terça-feira, 9 de junho de 2009

Guiné 63/74 - P4491: Fauna & flora (21): Surucucus (Lachesis muta muta) que cantavam nas praias dos Bijagós (Joaquim Mexia Alves)

Fonte: Wikipédia (2009). Copyleft 

1. Mensagem de J. Mexia Alves, com data de 8 de Junho de 2009. 

Meus caros camarigos, 

Ainda a propósito de cobras e outros rastejantes, lembro-me que quando estivemos em Bolama a fazer o IAO, (embora pareça não é o "aiólinda"), houve uma semana em que fomos acampar mais para perto das praias, junto a uma tabanca de Bijagós que se chamava, salvo o erro, Pujunguto. 

Foi aí que provei vinho de caju e que fui agraciado com uma valente diarreia devida á ingestão de tal bebida, se assim lhe podemos chamar. 

Mas aí também contaram-nos a história de que, nas noites de mais calor e com luar, se fossemos á praia poderíamos ouvir as surucucos, (julgo eu que era isto que lhe chamavam), a cantar, ou seja, pela descrição era mais assobiar. 

Lembro-me de termos ido numa surtida nocturna às praias, mas ou não estava calor, (o que seria difícil porque estávamos em Janeiro), ou porque não havia luar, não me lembro de ter ouvido nenhum cantar, ou assobiar, "rastejante". 

Talvez fosse uma grande "peta", mas mais tarde, no meio da Guiné, alguém me referenciou a mesma história, pelo que das duas, uma: ou caiu na mesma "conto", ou era verdade e eu é que não ouvi nada! 

Alguém ouviu alguma vez o tal cantar ou assobiar, ou pode constatar a veracidade desta história? 

Abraço camarigo para todos,

2. O Joaquim Mexia Alves, sobre este assunto "Surucucuiano", já havia deixado o seguinte comentário na mensagem "Guiné 63/74 - P4477: FAP (29): Encontros imprevist...":

Meus caros camarigos,

Se há jibóias ou não na Guiné, não vou eu afirmar, mas que no Mato Cão comi um bife de facochero, frito em banha de uma dita cuja, que para mim era em tudo uma jibóia, no tamanho a na "pelagem", disso não tenho eu dúvidas.

Julgo até que num qualquer post meu sobre o Mato Cão, já publicado está referenciado esse "manjar dos deuses"!

Abraço camarigo para todos.
 
Joaquim Mexia Alves 

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Nota de M.R.: 

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Guiné 63/74 - P4490: Em busca de... (76): Pessoal da CART 2714, Mansambo, 1970/72 (Guilherme Sousa, ex-Soldado Condutor Auto, França)

Guiné- Bissau > Região Leste > Mansambo > 1996: Monumento erigido pela CART 2714 ("Bravos e Leais"), pertencente ao BART 2917 (Bambadinca, 1970/1972). É o único que restava de pé em 1996.


© Humberto Reis (2005)

O nosso Camarada Humberto Reis fez-nos chegar o seguinte apelo, via e-mail, com data de 7 de Junho de 2009, com o título Monumento de MANSAMBO, que lhe foi dirigido pelo ex-Soldado Condutor Auto Guilherme Sousa , que se encontra emigrado em França desde 1972:

Bom dia,

Eu, Guilherme Sousa, fui Soldado Condutor da CART 2714 e prestei serviço na Guiné, entre 1970/ 72, precisamente no acampamento de Mansambo, que fazia parte de Bambadinca, aonde estava a sede do nosso BART 2917.
Desde que regressei da Guiné emigrei para França.
Ao navegar um pouco pela internet encontrei no blogue do senhor Luís Graça, uma foto do acampamento de Mansambo aonde esta o Sr. Reis, de pé, ao lado do nosso monumento à CART 2714, que eu ajudei a construir.
Gostava muito de encontrar colegas da CART 2714, para eventuais encontros de convívio.
Talvez o senhor me possa ajudar.

Desde já muito obrigado.
Guilherme Sousa.
França: telef. 0033386951938 ou 0033670611957.

O Humberto Reis respondeu-lhe, com data de 8 de Junho de 2009, também via e-mail com o mesmo título: Monumento de MANSAMBO.

Sr. Guilherme Sousa,

Exactamente no blogue "Luís Graça & Camaradas da Guiné" encontra notícias da 2714, que eu conheci em Mansambo, até Março de 1971, quando me vim embora da CCAÇ 12 (a companhia de intervenção do sector de Bambadinca).

Cumprimentos,

Humberto Reis

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Nota de M.R.:

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Guiné 63/74 - P4489: Convívios (145): Convívio anual da CCAV 8350 “Piratas de Guileje” (1972/74), na Covilhã (Casimiro Carvalho / Magalhães Ribeiro)


Os Piratas de Guileje (CCAV. 8350 - 1972/74), levaram a efeito mais um animado e amigável almoço/convívio, no passado domingo, dia 7 de Junho, na Covilhã. 


Após a concentração das "tropas", seguiu-se uma Missa Solene em Memória dos Camaradas já Falecidos. 


Finda a missa partiu-se para o esperado repasto, onde marcaram presença perto de noventa pessoas, tendo tudo decorrido no meio de muita alegria e conversa, na airosa, acolhedora e agradável Quinta das Flores. 


Entre os "Piratas" estiveram presentes os Cor. Coutinho e Lima e Vieira da Silva, os Alferes Reis e Seabra e os Furriéis Casimiro Carvalho, Bilhau, Silva, Neves, etc. 

Como convidados estiveram o Capitão Vasco da Gama - que foi Comandante da célebre Companhia os Tigres de Cumbijã (CCAV. 8351 - 1972/74) e o nosso  camarada Magalhães Ribeiro (da CCS do BCAC. 4612/74). 

Sobre a forma fraterna como foram recebidos e tratados pelos "Piratas", tanto um como outro, apresentaram os seus melhores agradecimentos a todos os convivas. 

Quanto ao "abastecimento", não faltaram os tradicionais aperitivos, a que se seguiu um excelente bacalhau à moda da casa e um bom pedaço de pernil assado no forno, bem regado com bons vinhos. 

O "remate" final fez-se com uma deliciosa sobremesa fria e apetitosas cerejas da Gardunha. 

Para terminar o "assalto" não faltou o habitual de aniversário e um bem confeccionado bolo, regado com uma ou outra taça de champanhe. 

Pela alegria estampada nos rostos das pessoas bem se pode dizer que, para o ano, haverá mais e melhor. 

P.S. - A nota mais triste do convívio, de que me apercebi durante a festa toda, foi sem dúvida nenhuma, a ausência do nosso Capitão Quintas que, segundo soube tem a esposa muito adoentada, motivo este que, obviamente, originou a sua falta neste maravilhoso encontro.  

Aproveito esta oportunidade para deixar aqui, mais uma vez, os melhores votos dos Piratas presentes, para que a sua querida esposa recupere, o mais rapidamente possível, de todos os males que a afligem. 












           
(Esquerda) Foto do conjunto - (Direita) Cor. Vieira da Silva, Fur. Milº Casimiro Cravalho, Cor. Coutinho e Lima, Alf. Milº Seabra, Alf. Milº Reis e Cap. Vasco da Gama (CCAV. 8351) 












           
(Direita) Aspecto geral do almoço - (Esquerda) Mesa de "comando" 












               


(Esquerda) Os Fur. Milº Casimiro Carvalho, Silva e Bilhau - (Direita) Elementos do 4º Grupo de Combate - O primeiro de pé, do lado esquerdo, é o Soldado Borges (Chaves), que foi o penúltimo homem a abandonar o local da terrível emboscada - de 4 de junho de 1973 em Gadamael Porto -, onde faleceram 4 "piratas". Recordo que o último a abandonar o fatídico local foi o Casimiro Carvalho.

Texto de Casimiro Carvalho 
Ex-Furriel Op Esp/RANGER 

Fotos e legendas: © Magalhães Ribeiro (2009). Direitos reservados. 
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Nota de M.R.: 

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Guiné 63/74 - P4488: Tabanca Grande (151): Jorge Rosales, ex-Alf Mil, Porto Gole, 1964/66, grande amigo do Cap 2ª linha Abna Na Onça



O soberbo Rio Geba, junto a Porto Gole. Do outro lado, a margem esquerda. Mais à frente, para leste, o Rio Corubal vai desaguar no Rio Geba. No tempo do Jorge Rosales (1964/66), os fuzileiros deitavam a bóia e prendiam a LDG - Lancha de Desembarque Grande, que vinha de Bissau... No Geba era eles que impunham a ordem e a lei... Mas em Ponta Ponta Varela, na marge eswuerda, entre a Ponta do Inglês e o Xime, já havia ataques, do PAIGC, à navegação de cabotagem. Na foto, encoberto pelo capim, o marco comemorativo do V Centenário da Descoberta da Guiné (1446-1946). Porto Gole foca na na margem direita do Rio, na estrada Bissau - Nhacra - Mansoa - Porto Gole - Bafatá (No tempo do Jorge Rosales, já estava interdito o troço Mansoa- Porto Gole). (LG) 

 Foto: © Jorge Rosmaninho, autor do blogue Africanidades (2009). Direitos reservados 


1. Texto de L.G.: 

LIgou-me estar tarde, por telefone, mais um camarada, o Jorge Rosales, de 69 anos, residente em Monte Estoril / Cascais, e que esteve em Porto Gole (1964/66)... Tem falado ao telefone com o Henrique Matos (*), que esteve a seguir a ele em Porto Gole (1966/68). 

Falei-lhe do Abel Rei (1967/68), que é mais novo, e que ele naturalmente não conhece... O seu objectivo era, muito simplesmente, o de poder ainda inscrever-se , a tempo, no nosso IV Encontro, em Ortigosa, o que eu assegurei automaticamente. É o nosso participante nº 96.

 É pai da Doutora Marta Rosales, minha colega (ISCTE e FCSH/UNL). Aqui vai, muito sumariamente, uma primeira apresentação do nosso novo camarada, que tem muitas fotografias do seu tempo de comissão e que vai levá-las, consigo, para o IV Encontro. 

Diz-me que era muito amigo do mítico Capitão de 2ª linha, o Abna Na Onça, chefe espiritual, poderoso, da comunidade balanta da região, a quem o PAIGC havia cometido o erro fatal de “matar duas mulheres e roubar centenas de cabeças de gado”. 

O seu prestígio, a sua influência e e o seu carisma eram tão grandes que ele sabia tudo o que se passava numa vasta região que ia de Mansoa a Bambadinca (nomeadamente, importantes informações militares, como a passagem de homens e armas do PAIGC). Jovem (teria hoje 72/73 anos se fosse vivo), era um homem imponente, nos seus 120 kg. 

Schulz tinha-lhe oferecido um relógio de ouro e uma G3 como reconhecimento pelos seus brilhantes serviços … Mais tarde, será morto, em Bissá, em 15/4/67, com seis dos seus polícias administrativos, todos eles residentes em Porto Gole… Nesse dia o destacamento é abandonado pelas NT: “ um dia trágico para quem estava no inferno de Bissá, como escreveu o Abel Rei no seu diário (Entre o paraíso e o inferno: de Fá a Bissá. Memórias da Guiné, 1967/68, editado em 2002, pp. 68/70) (**)… 

O Jorge Rosales pertencia à 1ª Companhia de Caçadores Indígena, com sede em Farim. (Havia mais duas, uma Bedanda e outra em Nova Lamego, acrescenta ele.) Ficou lá pouco tempo, em Farim, talvez uma semana. A companhia estava dispersa. Foi destacado para Porto Gole, com duas secções (da CCAÇ 556, do Enxalé) e outra secção, sua, de africanos. 

Tinha um guarda-costas bijagó. Parte dos soldados eram balantas. Possuíam apenas 1 morteiro (60) e 1 bazuca. A farda ainda era amarela. Ficou 18 meses em Porto Gole. Ia a Bambadinca jogar à bola com os de Fá. Foi uma vez a Bafatá, apanhar o NordAtlas. Lembra-se da piscina. 

Enquanto lá esteve, em Porto Gole, havia um certo respeito mútuo, de parte a parte. A influência de Cabral era evidente, fazendo a distinção entre o povo (português) e o regime (colonialista). Podiam deslocar-se num raio de 10 km…. Mas a ligação com Mansoa já se perdera. O troço já não era seguro. Em Mansoa estavam os respeitados Águias Negras (BART 645, que dominavam o triângulo do Óio: Olossato, Bissorâ e Mansabá) . Do lado do Geba, eram os fuzileiros que impunham a lei e o respeito. Lançavam uma bóia e fundeavam a LDG em frente a Porto Gole. 

Vinha quase tudo por rio: os frescos, a bianda, os cunhetes de munições… (excepto o correio, que era lançado do ar, de DO 27, e às vezes ir cair no tarrafo; em contrapartida, o correio expedido ia de LDG... Singularidades de Porto Gole que não tinha uma simples pista de terra batida, para as aeronaves). 

Tem vários amigos fuzos, desse tempo, incluindo o comandante Castanho Pais. Do outro lado, a nascente estava a CCAÇ 556, no Enxalé… Também conhece dois furrieís do Enxalé, de quem se tornou amigo. Também passou por Fá. E no final da comissão, esteve em Bolama, por onde passavam os periquitos… Conviveu com algumas companhias que, de Bolama, partiam para operações no continente… 

No seu tempo (Março de 1966), morreu em Porto Gole o Alf Mil António Maldonado, que o veio substituir. O Maldonado, de Coimbra, estava em Bolama. Eram amigos, tinham estado em Mafra. Tinham combinado revezar-se ao fim de um ano. O Maldonado vinha para Porto Gole e o Jorge ia para Bolam… No meio disto, há um coronel que vem dificultar o acordo de cavalheiros. Enfim, uma história que é preciso contar com tempo e vagar. O Maldonado é morto num ataque violentíssimo a Porto Gole, depois de as NT terem feito um ronco nas áreas controladas pelo PAIGC… Ferido, aguardou em vão o heli que só podia vir de manhã. A mãe do Jorge foi ao enterro, em Coimbra. O cadáver foi rapidamente trasladado, contrariamente ao que acontecia na época.  Esta morte abalou muito o Jorge Rosales, seu amigo. 

Voltando ao nosso IV Encontro, o Jorge está entusiasmadíssimo com a ideia de poder encontrar malta de Bambadinca, Xime, Enxalé, Porto Gole, Fá... Queixa-se de estar isolado, de não ter ninguém do seu tempo, até pelo facto de ter sido de rendição individual. Está reformado de uma dessas empresas que faziam o reabastecimento de combustível aos aviões, no aeroporto de Lisboa. Alguma malta da TAP e da ANA deve reconhecê-lo. Falei-lhe do Humberto Reis, do José Brás, do Alberto Branquinho, do Mário Fitas… Mas no aeroporto há milhares de pessoas a atrabalhar. 

Tem uma segunda habitação, no Couço, Coruche… Há muita rapaziada que passou pela Guiné. Anda com ideias de lá voltar, à Guiné, com mais malta do seu tempo… Quer fazer parte do nosso blogue, que acompanha diariamente (***). Já lhe dei as boas vindas à nossa Tabanca Grande, já o inscrevi na lista de participantes no nosso IV Encontro. Vai lá ter, não leva a esposa... Já actualizei o blogue. Abraço. Luís

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Notas de L.G.:



Guiné 63/74 - P4487: Agenda Cultural (16): Do Rui Gonçalves (Gravura, Lisboa, hoje ) aos Melech Mechaya (Música klezmer, Porto, 11 e 12, e Lisboa, 13)

Crónica´, de Salomé Paiva e Rui Gonçalves > Exposição de gravura > Inauguração hoje, 9 de Junho, às 1hh30, na Biblioteca Municipal Camões, Largo do Calhariz,. 17, 2º Esq. De 12 a 30 de Junho, sábado 27. Das 10h30 às 18h.


1. Amigos e camaradas:

Apontem na vossa Agenda (Cultural)... É inaugurada hoje, às 16h30, uma exposição de gravura em madeira, na Biblioteca Municipal Camões, em Lisboa, ao Chiado, que integra trabalhos do nosso Rui Gonçalves, estudante de Belas Artes, filho do nosso camarada GG, Gabriel Gonçalves, o Arcanjo, o tocador de viola, o cripto da CCAÇ 12 (Bambadinca, 1969/71)...

E digo nosso, por que os filhos dos nossos camaradas nossos filhos são... Além disso, o Rui é também, de longa data, um colaborador do nosso blogue, a quem recorro, através do pai, quando preciso de alguns truques (por ex., transformar ficheiros áudio em vídeo)...

Vamos desejar-lhe bom sucesso para a exposição e passar por lá, quem puder...(malta de Lisboa, espero uma foto e uma legenda, no mínimo). Luís Graça

PS - GG, dá um Alfa Bravo especial, bem atabancado, ao teu rapaz... Espero poder passar por lá... e conhecê-lo pessoalmente (*).


2. Melech Mechaya, no Porto (11 e 12 de Junho) e em Lisboa (13)






Depois de 60 concertos em 2 anos, e após uma paragem de 5 meses para preparar o seu primeiro registo de longa duração, os Melech Mechaya são anfitriões de uma enorme festa mechaya, dia 13 de Junho, no carismático teatro A Comuna, em Lisboa , à Praça de Espanha,], que se prolongará com o dj set da DJ Raquel Bulha. Este regresso aos palcos celebra o lançamento de Budja Ba e assinala o arranque da digressão de apresentação do disco, que inclui palcos como o emblemático Festival de Músicas do Mundo de Sines e o Festival Spancirfest na Croácia. Dias 11 e 12 estarão no Porto (às 21h30, no Coliseu).

O disco tem o selo da Ovação e contém, entre várias novidades, alguns dos momentos fortes do espectáculo ao vivo, como a "Dança do Desprazer" (o primeiro single extraído do disco), o tema-título "Budja Ba", e o "Bulgar de Almada", tema que conta com a participação das Tucanas.

Depois de quase meio-ano em retiro criativo, os Melech Mechaya regressam com fome de palco e prometem muita festa, num novo espectáculo mais divertido e interactivo que nunca!


3. Em especial, para os amigos e camaradas do Grande Porto e da Grande Lisboa:

Os Melech Mechaya (grupo de música klezmer de que faz parte o João Graça, violino) estão a lançar o seu novo CD (Budja Ba - Deusa da festa, em hebreu)... Eles já têm, na nossa Tabanca Grande, alguns fãs e ao vivo ainda são muito mais divertidos (**)...

Na sua página na Net poderão ver a sua já sobrecarregada agenda, e em especial os próximos concertos em Junho e Julho, nomeadamente em Lisboa e no Porto... Apareçam, se estiverem por perto! No de Lisboa (13), pelo menos estarei... Nos do Porto, em especial no Coliseu (12), ainda não sei se posso... (11 e 12, nas FNAC; 12, às 21h30, no Palácio de Cristal).

Atenção, a hora de abertura de portas no concerto do teatro da Comuna, em Lisboa, dia 13, é às 23h30...

O vídeo do concerto de lançamento está diponível em http://www.youtube.com/watch?v=SKK6B_gelA4

Para mais detalhes, vd. a página do grupo em http://www.myspace.com/melechmechaya

... Isto também faz parte dos nossos Seres, Saberes e Lazeres!

Felizmente que os nossos filhos têm tido, pelo menos até agora, a sorte de terem o tempo certo para fazerem o que devem fazer, nnos seus verdes anos (estudar, viajar, viver, aprender música, fazer arte,divertir-se... ). Tudo, menos a guerra que nos calhou na rifa, a todos nós!

Um Alfa Bravo. Bons feriados, bons santos, viva a preguiça (ds outros).

Luís Graça
__________

Notas de L.G.

(*) Há um ano e tal atrás (16/3/2008), recebemos a seguinte:

Caro Luís Graça: sou Rui Gonçalves, filho de Gabriel Gonçalves, seu camarada da Guiné. Estou a realizar um trabalho académico com um grupo de colegas para a disciplina de sociologia artística na Faculdade de Belas artes da Universidade de Lisboa, subordinado ao tema do monumento e a questão pós-colonial Portuguesa.

Pensamos em realizar um estudo sobre os memoriais feitos por soldados durante a guerra colonial (neste caso específico na Guiné-Bissau). Para isso precisamos da colaboração dos intervenientes, informações sobre a natureza dos memoriais, a história (como se criou essa tradição), os materiais, a função de memória/homenagem, quem os construía e questões estéticas.

Gostariamos de poder contar com a sua ajuda, assim como de todos os participantes do blog que nos possam fornecer informações relevantes, relatos e fotografias dos memoriais, assim como a possibilidade de contactar alguém que tenha feito parte da criação dos mesmos.

Muito obrigado, com os melhores cumprimentos

Rui Gonçalves

Um dia depois, eis a minha resposta:


Rui: Vamos ajudar-te... Essa questão também interessa-nos, a todos, mas também aos nossos amigos guineenses, e em especial à ONG AD, que está interessada em identificar, restaurar, preservar, conservar, estudar e divulgar esses memoriais, sobretudo no sul do país (Região de Tombali, sectores de Bedanda e Cacine).

Vou pôr o teu apelo no nosso blogue e pedir toda a colaboração possível... No nosso blogue (1ª e 2ª série) há já várias fotos de memoriais: pesquisa também em brazões... Vou passar a incluir a palavara-chave Memoriais.


O Rui não nos chegou a dizer se este trabalho foi bem sucedido, como eu esperava, e se teve alguma apoio por parte da nossa malta...

(**) Vd. 7 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3028: Eu, o Jorge Cabral, o António Graça de Abreu e... o Levezinho, no velho/novo Maxime, com os Melech Mechaya (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P4486: Vindimas e Vindimados (José Brás (2): Coágulos

1. Segunda história da série Vindimas e Vindimados do nosso camarada José Brás, ex-Fur Mil da CCAÇ 1622, Aldeia Formosa e Mejo, 1966/68, baseada no seu livro "Vindimas no Capim"


COÁGULOS

Ninguém é novo demais, ou velho, para morrer.
Morre-se, simplesmente, na hora certa, no fim da vida, tenha-se ou não vivido muito, esteja-se ou não cansado disto e pronto para partir.

Morre-se de imprevisto, sem ninguém esperar, às vezes por uma coisinha insignificante, um momento de distracção, até parece.

A vida toda a correr bem, vendendo saúde, amigos no convívio, afectos... e, pumba. Uma escorregadela, um parafuso que salta, um travão que falha, uma curva apertada... uma veia, uma artéria que ninguém tinha visto apertada, uma gota de sangue, um coágulo que se intromete no fluir corrente... uma bala perdida.

Ou se morre, simplesmente, quando todos já o esperam, de doença descoberta e prolongada, acompanhada por médicos e tratamentos, o corpo exaurido, a alma esfrangalhada, sem forças nem vontade para continuar.

Ninguém é novo demais para morrer, repito.
A vida chega-nos sem que nada tivéssemos feito antes para a ter, oferecida, em berço d'ouro ou enxerga, e respirámo-la, sorvemo-la, agarramo-nos como náufragos desde o primeiro momento, incrédulos ainda de aqui estarmos, tão perto do nada do minuto precedente, do vazio que era o não ser... e enchemo-nos dela, ávidos, por um temor qualquer, imediato e instintivo, de regressarmos ao nada, ao limbo, à outra zona do não conhecer e do onde viemos.

Mais tarde julgámo-nos os donos do mundo!
Mamamos na teta, na da mãe e na da cabra. Trambolhões, escapamos duma, escapamos de outra. A vida corre e engrossa-nos a confiança, a certeza de que tudo corre sobre rodas, o sentimento de que o mundo é justo ou injusto; a convicção de que a água, correndo sempre para baixo, num sítio qualquer da corrente, podemos pará-la, podemos contê-la por momentos, inverter-lhe o fluir, levá-la de novo à nascente.

Ninguém é novo demais para morrer, trerepito!
A vida não se mede aos quilos, bem ou mal pesados, excessivos ou roubados no peso, nem nos anos que se contam na cédula pessoal, no B.I., no processo individual da empresa que nos paga os dias de trabalho, no caderno de recenseamento eleitoral, na ficha da polícia se já nos convocaram para entrevista em esquadra, ou mesmo que não.

Morre-se, simplesmente, quando Deus quer, dizia na minha aldeia o Manuel da Cruz, ou um tio se distrai, acrescento eu.

Como no caso da Guerra.

Dizem-nos: - A Pátria está em perigo! Tens de a defender até ao sacrifício da própria vida - e lá vamos nós cumprir a sina, de saco na mão e arma ao ombro da coragem ou do medo, da sorte ou do azar, às vezes morrendo ou vivendo por pequenas coisas, por um quase nada.

Como aconteceu com o Dias, Soldado de Transmissões da minha Companhia de Infantaria, destacada na zona de Guiledje, numa terrinha chamada Medjo, rodeada de mata densa, bicharada, aquartelamentos do IN tão próximos que quase nos podíamos ofender de voz, pessoalmente gritada, de cá para lá e de lá para cá.

Ao Dias disseram que estava no tempo certo de largar a aldeia, o ofício de mecânico que começara a aprender mal saíra da primária, de agarrar no bornal e se fazer ao caminho da tropa.

Foi a primeira vez que largou a asa da mãe, passou a Serra da Neve e se afastou a Sul do mapa pendurado na escola do Caldeira.

Havia de lhe calhar, mais tarde, depois de andanças pela geografia do País, fechado nos muros altos de dois ou três quartéis, ordem unida, Mauser, AN-GRC9, o PRC-10, os Alfa, Bravo, Charlie, Delta, embarcar na Rocha do Conde de Óbidos, despejado, por assim dizer, cinco dias depois, em cascos de rolha.

Não vamos falar aqui das coisas interiores do Dias, das suas esperanças, do modo de ver a vida, do convívio com o anarca do Arnaldo, e com o outro, o da PSP que queria ser da PIDE e prender comunas, coisa que nunca chegou a saber o que era.

Nem falaremos da sua figura física de portuga das Beiras, aldeão, fazendo diariamente o caminho da aldeia à vila, e vice-versa, pendurado numa bicicleta de segunda ou terceira mão, para ir aprendendo sobre cárteres, pistons, velas, bobines e o diabo a sete dos motores de explosão.

Não falaremos destas coisas, embora eu lhas conheça bem, para não perdermos tempo com desimportâncias, porque importante mesmo seria ver-lhe a qualidade de soldado, no número de identificação que lhe gravaram na chapa dependurada do pescoço, picotada a meio para os fins que sabemos, na devoção com que se entregava ao saber sobre os emissores/receptores, no ar de submissão que trazia da aldeia e se acentuara sob as ordens dos senhores sargentos e oficiais.

Provavelmente porque a Guiné cansava mais do que outros lugares da nossa guerra, e talvez porque de Super-constelation se fazia em pouco mais de sete horas (mais tarde, em cerca de metade no Boing 727-100) quase todos os que conseguiam reunir meios para passar um mês de férias na terra, compravam o bilhete da TAP e faziam o seu baptismo de voo.

Cheguei à minha aldeia, no início de Julho, de gravador Sony nas mãos queimadas dos canos da G3 que no escuro da noite, soldados me passavam à vez, na boca de um abrigo feito de cibos, lata e terra (preferia morrer a céu aberto) e eu despejava por cima da paliçada, em inimigos que não via mas adivinhava pelo rastro das rastejante e pelas saídas de morteiros e canhões sem recuo.

Fim de Julho, festa de Verão na aldeia, banda de música no coreto, bailaricos, gado bravo no cercado, o forcado que era antes da partida, estão a ver a felicidade quase sólida ali nas mãos, mesmo que faltassem apenas dois dias para voltar a Mejo.

Na Segunda-Feira da festa, entre umas imperiais e uns tremoços, o carteiro entrega-me um telegrama que havia chegado da Guiné, curto, seco, violento.

"Dias morreu Xinxi-Dari. Ponto. Outro morto feridos outras secções. Ponto. Oliveira ferido grave Hospital Estrela. Ponto. Dá apoio antes voltares. Ponto. Loja".

Grande murro no estômago!

De repente desabou tudo sobre mim.

Olhava, tanto quanto me lembro e os amigos diziam depois, olhava de olhar parado, a gente à volta, falando comigo "o que é que foi pá diz lá porra" e, nada, niqueles, perdera a palavra.

O meu pai tirou-me o telegrama da mão e leu. Ficou parvo também mas não perdeu nem a fala, nem a ternura. Tirou-me da cadeira já as lágrimas me corriam abundantes.

O Dias era Soldado da minha Secção e morrera sem mim.
O Oliveira era da minha Secção e jorrara o seu sangue em Xinxi-Dari sem mim.
E os outros de quem não constava nome no telegrama, que eram da minha Companhia, haviam morrido sem mim.

Logo ali, à frente de todos, o meu pai garantia:

- Agora é que vais mesmo para fora. Já não voltas a essa terra de doidos. O Salazar que se f...

Naquele momento nem ripostei. No dia seguinte, bem cedo, autocarro da Bucelence, Lisboa, voltas e mais voltas na Estrela, um mundo de mortos-vivos, até que encontrei o Oliveira. Não iria morrer, pareceu-me, embora me tivesse afiançado que alguém na mata lhe apanhara intestinos. De mais importante para lhe dizer apenas a merda de um consolo vazio no estado de alma que tinha de lhe esconder. "Olha, Oliveira, daquilo estás safo!"

À noite, de novo em casa, poucas falas para trocar, o meu pai seguro de que me poria na fronteira e eu remoía ainda os pequenos nadas da tragédia.

Antes da cama tudo ficou claro entre nós. Medjo iria continuar a ser a minha Pátria por mais alguns meses. A mala já estava feita. O meu pai iniciou ainda a argumentação, mas calou-se com as lágrimas que me haviam rebentado de novo.

E nem precisei de dizer-lhe que me sentia miserável por ter deixado morrer aqueles amigos sem a minha presença de arma na mão.
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Nota de CV:

Vd. primeiro poste da série de 2 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4453: Vindimas e Vindimados (José Brás) (1): O Correio da Malta... e o enfermeiro, herói do dia

Guiné 63/74 - P4485: Memória dos lugares (29): Beli e Madina do Boé, CCAÇ 1589, 1966/68 (Armandino Alves)


Caro amigo Luís Graça,

Na apresentação do Poste 4468, dava como anos de intervenção da minha Companhia na Guiné, 1968/70, quando na verdade é 1966/68.

Não me admiro do lapso, pois, pelo que tenho lido, parece que todos os camaradas que estiveram lá nestes anos, 1966/68, já morreram. Eu já estive quase, mas cá me vou aguentando.

Quanto ao tempo que passei na Guiné não é muito o que tenho para contar. Logo a seguir ao desembarque, em 5 de Outubro de 1966 e depois de me apresentar na minha Companhia estacionada em Stª Luzia (600), fomos fazer uma incursão para os lados de Nhacra.

Depois de muito andar e nem sequer o IN cheirar, quando chegámos ao local onde as viaturas nos deviam ir recolher, deparámos com um Unimog que tinha caído do pontão de troncos ao rio que, felizmente, nessa altura do ano, só levava água que nos dava pelo peito.

Ora toda a gente foi para dentro do rio incluindo o Cmdt da Companhia e, à força de braços, lá conseguimos recolocar o “bicho” na estrada.

Depois seguimos para o aquartelamento de Nhacra, que estava sobre o comando do Capitão Carlos Fabião. Era um dos oficiais de que se falava nessa altura pois, quando era atacado pelo IN, ia às tabancas que circundavam o quartel e, se não lhe dissessem de onde tinha vindo o IN, ele, ou os seus oficiais, não tinham problemas em disparar sobre o pessoal, para eles falarem.
Se era para o ar ou para as pessoas, é que eu não sei.

Ali descansamos uns dias tendo voltado a Bissau.

Passados mais uns dias fomos destacados para fazer segurança a uma coluna que ia partir do Batalhão de Engenharia, com destino a Mansoa. Quando a coluna arrancou em marcha lenta pela estrada, que levava a Mansoa, uma das viaturas da frente avariou.

Num dos Unimogs da coluna seguiam vários colegas da companhia, indo dois deles sentados no banco atrás e levando como habitualmente o taipal deitado para baixo, prontos para saltarem para o chão o mais rapidamente possível, em caso de ataque do IN. Só que tiveram azar, pois o veículo que seguia atrás, era um auto-tanque de água e, como o condutor ia a conversar com o Alferes sentado a seu lado, quando deu fé da paragem, devido ao veículo avariado, travou a fundo, mas o balanço da água impulsionou-o para a frente e, este por sua vez, foi bater nas traseiras do Unimog.

Disto resultou que um dos soldados ficasse logo sem uma das pernas e, outro soldado, ficou com as pernas partidas, sendo de imediato evacuados para o HM 231, em Bissau. O primeiro depois de socorrido, foi evacuado para o Hospital da Estrela, em Lisboa, e nunca mais soube nada dele. O segundo voltou, passado algum tempo, à Companhia.

Passados uns meses, em Fá Mandinga, apareceu um Médico que vinha fazer a avaliação do estado físico deste último soldado. Como o nosso Furrel Enfermeiro tinha saído da Companhia, por ter sido castigado, tive de ser eu a confirmar o veredicto do Médico, que me disse que o ia passar para os serviços auxiliares do exército.

Foi então que eu disse, para o médico, que isso era o mesmo que o mandar passar a operacional, obrigando-o a participar em todas as operações que houvessem na Companhia. Ele perguntou-me porquê. E eu expliquei-lhe, que eu tinha sido apurado para os Serviços Auxiliares do Exército, e ali estava a fazer a mesma coisa, que os outros camaradas-de-armas faziam nas operações.

Ele ripostou logo, que não podia ser, e eu disse-lhe para dizer isso ao meu Capitão. Foi o que ele fez e, por esse motivo, nunca mais fui escalado para fazer patrulhas sequer.

De pouco me valeu, pois eu fui para Béli e a restante Companhia para Madina.

Felizmente que Béli só foi atacada 4 vezes (era atacada de 3 em 3 meses), e só numa delas com forte intensidade de tiroteio de armas ligeiras.

Não sei como era o caminho para a fronteira, mas não devia ser bom, pois nunca ouvimos armas pesadas.

Sabíamos que o PAIGC tinha um acampamento muito perto, pois de madrugada víamos o helicóptero deles. Além de silencioso só lhe víamos a luz que ele projectava para o solo onde ia aterrar. Nunca o vimos de dia.

Mas como eles não se metiam connosco, nós também não nos metíamos com eles.

O pior de Béli era a época das chuvas, pois durante esse tempo nenhuma DO lá aterrava e, quando os mantimentos acabavam, tínhamos que “improvisar” alimentos.

Fora disso nem me queixo muito.

Um abraço para todos do,

Armandino Alves
Ex 1º Cabo Enf da CCaç 1589 (1966/68)
__________

Notas de M.R.:

Vd. último poste desta série em:

Guiné 63/74 - P4484: Fauna & flora (20): Histórias de grandes serpentes: da jibóia de 7 metros (Paulo Raposo) ao irã-cego (Clara Amante)


Guiné > Região do Oio > Mansoa > 1968 > O Alf Mil Raposo, de óculos escuros, com o Furriel Ribas, à sua esquerda, e alguns soldados, observando uma jibóia morta pelas NT... "De sete metros!"...

Foto: © Paulo Raposo (2006). Direitos reservados




1. Havia jibóias na Guiné, no nosso tempo ? Assunto controverso, avaliar pelos comentários que já suscitou o poste do Miguel Pessoa (*). Pelo menos, não voavam, isso garante o nosso piloto, mas que se atravessavam no caminho dos bissalanquenses da BA 12, isso garante-nos a também strelada sargento pára-quedista Giselda Antunes Pessoa... 

O Paulo Raposo, por sua vez, conta-nos que matou uma, medonha, com sete metros de comprimento... O Mário Fitas também viu serpentes gigantes lá para os lados de Cufar... A Clara Amante, que viveu na Guiné, em criança, fala-nos com magia do irã-cego... E muitos de nós têm histórias de cobras, pequenas e grandes, venenosas e não venenosas, para contar...Com tudo isto, vamos aumentando o bestiário da Guiné... (LG)



Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 763 (1965/66), Os Lassas > "Foto que me foi concedida pelo Manuel Brita, condutor das Fox, e que esteve em Cufar no tempo do António Graça de Abreu" [1973/74].
Foto (e legenda): © Mário Fitas (2008). Direitos reservados.


1. Mansoa: Baptismo de fogo

por Paulo Raposo

Excerto de um livro, policopiado, do nosso camarada de Montemor-O-Novo, Paulo Raposo (ex-Alf Mil Inf, com a especialidade de Minas e Armadilhas, da CCAÇ 2405, pertencente ao BCAÇ 2852, Galomaro e Dulombi (1968/70).

Extractos de: Raposo, P. E. L. (1997) - O meu testemunho e visão da guerra de África.[Montemor-o-Novo, Herdade da Ameira]. Documento policopiado. Dezembro de 1997 (**)

O sacrifício era muito. Vou contar uns episódios dos muitos que por lá passàmos:
Guiné > Região de Tombali > Cufar > CCAÇ 763 (1965/66), Os Lassas > "Da esquerda para a direita: Soldado que não recordo o nome, de camuflado o Fur Mil Enf Juvenal, o Fernando que nos acompanhou desde Bissau, Mário Fitas, Fur Mil Op Esp, e Olindo, apontador de bazuca da minha secção".
Foto (e legenda): © Mário Fitas (2008). Direitos reservados.
O sacrifício era muito. Vou contar uns episódios dos muitos que por lá passamos:


(i) Após a nossa chegada a Mansoa, foi-nos distribuído o material de guerra. Já armados, fomos para uma bolanha, nome que se dava a um grande charco de água, que enchia com a chuva.

Esta bolanha ficava para além de uma companhia de balantas, que fazia a protecção do nosso quartel. Naquela zona de Mansoa, sair fora do arame farpado tinha riscos.Este exercício tinha como objectivo habituarmo-nos a estar debaixo de fogo. Deita-se um grupo de combate, e por cima deste, faz-se fogo. Aconteceu que logo no primeiro exercício, quando estava o primeiro grupo de combate deitado, há um disparo que sai mais baixo e vai ferir em ambas as pernas um soldado. Depressa foi chamada uma viatura, para o levar rapidamente para o Hospital. Para aquele rapaz, a comissão terminou ali.

Este acidente foi muito desmoralizante para os restantes e mais nenhum outro exercício foi feito. Perguntei-me nessa altura como iria sair dali.

(ii) Um belo dia o meu grupo de combate estava encarregue de levar e proteger os homens que iam limpar do capim uma faixa grande de ambos os lados da estrada. Assim evitávamos que tivessemos emboscadas coladas à picada.Dirigimo-nos para o local de trabalho em duas viaturas. Parámos precisamente no sítio aonde tínhamos terminado o trabalho no dia anterior, ou seja ainda na zona já descapinada.

Quando parámos, saltaram do capim alguns elementos IN para a estrada. Fizemos fogo, eles fugiram e não responderam. Se tivéssemos parado 50 metros mais à frente, tínhamos caído na emboscada.

Recuperados da emoção, os homens começaram o seu trabalho e eu dirijo-me para um tronco de árvore, que estava caído, para me sentar. Ao aproximar-me do tronco, este mexe-se. Era uma jibóia, com sete metros de comprido. Enfiei-lhe um carregador em cima e ela continuava bem viva.

O Cabo enfermeiro Luís agarra num tronco de um ramo verde, e, pondo-se à frente dela, bate-lhe continuamente na cabeça, até a cobra se ver perdida.Uma vez perdida, morde-se a ela própria, para não se humilhar à mão do enfermeiro Luís. (...)


2. O irã-cego
por Clara Amante


Amante da Rosa > "Meu Cabo Verde. História e Estórias. Minhas raízes, família e recordações. A Guiné. Pensamentos e Imagens. Sem ordem cronológica". Um blogue no feminino. Carla. Cabo Verde. Ilha de Santiago. Praia... A Carla é filha do nosso amigo e camarada Manuel Amante, membro da nossa Tabanca Grande.... Já aqui transcrevemos um poste, desse blogue, em que se falava de nós, do nosso blogue (***) . Infelizmente, o blogue Amante da Rosa deixou de estar activo, embora continue em linha... Tomo a liberdade de recuperar uma belíssima história ali publicada, com recordações de infância da Guiné (****).

Acordou alagada da sesta… maldita humidade. Abriu os olhos ainda tempo de ver o Irã que deslizava, entre uma trave e outra, no tecto do quarto, para desaparecer no escuro da telha enegrecida. Em que buraco se metia? Lembrou-se…

“- Matem a cobra!
- Não. Senhora…
- Mata a cobra… Anselmo?! Há uma cobra no tecto da casa!
- Senhora é o guardião… não.
- Guardião…?
- Sim, Senhora, guarda a casa.
- Anselmo… É uma cobra branca.
- Não… É Irã Cego… é poderoso e vai protegê-la a si e aos meninos.”


A humidade… nem sabia se estava acordada. Nunca a tinha visto assim… Gorda e branca. Ela… O Guardião. O Irã Cego. A cobra albina que vivia no telhado da casa. Foi regressando devagar daquela letargia do sono. Como foi que vim parar neste fim de mundo? O mato, os bichos, o raio das cobras e o bucho cheio ano sim ano… Não, nada de lástimas! Calor… parece que o diabo se entretêm a chupar ar. Ai Guiné! Ai Mindelo... Irã Cego… as minhas crianças aqui em baixo deste tecto. Ninguém num raio de quilómetros e ele que se mete no mato dias a fio. Deve estar nalguma tabanka. Um banho... preciso de um banho. Mãe… e tu que nunca mais chegas. O Nhelas, lá para o Sul sem conseguir fugir - do contrato da roça.

Nando, embarcado sabe-se lá onde. Os meus irmãos espalhados em tudo o que é fim de mundo. A onça… é preciso ver se os meninos estão cá dentro… a onça que quase leva o Canelito. Bendito cachorro... e ele ainda a gritar pelo pobre do bicho... sozinho em frente da casa. Isto é o fim do mundo. Irã… que me vale Deus aqui. Irã Cego! O guardião da casa que engole os ovos das galinhas é quem nos protege. E a minha terra lá tão longe. O vento… que falta faz o vento, Mãe. Banho… aquele banho semanal que nos davas com a água que trazias de casa d’inglês. Anselmo… é preciso ir ao poço... A onça que deve andar à caça… E ele que não chega metido nesse mato sem ninguém. Como foi… ah… Dava tudo para sentir aquele cheiro de colónia inglesa do Nana... Cheiro nauseabundo com que ele chega… Meu Nana… como fui acabar tudo com ele. Lembranças não levam a nada e o que foi foi… deve ser do calor, estás a enlouquecer, Vinda. Valha-me a cobra para nos proteger e…
- Dona Vinda…? - o chamado urgente sacudiu-a.
- Sim, Anselmo...
- É o Irã... Irã Cego fugiu para o mato.
- ...
- Senhora… não é bom.

[Revisão / fixação de texto: L.G.] (*****)________

Notas de L.G.:

(*) Vd. poste de 7 de Junho de 2009 > Guiné 63/74 - P4477: FAP (29): Encontros imprevistos (Miguel Pessoa, ex-Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74)

(**) Vd. poste de 8 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXXIII: O meu testemunho (Paulo Raposo, CCAÇ 2405, 1968/70) (6); Mansoa, baptismo de fogo

(***) Vd. poste de 27 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1787: Embaixador Manuel Amante (Cabo Verde): Por esse Rio Geba acima...

Vd. também 28 de Maio de 2007> Guiné 63/74 - P1789: Blogues que nos citam (2): Amante da Rosa ou a Geração das Flores da Revolução de Bissau

(****) Vd. poste de 14 de Novembro de 2006 > O despertar de uma sesta, no fim do mundo dos anos 50, visto num quadro de Paulo Rego (Clara Amante)


(*****) Vd. último poste desta série > 16 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4038: Fauna & flora (19): Também os babuínos dizem Nós na pidi paz, ka misti guerra (Joana Silva)

Vd. também poste de 25 de Janeiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3793: Fauna & flora (16): Relações amistosas com o Macaco-cão na zona de Cufar (Mário Fitas)

Escreve o L.G., em comentário ao poste do Miguel Pessoa:

(....) Há uma diferença (até no comprimento) entre a jibóia (nome científico, Boa constrictor) e a pitão, jibóia africana ou irã cego (na Guiné-Bissau) (nome científico, Python sebae)... Esta última, sim, é a maior cobra da África subsahariana. Quando adulta, pode atingir os 6 metros e ultrapassar os 100 quilos de peso... Habita a floresta-galeria, as matas e só ocasionalmente a savana. A sua dieta é constituída por aves, pequenos roedores e ainda mamíferos de média dimensão. Pode viver trinta anos e não está em risco de desaparecer.

Já a jibóia p.d. (que está no nosso imaginário, pela pomada jibóia e não só...) é centro e sulamericana.Boa constrictor deve o seu nome à forma como mata as suas vítimas, por constrição, sufocando a presa, técnica usada pelas cobras não venenosas.Contrariamente a muitos mitos populares, é pacífica e fugidia, evita sempre o contacto com animais de grande porte, incluindo o homem... Em média anda nos três metros...É sobretudo caçadora nocturna, alimentando-se de roedores e aves...

Por sua vez, o nosso amigo Nelson Herbert, hoje cidadão norte-americana, mas born in Bissau, acrescenta o seguinte:


(...) Tem razão o Luís Graça. O familiar mais próximo da jiboia sul americana, na Guiné é o Irã Cego. De criança,sempre ouvi dizer que o unico Ser que esse tal de Irã Cego de facto temia, imaginem!, eram aItálicos formigas...(qual quê: formiguinhas). Aquelas típicas da Guiné, conhecidas pela sincronização das dolorosas dentadas e a acrobática posição de pino. Melhor, aquelas que mordem a vítima, de pernas pro ar ! Curioso, né ! Mas existe uma explicação lógica ! É que engolida uma ave, um réptil ou atéum cabrito (a lenda fala de bois), o bicharoco necessita de algumas espaçosas horas para a digestão da presa...tanta é a languidez ...

É pois nesses momentos que o bicho, ele mesmo, torna-se presa fácil das formigas. Aliás, não é por acaso que na Guiné, em tudo que seja , terreno por excelência de pastagens, por perto existe sempre um "morro de baga baga"...não vá pois o Irã Cego tecer das suas !

Ainda relativamente a esse bicharoco, baptizado de Irã Cego, por conseguinte, à luz de algumas crenças e crendices, nossas ( guineenses), um animal outrora venerado, senão temido, Amílcar Cabral faz referência, em alguns dos seus escritos, às dificuldades enfrentadas no início da guerrilha, no aliciamento de alguns guerrilheiros para operações, que tivessem por cenário...qualquer mata cerrada, tida por santuario dos Irãs Cegos. Cabral mobiliza esse exemplo, para exemplificar o quanto o obscurantismo poderia em certa medida comprometer o avanço da guerrilha nas matas da Guiné. (...)