Amigos!
Após achaques vários e um grande susto. o Alfero estoriador está de volta.
Abraços.
J. Cabral
PS - Não liguem ao Que Fazer!
2. Estórias cabralianas > O conde de Bobadela
Estou no Tribunal de Mafra à espera de um Julgamento, quando
uma mulher me interpela:
-É o Senhor Conde, não é?
Hesito, mas para evitar mais conversa, respondo:
Hesito, mas para evitar mais conversa, respondo:
Chamam-me para a Sala de Audiências. Despeço-me.
No regresso a Lisboa, qual arqueólogo, colo os cacos da
memória.Foi há quarenta e quatro anos, no início de Junho, que o meu velho vizinho Alvarenga, coronel reformado, me procurou. Sabendo que eu ia para Mafra,
pediu-me que levasse uma encomenda ao seu amigo, Coronel Ilídio Montez, que morava
na Achada, perto da Ericeira.
-Nem precisas de ir à casa. Vais ao
CMEFD., mesmo ao lado do Convento. Ele passa lá os dias a montar a cavalo.
E assim,poucos dias depois de apresentado na EPI., fui
procurar o Coronel. Logo no portão recebi uma reprimenda do 1º Cabo de serviço:
- Dobre a língua, nosso Cadete! O
Coronel Montez é Dom! Dom Ilídio, está bem !?
Conduziu-me ao picadeiro e conheci D. Ilídio. Um velho
pequenino, sem dúvida já octogenário, de bigode branco, pose altiva, mas
simpático. Abriu à minha frente a encomenda e rejubilou: umas bonitas
esporas prateadas.
Pouco tempo depois, eis-me metido no carro conduzido por
Dona Florípedes, a mulher.Uma senhora muito branca, talvez triste, com ar de
tédio e algo de snobe.Jantei nessa noite e em muitas outras.
Bebia os conhaques do Coronel. Declamava para a Dona Florípedes. Comentava o Maio francês com a filha Francisca, mas à noite no
quartel, era com a empregada Aurora, que sonhava.
Dona Florípedes sentia-se exilada em terra de saloios.Trocar
o Estoril pela Achada. E tudo por culpa dos cavalos…E logo ela. neta do Marquês
de Pintéus, sobrinha do Barão da Marateca. Para não destoar, confessei-lhe que
também eu era Conde. Mas não usava o título, nem aliás o nome completo - D. Almeida
Cabral y Athouguia De Vasconcelos, Conde da Bobadela.
Às vezes discutia-se o meu futuro militar. D. Ilídio tinha
esperança que eu fosse parar a Santarém, à Cavalaria. Possuia perfil e estatura de
grande combatente dizia, contra a opinião de Dona Florípedes:
-Um rapaz tão sensível.
Até faz versos..-
- E daí? - retorquia o Coronel- - Camões também andou na Guerra!
D. Ilídio tinha uma teoria, segundo a qual os mais valentes
são sempre os Homens mais pequenos:_
- Olha o Napoleão, para não falar no
nosso Marechal Carmona!
Ele nunca fora a
África, mas falava das savanas de Angola, com tal propriedade, que era fácil imaginá-lo à frente do Esquadrão a galope,
perseguindo o inimigo.
Conhaque e cavalos.Cavalos e conhaque constituíam os interesses do Coronel. Nos conhaques ainda o ia acompanhando:
Conhaque e cavalos.Cavalos e conhaque constituíam os interesses do Coronel. Nos conhaques ainda o ia acompanhando:
- Prova-me este
Courvoisier! Que achas do Remy Martin?
Gostas do Henri IV ?
Mas nos cavalos….Bem, convidou-me muitas vezes a ficar em Mafra, um fim de
semana, para montar e escusei-me sempre. A apendicite da mana….. A úlcera do Avô…A apoplexia do tio Gilberto…O certo é que nunca cheguei a demonstrar
os meus dotes equestres.
Acabou a recruta. Deixei Mafra e rumei a Vendas Novas.
Estou, ainda nem passaram quinze dias, sou chamado ao Comandante da Bateria.
- Jorge Pedro de
Almeida Cabral, meu Capitão.
Está endereçada a Jorge D. Almeida Cabral y Athouguia de
Vasconcelos, Conde da
Bobadela.
Embora tivesse ficado como Aspirante em Vendas Novas , nunca o
Capitão, depois Major, me voltou a tocar no assunto. Escrevi-lhe da Guiné. E assinei: Jorge Alfa Mamadú Cabral de Embalo Balde, Conde de Missirá e Barão da Bolanha de Finete.
Jorge Cabral
3. Comentário do editor: Falei ontem ao telefone com o Jorge, de quem não tinha notícias há uns bons tempos. Andou por aí um mês e tal na "mão dos médicos", a "checar" a anatomia e a fisiologia. Felizmente, está bem. E "manda estória", sinal de que está vivo da costa, como a sardinha, e vai-nos continuando a fazer sorrir "com meia cara"... Gostei do seu "post scriptum": Não liguem ao Que Fazer!... Eu descodifico: Vivam a vida, rapazes!
_______________3. Comentário do editor: Falei ontem ao telefone com o Jorge, de quem não tinha notícias há uns bons tempos. Andou por aí um mês e tal na "mão dos médicos", a "checar" a anatomia e a fisiologia. Felizmente, está bem. E "manda estória", sinal de que está vivo da costa, como a sardinha, e vai-nos continuando a fazer sorrir "com meia cara"... Gostei do seu "post scriptum": Não liguem ao Que Fazer!... Eu descodifico: Vivam a vida, rapazes!
Nota do editor:
Último poste da série > 9 de maio de 2012 > Guiné 63/74 - P9873: Estórias cabralianas (72): Ressonar... à fula (Jorge Cabral)
(...) Além de ressonar, sempre falei a dormir. Um dia em Missirá propus-me descobrir, de que falava, o que dizia. Ora, havia lá um velho gravador de fita, máquina pertencente a não sei quem, enfim nossa, pois viviamos numa espécie de “economia comum”. Resolvi pois gravar uma das minhas noites. (...)