Guiné > Bissau > 1967 > Edifício do Comando de Defesa Marítima da Guiné, no final do T da ponte-cais, em Bissau.
Foto: © Manuel Lema Santos (2007). Direitos reservados.
Texto de Manuel Lema Santos, ex-1º tenente da reserva naval (1965-1972), que serviu como Imediato no NRP Orion (Guiné, 1966/68)(1).
O editor do blogue publica o documento da íntegra, incluindo a segunda parte, constituída pelo relatório (oficial) da Operação Larga Agora: embora extenso, é um exemplo ilustrativo do estilo (burocrático) dos nossos relatórios militares. A II parte será publicada, à parte.
A I primeira parte resulta da apaixonada e apaixonante pequisa documental que o nosso camarada Lema Santos tem vindo a fazer feito sobre a actividade operacional, ou melhor, a epopeia das LFG - Lanchas de Fiscalização Grande, no TO da Guiné. Mais uma vez lhe agradeço, em nome de todos nós, este trabalho altamente profissional.
Recordo ainda que a Operação Larga Agora, na mítica região do Tancroal, foi superiormente comandado pelo Coronel Paraquedista Durão, Rafael Durão, que na Guiné, no tempo de Spínola, fez jus ao apelido. O Coronel D. é uma figura omnipresente, evocada com um misto de temor e de admiração no Diário da Guiné, escrito recentemente pelo nosso camarada António da Graça Abreu, o qual teve a gentileza de me enviar um exemplar autografado (Em breve farei uma recensão detalhada do livro) . O Coronel Durão era o Comandante do CAOP1 (originalmente sedeado em Teixeira Pinto), a que pertenceu o Alf Mil Abreu (1972/74)...(LG)
Caros ex- Camaradas e Amigos,
Comprometi-me, perdi (ou encontrei ?) um fim de semana e aqui vai o texto, bem longo, que se inicia no Cacheu, Tancroal (local amaldiçoado para a Marinha) e o regresso ao relatório final da Operação Larga Agora, inteiramente batido. Espero que corresponda aos mínimos exigidos aí pela equipa. Cortem e emendem o que entenderem.
Um abraço,
Manuel Lema Santos
Texto enviado em 11 de Março de 2007, pelo Manuel Lema Santos
Operação Larga Agora, apenas uma entre tantas! (Parte I)
por Lema Santos
...O juízo que cada um faça de si próprio perde-se na primazia do julgamento que outros lhe outorgarem... (Vice-Almirante Ferrer Caeiro, 1976).
Introdução
Permitam-me que inicie este texto complementar com a referência filosófica acima, extracto de um texto escrito pelo punho do homem e militar que, de 1964 a 1967, conduziu os destinos da
Marinha de Guerra na Guiné.
Acreditando, ele próprio, estar a desempenhar da melhor forma o que lhe era pedido e exigido, ao serviço da Marinha e do País, como homem e como militar e, neste caso pessoal invulgar, também como aviador, que escolheu ser. E fê-lo muito bem, em minha opinião. Com dignidade, determinação, competência e bom senso. Também com muita autonomia e responsabilidade assumida. Era assim necessário...
Não me alongarei em apreciações sobre estratégias e competências militares, individuais ou concertadas, porque mestre e juiz da arte militar não sou. Deixarei essa tarefa à Instituição Militar competente para o efeito, no caso dos militares dos quadros permanentes que optaram, pessoalmente, por essa carreira profissional.
Tão pouco me dispersarei em divagações económicas e político-sociais que apoiem ou justifiquem juizos de valor históricos desajustados, invariavelmente precoces, tentando correlacionar indevidamente o que não é relacionável no tempo. Acontecimentos históricos de contexto social, político e económico profundamente dispares resultam em conclusões sofismadas.
Com o decorrer do tempo, investigadores, historiadores e sociólogos iniciarão a tarefa que prevejo ser bem longa. Acredito sim, piamente, que a História não se esgota em embalagens hermeticamente fechadas, por época ou acontecimento. Há sempre lugar para mais um aditamento.
Pessoalmente, limitei-me, como oficial da Marinha de Guerra da Reserva Naval, a desempenhar como melhor pude e sabia, as funções que me foram cometidas e para as quais fui formado.
A imagem que dessa época guardo foi indelevelmente esboçada e gravada no meu espírito e sentir, pelos locais que percorri, acontecimentos que vivi e em que participei. Também, em grande parte, pela arte de comandar de quem me dirigiu e a minha própria sabedoria de o transmitir correcta e ajustadamente, nas decisões que tive de tomar, aos colaboradores que tive a honra de dirigir.
1. O Tancroal em Amostras
Para quem navegava na Guiné, em LFG como a Orion, o rio Cacheu, lá muito para montante, a juzante de Binta, significava pouco mais do que 60 a 80 m de largo, um misticismo sereno, água e muito tarrafo, mesmo muito, alto e frondoso.
A navegar de montante para juzante, depois de deixar para trás a foz do rio Olossato, o tarrafo que, enquanto alto e espesso, oferecia protecção natural, primeiro estreitava a largura da faixa de vegetação larga e densa mas depois acabava mesmo se interromper totalmente, deixando a descoberto lalas e palmeirais, numa extensão apreciável e sempre ameaçadora.
Guiné > Região do Cacheu > Rio Cacheu > A LFG Orion navega no Cacheu, entre a foz dos rios Talicó e Sambuiá, a montante de Ganturé.
Foto: © Manuel Lema Santos (2007). Direitos reservados.
Atingia-se assim, na região de Tancroal, em terra correspondente a Porto Batu, uma enorme clareira a bombordo para, ainda mais a juzante encontrar a Ponta do Pau e o respectivo porto.
A vulnerabilidade nestas condições era extremamente elevada, transformando o navio e outras embarcações que cruzassem aquela zona em alvos potencialmente fáceis de ser atingidos em emboscadas, muitas vezes ardilosamente montadas.
A passagem no local fazia-se sempre em postos de combate, o que significava cada elemento da guarnição no seu posto pré-definido, peças a fazer o varrimento da margem, concentração plena e dedos nos mecanismos de disparo. Quase sempre, alguns tiros de reconhecimento, na tentativa de prevenir e dissuadir alguma ameaça.
Reconheço que se fosse elemento IN e visse, próximo de mim, a pavonear-se à minha frente, mesmo nas minhas barbas, a transar, uma qualquer LFG com 42 m de comprimento e cerca de 10 m de altura a partir da linha de água, a tentação talvez fosse demasiado grande. A probabilidade de acertar era convidativa e, bom, se tivesse um RPG comigo...
Foi isto mesmo que sucedeu muitas vezes ao logo de 12 anos de guerra com ou sem operações Larga Agora. E volta que não volta, mesmo sabendo que as LFG navegavam com as anti-aéreas de 40 mm, as MG 42 e as ALG prontas a disparar e em companhia ou sós, com fuzileiros embarcados ou sem eles, candidatavam-se na mesma.
O prémio devia ser atractivo e, infelizmente para nós, foram várias vezes bem sucedidos, em alguns casos com perda de vidas e, noutros casos, com feridos graves, outras vezes ligeiros e ainda, em casos mais felizes, só sustos.
Por detrás de cada transporte civil, militar, fiscalização silenciosa, dia e noite, apoio a operações, escoltas a transportes, abastecimentos, evacuações e até partilha do que de bom havia num simples convívio, esteve sempre uma unidade da Marinha: LFG (Lancha de Fiscalização Grande), LDG (Lancha de Desembarque Grande), LFP (Lancha de Fiscalização Pequena), LDM (Lancha de Desembarque Média) ou LDP (Lancha de Desembarque Pequena) e, claro, os Fuzileiros.
Guiné > Bissau > LFG Orion atracada em Bissau. Visíveis na ponte, além de uma placa de honra do rio Cumbijã, o registo actualizado na altura, de ataques, impates e feridos
Foto: © Manuel Lema Santos (2007). Direitos reservados.
De forma sucinta e discreta, prefiro-o, dou abaixo alguns exemplos da vida das gentes da Marinha que, muitas vezes na sombra e no isolamento de uma gaiola metálica, como as LFG e as LDG, ou em alguns casos autênticas caixas de sardinhas, as LFP e as LDM, silenciosamente, mas com determinação e eficácia cumpriram, até final, as missões para que foram nomeados:
– Em 27 de Abril de 1965, a LFG Orion, com a guarnição anterior à minha, foi a primeira a ser carimbada, com armamento ligeiro e metralhadora pesada. O resultado foi quase surpreendente pois 83 buracos de bala em todo o navio, sem acertar nos chocolates, foi obra! Mesmo assim, um marinheiro fogueiro, em dia de azar, ao subir para a ponte, acabou por ser atingido por uma bala de pesada num pé, na zona acima do artelho. Teve de ser evacuado.
– Em 4 de Agosto de 1966, novamente a LFG Orion foi atacada no mesmo local do Tancroal com armamento ligeiro e também com metralhadora pesada. Em resposta pronta e eficaz o navio silenciou o IN.
– Em 13 de Janeiro de 1968, a LFG Lira que escoltava a LDG Alfange, depois de ter transportado 3 companhias de FT de S. Vicente para Binta, foi violentamente atacada no Tancroal com RPG, sendo atindida na ponte e no rufo (cobertura) da casa das máquinas. O resultado, além dos estragos materiais, foi dramático: 1 morto e 8 feridos, alguns deles em estado grave, sendo 2 evacuados de helicóptero e 3 de Dornier.
Guiné > Bissau > A LFG Lira, já atracada em Bissau, ao lado da Orion, sendo bem visíveis, na ponte, os estragos provocados pelo rebentamento da granada de RPG, em chapa balística de 0.25 .
Foto: © Manuel Lema Santos (2007). Direitos reservados.
– Em 2 de Março de 1970, a LFG Cassiopeia que acompanhava a LDM 305, foi atacada com morteiro, metralhadora pesada e bazooka, mais a juzante, próximo de Canja (Barro), junto à foz do rio Baião, numa pequena clareira. Inverteu a marcha e efectuou mais duas passagens, detectando as bocas de fogo e ripostando com as Boffors. Apenas alguns estilhaços atingiram o convés, nos rebentamentos junto à LFG.
– Em 20 de Maio de 1973 a LFG Hidra, frente à clareira de Jagali, a juzante da foz do rio Buborim, foi emboscada da margem Norte com RPG, armas ligeiras e morteiro 60 mm. O primeiro RPG deflagrou contra os cunhetes de munições da Boffors de vante, provocando rebentamentos e um grave incêndio, tornando a peça inoperativa. Reagiu de imediato e tudo acabou por se compor, não sem alguns estragos.
Foi elogiada a colaboração de elementos da CCP 121 e BCCmds (Baltalhão de Comandos) que, seguindo a bordo, conjuntamente com o navio, reagiram prontamente com o armamento de que dispunham. O resultado foram 3 feridos graves (Comandos) e 6 feridos ligeiros (Comandos, Paras e LFG).
- Em 5 de Agosto de 1973 as LDM 113 e 412, navegando em comboio de Ganturé para Farim, foram emboscadas violentamente no Tancroal com armamento diverso incluindo RPG. A LDM 113, que ocupava a 2ª posição na coluna, foi atingida por RPG em cheio no sector de ré, zona da cabine, toldo e convés. O patrão, Cabo M, teve morte quase imediata e o Mar C (telegrafista), gravemente ferido, veio a falecer no Hospital Militar de Bissau. Depois de reagirem aportaram a Bigene.
- Em 5 de Janeiro de 1974, a LFG Dragão, com as LDM 107 e 113, de braço dado, foram atacadas da clareira do Tancroal durante alguns minutos. A LDM 107, atingida com uma granada de RPG7 acima do convés, foi totalmente atravessada que ainda perfurou o costado da LFG. Mais 2 granadas de RPG atingiram a ponte da LFG e um terceiro destruiu as antenas de todas as unidades. Tiros de arma ligeira furaram a antena do radar. Estragos materiais enormes, 1 ferido grave (LDM 107) e 4 feridos ligeiros (LFG Dragão).
Guiné > Bissau > A LGF Lira > Os danos no convés, no rufo da casa das máquinas e nos botes de borracha dos FZ .
Foto: © Manuel Lema Santos (2007). Direitos reservados.
Os acontecimentos referidos têm como base relatórios oficiais e são resultado da pesquisa que tenho vindo a efectuar há cerca de dois anos sobre a vida operacional das 10 LFG da Classe Argos. Obviamente, limitei o número de relatos a alguns casos notáveis. Simplifiquei cada relato, reduzindo-o a uma curta descrição e apenas naquela zona.
De 1963 e quase até 1975, o dispositivo naval foi alterado por diversas vezes e relativamente ampliado. Grosseiramente, seria um exercício aparentemente simples extrapolar dos exemplos citados para toda a hidrografia da Guiné e para um dispositivo naval que nos anos 70 chegou a incluir 7 LFG, 8 LFP, 3 LDG, 8 LDP, 24 LDM, 5 DFE e 2 CF. Haverá, com certeza, muitos factos e acontecimentos para pesquisar e citar historicamente.
O meu sentido respeito e homenagem a todos os que lá foram caindo inutilmente, de um lado ou de outro, mas também aos que, acreditando poder modificar os acontecimentos, se bateram sempre por esse objectivo ainda que não o tenham conseguido. Uma referência especial, em nome do Vitor Junqueira, a todos os militares que participaram directa ou indirectamente na operação abaixo relatada (3), exemplo de muitas outras.
(Continua)
_____________
Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 21 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXXIII: Apresenta-se o Imediato da NRP Orion (1966/68) e 1º tenente da reserva naval Lema Santos
(2) Vd. post de 6 de Fevereiro de 2007 >Guiné 63/74 - P1499: A guerra em directo em Cufar: 'Porra, estamos a embrulhar' (António Graça de Abreu)
(3) Vd. posts de:
7 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1571: A Operação Larga Agora, o Tancroal / Porto Batu e as cartas náuticas do Instituto Hidrográfico (Lema Santos)
6 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1567: Operação Larga Agora, na região do Tancroal, com a CCAÇ 2753 (Vitor Junqueira)
Blogue coletivo, criado e editado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra col0onial, em geral, e da Guiné, em particular (1961/74). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que sáo, tratam-se por tu, e gostam de dizer: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
segunda-feira, 16 de abril de 2007
domingo, 15 de abril de 2007
Guiné 63/74 - P1664: Composição da CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/74) (Sousa de Castro)
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Xime > 1972 > Militares da CART 3494, em passeio despreocupado pela tabanca do Xime. O Sousa de Castro é o segundo a contar da esquerda para a direita.
Foto: © Sousa de Castro (2005). Direitos reservados.
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > Campa do José Maria da Silva e Sousa, que morreu afogado no Rio Geba, em 10 de Agosto de 1972. Era soldado da CART 3494, pertencente ao BART 3873. Este batalhão, sedeado com a respectiva CCS em Bambadinca (1972/74), tinha três unidades de quadrícula no Sector L1: CART 3493 (Mansambo, 1972/1973); CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974); CART 3492 (Xitole, 1972/74).
Foto: © Sousa de Castro (2007). Direitos reservados.
1. Mensagem, de 5 de Fevereiro último, do nosso tertuliano nº 2, o Sousa de Castro (2006) (ex-1º cabo de transmissões da CART 3494, Xime e Mansambo, 1972/74).
Carissímos ex-combatentes:
Junto a seguir listagem do número de elementos que formaram a CART 3494 (Guiné 1971/1974, Xime e Mansambo). Também uma foto da campa de um soldado que ficou enterrado em Bambadinca, curiosamente esta campa da foto passou em imagens da RTP por ocasião da última reportagem sobre os cemitérios no Ultramar (1). De referir que não consta nos ficheiros os nomes dos Sold Manuel Salgado Antunes e Sold Abraão Moreira Rosa. Estes dois desapareceram de vez no Rio Geba quando iam para uma operação ao Mato Cão.
Abraços, Sousa de Castro
2. Posto e nome do pessoal que compunha a CART 3494:
(Assinalam-se, a negrito, e com o respectivo endereço de e-mail, os que pertencem à nossa tertúlia)
Cap Art Victor Manuel da Ponte Silva Marques
Cap Art António José Pereira da Costa (Agosto de 1972)
Cap Mil Luciano Carvalho da Costa (Novembro de 1972)
Alf Mil Art Acácio Dias Correia
Alf Mil Art António José Serradas Pereira
Alf Mil Art Eduardo A. P. Oliveira
Alf Mil Art João P. R. C. Guimarães
Alf Mil Art Joaquim Silva Martins
Alf Mil Art José Henrique Fernandes Araújo
Alf Mil Art Manuel Barbosa Carneiro
Alf Mil Art Manuel Jorge Martins Gomes
Maurício Viegas
Josué Chinelo Fortunato
1º Sarg Art Carlos de Sousa Simões
1º Sarg Art Orlando Bilro Bagorro
Fur Mil Alim Abílio do Carmo Alves de Oliveira
Fur Mil Inf António de Sousa Bonito
Fur Mil Art António Espadinha Carda
Fur Mil Art Cláudio Manuel Marques Ferreira
Fur Mil Art Inácio José Carola Figueira
Fur Mil Art João António David Godinho
Fur Mil Jorge Alves Araújo
Fur Mil Art José Agostinho B. Vilela Peixoto
Fur Mil José Fernando da Costa Padeiro
Fur Mil Svc Mat José Carlos Mendes Pinto
Fur Mil Enf José Luís Carvalhido da Ponte
Fur Mil Art Luciano J. M. de Jesus
Fur Mil Trms Luís Coutinho Domingues
Fur Mil Art Manuel Benjamim Martins Dias
Fur Mil Art Manuel da Rocha Bento (Morto em combate em 22 de Abril de 1972
Fur Mil Mário Maria Neves
Fur Mil Inf Raul Magro Sousa Pinto
1º Cabo Abílio Soares Rodrigues
1º Cabo Adelino Alves Pereira
1º Cabo Adriel da Costa Lourenço
1º Cabo (Enfermeiro) Alcindo Joaquim Pereira da Silva
1º Cabo (Condutor) Alcino Rodrigues da Costa
1º Cabo (Condutor) Amandino Carvalho dos Santos
1º Cabo António Augusto de Jesus Santos
1º Cabo António dos Santos Pinheiro
1º Cabo António Francisco Leite Avelino
1º Cabo António João Mendes Morais
1º Cabo (Radiotelegrafista) António Manuel Sousa de Castro
1º Cabo (Padeiro) Carlos Bento Fialho
1º Cabo Carlos José Pereira
1º Cabo Diamantino de Oliveira
1º Cabo Fernando Manuel da Silva
1º Cabo (Enfermeiro) Fernando Monteiro Botelho Gomes
1º Cabo Fernando Silva
1º Cabo Francisco Adolfo Pereira Ribeiro
1º Cabo Francisco da Costa Pereira
1º Cabo Jacinto Dias Nunes
1º Cabo (Cozinheiro) João Domingos de Sousa Machado
1º Cabo Joaquim da Silva Oliveira
1º Cabo Joaquim Neves Carvalho
1º Cabo Joaquim Olimpo Milheiro da Volta e Silva
1º Cabo José do Nascimento Ramos
1º Cabo José Mano Sebastião
1º Cabo José Martins Mendes
1º Cabo Laurentino Bandeira dos Santos
1º Cabo Lúcio Damiano Monteiro da Silva
1º Cabo (Cripto) Luís Fernando Pereira Romão
1º Cabo Manuel Amorim do Alto
1º Cabo (Morteiro 81 mm) Manuel da Cruz Ramos
1º Cabo Manuel de Medeiros
1º Cabo Manuel de Sousa Monteiro
1º Cabo Manuel Fernando Valente Marques da Cruz
1º Cabo Manuel Gonçalves
1º Cabo Manuel Lopes de Azevedo
1º Cabo Manuel Pais Moreira
1º Cabo Paulo José Pereira Martins Cândido
1º Cabo Vasco Alfredo de Matos Miranda
Soldado Abel Maia de Pinho Campos
Soldado Abraão Moreira Rosa (desaparecido no Rio Geba em 10-08-1972)
Soldado Adão Manuel Gomes da Silva
Soldado Adílio do Carmo Alves de Oliveira
Soldado Adriano Almeida da Conceição
Soldado Alcides de Sá Pinto Castro
Soldado Alcino Rodrigues da Fonseca
Soldado Alfredo Barbedo Pereira
Soldado Alvarinho Moreira da Silva
Soldado Álvaro dos Santos Ferreira
Soldado Amândio Martins Domingues
Soldado (Radiotelegrafista)António Alves Ramos
Soldado António Augusto Cardoso
Soldado António da Costa
Soldado António da Costa Valentim
Soldado António de Jesus Matias
Soldado António de Oliveira Fonseca
Soldado António dos Santos Azevedo
Soldado António dos Santos Reis
Soldado António Fernando Martins Correia
Soldado António Ferreira Lopes
Soldado António Gomes de Azevedo
Soldado António Jorge Gomes
Soldado (Condutor auto) António Júlio Peixoto
Soldado António Pereira Pinto
Soldado António Soares da Silva
Soldado Armando Alves Dias
Soldado (Trms Inf) Augusto de Oliveira Meireles
Soldado Augusto Vieira Fidalgo
Soldado Carlos Alberto Carvalho da Cunha
Soldado Carlos Dias da Silva
Soldado Carlos dos Santos Monteiro
Soldado Carlos Duarte Teixeira
Soldado Carmindo de Oliveira Moreira
Soldado Carmindo Franklim Tavares da Silva
Soldado Celestino da Cunha Rodrigues
Soldado Cesário Mendes de Pinho
Soldado David Fernandes
Soldado (Aux Cozinheiro) Dionísio Dantas Fernandes
Soldado Eduardo Barata Santos
Soldado Eduardo João de Oliveira Ferreira
Soldado (Trms Inf) Emílio Lima Tojal
Soldado Fernando José Pereira de Almeida Ramos
Soldado Fernando Loureiro de Sousa
Soldado Fernando Martins Teixeira
Soldado Francisco da Costa Ferreira Inocêncio
Soldado Gregório Caetano dos Santos
Soldado Ilídio Ferreira Amaral
Soldado Ismael de Oliveira Pires
Soldado Jaime da Costa Latada
Soldado (Cozinheiro) João da Silva Torres
Soldado João de Almeida Pereira Cardoso
Soldado João Ferreira Gomes
Soldado João Pereira Rodrigues
Soldado Joaquim Carlos Gomes Cerqueira
Soldado Joaquim da Costa Macedo
Soldado Joaquim de Jesus Fernandes
Soldado Joaquim Lino Monteiro
Soldado Joaquim dos Santos Dias
Soldado Joaquim Gomes de Azevedo
Soldado Joaquim Manuel Lino Monteiro
Soldado Joaquim Moreira de Sousa
Soldado Joaquim Pereira de Sousa Ferreira
Soldado Joaquim Torres da Trindade
Soldado Jorge Manuel Marques da Costa
Soldado José de Sousa Monteiro
Soldado (Trms Inf) José do Espírito Santo Vicente
Soldado José Duarte Neves de Campos
Soldado José Fernando da Cruz Moreira
Soldado José Fernando Moreira Dias
Soldado José Gomes Leopoldino
Soldado José Gonçalves de Almeida
Soldado José Joaquim Terra
Soldado José Jorge Antunes Dias
Soldado José L. P. Santos
Soldado José Maria da Silva e Sousa (morto no Rio Geba em 10 de Agosto de 1972)
Soldado Lícinio de Almeida Pereira
Soldado Licínio Domingos Andrade
Soldado Luís Carlos Soares de Oliveira
Soldado Luís dos Santos
Soldado Manuel Adão Freitas
Soldado Manuel Alberto de Almeida
Soldado Manuel Carlos da Silva
Soldado Manuel Carvalho de Sousa
Soldado Manuel da Fonseca Gonçalves
Soldado Manuel da Silva
Soldado Manuel da Silva Amorim
Soldado Manuel de Jesus da Costa
Soldado Manuel de Sousa Monteiro
Soldado Manuel Dias Jeremias
Soldado Manuel Gonçalves da Costa
Soldado (condutor auto) Manuel Guedes Ferreira
Soldado Manuel Henrique Moreira
Soldado Manuel José Gomes
Soldado Manuel Martins Mendes
Soldado Manuel Nunes Pereira
Soldado Manuel Óscar de Almeida
Soldado Manuel Paiva Duarte Almeida
Soldado Manuel Pedrosa Alves do Couto
Soldado Manuel Salgado Antunes (desaparecido no Rio Geba em 10 de Agosto de 1972)
Soldado (Trms Inf) Mário Campos Marinho
Soldado Mário Rodrigues Nascimento
Soldado Nelson Marques Cardoso
Soldado Ricardo de Almeida Teixeira
Soldado Ricardo Silva do Nascimento
Soldado (Radiotelegrafista)Rogério Tavares da Silva
Soldado Salvador Pinto Carriço
Soldado Sérgio Ferreira Fernandes
Soldado Silvério Augusto Mano Reverendo
Soldado Silvino Vaz da Rosa e Silva
Soldado Victor Manuel Ferraz da Rocha Cardoso
Soldado Virgilio Duarte
TOTAL: 184 HOMENS
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Nota de L.G.:
(1) Vd. post de 2 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1488: Vídeos (1): Reportagem da RTP sobre os talhões e cemitérios militares no Ultramar (Jorge Santos)
Guiné 63/74 - P1663: Recortes de imprensa (1): As nossas mulheres e o stresse pós-traumático de guerra (Zé Teixeira)
Início da série Recortes de Imprensa. O primeiro recorte foi-nos enviado pelo José Teixeira (1º cabo enfermeiro, CCAÇ 2381, Buba, Quebo, Mampatá, Empada, 1968/70).
Mulheres de combatentes vivem inferno há 40 anos
Stress da guerra colonial passado à família
Correio da Manhã, 27 de Março de 2006
As mulheres dos ex-combatentes herdaram sintomas do stress pós-traumático, uma doença que lhes deixou marcas para toda a vida. Numa troca intensa de correspondência, juraram amor em tempos de guerra e sonharam com o dia em que os noivos regressariam a Portugal. Todas elas esperavam os rapazes por quem se tinham apaixonado, mas viram desembarcar homens sombrios que já não conheciam.
“Cheguei a ir a um bruxo, porque pensava que ele tinha alguma coisa do outro mundo dentro dele. Vinha diferente e ninguém sabia o que ele tinha, ninguém o reconhecia”, recorda Lucília, que encontrou uma resposta no grupo de auto-ajuda da Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vítimas do Stress de Guerra (APOIAR) (1).
É num dos edifícios degradados do bairro da Liberdade, em Lisboa, que a APOIAR recebe quinzenalmente 24 mulheres para as reuniões do grupo de auto-ajuda e para as sessões de terapia de grupo, estas últimas coordenadas por uma psicóloga. Durante décadas viveram isoladas, pensando que o seu caso era único. Só mais recentemente começaram a ouvir falar de “stress de guerra induzido”. Dizem não ter palavras para descrever a angústia e ansiedade e confessam ter momentos em que “perdem o amor pela vida”.
“Eu digo que o meu marido é que está doente, mas sou eu quem toma os comprimidos. O que eu tenho é uma coisa fruto da doença dele”, tenta explicar Conceição, 57 anos, a mais franzina das seis mulheres, que já teve “um esgotamento e várias depressões”.“Vivemos com um morto-vivo que come, dorme e nunca fala. Nunca há um beijo, não há um carinho. Não há um ‘boa noite’ ou um ‘bom dia’”, descreve Maria de Lurdes, que compara o marido a “uma alma que anda de um lado para o outro”, e acrescenta: “O meu marido esteve 24 meses no Ultramar, mas eu estou em guerra há quarenta anos, desde o dia em que casei”, revela Maria de Lurdes.
Aos 61 anos, Maria confessa já ter chegado a dizer à filha que “a preferia ver morta a casada com um homem como o pai”, apesar de saber que o “marido não é mau” e de se orgulhar de ele nunca lhe ter levantado a mão. Já a mulher que se senta ao seu lado não pode dizer o mesmo. Sem querer dar o nome, assume-se como uma das três esposas, presentes na reunião, vítima de agressões físicas.“Às vezes ele bate-me, mas se eu saísse de casa quem é que tomava conta do meu marido?” Ainda assim, todas concordam que “há frases e palavras que magoam muito mais que um estalo”. Elas são muitas vezes o único suporte financeiro e emocional da família, esforço ignorado pelos maridos.
Mais de 800 mil portugueses foram recrutados para a Guerra Colonial (1961-1974). Segundo um estudo do psiquiatra Afonso de Albuquerque, “140 mil homens sofreram graves perturbações psicológicas”.
PELO MENOS 80 MIL VÍTIMAS EM PORTUGAL
O nome técnico é Perturbação Secundária de Stress Pós-traumático. Apesar de não existirem estatísticas rigorosas, os especialistas que trabalham nesta área estimam que haja em Portugal 80 mil mulheres de ex-combatentes com stress de guerra.
Susana Pedras, psicóloga da Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra (APVG), com sede em Braga (2), diz que “as mulheres têm sido, ao longo de décadas, vítimas silenciosas de um problema grave” e que “muitas estão seriamente afectadas e não têm tido qualquer ajuda”. Foi por isso que, há dois anos, a APVG resolveu estender às mulheres o serviço de apoio psicológico aos antigos combatentes e os resultados são “francamente animadores”.
Tal como o CM [ Correio da Manhã] revelou a 24 de Janeiro, as mulheres que participam neste tipo de grupos de apoio acabam por encarar a vida de forma mais positiva e, em muitos casos, por contagiar os maridos e levá-los a procurar ajuda. As seis mulheres que participaram no terceiro grupo de terapia de apoio, em Braga, estão “extremamente satisfeitas”. Voltaram a gostar delas próprias e a valorizar os maridos que, em tempos, chegaram a odiar. Rosa diz que viveu mais de 30 anos de inferno. “Quando o conheci parecia um santo, mas nove meses depois deu-lhe o paludismo e, a partir daí, ao rebentar e ao cair da folha, tínhamos sempre novelas em casa”, disse esta mulher, que não tem dúvidas em afirmar que passou a sofrer muito mais de stress do que o marido.
ENLOUQUECEU COM FOGUETES
Conceição começou por rir das atitudes do marido. Julgava-as engraçadas mas, mais tarde percebeu que o caso era bem mais grave. O Grupo de Auto-Ajuda permitiu-lhe compreender a reacção do marido logo no primeiro ‘réveillon’ que passaram juntos. “Quando, à meia-noite da Passagem de Ano, rebentaram os foguetes, ele transformou-se num louco. Começou aos gritos, escondeu-se atrás dos móveis e depois disse-me que pensava que era um bombardeamento. Fartámo-nos de rir. Mal eu sabia a sorte que me esperava.” Os problemas da família de Conceição agravaram-se em 1986. “Começou a ter dupla personalidade – ora era um bom pai, um bom amigo e marido ora era um carrasco, um Hitler”, lembrou. Ainda assim, acredita que a culpa não é dele, mas de quem o mandou para a frente de batalha.
"ESTAMOS CONDENADAS"
Segundo a psicóloga da Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vítimas do Stress de Guerra, “existe em Portugal uma cultura que leva estas mulheres a preferirem ser mal tratadas a abandonarem os maridos. Elas justificam a sua decisão, alegando que eles estão doentes”, diz Carla Santos. Os filhos são a principal razão que apontam para não saírem de casa. Exemplo disso é Maria de Lurdes, a mais traumatizada do grupo: “Tenho tratado do meu marido ao longo de todos estes anos para que a minha filha nunca o veja deitado a dormir num banco de jardim.” Para as mulheres, o stress pós-traumático é uma “doença hereditária” que passa “de pai para filho e de filho para neto”, mas também uma “doença contagiosa” transmitida “do homem para a esposa”. A Guerra do Ultramar, segundo dizem, condenou-os. “Agora a guerra é nossa”, desabafam as mulheres.
Sílvia Maia, Lusa
CORREIO DA MANHÃ - 27.03.2006
____________
Notas de L.G.:
(1) Vd. sítio da Associação Apoiar
(2) Vd. sítio da Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra > Departamento de Psicologia
Mulheres de combatentes vivem inferno há 40 anos
Stress da guerra colonial passado à família
Correio da Manhã, 27 de Março de 2006
As mulheres dos ex-combatentes herdaram sintomas do stress pós-traumático, uma doença que lhes deixou marcas para toda a vida. Numa troca intensa de correspondência, juraram amor em tempos de guerra e sonharam com o dia em que os noivos regressariam a Portugal. Todas elas esperavam os rapazes por quem se tinham apaixonado, mas viram desembarcar homens sombrios que já não conheciam.
“Cheguei a ir a um bruxo, porque pensava que ele tinha alguma coisa do outro mundo dentro dele. Vinha diferente e ninguém sabia o que ele tinha, ninguém o reconhecia”, recorda Lucília, que encontrou uma resposta no grupo de auto-ajuda da Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vítimas do Stress de Guerra (APOIAR) (1).
É num dos edifícios degradados do bairro da Liberdade, em Lisboa, que a APOIAR recebe quinzenalmente 24 mulheres para as reuniões do grupo de auto-ajuda e para as sessões de terapia de grupo, estas últimas coordenadas por uma psicóloga. Durante décadas viveram isoladas, pensando que o seu caso era único. Só mais recentemente começaram a ouvir falar de “stress de guerra induzido”. Dizem não ter palavras para descrever a angústia e ansiedade e confessam ter momentos em que “perdem o amor pela vida”.
“Eu digo que o meu marido é que está doente, mas sou eu quem toma os comprimidos. O que eu tenho é uma coisa fruto da doença dele”, tenta explicar Conceição, 57 anos, a mais franzina das seis mulheres, que já teve “um esgotamento e várias depressões”.“Vivemos com um morto-vivo que come, dorme e nunca fala. Nunca há um beijo, não há um carinho. Não há um ‘boa noite’ ou um ‘bom dia’”, descreve Maria de Lurdes, que compara o marido a “uma alma que anda de um lado para o outro”, e acrescenta: “O meu marido esteve 24 meses no Ultramar, mas eu estou em guerra há quarenta anos, desde o dia em que casei”, revela Maria de Lurdes.
Aos 61 anos, Maria confessa já ter chegado a dizer à filha que “a preferia ver morta a casada com um homem como o pai”, apesar de saber que o “marido não é mau” e de se orgulhar de ele nunca lhe ter levantado a mão. Já a mulher que se senta ao seu lado não pode dizer o mesmo. Sem querer dar o nome, assume-se como uma das três esposas, presentes na reunião, vítima de agressões físicas.“Às vezes ele bate-me, mas se eu saísse de casa quem é que tomava conta do meu marido?” Ainda assim, todas concordam que “há frases e palavras que magoam muito mais que um estalo”. Elas são muitas vezes o único suporte financeiro e emocional da família, esforço ignorado pelos maridos.
Mais de 800 mil portugueses foram recrutados para a Guerra Colonial (1961-1974). Segundo um estudo do psiquiatra Afonso de Albuquerque, “140 mil homens sofreram graves perturbações psicológicas”.
PELO MENOS 80 MIL VÍTIMAS EM PORTUGAL
O nome técnico é Perturbação Secundária de Stress Pós-traumático. Apesar de não existirem estatísticas rigorosas, os especialistas que trabalham nesta área estimam que haja em Portugal 80 mil mulheres de ex-combatentes com stress de guerra.
Susana Pedras, psicóloga da Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra (APVG), com sede em Braga (2), diz que “as mulheres têm sido, ao longo de décadas, vítimas silenciosas de um problema grave” e que “muitas estão seriamente afectadas e não têm tido qualquer ajuda”. Foi por isso que, há dois anos, a APVG resolveu estender às mulheres o serviço de apoio psicológico aos antigos combatentes e os resultados são “francamente animadores”.
Tal como o CM [ Correio da Manhã] revelou a 24 de Janeiro, as mulheres que participam neste tipo de grupos de apoio acabam por encarar a vida de forma mais positiva e, em muitos casos, por contagiar os maridos e levá-los a procurar ajuda. As seis mulheres que participaram no terceiro grupo de terapia de apoio, em Braga, estão “extremamente satisfeitas”. Voltaram a gostar delas próprias e a valorizar os maridos que, em tempos, chegaram a odiar. Rosa diz que viveu mais de 30 anos de inferno. “Quando o conheci parecia um santo, mas nove meses depois deu-lhe o paludismo e, a partir daí, ao rebentar e ao cair da folha, tínhamos sempre novelas em casa”, disse esta mulher, que não tem dúvidas em afirmar que passou a sofrer muito mais de stress do que o marido.
ENLOUQUECEU COM FOGUETES
Conceição começou por rir das atitudes do marido. Julgava-as engraçadas mas, mais tarde percebeu que o caso era bem mais grave. O Grupo de Auto-Ajuda permitiu-lhe compreender a reacção do marido logo no primeiro ‘réveillon’ que passaram juntos. “Quando, à meia-noite da Passagem de Ano, rebentaram os foguetes, ele transformou-se num louco. Começou aos gritos, escondeu-se atrás dos móveis e depois disse-me que pensava que era um bombardeamento. Fartámo-nos de rir. Mal eu sabia a sorte que me esperava.” Os problemas da família de Conceição agravaram-se em 1986. “Começou a ter dupla personalidade – ora era um bom pai, um bom amigo e marido ora era um carrasco, um Hitler”, lembrou. Ainda assim, acredita que a culpa não é dele, mas de quem o mandou para a frente de batalha.
"ESTAMOS CONDENADAS"
Segundo a psicóloga da Associação de Apoio aos Ex-Combatentes Vítimas do Stress de Guerra, “existe em Portugal uma cultura que leva estas mulheres a preferirem ser mal tratadas a abandonarem os maridos. Elas justificam a sua decisão, alegando que eles estão doentes”, diz Carla Santos. Os filhos são a principal razão que apontam para não saírem de casa. Exemplo disso é Maria de Lurdes, a mais traumatizada do grupo: “Tenho tratado do meu marido ao longo de todos estes anos para que a minha filha nunca o veja deitado a dormir num banco de jardim.” Para as mulheres, o stress pós-traumático é uma “doença hereditária” que passa “de pai para filho e de filho para neto”, mas também uma “doença contagiosa” transmitida “do homem para a esposa”. A Guerra do Ultramar, segundo dizem, condenou-os. “Agora a guerra é nossa”, desabafam as mulheres.
Sílvia Maia, Lusa
CORREIO DA MANHÃ - 27.03.2006
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Notas de L.G.:
(1) Vd. sítio da Associação Apoiar
(2) Vd. sítio da Associação Portuguesa dos Veteranos de Guerra > Departamento de Psicologia
sábado, 14 de abril de 2007
Guiné 63/74 - P1662: Aumento salarial de 15% da tropa africana em meados de 1973 (António Duarte, CART 3493 e CCAÇ 12)
Foto do arquivo pessoal de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71). © Humberto Reis (2006). Direitos reservados.
Texto do António Duarte, ex-furriel miliciano ("Estive na CCAÇ 12 desde Janeiro de 1973, primeiro em Bambadinca e a partir de Abril no Xime, após as rotações das companhias, geradas pela transferência para Cobumba da Cart 3493, minha unidade inicial. Regressei à metrópole em Janeiro de 1974") (2).
Caro Luís Graça,
Por me parecer curioso, transcrevo um texto de Agosto de 1973, da história do BART 3873:
"Acção Psicológica e Promoção Social
"Segundo o que se acentuou, os contactos pop enfrentaram as dificuldades conexas à faina agrícola da época que retém na bolanha a gente das tabancas, durante quase todo o dia.
"O número de apresentados foi de 1 e uma vez mais no Enxalé.
"O aumento dos 15%, agora, pago, sobre os ordenados e pensões da tropa africana produziu uma impressão benéfica. São mais necessidades que se podem satisfazer o que se projecta na subida do nível de vida, não obstante a ignorância de muitos que os leva a desbaratar o dinheiro prodigamente".
Trata-se de um texto que roça o simplório / paternalista, mas que vale como peça da nossa história, mostrando a visão das NT.
Mantenhas para todos,
António Duarte
Por me parecer curioso, transcrevo um texto de Agosto de 1973, da história do BART 3873:
"Acção Psicológica e Promoção Social
"Segundo o que se acentuou, os contactos pop enfrentaram as dificuldades conexas à faina agrícola da época que retém na bolanha a gente das tabancas, durante quase todo o dia.
"O número de apresentados foi de 1 e uma vez mais no Enxalé.
"O aumento dos 15%, agora, pago, sobre os ordenados e pensões da tropa africana produziu uma impressão benéfica. São mais necessidades que se podem satisfazer o que se projecta na subida do nível de vida, não obstante a ignorância de muitos que os leva a desbaratar o dinheiro prodigamente".
Trata-se de um texto que roça o simplório / paternalista, mas que vale como peça da nossa história, mostrando a visão das NT.
Mantenhas para todos,
António Duarte
Cart 3493 e CCAÇ 12 (1971 a 1974)
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Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 21 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLXXV: Composição da CCAÇ 12, por Grupo de Combate, incluindo os soldados africanos (posto, número, nome, função e etnia)
(2) Vd. os seguintes posts, da autoria do António Duarte (ou com referências a ele):
5 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1565: A CCAÇ 12, o nosso 'neto' António Duarte e os nossos queridos 'nharros' (Abel Rodrigues)
28 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1553: A CCAÇ 12 no Poidão e na Ponta do Inglês, pela enésima vez (António Duarte)
20 de Fevereiro de 2006 > Guiné 63/74 - DLXVIII: Notícias da CART 3493 (Mansambo, 1972) e da CCAÇ 12 (Bambadinca e Xime, 1973/74) (António Duarte)
18 Fevereiro 2006 > Guiné 63/74 - DLXI: Um periquito da CCAÇ 12 (António Duarte / Sousa de Castro)
21 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1302: Blogoterapia (1): Palmas para o Amílcar Mendes, o Beja Santos e o Victor Tavares (António Duarte, CART 3493 e CCAÇ 12)
24 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P984: Ainda a tragédia de Quirafo: o 'morto' que afinal estava vivo (António Duarte)
17 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P966: O Mexia Alves que eu conheci em Bambadinca (António Duarte, CCAÇ 12, 1973)
11 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLV: Ex-graduados da CCAÇ 12 também foram fuzilados (António Duarte)
Guiné 63/74 - P1661: Tertúlia: Notícias de Lafões, do Rui Ferreira, do Carlos Santos e da nossa gloriosa FAP (Victor Barata)
Guiné > Bissalanca > Restos do motor da DO 27, do Furriel Piloto Aviador Baltazar... De vez em quando, embora com menos frequência do que o pessoal do Exército, o pessoal da FAP também sofria acidentes graves (e quase sempre mortais).
Esta imagem foi-nos enviada pelo nosso camarada Victor Barata, que vive hoje em Viseu, e que foi especialista de Instrumentos de Bordo, na nossa gloriosa FAP (1969/1974). Esteve na Guiné, de 1971/73, "na linha da frente das DO 27". Aterrou em tudo o que era bocado de pista (1). Pedi-lhe para me dar mais pormenores sobre este trágico acidente.
Foto: © Victor Barata (2007). Direitos reservados.
Mensagem do Victor Barata, com data de 2 de Março de 2007:
Olá, Camarada Luis.
Pode parecer que ando ausente da tertúlia, mas na realidade não é verdade, todos os dias de manhã e à noite, vou recuperar energias tertulianas para combater as carências sócio-afectivas em que mergulhou este País!
Convidei para almoçar comigo há cerca de 15 dias o Rui Alexandrino e o Carlos Santos, foi para mim uma satisfação conhecer mais um elemento da Guiné, o Carlos Santos, pois o Rui já conhecia. Fez o favor de, tal como a ti, oferecer-me a sua obra Rumo a Fulacunda com uma dedicatória comovente, como só ele sabe fazer (2).
Pois bem, alvitrei durante o repasto propor aos nossos camaradas Tertulianos uma recepção neste lindo jardim que dá pelo nome de Lafões (área geográfica que compreende os concelhos de Oliveira de Frades, Vouzela e S. Pedro do Sul) já com programa elaborado e tudo, solicitando ao Rui, que precisa de se entreter, que fosse o interlocutor contigo para que tal fosse uma realidade.
Segundo a informação do Rui e transmitida por ti, vai haver um almoço em Pombal com o Vitor Junqueira!?...
Vou fazer os possíveis para estar presente a representar a minha FAP [Força Aérea Portuguesa], mas não podemos nem queremos estar à vossa espera para o ano, é muito tempo, e esta confraternização aqui é reclamada por mim, pelo Rui Alexandrino, pelo Martins Julião, pelo Carlos Santos,etc, Vamos lá a fazer um esforço, acreditem que não vamos ficar mal com o programa a proporcionar-vos.
Vamos, Luis, fala lá com a malta, faz o teu esforço a que estas habituado para atingir este objectivo!
Um grande abraço.
Victor Barata
Telemóvel > 917 567 868
Comentário de L.G.:
Victor: Como eu já em tempos de tinha dito, a pista pode ser curta mas é toda tua... Na nossa caserna cabem todos os camaradas, sejam eles terrestres, voadores ou anfíbios. A FAP, tão dignamente representada por ti, é bem especialmente bem vinda à nossa tertúlia e ao nosso blogue...
Também te disse que, sem ter privado convosco (contrariamente ao meu camarada da CCAÇ 12, o Fur Mil Humberto Reis, que adorava viajar pelo ar e fotografar os cantinhos da Guiné), eu sempre tive uma especial, secreta, admiração pelos malucos dessas máquinas voadoras que eram as DO 27 e que nos traziam notícias do mundo, do outro do mundo...
Já não gostava tanto, como também te disse, muito sinceramente, quando elas, em vez do carteiro, transportavam o senhor major de operações ou o senhor comandante de qualquer coisa... Ou sejam, quando de frágil caranguejola eram promovidas a um coisa que pomposamente se chamava o PCV. Do PCV tenho as piores recordações da mimnha vida na Giuné...
A tua proposta - que eu sei que é também do Rui e da rapaziada da tertúlia de Viseu - é irrecusável. Por mim, proponho que o 3º encontro da nossa tertúlia seja nas terras de Lafões. Ms o povo é quem mais orden(h)a...
Dá-me uma valente abraço ao Rui, ao Carlos e ao Julião. Outro para ti. E faz-me o favor de ma ndar estórias desses gloriosos malucos das máquinas voadoras. A minha homenagem, sentida, aos que perderam a vida na Guiné. Encontramo-nos em Pombal.
_____________
Notas de L.G.
(1) Vd. posts de:
10 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLI: Ajudem-me a encontrar o tenente evacuado em 1973 do Corredor da Morte (Victor Barata)
9 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXXXIX: Victor Barata, MELEC da FAP (1971/73)
(2) Vd. post de 17 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1285: Bibliografia de uma guerra (14): Rumo a Fulacunda, um best seller, de Rui Alexandrino Ferreira (Luís Graça)
Foto: © Victor Barata (2007). Direitos reservados.
Mensagem do Victor Barata, com data de 2 de Março de 2007:
Olá, Camarada Luis.
Pode parecer que ando ausente da tertúlia, mas na realidade não é verdade, todos os dias de manhã e à noite, vou recuperar energias tertulianas para combater as carências sócio-afectivas em que mergulhou este País!
Convidei para almoçar comigo há cerca de 15 dias o Rui Alexandrino e o Carlos Santos, foi para mim uma satisfação conhecer mais um elemento da Guiné, o Carlos Santos, pois o Rui já conhecia. Fez o favor de, tal como a ti, oferecer-me a sua obra Rumo a Fulacunda com uma dedicatória comovente, como só ele sabe fazer (2).
Pois bem, alvitrei durante o repasto propor aos nossos camaradas Tertulianos uma recepção neste lindo jardim que dá pelo nome de Lafões (área geográfica que compreende os concelhos de Oliveira de Frades, Vouzela e S. Pedro do Sul) já com programa elaborado e tudo, solicitando ao Rui, que precisa de se entreter, que fosse o interlocutor contigo para que tal fosse uma realidade.
Segundo a informação do Rui e transmitida por ti, vai haver um almoço em Pombal com o Vitor Junqueira!?...
Vou fazer os possíveis para estar presente a representar a minha FAP [Força Aérea Portuguesa], mas não podemos nem queremos estar à vossa espera para o ano, é muito tempo, e esta confraternização aqui é reclamada por mim, pelo Rui Alexandrino, pelo Martins Julião, pelo Carlos Santos,etc, Vamos lá a fazer um esforço, acreditem que não vamos ficar mal com o programa a proporcionar-vos.
Vamos, Luis, fala lá com a malta, faz o teu esforço a que estas habituado para atingir este objectivo!
Um grande abraço.
Victor Barata
Telemóvel > 917 567 868
Comentário de L.G.:
Victor: Como eu já em tempos de tinha dito, a pista pode ser curta mas é toda tua... Na nossa caserna cabem todos os camaradas, sejam eles terrestres, voadores ou anfíbios. A FAP, tão dignamente representada por ti, é bem especialmente bem vinda à nossa tertúlia e ao nosso blogue...
Também te disse que, sem ter privado convosco (contrariamente ao meu camarada da CCAÇ 12, o Fur Mil Humberto Reis, que adorava viajar pelo ar e fotografar os cantinhos da Guiné), eu sempre tive uma especial, secreta, admiração pelos malucos dessas máquinas voadoras que eram as DO 27 e que nos traziam notícias do mundo, do outro do mundo...
Já não gostava tanto, como também te disse, muito sinceramente, quando elas, em vez do carteiro, transportavam o senhor major de operações ou o senhor comandante de qualquer coisa... Ou sejam, quando de frágil caranguejola eram promovidas a um coisa que pomposamente se chamava o PCV. Do PCV tenho as piores recordações da mimnha vida na Giuné...
A tua proposta - que eu sei que é também do Rui e da rapaziada da tertúlia de Viseu - é irrecusável. Por mim, proponho que o 3º encontro da nossa tertúlia seja nas terras de Lafões. Ms o povo é quem mais orden(h)a...
Dá-me uma valente abraço ao Rui, ao Carlos e ao Julião. Outro para ti. E faz-me o favor de ma ndar estórias desses gloriosos malucos das máquinas voadoras. A minha homenagem, sentida, aos que perderam a vida na Guiné. Encontramo-nos em Pombal.
_____________
Notas de L.G.
(1) Vd. posts de:
10 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXLI: Ajudem-me a encontrar o tenente evacuado em 1973 do Corredor da Morte (Victor Barata)
9 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCXXXIX: Victor Barata, MELEC da FAP (1971/73)
(2) Vd. post de 17 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1285: Bibliografia de uma guerra (14): Rumo a Fulacunda, um best seller, de Rui Alexandrino Ferreira (Luís Graça)
Guiné 63/74 - P1660: Tertúlia: Presente em espírito no encontro de Pombal (1): Martins Julião, ex-al mil, CCAÇ 2701 (Saltinho, 1970/72)
1. Mensagem do Martins Julião (1):
É com enorme desgosto que te comunico que não poderei estar presente em Pombal (1). Estarei em Itália em negócios inadiáveis.
Por favor aceita ser o portador do meu imenso abraço para todos, abraço de camaradagem, amizade, solidariedade e saudade.
Bem hajam todos, por nos mantermos unidos num País que nos esquece e nos mal trata, mas nós não podemos esquecer, porque , bem ou mal ( à luz da História dos Povos), servimos Portugal.... a nossa Pátria.
Bem hajas tu pela iniciativa que tomaste e que tão bem guias pelo tempo que passa.
Será um grande Convívio e um grande Encontro em Pombal.
Um abraço para todos do
Martins Julião
Ex Alf Mil CCAÇ 2701
(Saltinho, Abril de 1970/Abril de 72).
_________
Notas de L.G.:
(1) Vd. posts de
23 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P981: Apresenta-se o Alf Mil Inf Martins Julião (CCAÇ 2701, Saltinho, 1970/72)
(...) "Só há pouco tempo conheci este espaço de encontro. O Paulo Santiago (Pel Caç Nat 53, Saltinho), foi o camarada responsável pela minha apresentação aos camaradas de tertúlia.Chamo-me Martins Julião, fui Alferes Miliciano de Infantaria da CCAÇ 2701 (Saltinho, Abril de 1970/Abril de 72).Hoje sou um pequeno empresário e gerente de uma unidade industrial, após mais de 20 anos como professor do Ensino Secundário" (...).
24 de Novembro de 2006> Guiné 63/74 - P1314: Estórias de Bissau (8): Roteiro da noite: Orion, Chez Toi, Pilão (Paulo Santiago)
(...) "O Martins Julião estava em Bissau a chefiar a comissão liquidatária da CCAÇ 2701 [, Saltinho, 170/72]: sabendo que me encontrava a bordo da Orion, apareceu no fim de jantar, ainda a tempo de beber uns uísques" (...).
13 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1424: Memórias de um comandante de pelotão de caçadores nativos (Paulo Santiago) (6): amigos do peito da CCAÇ 2701 (Saltinho, 1970/72)
(...) "Havia depois o Alf Julião, como mais antigo, substituía o Clemente, nas ausências deste. Já é conhecido da Tertúlia, esteve na Ameira (3), e todos sabem termos uma amizade de aço, vinda dos matos da Guiné" (...).
(2) vfd. post de 15 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1177: Encontro da Ameira: foi bonita a festa, pá... A próxima será no Pombal (Luís Graça)
É com enorme desgosto que te comunico que não poderei estar presente em Pombal (1). Estarei em Itália em negócios inadiáveis.
Por favor aceita ser o portador do meu imenso abraço para todos, abraço de camaradagem, amizade, solidariedade e saudade.
Bem hajam todos, por nos mantermos unidos num País que nos esquece e nos mal trata, mas nós não podemos esquecer, porque , bem ou mal ( à luz da História dos Povos), servimos Portugal.... a nossa Pátria.
Bem hajas tu pela iniciativa que tomaste e que tão bem guias pelo tempo que passa.
Será um grande Convívio e um grande Encontro em Pombal.
Um abraço para todos do
Martins Julião
Ex Alf Mil CCAÇ 2701
(Saltinho, Abril de 1970/Abril de 72).
_________
Notas de L.G.:
(1) Vd. posts de
23 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P981: Apresenta-se o Alf Mil Inf Martins Julião (CCAÇ 2701, Saltinho, 1970/72)
(...) "Só há pouco tempo conheci este espaço de encontro. O Paulo Santiago (Pel Caç Nat 53, Saltinho), foi o camarada responsável pela minha apresentação aos camaradas de tertúlia.Chamo-me Martins Julião, fui Alferes Miliciano de Infantaria da CCAÇ 2701 (Saltinho, Abril de 1970/Abril de 72).Hoje sou um pequeno empresário e gerente de uma unidade industrial, após mais de 20 anos como professor do Ensino Secundário" (...).
13 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1170: Memórias de um comandante de pelotão de caçadores nativos (Paulo Santiago) (2) : nhac nhac nhac nhac ou um teste de liderança
(...)"Em meados de Novembro, o Alf Mil Julião, na altura a comandar a companhia [,a CCAÇ 2701,] na ausência do Cap Clemente, em férias, chamou-me ao gabinete para me informar de um patrulhamento que teria de fazer no dia seguinte. Sairia do quartel às 05.00 em coluna auto até Cansonco, donde seguiria a pé, ladeando o rio Pulom, até encontrar o carreiro dos djilas continuando para Madina Buco. Não deveria ter problemas, era mais para me ambientar ao mato, informou-me" (...).
24 de Novembro de 2006> Guiné 63/74 - P1314: Estórias de Bissau (8): Roteiro da noite: Orion, Chez Toi, Pilão (Paulo Santiago)
(...) "O Martins Julião estava em Bissau a chefiar a comissão liquidatária da CCAÇ 2701 [, Saltinho, 170/72]: sabendo que me encontrava a bordo da Orion, apareceu no fim de jantar, ainda a tempo de beber uns uísques" (...).
13 de Janeiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1424: Memórias de um comandante de pelotão de caçadores nativos (Paulo Santiago) (6): amigos do peito da CCAÇ 2701 (Saltinho, 1970/72)
(...) "Havia depois o Alf Julião, como mais antigo, substituía o Clemente, nas ausências deste. Já é conhecido da Tertúlia, esteve na Ameira (3), e todos sabem termos uma amizade de aço, vinda dos matos da Guiné" (...).
(2) vfd. post de 15 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1177: Encontro da Ameira: foi bonita a festa, pá... A próxima será no Pombal (Luís Graça)
sexta-feira, 13 de abril de 2007
Guiné 63/74 - P1659: O Mito do Lobo Mau e as manhas do Capuchinho Vermelho do PAIGC (Vitor Junqueira)
Texto do Vitor Junqueira (Ex-Alf Mil CCAÇ 2753 , Os Barões, Bironque, K3, Mansabá, Ago 1970/ Jul 1972, residente em Pombal onde é médico):
Camarada Raúl Albino,
Acabei de ler o teu texto no Blog (1), com muito interesse, e não resisti ao impulso de acrescentar qualquer coisa da minha própria vivência como palmilhante daqueles sítios.
Começo por confirmar que, de facto, a progressão de qualquer coluna militar (apeada) naquele tipo de mata era extremamente difícil. Na maior parte das vezes, éramos mesmo obrigados a utilizar os trilhos do IN com os inerentes cuidados e perigos. Nesses trilhos ficaram muitas pernas e alguns tomates de camaradas nossos. A opção era poder ficar debaixo de fogo, encurralados sob um tecto vegetal com os corpos e equipamento enredados pelas lianas. E aí sim, eles faziam-nos a barba.
Mas se a escolha dos itinerários de aproximação era um negócio complicado que por vezes exigia horas de estudo àquele a quem calhava a fava, os trajectos de regresso ou retirada eram ainda mais difíceis de seleccionar. Aí, valia a experiência e o instinto, exclusivamente. É claro que isto era válido para a região que conhecemos, provavelmente os camaradas que trabalharam num contexto florístico diferente, teriam de fazer opções de outra natureza.
Quanto ao secretismo das operações, no meu tempo, ele nunca existiu. Em primeiro lugar, porque havia tempo que o PAIGC e as suas forças armadas possuíam um excelente serviço de rádio-escuta. Os seus especialistas desencriptavam Ordens de Operações emanadas de Rep Oper em Bissau e os comandos regionais eram alertados com a devida antecedência.
Nestes casos, acontecia o que descreves, ou seja, os caminhos que conduziam ao nosso objectivo, ficavam sob vigilância e eram muitas vezes emboscados. Depois, porque na preparação de operações da iniciativa das unidades de quadrícula, havia certos sinais impossíveis de neutralizar, que eram facilmente detectáveis por certos elementos da população. Quem não se lembra das colunas em que até à última da hora ninguém piava, e no entanto, ainda antes dos Unimog e das Berliet formarem, lá estava a tabanca inteira com a respectiva quitanda à espera de boleia?
Abordaste também a questão da fidelidade (duvidosa) de batedores ou pisteiros integrados na tua coluna. É assunto sobre o qual não tive qualquer experiência. Não existiam na minha unidade. Na dúvida, inclino-me para que fossem leais. Até porque o seu próprio coiro, corria os mesmos riscos que todos vós.
Outra coisa é a passagem de informações do seio das nossas FA para o IN. Sobre isso não tenho quaisquer dúvidas, é norma em todos os conflitos bélicos.
Para terminar, a questão do Helicanhão. Que se pronunciem os especialistas, mas enquanto tal não acontece, sempre vou adiantando, sujeito a desmentido, que estava armado com um canhão/metralhadora Browning de 20mm cujas munições dispunham de espoleta de tempos. O segundo tempo produzia os estilhaços que podiam atingir diversos níveis, por ex. o solo ou as copas das árvores, dependendo da altitude do sobrevoo.
Naturalmente que todos reconhecemos o esforço e valentia dos nossos camaradas da Força Aérea, que davam tudo por tudo para nos apoiarem em situações de aperto. Estamos-lhes gratos por isso. Infelizmente, não existem armas mágicas ou infalíveis, e todas as aeronaves têm as suas vunerabilidades. No caso dos Helicanhões, para nos apoiarem com eficiência tinham que voar a baixa altitude, o que os colocava ao alcance dos projécteis de armas ligeiras e até dos RPG. Algumas vezes ouvi o seguinte Estou a ser batido, tenho de retirar.... E não havia mais nada para ninguém.
No entanto, a [força]mítica do Lobo Mau (2) manteve-se até hoje. Em grande parte perpetuada por nós próprios, certamente devido ao conforto psicológico que nos invadia quando no horizonte avistávamos a sua silhueta, ou ouvíamos o ruído dos rotores pairando sobre as nossas cabeças, de aflitos mortais. E como mortais que somos, precisamos de mitos. Um dos mais extraordinários e bem aceites que conheço, é o que dá crédito à afirmação de que tendo perdido o domínio do espaço aéreo, com o aparecimento no teatro de operações dos mísseis Strella, perdemos militarmente a guerra!
Hei-de voltar a este assunto.
Peço-te que aceites um abraço do,
Vitor Junqueira
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Notas de L.G.:
(1) Vd. post de 13 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1658: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (4): Uma emboscada em Catora e um Lobo Mau pouco predador
(2) Observação adicional do Vitor Junqueira.: " Luís, Lobo Mau, não era alcunha, era o código de identificação e chamada do Helicanhão. Para os Fiat era Tigre, as DO eram Rajá e por aí fora".
Guiné 63/74 - P1658: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (4): Uma emboscada em Catora e um Lobo Mau pouco predador
Guiné > Região do Cacheu > Pelundo > Có > CCAÇ 2402 (1968/70) > 26 de Setembro de 1968 > Operação Adenóide > O 3º Pelotão, em bicha de pirilau, a caminho da mata de Catora (a meio, a sul da estrada Pelundo-Có).
Região do Cacheu > Pelundo > Có > CCAÇ 2402 (1968/70) > 26 de Setembro de 1968 > Operação Adenóide > As NT em deslocação a caminho do objectivo: a mata da Catora.
Quarta parte das memórias de campanha de Raul Albino, ex-alf mil da CCAÇ 2402, pertencente ao BCAÇ 2851 (Có, Mansabá, Olossato, 1968/70), que embarcou no Uíge, em finais de Julho, juntamente com o BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70) . Texto enviado em 21 de Fevereiro de 2007. As nossas desculpas ao autor pelo atraso na publicação desta IV parte (1). (LG).
Fotos: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
Operação Adenóide – Emboscada na Catora
por Raul Albino
Esta operação, realizada em 26 de Setembro de 1968, era constituída por um pequeno número de Milícias Nativos e dois grupos de combate da CCAÇ 2402. Os nativos seguiam na frente da coluna como batedores, seguindo-se o 3º pelotão e na retaguarda o outro grupo que a memória já não me permite recordar.
O objectivo da missão encontrava-se no interior da mata da Catora, considerada na altura como uma região extremamente perigosa, pela densidade da sua mata, difícil de penetrar e que, por essas razões, controlada pelo inimigo, que se movimentava dentro dela com grande à vontade devido à protecção que as características do terreno lhes dava.
A maneira mais fácil de atravessar esta mata era precisamente através do caminho estreito de terra batida que lá existia, tornando-o uma autêntica tentação para a sua travessia, em comparação com qualquer outro penoso trajecto que se tivesse coragem de utilizar. (Ver a seta).
Localização de Catora, na carta de Pelundo. Pertencia ao regulado de Có. Ficava na bacia hidrográfica do Rio Catora. afluente do Rio de Timate que, por sua vez, ia desaguar no Rio Mansoa...
Quando o passa-a-palavra era um meio de comunicação.
Como podem ver pela Figura 1 (as figuras espinhosas significam árvores e não explosões), as nossas tropas encaminhavam-se precisamente para a entrada dessa mata, conduzidas pelas milícias que na frente escolhiam o melhor caminho. O curioso é que nem os nativos propuseram qualquer outro caminho de entrada na dita mata, talvez sabendo o castigo que era percorrer os outros trilhos alternativos.
Fonte: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
Quando me apercebi dessa orientação para a entrada da mata, um sexto sentido me ia dizendo que, se eu fosse o inimigo, era nessa entrada, precisamente, que eu faria uma emboscada. Aprecei-me a fazer passar a palavra para os batedores da frente, que deveriam atravessar a caminho para o lado direito e procurar outra entrada ao longo da orla da floresta.
Em cima, tropas em deslocação para o objectivo. Para perceber melhor o meu drama, devo esclarecer que na época o único meio de comunicação que possuíamos, era um rádio carregado às costas por um soldado de transmissões que servia para o contacto com o quartel. Entre os componentes da coluna, a única forma de comunicação era o que se denominava de passa-palavra, pessoa a pessoa, até chegar ao elemento de destino, neste caso os milícias que seguiam na cabeça da coluna.
Que jeitão daria possuirmos nessa altura telemóveis para falar, para já não referir aos modernos e sofisticados sistemas de comunicação que as tropas americanas possuem nos dias de hoje. Quando me apercebi que a ordem que enviei não estava a ser cumprida e as nossas tropas continuavam a dirigir-se inexoravelmente para a boca do lobo, tive de reconhecer que efectivamente só as ordens de parar e andar funcionavam a preceito. Vai daí, dei ordem de paragem à coluna, dirigi-me pessoalmente aos nativos que seguiam na frente e expliquei-lhes o que eu pretendia.
Fonte: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
Em boa hora o fiz, porque esta minha teimosia, salvou-nos de um desastre militar bem grande. Como podem ver pela Figura 2, quando o inimigo se apercebeu da nossa manobra, iniciaram o ataque como tinham planeado, mas, agora, as nossas tropas já tinham capacidade de resposta ao fogo inimigo.
A nossa posição ainda não era a melhor porque o grupo de combate que seguia na retaguarda, ainda não tinha feito a passagem para o lado direito do caminho, daí a que a sua reacção foi praticamente nula, contudo as milícias nativas e o 3º pelotão que seguia comigo na frente colado aos milícias, conseguimos responder prontamente com todo o armamento que possuíamos.
Uma história do Lobo Mau.
Logo que o contacto com o inimigo aconteceu, foi imediatamente pedido ao quartel, via rádio, para nos ser enviado auxílio aéreo. Nesse momento, tive simultaneamente a maior alegria e maior desilusão, no respeitante a apoio aéreo. A maior alegria foi que, com grande rapidez, surgiu no ar um heli-canhão de apoio ao solo, que na altura era conhecido por Lobo Mau.
Região do Cacheu > Pelundo > Có > CCAÇ 2402 (1968/70) > 26 de Setembro de 1968 > Operação Adenóide > "om grande rapidez, surgiu no ar um heli-canhão de apoio ao solo, que na altura era conhecido por Lobo Mau"...
Foto: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
Possuía um canhão ligeiro de granadas explosivas, que disparava com uma boa cadência. A desilusão consistiu em que eu esperava que a eficiência daqueles disparos fosse maior, porque estávamos numa situação única para darmos ao inimigo uma lição forte, visto eles estarem mesmo ao alcance do helicóptero, coisa que raramente acontecia, pois quando o helicóptero ou avião de apoio chegavam, já o inimigo se tinha retirado há muito.
O resultado foi que a mata era demasiado densa, as granadas tinham fraca intensidade e o inimigo facilmente se escondia debaixo das árvores, enquanto as granadas rebentavam na copa. Mais eficiente foi o fogo de dilagrama (dispositivo de lançamento de granadas de mão defensivas) que eu próprio orientei no terreno, que se manifestou como uma excelente arma para as características da maior parte dos terrenos onde as nossas tropas se movimentavam.
Região do Cacheu > Pelundo > Có > CCAÇ 2402 (1968/70) > Uma dilagrama na ponta da espingarada G-3
Foto: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
A partir daí passei sempre a andar com um militar munido de dilagramas perto de mim. Teoricamente esse militar funcionava como o meu guarda-costas, mas, na prática, eu é que era o guarda-costas dele, porque um militar com este tipo de arma, não se podia defender nem a ele próprio quando alguma luta corpo-a-corpo ou de grande proximidade tinha lugar.
Agora teremos de reconhecer que, se bem que a eficiência de tiro do helicanhão não fosse satisfatória, a sua influência dissuasiva com os disparos aéreos, foi mais que suficiente para meter o inimigo em fuga com algumas baixas e abandono de material. Para nosso desespero os ferimentos só eram detectados pelo sangue no solo, que denunciava a consequência do nosso fogo. O inimigo tinha uma preocupação extrema em não deixar ficar para trás qualquer ferido, retirando assim às nossas tropas a hipótese de quantificar o número de baixas causadas.
Perguntas sem resposta
Análise militar a este contacto com o IN. Perguntas que me ficaram sem resposta.
(i) O que fazia um grupo IN emboscado naquele local à espera das nossas tropas? Coincidência? Não acredito… Eles tinham sempre alvos estáticos (ex.: quartéis) ou móveis de sentido garantido (ex.: colunas de viaturas de reabastecimento), porque estariam ali em espera pela hipótese remota das NT por lá passarem? Ou tiveram informação prévia? Neste caso como teria sido feita a transmissão? Por estafeta? Por rádio? Só souberam da operação à saída das tropas do quartel, ou souberam mesmo antes de eu ter conhecimento dela?
Nisto o Cap Vargas Cardoso [, comandante da CCAÇ 27102,] era rigoroso. Só informava os operacionais uma ou duas horas antes da saída. A única excepção era o serviço de alimentação e por consequência o seu pessoal da cozinha (com nativos na equipa – ver foto em baixo), que era informado mais cedo para ter prontas as rações de combate e o café matinal nas saídas de madrugada, como era o caso, no entanto, eles saberiam que íamos sair e qual a hora, mas nunca o objectivo.
O que me faz matutar nisto é que este estilo de emboscada do IN era perfeitamente normal nas NT que as faziam amiúde nos arredores dos aquartelamentos como medida preventiva contra ataques aos quartéis, ou ao longo do itinerário das colunas de viaturas de abastecimento. Parecia que, por razão desconhecida, as coisas estavam invertidas. Ou estariam eles a proteger alguma coisa verdadeiramente importante ao ponto de recorrerem a uma emboscada preventiva à boa maneira das nossas tropas?
Região do Cacheu > Pelundo > Có > CCAÇ 2402 (1968/70) > O pessoal de cozinha incluía civis cuja lealdade às NT era controversa...
Foto: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
(ii) A prontidão no aparecimento do heli-canhão Lobo Mau. O heli-canhão devia estar bem perto do local da emboscada, para se apresentar tão prontamente em nosso auxílio, num tempo que considerei recorde e me deixou deveras espantado. Qual seria a missão do heli-canhão para estar a sobrevoar aquelas redondezas? Estaria a procurar precisamente aquilo que o IN queria proteger com a emboscada que fez às NT?
(iii) A persistência dos guias nativos em nos conduzir ao ponto da emboscada. Na altura entendi que eles estavam simplesmente a escolher o percurso mais fácil e directo para o local de objectivo das NT. Mas, seria mesmo isso?
Creio que estas dúvidas nunca chegarão a ter resposta. Só o inimigo de outrora as poderia tirar e esses, possivelmente, já nem estarão vivos.
________
Nota de L.G.:
(1) Vd. post anteriores:
15 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1282: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (1): duas baixas de vulto, Beja Santos e Medeiros Ferreira
6 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1343: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (2): O primeiro ataque ao quartel de Có, os primeiros revezes do IN
12 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1516: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (3): Combatentes, trolhas e formigas bagabaga
Região do Cacheu > Pelundo > Có > CCAÇ 2402 (1968/70) > 26 de Setembro de 1968 > Operação Adenóide > As NT em deslocação a caminho do objectivo: a mata da Catora.
Quarta parte das memórias de campanha de Raul Albino, ex-alf mil da CCAÇ 2402, pertencente ao BCAÇ 2851 (Có, Mansabá, Olossato, 1968/70), que embarcou no Uíge, em finais de Julho, juntamente com o BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70) . Texto enviado em 21 de Fevereiro de 2007. As nossas desculpas ao autor pelo atraso na publicação desta IV parte (1). (LG).
Fotos: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
Operação Adenóide – Emboscada na Catora
por Raul Albino
Esta operação, realizada em 26 de Setembro de 1968, era constituída por um pequeno número de Milícias Nativos e dois grupos de combate da CCAÇ 2402. Os nativos seguiam na frente da coluna como batedores, seguindo-se o 3º pelotão e na retaguarda o outro grupo que a memória já não me permite recordar.
O objectivo da missão encontrava-se no interior da mata da Catora, considerada na altura como uma região extremamente perigosa, pela densidade da sua mata, difícil de penetrar e que, por essas razões, controlada pelo inimigo, que se movimentava dentro dela com grande à vontade devido à protecção que as características do terreno lhes dava.
A maneira mais fácil de atravessar esta mata era precisamente através do caminho estreito de terra batida que lá existia, tornando-o uma autêntica tentação para a sua travessia, em comparação com qualquer outro penoso trajecto que se tivesse coragem de utilizar. (Ver a seta).
Localização de Catora, na carta de Pelundo. Pertencia ao regulado de Có. Ficava na bacia hidrográfica do Rio Catora. afluente do Rio de Timate que, por sua vez, ia desaguar no Rio Mansoa...
Quando o passa-a-palavra era um meio de comunicação.
Como podem ver pela Figura 1 (as figuras espinhosas significam árvores e não explosões), as nossas tropas encaminhavam-se precisamente para a entrada dessa mata, conduzidas pelas milícias que na frente escolhiam o melhor caminho. O curioso é que nem os nativos propuseram qualquer outro caminho de entrada na dita mata, talvez sabendo o castigo que era percorrer os outros trilhos alternativos.
Fonte: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
Quando me apercebi dessa orientação para a entrada da mata, um sexto sentido me ia dizendo que, se eu fosse o inimigo, era nessa entrada, precisamente, que eu faria uma emboscada. Aprecei-me a fazer passar a palavra para os batedores da frente, que deveriam atravessar a caminho para o lado direito e procurar outra entrada ao longo da orla da floresta.
Em cima, tropas em deslocação para o objectivo. Para perceber melhor o meu drama, devo esclarecer que na época o único meio de comunicação que possuíamos, era um rádio carregado às costas por um soldado de transmissões que servia para o contacto com o quartel. Entre os componentes da coluna, a única forma de comunicação era o que se denominava de passa-palavra, pessoa a pessoa, até chegar ao elemento de destino, neste caso os milícias que seguiam na cabeça da coluna.
Que jeitão daria possuirmos nessa altura telemóveis para falar, para já não referir aos modernos e sofisticados sistemas de comunicação que as tropas americanas possuem nos dias de hoje. Quando me apercebi que a ordem que enviei não estava a ser cumprida e as nossas tropas continuavam a dirigir-se inexoravelmente para a boca do lobo, tive de reconhecer que efectivamente só as ordens de parar e andar funcionavam a preceito. Vai daí, dei ordem de paragem à coluna, dirigi-me pessoalmente aos nativos que seguiam na frente e expliquei-lhes o que eu pretendia.
Fonte: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
Em boa hora o fiz, porque esta minha teimosia, salvou-nos de um desastre militar bem grande. Como podem ver pela Figura 2, quando o inimigo se apercebeu da nossa manobra, iniciaram o ataque como tinham planeado, mas, agora, as nossas tropas já tinham capacidade de resposta ao fogo inimigo.
A nossa posição ainda não era a melhor porque o grupo de combate que seguia na retaguarda, ainda não tinha feito a passagem para o lado direito do caminho, daí a que a sua reacção foi praticamente nula, contudo as milícias nativas e o 3º pelotão que seguia comigo na frente colado aos milícias, conseguimos responder prontamente com todo o armamento que possuíamos.
Uma história do Lobo Mau.
Logo que o contacto com o inimigo aconteceu, foi imediatamente pedido ao quartel, via rádio, para nos ser enviado auxílio aéreo. Nesse momento, tive simultaneamente a maior alegria e maior desilusão, no respeitante a apoio aéreo. A maior alegria foi que, com grande rapidez, surgiu no ar um heli-canhão de apoio ao solo, que na altura era conhecido por Lobo Mau.
Região do Cacheu > Pelundo > Có > CCAÇ 2402 (1968/70) > 26 de Setembro de 1968 > Operação Adenóide > "om grande rapidez, surgiu no ar um heli-canhão de apoio ao solo, que na altura era conhecido por Lobo Mau"...
Foto: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
Possuía um canhão ligeiro de granadas explosivas, que disparava com uma boa cadência. A desilusão consistiu em que eu esperava que a eficiência daqueles disparos fosse maior, porque estávamos numa situação única para darmos ao inimigo uma lição forte, visto eles estarem mesmo ao alcance do helicóptero, coisa que raramente acontecia, pois quando o helicóptero ou avião de apoio chegavam, já o inimigo se tinha retirado há muito.
O resultado foi que a mata era demasiado densa, as granadas tinham fraca intensidade e o inimigo facilmente se escondia debaixo das árvores, enquanto as granadas rebentavam na copa. Mais eficiente foi o fogo de dilagrama (dispositivo de lançamento de granadas de mão defensivas) que eu próprio orientei no terreno, que se manifestou como uma excelente arma para as características da maior parte dos terrenos onde as nossas tropas se movimentavam.
Região do Cacheu > Pelundo > Có > CCAÇ 2402 (1968/70) > Uma dilagrama na ponta da espingarada G-3
Foto: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
A partir daí passei sempre a andar com um militar munido de dilagramas perto de mim. Teoricamente esse militar funcionava como o meu guarda-costas, mas, na prática, eu é que era o guarda-costas dele, porque um militar com este tipo de arma, não se podia defender nem a ele próprio quando alguma luta corpo-a-corpo ou de grande proximidade tinha lugar.
Agora teremos de reconhecer que, se bem que a eficiência de tiro do helicanhão não fosse satisfatória, a sua influência dissuasiva com os disparos aéreos, foi mais que suficiente para meter o inimigo em fuga com algumas baixas e abandono de material. Para nosso desespero os ferimentos só eram detectados pelo sangue no solo, que denunciava a consequência do nosso fogo. O inimigo tinha uma preocupação extrema em não deixar ficar para trás qualquer ferido, retirando assim às nossas tropas a hipótese de quantificar o número de baixas causadas.
Perguntas sem resposta
Análise militar a este contacto com o IN. Perguntas que me ficaram sem resposta.
(i) O que fazia um grupo IN emboscado naquele local à espera das nossas tropas? Coincidência? Não acredito… Eles tinham sempre alvos estáticos (ex.: quartéis) ou móveis de sentido garantido (ex.: colunas de viaturas de reabastecimento), porque estariam ali em espera pela hipótese remota das NT por lá passarem? Ou tiveram informação prévia? Neste caso como teria sido feita a transmissão? Por estafeta? Por rádio? Só souberam da operação à saída das tropas do quartel, ou souberam mesmo antes de eu ter conhecimento dela?
Nisto o Cap Vargas Cardoso [, comandante da CCAÇ 27102,] era rigoroso. Só informava os operacionais uma ou duas horas antes da saída. A única excepção era o serviço de alimentação e por consequência o seu pessoal da cozinha (com nativos na equipa – ver foto em baixo), que era informado mais cedo para ter prontas as rações de combate e o café matinal nas saídas de madrugada, como era o caso, no entanto, eles saberiam que íamos sair e qual a hora, mas nunca o objectivo.
O que me faz matutar nisto é que este estilo de emboscada do IN era perfeitamente normal nas NT que as faziam amiúde nos arredores dos aquartelamentos como medida preventiva contra ataques aos quartéis, ou ao longo do itinerário das colunas de viaturas de abastecimento. Parecia que, por razão desconhecida, as coisas estavam invertidas. Ou estariam eles a proteger alguma coisa verdadeiramente importante ao ponto de recorrerem a uma emboscada preventiva à boa maneira das nossas tropas?
Região do Cacheu > Pelundo > Có > CCAÇ 2402 (1968/70) > O pessoal de cozinha incluía civis cuja lealdade às NT era controversa...
Foto: © Raul Albino (2007). Direitos reservados.
(ii) A prontidão no aparecimento do heli-canhão Lobo Mau. O heli-canhão devia estar bem perto do local da emboscada, para se apresentar tão prontamente em nosso auxílio, num tempo que considerei recorde e me deixou deveras espantado. Qual seria a missão do heli-canhão para estar a sobrevoar aquelas redondezas? Estaria a procurar precisamente aquilo que o IN queria proteger com a emboscada que fez às NT?
(iii) A persistência dos guias nativos em nos conduzir ao ponto da emboscada. Na altura entendi que eles estavam simplesmente a escolher o percurso mais fácil e directo para o local de objectivo das NT. Mas, seria mesmo isso?
Creio que estas dúvidas nunca chegarão a ter resposta. Só o inimigo de outrora as poderia tirar e esses, possivelmente, já nem estarão vivos.
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Nota de L.G.:
(1) Vd. post anteriores:
15 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1282: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (1): duas baixas de vulto, Beja Santos e Medeiros Ferreira
6 de Dezembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1343: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (2): O primeiro ataque ao quartel de Có, os primeiros revezes do IN
12 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1516: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (3): Combatentes, trolhas e formigas bagabaga
Guiné 63/74 - P1657: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (41): Cartas de além-mar em África para aquém-mar em Portugal (3)
41ª Parte da série Operação Macaréu à Vista, da autoria de Beja Santos (ex-alf mil, comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) (1). Texto enviado em 19 de Março de 2007.
Cartas de um militar além-mar em África para aquém em Portugal(3º e última parte)
por Beja Santos
Carta para o Paulo Simões da Costa
Meu estimado Paulo
Recebi a tua carta a caminho de Nampula. Espero que na secretaria tenhas uma existência agradável e nas horas vagas possas apreciar as beleza naturais, que me dizem ser assombrosas. O fotógrafo Luís Soares, que trabalhou com o meu pai, ofereceu-me uma fotografia da ilha de Moçambique que me deixou sem fala.
Por aqui vivemos um período de grandes dificuldades, a reconstruir Missirá, bem afectada por um ataque que incendiou metade das moranças civis. Felizmente que tem sido possível conciliar as obrigações inadiáveis dos nossos patrulhamentos diários com a reconstrução. Tenho muito orgulho nos meus soldados que prescindem férias e descanso.
Dentro em breve irá para Moçambique o Carlos Sampaio, seguramente mobilizado para um teatro de operações. Como tu gostas muito do Malraux (sobretudo o estudioso da arte) quero informar-te que vai seguir pelo correio um livrinho da colecção Miniatura, dos Livros do Brasil, que me surpreendeu pela alta qualidade literária, quando ele tinha a nossa idade. Tu vais ler diálogos imaginados entre um francês possídor de conhecimentos de obras chinesas que troca correspondência com um chinês, fascinado pela cultura ocidental.
Para te despertar a curiosidade, aqui vão algumas passagens. Escreve Ling: "O artista não é aquele que cria mas aquele que sente... o tempo para vós é aquuilo que fazeis dele e nós somos o que ele faz de nós". O correspondente francês procura sensibilizá-lo coma a ideia de nação, o sentido da alma ocidental, as fontes da vida imaginária e o génio europeu. O chinês contrapõe e esclarece a diferença que separa as duas sensibilidades: "Se sonhamos é apenas para pedir aos nossos sonhos a sabedoria que nos recusa a vida. O sonho do chinês não é povoado de imagens, ele não vê nem velhas conquistas nem a glória, mas a possibilidade de apreciar tudo com perfeição, de não se prender ao efémero".
Quando o francês procura esclarecer o chinês acerca das experiências artísticas, fazendo coincidir a história da Europa com a história da sua arte, ele responde: "Para o pensador do Extremo Oriente, o único conhecimento digno de ser adquirido é o do universo. O mundo é o resultado da oposição de dois ritmos que penetram todas as coisas existentes. O seu equlíbrio absoluto seria o nada; toda a criação procede da sua ruptura e implica necessariamente a diferença".
Dou comigo às vezes a pensar nestes labirintos silenciosos onde nos encontramos e ficamos em diálogo como amigos de longa data. Olha a curiosidade: a 11 de Abril de 67, almocei em minha casa com o Carlos Sampaio e a minha mãe. O Carlos levou-me à estação, entregou-me livros, prometemo mantermo-nos em contacto. A seguir apanho o comboio e conheci-te e aqui estamos. Desejo do coração que tudo corra bem contigo e que me ajudes nos momentos mais difíceis e me encorajes a resistir a esta dura canseira. Fica com muita estima.
Carta para José Carlos Megre
Meu caro Zé Carlos
Recebi a tua carta com a revista em que publicaste um poema meu. Tenho muitas saudades do tempo em que na Av da República, 84, 4º, confeccionávamos com o Pedro Roseta e o Barata Moura o nosso Encontro. Tu empurraste-me para as críticas de cinema e teatro, ensinaste-me as manhas para enganarmos a censura, deste-me a conhecer Mounier, aprendi contigo o que era o catolicismo de vanguarda e a importância de muitos títulos da Moraes Editora.
Não te quero deixar sem uma compensação. Imagina tu que antes de ir para a Guiné um amigo me ofereceu um livro da Simone Weil, autora que eu desconhecia, com uma temática extremamente arrojada: uma crente que está nos umbrais da fé, que se sente chamda por Cristo, mas que ainda não pode ultrapassar o silêncio. Vou mandar-te o livro, logo que ele esteja bem digerido. A Simone Weil, militante da Extrema Esquerda que por ser judia é forçada a abandonar a França e conhece exílios na América e em Londres, onde morre precocemente. O livro chama-se Attente de Dieu e é constituído por cartas que envia a um religioso. O que pasma é a sua extrema sinceridade, a sua força espiritual e o conhecimento do cristianismo. Ela aproxima-se da Igreja, mas está cheia de dúvidas.
Dou-te só dois pequenos exemplos da beleza desta escrita: "A infelicidade está verdadeiramente no centro do cristianismo. Amar a Deus ou amar o próximo passa pela infelicidade. Não podemos amar a Deus senão olhando a Cruz". E mais adiante: "No amor verdadeiro, não somos nós que amamos os infelizes em Deus, é Deus em nós que ama os infelizes. Quando estamos mergulhados na infelicidade, é Deus em nós que ama aqueles que nos querem bem". Aqui, neste ponto ermo, esta espera de Deus veio em meu auxílio. Espero que aprecies esta grande senhora que foi professora de filosofia e que quis combater na Guerra Civil de Espanha, uma agnóstica que um dia confessou: "Cristo desceu e tomou-me".
Zé Carlos, tomei a decisão de não voltar a publicar poemas, não sou poeta, o que escrevo é uma xaropada, há que ter respeito por quem paga jornais e revistas. Acresce que o que me vai na alma muitas vezes é tão doloroso que receio confundir a conjuntura com o sentimento definitivo. O que escrever vou guardar, sem quaisquer compromissos. Sempre que puderes, manda-me os jornais para eu ter saudades do ideal e da alegria com que colaborava no nosso jornal E escreve-me sempre pois um dia esta guerra vai acabar e tu vais ajudar-me a recomeçar. Obrigado por tudo.
Carta para Cristina Allen
Meu Adorado Amor
Chegaram ontem duas cartinhas tuas. Agradeço-te as visitas que fizeste ao Fodé e ao Paulo, isto quando estás a fazer frequências. Antes de falar do que tem aqui acontecido, quero dizer-te que o teu antigo professor de Expansão Portuguesa, o Teixeira da Mota, fez de mim seu ajudante para confirmar alguns dados. Penso que ele anda a preparar seja um livro acerca do Teixeira Pinto, seja sobre as guerras da pacificação da Guiné, assim que lhe disse que estava vivo o último filho do régulo Infali Soncó, logo me mandou uma bateria de perguntas acerca desse lendário guerreiro que derrotou o Teixeira Pinto nas guerras do Oio.
Recolhi o depoimento de Alage Soaré Soncó com o auxílio do Benjamim Lopes da Costa e do principe Samba, que dominam perfeitamente o mandinga. Não te vou prender com o relato destas peripécias, ele foi amado e condecorado pelas autoridades portuguesas que mais tarde traiu sem piedade. O que gostei mais no relato deste Alage Soncó foi uma história passada em 1915 em que o Governador, que na altura vivia em Bolama, então a capital, se deslocou aos regulados do Leste da Guiné, onde se deu um grave incidente.
Infali saiu de Sansão (aqui ao pé de Missirá) acompanhado por músicos em sinal de boas vindas. Foi tal a algazarra dos músicos e o avanço de uma multidão a correr para o séquito do Governador que um alferes, desconhecedor do significado daquela fanfarra, mandou disparar, dando origem ao cerco dos portugueses pela gente de Inafali.
Foi preso um alferes, dois sargentos e catorze praças, que ficaram reféns, enquanto o Governador se punha em fuga. Começaram as hostilidades e um pouco á semelhança do que se passa hoje, começaram os ataques do Geba. Entretanto, o alferes, que vivia perto aqui de nós, em Aldeia do Cuor, apaixonou-se por uma linda negra de nome Cumba Mané. Como numa ópera ou numa tragédia literária, assim que vieram resgatar o alferes, este suicidou-se, há quem diga por insanidade mental, há quem diga que por um grande amor pela Cumba, que ele não queria abandonar (2). O que aqui te escrevo, juro-te que me foi contado e transmiti ao Comandante Teixeira da Mota.
Informo-te que já chegaram camas, lençóis e fronhas para substituir tudo o que foi devorado pelo fogo. Como as obras se vão prolongar por mais um mês e meio, como as casas ainda estão em construção, não é possível viver de outra maneira de que atamancados nos abrigos, à espera de dias melhores.
Dois meninos meus amigos vieram visitar-me, o Mazaqueu e o Abudu Cassamá. Prometi-lhes material escolar e roupa nova no mercado de Bambadinca. Espero dentro de dias passar uma semana em Finete, a dar apoio ao novo Comandante, Bacari Soncó. Vamos fazer um telheiro para as mulheres do chefe de tabanca, instalações sanitárias e dois abrigos.
Como tu achas graça às trivialidades, segue-se mais uma . Através da confidencial 1704/01/69, o Batalhão de Engenharia mandou-nos uma agradável mensagem: "Motoserra segue hoje via barco. Fica como material carga". Um mês depois do ataque a Missirá chegam as malditas chuvas e imprevistos tornados. Tenho casas alagadas, o tecto da casa de Uam Sambu andou pelos ares e veio cair na parada.
Bambadinca informou-me ter dado apoio às propostas para condecoração de três bravos soldados, Cherno Suane, Mamadu Djau e Mamadu Camará. O Almeida e o pelotão 63, que estão em Bambadinca, passaram um mau bocado numa emboscada na zona do Xime, foi uma duríssima hora debaixo de fogo em que foi preciso a aviação vir tirar do apuro e mesmo assim teve três soldados estilhaçados com gravidade.
Deixo boas e más notícias para o fim. Chegou o Casanova que me entregou o Chopin interpretado por Samson François (prelúdios) e por Vladimir Ashkenazy (os dois concertos). Não sei como te hei-de agradecer bem como aos teus pais. Volto a andar sem dinheiro, já tenho idade para resistir a certos impulsos mas apareceu aqui o soldado Sadjo Seidi em pranto com as dívidas do pai que ameaça matar-se se não paga as dívidas e passei-lhe para as mãos os meus últimos 500 escudos...
E logo o Sadjo me perguntou se para o mês que vem lhe posso emprestar dinheiro para comprar nova mulher já que a primeira fugiu com o outro que vive na povoação de Geba. Como te recordas, palmaram-me 1500 escudos que deixara em cima da mesa, ainda não estou recomposto com a violência desta agressão e aproveitei para dizer aos soldados quando nos reunimos que há bandidos que nos queimam as casas e há outros que nos roubam sossegadamente dentro delas. Mudando de assunto, o Djaló Indjai escreveu-me, já está a restabelecer-se e vai contactar-te.
Estou a ler Espera de Deus de Simone Weil. Desculpa hoje não te falar da obra, tal o cansaço. Amanhã quem vai de manhã cedo a Mato de Cão é o Casanova, temos os cibes cortados e quero estar presente na montagem do forro dos abrigos, onde depois metemos cimento dentro e por cima da chapa zincada. Mas este livro tocou-me tão profundamente que resolvi escrevinhar um textinho que é só para ti:
Caminhada
Tu és a minha companhia da viagem.
Quando a minha memória se povoa de pássaros cegos,
quando uma melodia de sal me traz à lembrança o cerco destas bolanhas,
onde os lótus frutificam dentro da água de arroz, insensíveis aos vermes,
tu vens na confidência das línguas de fogo,
tu vences esta solidão que se evapora nos alto fornos
resgatando a esperança
que está imobilizada na estrada acima do rio
para onde vou partir a pensar em ti
e na tua coragem textual.
Tu és a minha companheira de viagem.
Por isso, antes de partir
falo silenciosamente no açude dos tímpanos
e quero que saibas: é fausto este amor, é um concerto polar
este amar.
Graças a ti, há todo o sentido em esquecer estes pingos da noite, conferindo direito de nos ocupares a sombra
neste gigante equatorial de matas que se sucedem,
aguardando a tua mensagem.
Tu és o sentido da caminhada.
Este textinho é um arremedo poético que não mostrarás a ninguém. Quanto à má notícia, as mulheres dos soldados e milícias foram até à fonte de Cancumba e quando estavam a espalhar a roupa a corar explodiu uma daquelas armadilhas que o Reis montou à volta. A mulher do soldado Dauda Seidi teve que ser evacuada com o peito todo estilhaçado. Vou trazer o Reis em breve, já não aguento estes sobressaltos. Desculpa, agora vou mesmo dormir. Recebe todo o meu amor e escreve-me depressa.
___________
Notas de L.G.
(1) Vd. último post desta série > 30 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1637: Operação Macaréu à Vista (Beja Santos) (40): Cartas de além-mar em África para aquém-mar em Portugal (2)
(2) Vd. post de 18 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P882: Infali Soncó e a lenda do Alferes Hermínio (Beja Santos)
Guiné 63/74 - P1656: 2º encontro da nossa tertúlia, Pombal, 28 de Abril de 2007: lista de inscrições (Vitor Junqueira / Carlos Marques dos Santos)
Actualização da lista de inscritos para o nosso almoço de convívio, no Restaurante Manjar do Marquês, em Pombal, no dia 28 de Abril de 2007 (1)...
Como vêem, a mesa vai-se comendo. Já temos quase 6 dezenas de comensais, devendo-se ultrapassar assim o nº de presenças do nosso primeiro encontro, na Herdade da Ameira, Ameira, Montemor-o-Novo (2)
Nome (entre parênteses, o nº de comensais e a ementa escolhida: A ou B) (1)
A. GRAÇA DE ABREU (1A)
A. MARQUES LOPES (3B)
ALBANO COSTA (1A)
ANTÓNIO BAIA (2B)
ANTÓNIO DUARTE (1A ou B)
ANTÓNIO FIGUEIREDO PINTO (2A)
ANTÓNIO SANTOS (2B)
BENJAMIM DURÃES (1B)
CARLOS MARQUES SANTOS (2B)
CARLOS OLIVEIRA SANTOS (1A ou B)
CARLOS VINHAL (2B)
CONSTANTINO (ou TINO) NEVES (2A ou B)
DAVID GUIMARÃES (2B)
FERNANDO CHAPOUTO (2B)
FERNANDO FRANCO (2B)
HÉLDER SOUSA (*)
HUGO MOURA FERREIRA (2A ou B)
HUMBERTO REIS (2A)
IDÁLIO REIS (1A)
J. L. VACAS DE CARVALHO (1A ou B)
JOAQUIM MEXIA ALVES (1A)
JOSÉ A. F. ALMEIDA (1A)
JOSÉ BASTOS (1A)
JOSÉ CASIMIRO CARVALHO (1A ou B)
JOSÉ GANCHO (2B)
JOSÉ M. MARTINS (2A)
LUÍS GRAÇA (2A)
LUÍS RODRIGUES C. MOREIRA (1B)
MANUEL LEMA SANTOS (2B)
MÁRIO BEJA SANTOS (1A ou B)
PAULO SANTIAGO (2A ou B)
RUI ALEXANDRINO FERREIRA (1A ou B)
SOUSA DE CASTRO (2A)
VIRGÍNIO A. BRIOTE (2A)
VITOR BARATA (2A ou B)
VITOR TAVARES (1A ou B)
VITOR BARATA (1A ou B)
(*) Dados a completar.
__________
Notas de L.G.:
(1) Vd. posts de:
9 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1649: 2º Encontro da nossa tertúlia: Pombal, Restaurante Manjar do Marquês, 28 de Abril de 2007 (Vitor Junqueira / Luís Graça)
10 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1650: Tod@s a Pombal, 28 de Abril de 2007 (Vitor Junqueira / Carlos Marques dos Santos / Luís Graça)
(2) Vd. post de 15 de Outubro de 2006 > 15 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1177: Encontro da Ameira: foi bonita a festa, pá... A próxima será em Pombal (Luís Graça)
Como vêem, a mesa vai-se comendo. Já temos quase 6 dezenas de comensais, devendo-se ultrapassar assim o nº de presenças do nosso primeiro encontro, na Herdade da Ameira, Ameira, Montemor-o-Novo (2)
Nome (entre parênteses, o nº de comensais e a ementa escolhida: A ou B) (1)
A. GRAÇA DE ABREU (1A)
A. MARQUES LOPES (3B)
ALBANO COSTA (1A)
ANTÓNIO BAIA (2B)
ANTÓNIO DUARTE (1A ou B)
ANTÓNIO FIGUEIREDO PINTO (2A)
ANTÓNIO SANTOS (2B)
BENJAMIM DURÃES (1B)
CARLOS MARQUES SANTOS (2B)
CARLOS OLIVEIRA SANTOS (1A ou B)
CARLOS VINHAL (2B)
CONSTANTINO (ou TINO) NEVES (2A ou B)
DAVID GUIMARÃES (2B)
FERNANDO CHAPOUTO (2B)
FERNANDO FRANCO (2B)
HÉLDER SOUSA (*)
HUGO MOURA FERREIRA (2A ou B)
HUMBERTO REIS (2A)
IDÁLIO REIS (1A)
J. L. VACAS DE CARVALHO (1A ou B)
JOAQUIM MEXIA ALVES (1A)
JOSÉ A. F. ALMEIDA (1A)
JOSÉ BASTOS (1A)
JOSÉ CASIMIRO CARVALHO (1A ou B)
JOSÉ GANCHO (2B)
JOSÉ M. MARTINS (2A)
LUÍS GRAÇA (2A)
LUÍS RODRIGUES C. MOREIRA (1B)
MANUEL LEMA SANTOS (2B)
MÁRIO BEJA SANTOS (1A ou B)
PAULO SANTIAGO (2A ou B)
RUI ALEXANDRINO FERREIRA (1A ou B)
SOUSA DE CASTRO (2A)
VIRGÍNIO A. BRIOTE (2A)
VITOR BARATA (2A ou B)
VITOR TAVARES (1A ou B)
VITOR BARATA (1A ou B)
(*) Dados a completar.
__________
Notas de L.G.:
(1) Vd. posts de:
9 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1649: 2º Encontro da nossa tertúlia: Pombal, Restaurante Manjar do Marquês, 28 de Abril de 2007 (Vitor Junqueira / Luís Graça)
10 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1650: Tod@s a Pombal, 28 de Abril de 2007 (Vitor Junqueira / Carlos Marques dos Santos / Luís Graça)
(2) Vd. post de 15 de Outubro de 2006 > 15 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1177: Encontro da Ameira: foi bonita a festa, pá... A próxima será em Pombal (Luís Graça)
quinta-feira, 12 de abril de 2007
Guiné 63/74 - P1655: Tabanca Grande (6): José Armando F. Almeida, ex-Fur Mil Trms (Bambadinca, CCS/BART 2917, 1970/72)
Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > CCS do BART 2917 (1970/72) > O Furriel Miliciano de Transmissões Almeida, que acaba de pedir a sua adesão à nossa tertúlia. Privou com a malta da CCAÇ 12 desde meados de 1970 a Março de 1971.
Foto actual do José Armando Ferreira Almeida, o ex-Fur Mil Trms da CCS do BART 2917 (1970/72), 60 anos, aposentado da PT, onde trabalhou na Direcção de Aveiro, na área da Gestão de Recursos Humanos. Casado, com uma filha, reside em Albergaria-A-Velha (1).
Fotos: © José Armando (2007). Direitos reservados.
Mensagem do José Armando (Almeida), com data de 4 de Abril de 2007:
Amigo e Camarada Luís Graça (Henriques):
Desde há algum tempo, tenho vindo a seguir com profundo interesse e emoção o que vai sendo escrito e documentado neste espaço de opinião e partilha, num verdadeiro espírito de sã camaradagem e amizade.
Para ti, desde já, os meus agradecimentos e admiração pela iniciativa que em devido tempo felizmente promoveste e em que continuas esforçadamente empenhado, agora com a colaboração dos restantes tertulianos.
Pois também eu, ex-Fur Mil de Transmissões Almeida, da CCS/BART 2917 (1), que partilhei contigo, então Henriques, e com o Levezinho, o Reis, o Moreira, o Rodrigues, o Fernandes, o Branquinho, para só falar de alguns da CCAÇ 12, do mesmo espaço em Bambadinca, gostaria de ser admitido na Tertúlia, agora também com a certeza - e já não só uma esperança - de poder voltar a reencontrar, se não todos, pelo menos alguns dos velhos - de mais de 35 anos - camaradas e amigos.
Teremos, certamente, oportunidade noutras ocasiões para falar de alguns aspectos mais particulares. De qualquer modo, aí vão alguns, à laia de curriculum:
Já estou aposentado da PT, onde trabalhei na Direcção de Aveiro - é verdade, já fiz 60 anos !... fui responsável na área dos Recursos Humanos, sou casado e tenho uma filha, já licenciada em Design.
E por agora, fiquemos por aqui que a prosa já vai adiantada!
Até breve, e um abraço amigo para todos os camaradas tertulianos do
Zé Armando (Almeida)
Comentário de L.G.:
Almeida: Reconheci-te logo pela foto, apesar de tantos anos já passados. É uma alegria ver-se alargar o círculo de camaradas de Bambadinca. Da tua CCS só cá tínhamos, até agora, o Luís Moreira - o vosso alferes miliciano sapador, ferido em mina anticarro, à saída de Nhabijões, a 13 de Janeiro de 1971, e evacuado para Bissau - (2), o Benjamim Durães (3) e o Abílio Machado (4), para além do David Guimarães (que pertencia à CART 2716, sedeada no Xitole, e que é um dos camaradas mais antigos desta terúlia).
Pois muito bem, faz como dantes, na nossa saudosa messe e bar de sargentos em Bambadinca: entra, acomoda-te e... paga um copo à gente! O mesmo é dizer, que fico/ficamos à espera das tuas estórias.
Um grande abraço do... Henriques.
__________
Notas de L.G.:
(1) Vd. posts de
15 de Fevereiro de 2007 > Guiné 63/74 - P1527: Lista de ex-militares da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72) e unidades adidas (Benjamim Durães)
1 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1556: 1º Convívio da CCS do BART 2917: Setúbal, 9 de Junho de 2007 (Benjamim Durães)
(2) Vd. posts de:
23 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCIX: Luís Moreira, de alferes sapador a professor de matemática
23 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCV: 1 morto e 6 feridos graves aos 20 meses (CCAÇ 12, Janeiro de 1971)
(3) Vd. post de 21 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1618: Tertúlia: Benjamim Durães, ex-furriel mil da CCS do BART 2917 (Bambadinca, 1970/72)
(4) 29 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1635: Amigos, enquando vos escrevo, bebo um Porto velho à nossa saúde (Abílio Machado, CCS do BART 2917, Bambadinca, 1970/72)
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