho era funcional, tinha conforto e comodidade. O Tangomau voltou 40 anos atrás, reviu mentalmente tudo quanto ali existia, o descalabro actual, tal como ele o entendeu, era um insulto à civilização e não aos militares portugueses que usavam este espaço de higiene e asseio. A comoção maior sobreveio na visita seguinte, à messe de oficiais.
É o que resta da porta de armas virada para os dois itinerários principais, Xime à direita e Xitoli à esquerda. A pista de aviação desapareceu, foi ocupada com a extensão do Bambadincazinho. Neste ângulo, é como se nos dirigíssemos para o quartel, para a escola, para a casa do chefe de posto, para a mãe de água, para a capela. Ao fundo, mesmo ao fundo, desapareceu a porta de armas que dava acesso à rampa.
Uma boa parte das instalações militares estão ainda de pé. Quem jogou à bola pode recordar as instalações por detrás. Entretanto, o Bambadincazinho vai investindo, na mais perfeita anarquia.
As irmãs franciscanas recuperaram a capela. Aqui entrei, com o pulso acelerado. Foi quando vi a fotografia que o Humberto Reis tirou, há mais de 10 anos, que me decidi a voltar à Guiné, como aconteceu, escrevendo a história da minha comissão militar. Sempre que podia, vinha aqui à missa, aqui depositei os nossos mortos. Não se chegava nem se partia de Bambadinca sem olhar a capela, até mesmo em frente se formavam as colunas de abastecimento que iam até ao Xitole.
A antiga escola de Bambadinca, hoje inoperacional. Vim aqui visitar a professora, que me emprestava livros e documentos. Era muito agradável ouvir o gralhar das crianças no interior do quartel. Ali ao pé, a mãe de água apareceu. A casa do chefe de posto está recuperada, vive lá a autoridade política.
Outro local mítico para o Tangomau e a sua equipa. Havia aqui um cais tosco, duas canoas e um canoeiro muito amigo, Mufali Iafai. Do outro lado, o princípio ou o termo da bolanha de Finete. O Tangomau ficou especado a olhar para o tempo parado, removida a importância do lugar, a própria bolanha de Finete já não é o que era. Amanhã vai recomeçar o seu dia neste ponto, rever o porto que teve uma actividade febril, vai procurar os seus últimos vestígios. Foi tal a comoção do dia que até irá conversar com um pescador vindo do Mali quanto custa levá-lo de canoa até Mato de Cão. Discutiu-se o preço, mas a viagem não se fez. Só que a viagem nunca acaba – e o entusiasmo do viajante também não.
Fotos: © Mário Beja Santos (2010). Direitos reservados.
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Espectacular vista aérea do aquartelamento, tirada no sentido leste-oeste, ou seja, do lado da grande bolanha de Bambadinca (vd. mapa da região)
Reconstituição feita, de memória, por Humberto Reis, Luís Graça e Gabriel Gonçalves (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71):
(i) Do lado esquerdo da imagem, para sul, era a pista de aviação (1) e o cruzamento das estradas para Nhabijões (a oeste), o Xime (a sudoeste) e Mansambo e Xitole (a sudeste);
(ii) Vê-se ainda uma nesga do heliporto (2) e o campo de futebol (3);
(iii) A CCAÇ 12 começou também a construir um campo de futebol de salão (4), com cimento roubado à engenharia nas colunas logísticas para o Xitole;
(iv) De acordo com a fotografia, em frente, pode ver-se o conjunto de edifícios em U: constituía o complexo do comando do batalhão (5) e as instalações de oficiais (6) e sargentos (8), para além da messe e bar dos oficiais (8) e dos sargentos (9);
(v) Apesar do apartheid (leia-se: segregação sócio-espacial) que vigorava, não só na sede dos batalhões, como em muitas unidades de quadrícula, uns e outros, oficiais e sargentos, tinham uma cozinha comum (19);
(vi) Do lado direito, ao fundo, para norte, a menos de um quilómetro corria o Rio Geba, o chamado Geba Estreito, entre o Xime e Bafatá;
(vii) O aquartelamento de Bambadinca (e posto administrativo do concelho de Bafatá) situava-se numa pequena elevação de terreno, sobranceira a uma extensa bolanha (a leste); são visíveis as valas de protecção (22), abertas ao longo do perímetro do aquartelamento que era todo, ele, cercado de arame farpado e de holofotes (24); a luz eléctrica era produzida por gerador...
(viii) Junto ao arame farpado, ficavam vários abrigos (26), o espaldão de morteiro (23), o abrigo da metralhadora pesada Browning (25); em 1969/71, na altura em que lá estivemos, ainda não havia artilharia (obuses 14);
(ix) A caserna das praças da CCS/BCAÇ 2852 (11) ficava do lado oeste, junto ao campo de futebol (3);
(x) Julgava-se que o pessoal do pelotão de morteiros e/ou do pelotão Daimler ficava instalado no edifício (12), que ficava do outro lado da parada, em frente ao edifício em U;
(xi) Mais à direita, situava-se a capela (13) - que funcionava também como casa mortuária - e, ao lado, a secretaria da CCAÇ 12 (14);
(xii) Creio que por detrás ficava o refeitório das praças; em frente havia um complexo de edifícios de que é possível identificar o depósito de engenharia (15) e as oficinas auto (16); à esquerda da secretaria, eram as oficinas de rádio (17);
(xiii) Do lado leste do aquartelamento, tínhamos o armazém de víveres (20), a parada e os memoriais (18), a escola primária antiga (19) e o depósito da água (de que se vê apenas uma nesga);
(xiv) Ainda mais para esquerda, o edifício dos correios, a casa do administrador de posto (que era um caboverdiano, na altura), e outras instalações que chegaram a ser utilizadas por camaradas nossos que trouxeram as esposas para Bambadinca (foi o caso, por exemplo, do Alf Mil Carlão, nosso camarada da CCAÇ 12);
(xv) Esta reconstituição foi feita pelo Humberto Reis (HR), completada por mim (LG) e, mais recentemente, pelo Gabriel Gonçalves (GG), que identificou novos sítios: cantina (27), posto de rádio (28), refeitório das praças (29) e centro cripto (no topo do edifício 5)...
Ficamos à espera de novos contributos, nomeademente por parte do pessoal das CCS do BCAÇ 2852 (1968/0) e do BART 2719 (1970/72) que privaram connosco, bem como as unidades adidas (Morteiros, Daimler, Intendência, Engenharia, Pelotões Caçadores Nativos...).
Foto: © Humberto Reis (2007) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guine. Todos os direitos reservados.
____________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 12 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7425: Operação Tangomau (Álbum fotográfico de Mário Beja Santos) (3): Dia 21 de Novembro de 2010
Guiné 63/74 - P7444: Parabéns a você (189): António Paiva, ex-Soldado Condutor, HM 241, 1968/70 (Tertúlia / Editores)
Hoje, 16 de Dezembro de 2010, está de parabéns, por festejar mais um ano de vida, o nosso camarigo Antonio Paiva*, ex-Soldado Condutor no HM 241 entre 1968 e 1970.
É nosso dever não deixar passar esta data sem vir testemunhar ao António o nosso regozijo pelo alegre acontecimento.
Caro António, recebe os nossos melhores votos para que tenhas uma longa vida, com saúde, junto dos teus familiares, na certeza de que estes amigos tertulianos estarão sempre por perto para festejar contigo em cada ano.
__________
Notas de CV:
- Postal de aniversário de Miguel Pessoa
(*) Vd. poste de 16 de Dezembro de 2009 > Guiné 63/74 - P5474: Parabéns a você (54): António Paiva, ex-Soldado Condutor do HM 241 de Bissau
Vd. último poste da série de 15 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7437: Parabéns a você (188): Francisco Santos, 68, Montijo; Sousa de Castro, 60, Viana do Castelo
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
Guiné 63/74 - P7443: Em busca de... (150): Pessoal do BENG 447, Bissau, 1966/68 (Jorge Picado / José Manuel Bastos Cachim)
Costa Nova > 25 de Agosto de 2010 > O nosso camarigo Jorge Picado mais o nosso camarada José Manuel Bastos Cachim que, espero, se torne em breve mais um dos camarigos da Tabanca Grande... Conhecia-o na casa do irmão do meu amigo Zé António Paradela, arquitecto, filhos de gente do mar, como bons ilhavenses que são... (O irmão do meu amigo é capitão da marinha mercante reformado, Tibério Paradela.)
Fotos: © Luís Graça (2010). Todos os direitos reservados.
1. Comentário do Jorge Picado ao poste P7419, na sequência de um pedido meu ("A propósito, tenho que ir recuperar as fotos que te tirei, a ti e ao teu amigo, engenheiro, do BENG, na Costa Nova, no verão passado... Recorda-me como é que ele se chama... Tomei nota algures, mas também posso pedir ao nosso comum amigo Zé António Paradela")...
Quanto ao engenheiro do BENG, chama-se José Manuel Bastos CACHIM e esteve lá entre 1966/68.
Se algum camarigo do BENG desta época que "frequente" o Blogue se lembrar, ele era o responsável pela Carpintaria e Mecânica Pesada (Caterpillar´s, etc)
_______________
Nota de L.G.:
Último poste desta série > 25 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7331: Em busca de... (149): Pedido de informação sobre a naturalidade de Vitorino António Marques (José Sampaio/José Martins)
Guiné 63/74 - P7442: Agenda Cultural (95): Convite para sessão de defesa da dissertação Os militares portugueses na Guiné-Bissau: da contestação à descolonização, Lisboa, ISCTE, 6ª feira, 17
AGENDA CULTURAL - CONVITE
Convite para sessão de defesa da dissertação de mestrado, “Os militares portugueses na Guiné-Bissau: da contestação à descolonização” (Rui F.B. Camacho Duarte)
Exmo.(a) Sr.(a),
Tenho a honra de convidar V. Exa. para a defesa de Dissertação de Mestrado em História Moderna e Contemporânea – Relações Internacionais, intitulada “Os militares portugueses na Guiné-Bissau: da contestação à descolonização”, a ter lugar no próximo dia 17 de Dezembro de 2010 (sexta-feira), pelas 15h30m, na sala 326, da Ala Autónoma do ISCTE - IUL (Piso 3 da Ala Autónoma - ISCTE-IUL), sito na Avenida das Forças Armadas, em Lisboa.
Com os meus melhores cumprimentos,
Rui Filipe de Brito Camacho Duarte
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 12 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7423: Agenda Cultural (94): A exposição A Marinha na República, Museu da Marinha, em Lisboa, Belém, até ao dia 5 de Janeiro de 2011 (Luís Graça)
Guiné 63/74 - P7441: O Mural do Pai Natal da Tabanca Grande (2010) (1): Querido Pai Natal... (Albino Silva, CCS/BCAÇ 2845, Teixeira Pinto, 1968/70)
1. Mensagem de Albino Silva* (ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845, Teixeira Pinto, 1968/70), com data de 4 de Dezembro de 2010:
Carlos Vinhal:
Nesta minha mensagem especial como não podia deixar de ser, quero desejar-te um Santo e Feliz Natal e Próspero Ano de 2011, aliás como acima o fiz, sem esquecer o Luís Graça, Magalhães Ribeiro, Humberto Reis e Virgínio Briote, transmitindo ainda a todos os Tertulianos que fazem parte ou frequentam a nossa Tabanca Grande, incluindo as Senhoras que nos vão dando conta de suas Histórias, e porque também elas viveram um passado deveras difícil, sabendo que outras há, e que decerto gostariam de escrever aqui na nossa Tabanca Grande, contando suas mágoas, e muitas tristeza pelo trauma vivido conjuntamente com seus maridos, porque conheço infelizmente alguns casos em que é por demais doloroso, ao ver sofrer mulheres e até filhos, quando camaradas nossos ainda gritam assustados daquele passado que nós tivemos naquela África sangrenta.
Vamos continuar com nossa Tabanca.
Eu estou já escrevendo mais umas coisinhas a meu jeito e que para 2011 enviarei à Tabanca Grande.
Um grande abraço a todos
BOAS FESTAS...
Para todos
BOAS FESTAS
Camaradas da Tertúlia,
para todos bem igual,
vos desejo tudo de bom,
um Santo e Feliz Natal...
Em especial saúde
e nunca nada de mau,
se possível neste Natal
comam muito bacalhau...
À nossa Tabanca Grande,
de gente boa e modesta,
desejo um Santo Natal
e Bom Ano Novo em festa...
Aos Régulos da nossa Tabanca
os quais eu sempre respeito,
Boas Festas e parabéns
por tudo quanto têm feito...
Termina o ano positivo
por tudo aquilo que eu vi,
das vezes que fui à Tabanca,
por tudo quanto eu lá li...
Estamos a chegar ao Natal,
por isso me lembro de ti,
de camaradas que já partiram
também esses não esqueci...
Sei que não estão entre nós
e sei que jamais os verei
e nesta quadra especial
eu por eles rezarei ...
Camaradas da Tabanca,
enquanto tiverdes memória,
pró Ano voltai a escrever,
contai sempre vossa História...
Estou pronto a ler tudo
e vejo sempre tudo tão bem
e para a Tabanca ser Grande
eu escrevo nela também ...
Dia a dia venho aqui,
e sei que fazes igual,
ver nossa Tabanca Grande
pois é este o meu jornal ...
Bom Natal ao Luís Graça,
da Tabanca fundador,
ao Humberto Reis, cartógrafo,
Carlos Vinhal, administrador...
Também ao Magalhães Ribeiro,
da Tabanca é seu editor,
igualmente um Bom Ano a todos,
e ao Virgínio Briote, administrador...
BOAS FESTAS para todos,
neste abraço puro e verdadeiro
deste que foi Soldado na Guiné,
Albino Silva, Maqueiro ...
Por:
Albino Silva
BCaç 2845
Guiné - Teixeira Pinto
(1968/70)
2. Comentário de C.V. /L.G.:
Com este Mural do Pai Natal 2010, vamos de dar início à nossa tradicional troca de postais, cartoons, mensagens, versos, imagens, fotos, histórias..., tudo o que for achado adequado à época festiva e à natureza nossa Tabanca Grande... Fazemos um apelo à criatividade e originalidade dos nossos camaradas, amigos e camarigos, bem como leitores, simpatizantes, críticos, adversários, detractores e até inimigos (se os tivermos)... O que importa é participar... Há rapaziada (e raparigada...) que não pega na caneta há um ror de tempo... ou seja, não anda com as quotas em dia. Participar não custa nada: está ao alcance de um clique...
Em anos anteriores já publicámos outras séries nesta quadra festiva tais como As Boas-Festas da nossa Tabanca Grande; O meu Natal no mato; Votos de Feliz Natal 2009 e Bom Ano Novo 2010...
Por outro lado, e sem qualquer preocupação em entrar para o Livro de Recordes do Guiness, temos a modestíssima ambição de ultrapassar os 1888 postes de 2009... Estamos, neste momento, com 1856, mas ainda faltam 2 semanas até ao fim do ano... A meta dos 2000, essa, é praticamente impossível de atingir, dada a "quadra festiva" em que a tendência é para baixar a produção e a produtividade dos editores e demais tabanqueiros...
Até lá, Festas Felizes, Quentes e Boas!
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 7 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6552: Convívios (163): Encontro do pessoal da CCAÇ 2368, ocorrido no dia 30 de Maio de 2010 (Albino Silva)
Carlos Vinhal:
Nesta minha mensagem especial como não podia deixar de ser, quero desejar-te um Santo e Feliz Natal e Próspero Ano de 2011, aliás como acima o fiz, sem esquecer o Luís Graça, Magalhães Ribeiro, Humberto Reis e Virgínio Briote, transmitindo ainda a todos os Tertulianos que fazem parte ou frequentam a nossa Tabanca Grande, incluindo as Senhoras que nos vão dando conta de suas Histórias, e porque também elas viveram um passado deveras difícil, sabendo que outras há, e que decerto gostariam de escrever aqui na nossa Tabanca Grande, contando suas mágoas, e muitas tristeza pelo trauma vivido conjuntamente com seus maridos, porque conheço infelizmente alguns casos em que é por demais doloroso, ao ver sofrer mulheres e até filhos, quando camaradas nossos ainda gritam assustados daquele passado que nós tivemos naquela África sangrenta.
Vamos continuar com nossa Tabanca.
Eu estou já escrevendo mais umas coisinhas a meu jeito e que para 2011 enviarei à Tabanca Grande.
Um grande abraço a todos
BOAS FESTAS...
Para todos
BOAS FESTAS
Camaradas da Tertúlia,
para todos bem igual,
vos desejo tudo de bom,
um Santo e Feliz Natal...
Em especial saúde
e nunca nada de mau,
se possível neste Natal
comam muito bacalhau...
À nossa Tabanca Grande,
de gente boa e modesta,
desejo um Santo Natal
e Bom Ano Novo em festa...
Aos Régulos da nossa Tabanca
os quais eu sempre respeito,
Boas Festas e parabéns
por tudo quanto têm feito...
Termina o ano positivo
por tudo aquilo que eu vi,
das vezes que fui à Tabanca,
por tudo quanto eu lá li...
Estamos a chegar ao Natal,
por isso me lembro de ti,
de camaradas que já partiram
também esses não esqueci...
Sei que não estão entre nós
e sei que jamais os verei
e nesta quadra especial
eu por eles rezarei ...
Camaradas da Tabanca,
enquanto tiverdes memória,
pró Ano voltai a escrever,
contai sempre vossa História...
Estou pronto a ler tudo
e vejo sempre tudo tão bem
e para a Tabanca ser Grande
eu escrevo nela também ...
Dia a dia venho aqui,
e sei que fazes igual,
ver nossa Tabanca Grande
pois é este o meu jornal ...
Bom Natal ao Luís Graça,
da Tabanca fundador,
ao Humberto Reis, cartógrafo,
Carlos Vinhal, administrador...
Também ao Magalhães Ribeiro,
da Tabanca é seu editor,
igualmente um Bom Ano a todos,
e ao Virgínio Briote, administrador...
BOAS FESTAS para todos,
neste abraço puro e verdadeiro
deste que foi Soldado na Guiné,
Albino Silva, Maqueiro ...
Por:
Albino Silva
BCaç 2845
Guiné - Teixeira Pinto
(1968/70)
2. Comentário de C.V. /L.G.:
Com este Mural do Pai Natal 2010, vamos de dar início à nossa tradicional troca de postais, cartoons, mensagens, versos, imagens, fotos, histórias..., tudo o que for achado adequado à época festiva e à natureza nossa Tabanca Grande... Fazemos um apelo à criatividade e originalidade dos nossos camaradas, amigos e camarigos, bem como leitores, simpatizantes, críticos, adversários, detractores e até inimigos (se os tivermos)... O que importa é participar... Há rapaziada (e raparigada...) que não pega na caneta há um ror de tempo... ou seja, não anda com as quotas em dia. Participar não custa nada: está ao alcance de um clique...
Em anos anteriores já publicámos outras séries nesta quadra festiva tais como As Boas-Festas da nossa Tabanca Grande; O meu Natal no mato; Votos de Feliz Natal 2009 e Bom Ano Novo 2010...
Por outro lado, e sem qualquer preocupação em entrar para o Livro de Recordes do Guiness, temos a modestíssima ambição de ultrapassar os 1888 postes de 2009... Estamos, neste momento, com 1856, mas ainda faltam 2 semanas até ao fim do ano... A meta dos 2000, essa, é praticamente impossível de atingir, dada a "quadra festiva" em que a tendência é para baixar a produção e a produtividade dos editores e demais tabanqueiros...
Até lá, Festas Felizes, Quentes e Boas!
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 7 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 - P6552: Convívios (163): Encontro do pessoal da CCAÇ 2368, ocorrido no dia 30 de Maio de 2010 (Albino Silva)
Guiné 63/74 - P7440: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (5): Do Bambadincazinho para Ponta Varela
1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Dezembro de 2010:
A partir deste dia 21 de Novembro passei a andar às ordens do Fodé Dahaba. Procurei deixar tudo anotado e por ordem. Em vão. Na mesma folha onde escrevi o nome de Demba Embaló, o guarda-costas de Jorge Cabral, pus o nome de Aliu Baldé, Binta Seidi, e para baralhar mais as coisas escrevi os nomes dos comandantes do PAIGC em Madina e Belel: Santiago Mendes, Farazinho Pereira e Samper Mendes.
A partir daqui ainda vai ser pior. Felizmente que me posso guiar pela ordem, dia-a-dia, registada pela máquina fotográfica. Mas falei com tanta gente, perguntei por tanta gente, estou certo e seguro que vou cometer graves omissões.
Nem tudo o que queria ver e que pedi ao Fodé foi possível visitar: a estrada da Amedalai para Moricanhe estava praticamente intransitável, e só conheci muito tarde a solução salvadora, Lânsana Sori e a sua milagrosa motocicleta; chegar ao Buruntoni e ao Baio é muito difícil, e tem que ser a partir da Ponta do Inglês; a mesma coisa com a viagem da Ponta do Inglês até à mata de Fiofioli, onde se situa a tabanca de Tubácuta onde viveu o comandante Domingos Ramos.
O importante é que a viagem nunca acaba. E os sonhos do viandante permanecem.
Um abraço do
Mário
__________________
Operação Tangomau (5)
por Beja Santos
Do Bambadincazinho para Ponta Varela
1. A partir de Bambadinca, chega-se num ápice ao Bairro Joli, contíguo de Santa Helena. Por aqui andei no passado longínquo em missões pacíficas e em nomadizações hostis. Durante a guerra, comprava-se aqui gado, muito útil para os problemas de intendência de Missirá, os dois cabritos que Jobo Baldé ali assou no Natal de 1968, daqui vieram, seguiram pela bolanha de Finete num Unimog 411 e finaram-se na véspera de Natal, para gáudio de quem combatia e vivia naquele ponto do Cuor. Estes caminhos do Bairro Joli eram espiolhados devido à incontestável conivência de alguma população com os inimigos de Madina/Belel. Era o drama das relações de sangue de quem tinha optado pela luta ou ficado à sombra da bandeira portuguesa.
Em Santa Helena, Fá Balanta e Mero viviam comunidades balantas onde se acoitavam, à sorrelfa, civis e militares do mato, que procuravam informações, compravam tabaco ou sal, abasteciam-se de gado, traziam esteiras e produtos das suas hortas. Atravessavam o Geba estreito entre as bolanhas de Finete e Ponta Nova. Aparecíamos ao amanhecer em missões pouco conciliatórias e às vezes com inquirições duras. A verdade é que a comunicação, mesmo com mortes e feridos de permeio, nunca se interrompeu completamente. Ora é acima de Ponta Nova que eu vou habitar. Aqui se devotou Inácio Semedo a construir casa, destilaria e horta. A casa, basta ver a fotografia, é bem semelhante àquelas que se podiam ver em Malandim, Saliquinhé ou São Belchior, até mesmo no Enxalé, ao tempo.
O panorama que se desfruta é, no mínimo, deslumbrante. O Tangomau vai desfrutar das vistas do amanhecer e do entardecer, são momentos mágicos. De manhã, antes das sete horas, Bambadinca aparece submersa pelo sereno, uma neblina que se evola com o primeiro calor da manhã, deixa ver, em toda a sua majestade, as bolanhas, os palmares e os meandros do Geba estreito. À tarde, é o cerimonial do pôr-do-sol, a bola de fogo tisna-se de todos os tons ígneos, até se esconder entre Mato de Cão e Chicri. Nesta casa onde me acolhera, há muito da traça portuguesa adaptada ao calor tropical, as varandas são indispensáveis, os telhados prolongam-se para dar sombra sobre os alpendres.
O Tangomau e comitiva são recebidos pela Dada e Fernando Semedo, Mio. Há duas crianças (Tuinho e Thierry), uma menina de nome Florinda, a empregada, depois vai aparecer um outro empregado, Alberto Djata. Mostram-lhe o quarto, a casa de banho, a sala onde irão ver os canais franceses mais alguns filmes em DVD.
O Tangomau logo regista a casa, teve mesmo a pretensão de captar as duas bolanhas em sequência, saiu imagem amassada, desbotada, paciência. Vamos agora ao que importa, mentaliza-se que se avizinham emoções muito poderosas, vai rever gente que muito estima, vão ser expostos problemas (para ele) insolúveis, ser-lhe-ão feitos pedidos que não poderá atender, é preciso estar de ânimo forte.
A casa no Bairro Joli, perto de Santa Helena, onde estou a viver. Foi erguida por Inácio Semedo, que pertenceu ao PAIGC e que por isso obrigado a viver em Angola durante 7 anos. Um dos seus filhos, o Eng.º Fernando Semedo, procura pôr de pé o sonho do seu pai, dar vida ao projecto agro-industrial
2. Para se sentir preparado, veio cedo contemplar a bolanha de Ponta Nova, trouxe “As Palavras”, de Jean-Paul Sartre, uma narrativa autobiográfica muito dolorosa e corajosa, não é qualquer um que se acomete a escrever assim:“Uma manhã, em 1917, em La Rochelle, aguardava alguns colegas que deviam acompanhar-me ao liceu; estavam a demorar; sem já saber o que inventar para me distrair, resolvi pensar no Todo-Poderoso. Logo ele se precipitou no azul-celeste e se sumiu sem dar explicação: não existe!, disse eu a mim próprio com um espanto cortês, e julguei o assunto arrumado. De certa maneira estava, visto que nunca mais, desde aí, senti a menor sensação de o ressuscitar. Mas o Outro subsistia, o Invisível, o Espírito Santo, o que garantia o meu mandato e regia a minha vida por grandes forças anónimas e sagradas. Deste, senti bem maior dificuldade em me livrar, pois que se instalara atrás da minha cabeça, nas noções adulteradas que eu usava para me compreender, me situar e me justificar. Escrever foi durante muito tempo pedir à Morte, à Religião, sob uma máscara, que me arrancassem a minha vida ao acaso. Fui da Igreja. Militante, quis salvar-me pelas obras; místico, tentei desvendar o silêncio do ser por um sussurrar contrariado de palavras e, sobretudo, confundi as coisas com os seus nomes: isto é querer”.
Divago sobre esta capacidade de falar sobre a perda da fé quando se começa a ouvir o motor da Renault Express. Fodé apresenta cumprimentos, não há tempo a perder, os eventos sociais estão marcados. Há só uma curta paragem no mercado de Bambadinca, o Tangomau vai abastecer-se de bolacha Maria, banana-maçã e alguma goiaba. Primeiro, e de acordo com a lei Mandinga, receber cumprimentos dos homens grandes, aparecem capitaneados por Aliu Fuma, mais do que octogenário, trazido pela mão de um genro. Há saudações e depois orações, dá-se graças a Deus por este reencontro. A seguir a família, mulheres, gente mais jovem e as crianças. Sucedem-se as reverências mandingas, o Tangomau é saudado com o profundo respeito da amizade que merecem os velhos. Aliás, o Tangomau vai passar repetidamente a ouvir o cumprimento: “Olá, velho! Corpo?”.
É neste grupo que aparece Mamadu Baldé, filho de Queta Baldé, chegara expressamente de Amedalai apresentar cumprimentos. E temos o último cerimonial, o pessoal da casa, mulheres e filhos. É nisto que o Tangomau acorda para um drama, a terceira mulher do Fodé, a quem chamam a Louca, aparece, profere uma frases ininteligíveis e desaparece. É a mãe de Calilo, Iaguba, Braima, isto só para falar dos machos, é impossível fixar o nome daquele rol de fêmeas a que constantemente Fodé grita para pedir coisas ou dar ordens.
Não fosse o Tangomau um obscuro fotógrafo amador e teria conseguido capturar a deslumbrante extensão das bolanhas de Ponta Nova e Finete, com Mato de Cão lá ao fundo. É o que há, pede-se desculpa por não se ter capturado um panorama magnífico do Geba estreito.
3. Súbito, o Tangomau é avassalado por uma emoção, diante dele, de braços abertos e riso bom aparece-lhe Samba Gebo, sempre jovem, distinto, mal se apresentou e já começa a pedir livros, lápis e papel. No seu caderninho, o Tangomau notou: o Samba trouxe-me a juventude de Missirá, é o porta-voz daquela gente abnegada, leal, sempre pronta a seguir-me.
Chegou igualmente Madiu Colubali, tem a vista turva, desfaz-se em ademanes. Fodé grita, a família Fati, os Sanhá e os Dahaba têm uma recepção à nossa espera em Amedalai. O primeiro choque surge quando o Tangomau pede uma curta paragem na ponte de Udunduma, depois de uma ligeira discussão Fodé condescende. Tiram-se fotografias e o Tangomau precipita-se ladeira acima, à procura do local onde esteve instalado o destacamento mais infecto da Guiné.
Encontrou uma tabanca, foi muito bem acolhido, explicou ao que veio e apanhou um instantâneo e uma festa de mulheres, só fixou que se tratava de um corte de cabelo. Pouco depois, chegaram a Amedalai, a tabanca é enorme, talvez tenha mesmo duplicado ou triplicado. Os Fati, os Sanhá e os Dahaba são uma pequena multidão. Fodé discursa, um homem grande responde e o Tangomau, inexplicavelmente, pede a palavra e conta onde e como nasceu a profunda amizade que nutre por Fodé. Fala-se de Finete, de uma colaboração muito leal, e no fim conta-se aquele desastre brutal no amanhecer de 22 de Fevereiro de 1969. Mudara a vida do Fodé e aquele menino alferes descobria que às vezes uma ordem pode dar um sinistro despropositado, como fora o caso daquele.
O almani presente na cerimónia levanta-se e reza uma nova acção de graças. O Tangomau gagueja: “Deus Todo-Poderoso tem compaixão de nós, perdoa os nossos pecados e conduz-nos à vida eterna”. Procura-se a seguir Mamadu Djau, não está, aproximam-se os familiares e até um homem que se apresenta como primeiro-cabo da CCaç 12, dá pelo nome de José Carlos [Suleimane Baldé], exige ficar numa fotografia para que lá em Portugal saibam que está vivo. E parte-se para o Xime, o alcatroado tem resistido bem ao tempo, o Tangomau viu-o nascer, em 1970. Pelo caminho, despontam as tabancas que surgiram depois da guerra, Taliurá e Ponta Coli, são os manjacos que exploram estas ricas de bolanha.
Uma variante da fotografia que já saiu no álbum, publicada há dias: estamos em Amedalai e alguém que se apresenta como José Carlos Suleimane Balbé [ex-1º Cabo, CCA>Ç 12, 1969/74] , pede para ser fotografado. Ei-lo, ladeado por Samba Baldé (Samba Gebo) e Madiu Colubali. O fundo é dado por membros da família de Mamadu Djau.
4. Chegados ao Xime, a primeira curiosidade é de visitar o porto. Este já existe, está reduzido a miseras meia-dúzia de estacas. Até o capim brota do alcatrão, como se protestasse por tão indigno abandono. Numa elevação, ergue-se uma estrutura monumental, ao que parece um silo para a mancarra, trata-se de uma infra-estrutura que nunca teve uso, quando Luís Cabral caiu em desgraça Nino Vieira votou ao desprezo os projectos do seu antecessor. Há ainda uma visita a fazer a membros da família Fati, aparece a viúva de Mankuma Biai, um guia muito capaz que prestou um óptimo serviço ao Tangomau na operação “Rinoceronte Temível”, tendo mesmo sido louvado.
O Xime é uma mistura de instalações ao abandono e da nova tabanca. Fodé adverte que vamos para o último itinerário da viagem, Ponta Varela. Tomou-se à direita a estrada Xime-Ponta do Inglês, seguiu-se por um estradão mal tratado, ao fim de meia hora entrei num território que percorrera sempre à espera de contacto com o inimigo. O que o levara ali era conhecer o local onde, nesse passado remoto da guerra, as forças do PAIGC desfechavam bazucadas sobre as embarcações civis que, arrastadas pela corrente, se aproximavam do tarrafe, à entrada do Geba estreito.
Nas operações que se destinavam ao Poindom ou Ponta do Inglês flanqueava-se as bolanhas e os velhos trilhos, que o PAIGC minara. Eram viagens que se faziam com luz, temia-se uma sarrafusca nocturna, com a desvantagem do inimigo saber retirar e de novo golpear. O importante é que mal chegados à tabanca, e feitos os cumprimentos da praxe, o Tangomau pediu para ir até à margem do Geba.
Um jovem, de nome Mussá, ofereceu-se mas logo avisou que havia passeata para cerca de 3km, o que não incomodou o Tangomau, ele segue excitado por mangais, picadas, hortas e palmares. Irá guardar a imagem dos fios de luz, uma luz coada a ouro, se ir infiltrando pelos cajueiros, tudo dentro de uma grande serenidade, não há mais presença humana, o passeio não cansa, depois surge o Geba, o terreno amoleceu e Mussá mostra o local, aponta para um pilar de cimento, era dali, dentro dos cajueiros fechados que vinha o fogo mortífero.
Captam-se várias imagens, o que era segredo deixou de o ser. E regressa-se em passo estugado. Dos aspectos essenciais, o Tangomau tomou nota: dentro de dias irá conhecer M’Fon Na Bra, comandante do bigrupo que actuava em Ponta Varela; a memória, vacilante, recuou até ao mês de Março de 1969, foi no HM 241 que o Tangomau conheceu aqueles membros da família Fati que vivem agora no Xime; na nova tabanca de Udunduma gostou muito de ser questionado pelos jovens que pretendiam mais informação sobre o quartel. Ainda havia umas folhas soltas com observações registadas, perderam-se. E assim findou o primeiro dia organizado pelo Fodé, Calilo vai depositá-lo no Bairro Joli.
Demba Embaló, guarda-costas de Jorge Cabral, do Pel Caç Nat 63. Atenda-se à naturalidade da pose, quando se vêem estas fotografias acorre ao espírito as pessoas naturalmente aristocráticas. O Demba coligiu a folha que já aqui foi publicada com os nomes dos soldados do Pel Caç Nat 63. O Demba vende cola e tabaco no mercado de Bambadinca. Garanti-lhe que uma das razões que me trouxera à Guiné era preparar a compra da casa do Jorge Cabral. O Demba tomou-me a sério: “Fica tão contente, tão contente!”
5. Deixou-se para o fim um pormenor essencial: Fodé vive no Bambadincazinho, não há que enganar. Mal se apercebeu dessa realidade, o Tangomau foi visitar a Missão do Sono, a escassas dezenas de metros. Aí voltará na manhã seguinte, na companhia de Mamadu Djau. Mas não se quer adiantar mais pormenores, amanhã será um dia dedicado a Bambadinca, haverá baba e ranho de todo o tamanho, desde o quartel ao porto, também ele desaparecido. Será aí que o Tangomau, especado, olhará para a bolanha de Finete, exactamente no local onde a canoa de Mufali Iafai o conduzia, perto do fim do dia. Mufali também desapareceu.
Ao longo deste dia perguntou-se por muita gente, foram explosões, umas atrás das outras. Serifo Candé, que o Tangomau tanto ansiava abraçar em Biana, perto de Fá, morreu. Na semana anterior morrera Mamadu Silá, o 108, um gigante de corpo com um fiozinho de voz. O Tangomau chega cabisbaixo, com aquela sensação paradoxal que satisfez a curiosidade de visitar lugares anteriormente interditos mas ter perdido camaradas inesquecíveis. Depois cumprimenta a família Semedo, já anoiteceu, conta o que viu e quem visitou, adormeceu cedo, desta vez não teme só os encontros com as pessoas, teme os lugares que vai rever e que tanto estimou, um afecto que guardará até ao fim dos tempos.
Outra variante da fotografia já publicada sobre Ponta Varela, exactamente no local onde as forças do PAIGC atacavam as embarcações civis. É pena não se ficar com a ideia de como, também neste local, nascera o Geba estreito, o leito do rio afunila, à esquerda, não muito longe daqui, passa o rio Corubal [. Vd. detalhe da carta do Xime, 1955, acima].
Fotos: © Mário Beja Santos (2010). Direitos reservados.
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 10 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7417: Operação Tangomau (Mário Beja Santos) (4): 20 de Novembro, de Bambadinca para o Bairro Joli
Marcadores:
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Guiné-Bissau,
Inácio Semedo,
Jorge Cabral,
José Carlos Mussá Biai,
José Carlos Suleimane Baldé,
Operação Tangomau,
Pel Caç Nat 52,
Ponta Varela,
viagem,
Xime
Guiné 63/74 - P7439: (Ex)citações (120): Destruição e incêndio do Mercado Central de Bissau (Francisco Henriques da Silva)
1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 15 de Dezembro de 2010:
Destruição e incêndio do Mercado Central de Bissau*
Carlos,
Peço-te a gentileza de publicares este esclarecimento do nosso Camarada Francisco Henriques da Silva.
Um grande abraço,
Mário
Isto é o estado actual do Mercado Central de Bissau. O embaixador Henriques da Silva garante que houve destruições no conflito político-militar 1998-1999. O que disseram ao Tangomau é que houve um incêndio há alguns anos atrás. Com guerra ou incêndio, perdeu-se um espaço que dava muita vida à Baixa de Bissau. O comércio faz-se à volta deste espaço, mas não é a mesma coisa.
(Foto e legenda de Mário Beja Santos)
2. Mensagem de Francisco Henriques da Silva, ex-Embaixador de Portugal na Guiné-Bissau, dirigida a Mário Beja Santos:
Mário,
Do blogue para onde tu escreves, transcrevo da legenda à fotografia do Mercado Central de Bissau, o seguinte:
"O embaixador Henriques da Silva garante que houve destruições no conflito político-militar 1998-1999. O que disseram ao Tangomau é que houve um incêndio há alguns anos atrás. Com guerra ou incêndio, perdeu-se um espaço que dava muita vida à Baixa de Bissau."
A memória dos bissau-guineenses parece ser curta. A verdade dos factos é que houve um bombardeamento que provocou um incêndio. Parece que estás a pôr em causa a minha palavra. Sempre me assumi como pessoa honesta e rigorosa. Que crédito é que te merecem esses locais que tem do caso em apreço recordações fragmentárias e vagas? Eu não só tenho a memória bem fresca desses acontecimentos porque os vivi com intensidade, como disponho de provas documentais do que afirmo.
Ora bem,
No capítulo 37 do meu manuscrito, refiro:
"Dos muitos incidentes de guerra e não os consigo reproduzir todos, recordo, por exemplo, que em 16 de Julho, o mercado central de Bissau, bem no centro da cidade, foi atingido em pleno pela artilharia da Junta, que resultou na sua destruição parcial. No dia seguinte, o mercado foi novamente atingido por disparos de artilharia tendo morrido um número indeterminado de populares que andavam na pilhagem e também alguns soldados senegaleses. Não foi permitido pelo comando militar conjunto que alguém visse os cadáveres. O mercado ardeu na totalidade."
Mais adiante, no capítulo 41 do meu manuscrito, quando menciono aspectos da vida quotidiana em Bissau durante a guerra, a determinado passo aludo de passagem ao seguinte:
"Como já referi num capítulo anterior, o mercado central da cidade foi destruído num bombardeamento e ardeu integralmente."
Ora tudo isto pode ser documentado pela leitura da imprensa da época (o caso em apreço é referido num "take" da agência LUSA, reproduzido pelos jornais diários, p. ex. no "Diário de Notícias", de 18.07.98, de que tenho cópia no meu arquivo).
Mais. Da correspondência oficial por mim subscrita, transcrevo a parte relevante de um telegrama de 16.07.98, remetido para o MNE - de que tenho cópia:
"Para além de disparos esporádicos, pelas 11h30, novas flagelações durante cerca de 45 minutos tendo sido atingido mercado central onde lavra incêndio, imediações da zona da Mãe d’Água e vários bairros de Bissau. Desconhece-se, por ora, número de vítimas."
E, já agora, segundo telegrama que se refere ao assunto, de 18.07.98, expedido para o MNE - de que também tenho cópia:
"... bombardeamentos da zona do Cuméré para centro cidade recomeçaram cerca das 15h45, com muita intensidade no início, a que se seguiu um período de abrandamento, tendo acções de fogo cessado cerca das 20h00. Mercado Central foi novamente atingido por foguetões tendo provocado um número indiscriminado de vítimas que andavam na pilhagem. Final da tarde ouviam-se distintamente da residência oficial disparos de armas ligeiras, “rockets” e bazucas oriundos presumivelmente da zona da Granja (a Norte do Bº. de Santa Luzia). Tiroteio foi durante vários períodos contínuo intercalados por fases em que apenas se registaram rebentamentos esporádicos. Após fortíssima trovoada e muita chuva, dia amanheceu calmo, não se tendo registado acções de fogo no centro da cidade, até agora."
Não tenho mais nada a acrescentar.
Abraço
Francisco
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7410: Operação Tangomau (Álbum fotográfico de Mário Beja Santos) (2): Dia 20 de Novembro de 2010
Vd. último poste da série de 11 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7419: (Ex)citações (119): O destino marca a hora ? (Jorge Picado, ex-Cap Mil, 1970/72)
Destruição e incêndio do Mercado Central de Bissau*
Carlos,
Peço-te a gentileza de publicares este esclarecimento do nosso Camarada Francisco Henriques da Silva.
Um grande abraço,
Mário
Isto é o estado actual do Mercado Central de Bissau. O embaixador Henriques da Silva garante que houve destruições no conflito político-militar 1998-1999. O que disseram ao Tangomau é que houve um incêndio há alguns anos atrás. Com guerra ou incêndio, perdeu-se um espaço que dava muita vida à Baixa de Bissau. O comércio faz-se à volta deste espaço, mas não é a mesma coisa.
(Foto e legenda de Mário Beja Santos)
2. Mensagem de Francisco Henriques da Silva, ex-Embaixador de Portugal na Guiné-Bissau, dirigida a Mário Beja Santos:
Mário,
Do blogue para onde tu escreves, transcrevo da legenda à fotografia do Mercado Central de Bissau, o seguinte:
"O embaixador Henriques da Silva garante que houve destruições no conflito político-militar 1998-1999. O que disseram ao Tangomau é que houve um incêndio há alguns anos atrás. Com guerra ou incêndio, perdeu-se um espaço que dava muita vida à Baixa de Bissau."
A memória dos bissau-guineenses parece ser curta. A verdade dos factos é que houve um bombardeamento que provocou um incêndio. Parece que estás a pôr em causa a minha palavra. Sempre me assumi como pessoa honesta e rigorosa. Que crédito é que te merecem esses locais que tem do caso em apreço recordações fragmentárias e vagas? Eu não só tenho a memória bem fresca desses acontecimentos porque os vivi com intensidade, como disponho de provas documentais do que afirmo.
Ora bem,
No capítulo 37 do meu manuscrito, refiro:
"Dos muitos incidentes de guerra e não os consigo reproduzir todos, recordo, por exemplo, que em 16 de Julho, o mercado central de Bissau, bem no centro da cidade, foi atingido em pleno pela artilharia da Junta, que resultou na sua destruição parcial. No dia seguinte, o mercado foi novamente atingido por disparos de artilharia tendo morrido um número indeterminado de populares que andavam na pilhagem e também alguns soldados senegaleses. Não foi permitido pelo comando militar conjunto que alguém visse os cadáveres. O mercado ardeu na totalidade."
Mais adiante, no capítulo 41 do meu manuscrito, quando menciono aspectos da vida quotidiana em Bissau durante a guerra, a determinado passo aludo de passagem ao seguinte:
"Como já referi num capítulo anterior, o mercado central da cidade foi destruído num bombardeamento e ardeu integralmente."
Ora tudo isto pode ser documentado pela leitura da imprensa da época (o caso em apreço é referido num "take" da agência LUSA, reproduzido pelos jornais diários, p. ex. no "Diário de Notícias", de 18.07.98, de que tenho cópia no meu arquivo).
Mais. Da correspondência oficial por mim subscrita, transcrevo a parte relevante de um telegrama de 16.07.98, remetido para o MNE - de que tenho cópia:
"Para além de disparos esporádicos, pelas 11h30, novas flagelações durante cerca de 45 minutos tendo sido atingido mercado central onde lavra incêndio, imediações da zona da Mãe d’Água e vários bairros de Bissau. Desconhece-se, por ora, número de vítimas."
E, já agora, segundo telegrama que se refere ao assunto, de 18.07.98, expedido para o MNE - de que também tenho cópia:
"... bombardeamentos da zona do Cuméré para centro cidade recomeçaram cerca das 15h45, com muita intensidade no início, a que se seguiu um período de abrandamento, tendo acções de fogo cessado cerca das 20h00. Mercado Central foi novamente atingido por foguetões tendo provocado um número indiscriminado de vítimas que andavam na pilhagem. Final da tarde ouviam-se distintamente da residência oficial disparos de armas ligeiras, “rockets” e bazucas oriundos presumivelmente da zona da Granja (a Norte do Bº. de Santa Luzia). Tiroteio foi durante vários períodos contínuo intercalados por fases em que apenas se registaram rebentamentos esporádicos. Após fortíssima trovoada e muita chuva, dia amanheceu calmo, não se tendo registado acções de fogo no centro da cidade, até agora."
Não tenho mais nada a acrescentar.
Abraço
Francisco
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 9 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7410: Operação Tangomau (Álbum fotográfico de Mário Beja Santos) (2): Dia 20 de Novembro de 2010
Vd. último poste da série de 11 de Dezembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7419: (Ex)citações (119): O destino marca a hora ? (Jorge Picado, ex-Cap Mil, 1970/72)
Guin é 63/74 - P7438: Álbum fotográfico de Jacinto Cristina, o padeiro da Ponte Caium, 3º Gr Comb da CCAÇ 3546, 1972/74 (5): Canquelifá, a ferro e fogo, 18 de Março de 1974
Guiné > Zona Leste > Região de Nova Lamego > Canquelifá > CCAÇ 3545 (1972/74) > 18 de Março de 1974 > A paisagem desoladora da tabanca, depois do violento ataque do PAIGC com morteiros 120 e foguetões 122, durante 4 horas...
Fotos: © Jacinto Cristina (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados
Continuação da publicação do álbum fotográfico de Jacinto Cristina (Sold At Inf, CCAÇ 3546, 1972/74) [, foto à esquerda] (*).
Recorde-se o trajecto (militar) do Jacinto Cristina: (i) Natural de Ferreira do Alentejo, hoje com 61 anos, fez a recruta no RI 14, em Viseu, e a especialidade no RI 2, Abrantes; (ii) Foi mobilizado para a Guiné, como Sold At Inf, da CCAÇ 3546; (iii) esta subunidade pertencia ao BCAÇ 3883, mobilizado pelo RI 2; (iv) A CSS estava sediada em Piche; (v) O comandante era o Ten Cor Inf Manuel António Dantas; (vi) O comandante da CCAÇ 3546 era o Cap QEO José Carlos Duarte Ferreira; (vii) As outras companhias do BCAÇ 3883 era a CCAÇ 3544 (Buruntuma e Piche) e a CCAÇ 3545 (Canquelifá e Piche); (ix) Estas quatro subunidades partiram para a Guiné de avião, em Março de 1972; (x) Regressaram à Metrópole, também de avião, em Junho de 1974; (xi) O Cristina esteve no destacamento de Ponte de Caium, na estrada entre Piche e Buruntuma, cerca de 14 meses (Fevereiro de 1973 / Abril de 1974), onde foi municiador do morteiro 10,7 e padeiro.
As últimas fotos do seu álbum fotográfico são justamente estas seis, que publicamos acima... São "recuerdos", sem legenda, de Canquelifá (junto à fronteira com o Senegal) depois do ataque de violento ataque do PAIGC que arrasou completamente a tabanca (**)... O Jacinto Cristina nunca lá esteve mas comprou estas fotos a alguém do seu batalhão, que vivia do negócio da fotografia. Comprou-as e pô-las no seu álbum, para "mais tarde recordar"... Há fotos que falam por si... (***)
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Notas de L.G.:
(*) Último poste da série > 18 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7303: Álbum fotográfico de Jacinto Cristina, o padeiro da Ponte Caium, 3º Gr Comb da CCAÇ 3546, 1972/74 (4): Parabéns ao municiador (e às vezes apontador) do Morteiro 10.7, que fez 61 anos no passado dia 14...
(**) Vd. poste de 27 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1216: A batalha (esquecida) de Canquelifá, em Março de 1974 (A. Santos)
(...) Camarada, Luis Graça.
Estou há muitos anos a guardar na minha memória vários acontecimentos que se passaram na Guiné. Penso que isso acontece com todo o pessoal. Vivi à distância os acontecimentos de Guidaje e Guileje, mas a guerra passava-me pelas mãos, porque em Nova Lamego fui sempre operador de mensagens e não transmissões que de facto foi a especialidade que me despejaram em Campolide - Lisboa.
Acho que chegou o momento para contar um deles. Além de Guidaje e Guileje/Gadamael houve uma terceira ofensiva forte, levada a cabo pelo PAIGC no final da guerra, mas desta vez no Leste, no início do ano de 1974, mais precisamente no sector L4 e L6. Alvos preferenciais: Bajocunda, Copá, Mareué e Canquelifa, sem esquecer outros.
Copá foi extinto em 14 de Fevereiro de 1974, após violentas flagelações, Mareué idem em 11 de Março de 1974, mas o aquartelamento mais sacrificado foi o de Canquelifá, que sofreu flagelações a toda a hora. Neste caso a arma mais utilizada foi o morteiro 120, e houve abrigos que não resistiram.
A 20 de Março de 1974, entrou em cena o Batalhão de Comandos Africanos, com as três companhias que dele faziam parte integrante. Saíram de Nova Lamego em coluna composta por viaturas militares e civis e dirigiram-se para o local. A operação durou 3 dias, de 21 a 23 de Março 1974. Segundo os canhenhos militares, capturaram 3 Mort 120, 1 RPG, 2 espingardas, 367 granadas de Morteiro e deixaram 26 mortos do lado IN (do nosso lado nada dizem)...
Mas cá o rapaz, no dia 22 [de Março de 1974], como não fazia nada, e porque o condutor da ambulância era do meu pelotão e foi chamado à pista, eu fui com ele. Chegados ao local, era um vaivém de helicópteros que traziam mortos e feridos. Eu dei uma mãozinha para pegar nas macas. Retirava dos Helis e, segundo instruções do médico, ora pousava na pista (estava morto), ora colocava num Dakota que estava logo ali (estava muito ferido)... Vi pernas destroçadas por estilhaços de não sei de quê!
Isto foi só em Nova Lamego porque em Piche não soube, nem quis saber e não sei o que se passou.
Um Alfa Bravo. A. Santos (...)
(***) Ainda sobre a batalha de Canquelifá, vd. comentário de Luís Borrega ao poste de 8 de Dezembro de 2010 >Guiné 63/74 – P7405: Controvérsias (113): Os derradeiros dias do Destacamento de Copá (Fernando Henriques)
Para quem não sabe, o Alf Mil OE Fernando Henriques pertencia ao BCaç 3883, que foi render em Pitche o meu BCav 2922.
O F. Henriques integrou a CCaç 3545, capitaneada pelo Cap Mil Fernando Peixinho de Cristo, que foi render em Canquelifá a CCav 2748.
O Destacamento de Copá tinha o apoio da Artilharia do Quartel de Canquelifá. Eram 3 obuses de 14 cms, que foram substituídos, por ordem de um Crâneo, residente em Bissau, por obuses de 10,5 cms. Como é óbvio, estes obuses, não tinham o alcance dos de 14 cms.
Esta substituição fragilizou o Destacamento de Copá, assim como o próprio Quartel de Canquelifá.
Em [18 de] Março de 1974, Canquelifá ficou a "ferro e fogo", e muito limitado no fogo de retaliação aos ataques. Tiveram que ser socorridos pelos Comandos Africanos. A força de socorro a Canquelifá integrava a 1ª, a 2ª e a 3ª CComandos Africanos, e era comandada pelo Major Raúl Folques [Op Neve Gelada, de 21 a 30 de Março de 1974].
Eram 6 Morteiros de 120 mm a despejar fogo e ainda com Canhão sem recuo, além de 300 foguetões de 122mm. A Tabanca ficou arrasada. Como já lá não estava ,vou lendo o que se escreve.
Abraço, Camarigo
Luís Borrega
Vd. também o poste do Hélder de Sousa > 11 de Agosto de 2009 > Guiné 63/74 - P4811: Informações adicionais ao Poste 4800 (Hélder Sousa)
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