Blogue coletivo, criado e editado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra col0onial, em geral, e da Guiné, em particular (1961/74). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que sáo, tratam-se por tu, e gostam de dizer: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande. Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quarta-feira, 20 de maio de 2009
Guiné 63/74 - P4388: As nossas mulheres (8): De um gigante com coração de passarinho para a Ti Pedrosa, com ternura (Joaquim Mexia Alves)
Caros Carlos e Luís:
Anexo um texto saído da fragilidade deste "gigante com coração de passarinho", como um dia me chamaram. Fica à vossa disposição para fazerdes dele o que quiserdes, porque a mim já me encheu a vida tê-lo escrito!
Abraço camarigo do Joaquim Mexia Alves
Comentário de L.G.:
Joaquim: Agora é que me tramaste!... Que raio de género literário é este ? E em que série é que eu vou encaixar-te, com esse tamanhão todo ? Conto, poesia, blogpoesia, prosa poética, memorialística ? História de vida, estórias avulsas, blogoterapia, as nossas mulheres ?
Opto por esta série (*), onde caibem as nossas mulheres, todas as nossas mulheres, mães, madrinhas, tias, amas, criadas, avós, irmãs, sobrinhas, primas... mas também madrinhas de guerra, namoradas, noivas, esposas, amantes... Todas elas, de uma maneira ou de outra, foram nossos anjos da guarda, que velaram, rezaram, suspiraram, sofreram por nós... Que nos apaparicaram, que nos desejaram, que nos amaram, que nos ajudaram a voltar ao mundo dos vivos, aos lugares seguros da nossa infância, ou então a trilhar outros caminhos, os do futuro...
Como te fica bem, meu gigante com coração de passarinho, "esta lágrima de amor, esta gota de ternura, este gesto de carinho, esta memória, esta emoção, esta gratidão" por esta Mulher Grande que fazia parte da tua tribo, do teu clã, da tua família extensa.... E como estamos hoje muito mais pobres, pobres de afectos, de valores e de emoções, reduzidos às nossas famílias nucleares e, cada vez mais, às nossas famílias monoparentais, em que a única figura parental tanto pode ser uam mulher como um homem!...
Parabéns, Joaquim, por este belíssimo texto, tão ternurento, que me comoveu... que vai comover mesmo os mais empedernidos tugas da Guiné... Com ele dás mais vida à vida do blogue, dás mais grandeza às almas grandes que habitam a nossa Tabanca Grande... Que a Ti Pedrosa, lá do alto, continue a velar por ti e, já agora, por todos nós, tabanqueiros, teus amigos de jornada... (LG).
Uma memória, uma emoção, uma gratidão.
por Joaquim Mexia Alves
Quando eu era menino, aliás mesmo já antes de eu nascer, vivia em casa dos meus pais, uma senhora, sim uma senhora, que tendo sido empregada em casa dos meus avós paternos, (que nem a minha mãe os conheceu pois morreram no principio do século xx, com o surto, salvo o erro, da pneumónica) (**), nunca saiu de perto do meu pai, ficando assim a viver lá em casa.
Mais velha do que o meu pai, (que nasceu em 1899), nunca quis deixar de trabalhar e assim tratava sobretudo da capoeira e, lembro-me bem, era quem embebedava o peru para o Natal.
Era carinhosamente tratada por Ti Pedrosa, e recebia sempre dois beijos de cada um de nós, meninos estudantes em Lisboa, sempre que regressávamos a Monte Real para os diversos períodos de férias.
Era família, tão família como qualquer avó muito querida, e que, mesmo tendo um pouco de seu, e mesmo depois dos sobrinhos da Argentina a quererem vir buscar, nunca quis sair de nossa casa, pois era ali que era a sua casa, a sua família.
De quando em vez fugia-lhe a palavra para o antigamente e tratava o meu pai por menino Olympio, numa ternura incapaz de aqui reproduzir, sobretudo por ver aquele homem grande enternecido por aquele tratamento tão íntimo.
Neste momento, já perguntam os meus camarigos o que é que tudo isto tem a ver com a Guiné!
Perguntam, porque já não temos a mesma paciência que ela tinha em esperar pelas férias, para ver como tinham crescido os seus meninos e quase obrigar as galinhas a porem os ovos amarelinhos, (que agora já não existem), para nós comermos estrelados em azeite, numa frigideira tão velha que já tinha a gordura “incorporada”.
Pois nos idos do mês de Abril de 1972, (mais para a frente ou mais para trás do dia 6, data do meu aniversário) (***), recebi no Xitole uma carta, cujo envelope escrito com caligrafia vacilante, tinha inscrito no remetente: Ti Pedrosa – Monte Real.
A letra não era dela, que não sabia escrever, mas de outra empregada que a seu pedido me dava os parabéns pelos meus 23 anos e servia de cobertura a uma nota de 20$00, para eu comprar o meu presente.
Calculam como o meu coração, já de si tão mole e sensível, enviou aos meus olhos a ordem para, com uma qualquer água, afastar o pó da Guiné e lubrificar a minha vista.
Claro que aquilo não era lágrimas, eram apenas os meus olhos a protestarem pela luz tão intensa da Guiné.
Foi um oásis de ternura, na brutalidade da guerra.
Mais tarde, uns meses mais tarde, julgo que ainda na Guiné, recebi outra carta, agora com a letra redonda e bem tratada da minha mãe, que me enviava, a pedido da Ti Pedrosa, uma fotografia sua, tirada nos seus oitenta ou noventa anos, que infelizmente a memória já não me deixa lembrar com precisão.
Dizia a minha mãe que a Ti Pedrosa tinha feito questão de tal envio e de que me dissesse da sua grande preocupação que o benjamim da família andasse por terras tão estranhas, a fazer coisas tão perigosas.
Que me cuidasse muito, tivesse cuidado com as temperaturas e que voltasse depressa e bem.
E porquê esta história agora?
Porque hoje tive uma insónia povoada de sonhos amargos, coisas da Guiné, e no meio da perturbação, da agitação, veio ao meu pensamento, (ou seria ao coração?), a imagem, a lembrança da Ti Pedrosa que lá no Alto olha por mim, tanto que pouco depois adormeci calmamente.
Claro que não podia deixar de lhe fazer esta homenagem, contando os seus gestos de ternura, que tanto amenizaram durante uns tempos, a dureza da minha vida na Guiné.
No meio das emboscadas, das minas, dos tiros, das dores, dos horrores, das horas amargas que aqui na Tabanca se vão desfiando, deixo-vos esta lágrima de amor, esta gota de ternura, este gesto de carinho, esta memória, esta emoção, esta gratidão.
Abraço-vos fortemente, meus camarigos, com um sorriso nos lábios, porque no peito de todos os combatentes, dos ex-combatentes, endurecidos pela guerra, empedernidos pela morte, ainda bate um coração sensível, que se alegra e enternece com os gestos de carinho, de amor, daqueles que por cá penaram a nossa estadia na Guiné.
Monte Real, 20 de Maio de 2009
_____
Notas de L.G.:
(**) Vd. postes anteriorea da série As Nossas Mulheres:
13 de Março de 2009 > Guiné 63/74 - P4027: As nossas mulheres (8): A uma mãe, a todas as mães, a todas as mulheres da nossa vida (Juvenal Amado)
6 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3848: As nossas mulheres (7): Eu, a NI e o Miguel em Biambe, para um almoço de batatas fritas (Henrique Cerqueira)
27 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3803: As nossas mulheres (6): As minhas correspondentes e a minha mulher (José Colaço)
23 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3779: As nossas mulheres (5): Ni, uma combatente em Mansoa (1973/74)
16 de Janeiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3748: As nossas mulheres (4): Recortes de imprensa de uma noiva (Luís Faria)
28 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3676: As Nossas Mulheres (3): Um poema da minha Mãe, Leopoldina Duarte (António Paiva)
24 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3667: As Nossas Mulheres (2): De Bissau a Lisboa, com amor (Cristina Allen)
22 de Dezembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3662: As Nossas Mulheres (1): As que casaram com ...a Guiné. (Virgínio Briote)
(**) A pneumónica foi a pior pandemia de gripe do Séc. XX... Terá morto entre 20 a 40, se não mais, milhões de seres humanos, em todo o mundo...Mais de 60 mil em Portugal, numa época (1918/19) em que nós deveríamos ser seis milhões e picos... Para saberes mais, clica aqui, neste Portal de Saúde Pública...
Aqui encontras um resumo de uma tese de doutoramento sobre a Pneumónica (ou gripe espanhola), com especial incidência no concelho... de Leiria.
A Pneumónica de 1918 em Portugal Continental - Estudo Socioeconómico e Epidemiológico com particular análise do concelho de Leiria... O autor é João José Cúcio Frada, Médico, Professor aposentado da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa.
Resumo de: Frada J. - A gripe pneumónica em Portugal Continental - 1918. 1ª edição, Lisboa: Setecaminhos, 2005
http://www.saudepublica.web.pt/TrabFrada/Pneumonica_JFrada.htm
(***) Vd. poste de:
6 de Abril de 2009 > Guiné 63/74 - P4146: Parabéns a você (3): No dia 6 de Abril de 2009, ao camarigo Joaquim Mexia Alves, ex-Alf Mil Op Esp, Guiné 1971/73 (Editores)
Guiné 63/74 - P4387: Memória dos lugares (25): Bafatá (Fernando Gouveia)
Porto: 19MAI2009
Caro Luís:
Vou tentar responder ao teu último e-mail e adiantar mais algumas coisas sobre a
nossa zona Leste e sobre a minha (mais minha) Bafatá.
Se os camaradas editores do blog o permitirem, muito do que teria para te contar, irei inclui-lo nas estórias que irei mandando para aí. Por razões muito especiais e pessoais, que em voz-off te poderei contar, a Guiné e especialmente Bafatá, ficaram no meu coração.
Adiantarei apenas que a maioria, senão todos os camaradas que lá estiveram, dizem cobras e lagartos sobre todo o processo, desde a mobilização até ao seu regresso e muitas vezes até à actualidade (traumatizados, etc.).
Como já disse na introdução da 1.ª estória, tive sorte, sorte e mais sorte. Como
exemplo, sabes de algum militar miliciano que tivesse vindo de férias à Metrópole três vezes, como eu vim?
Vou então comentar o teu e-mail com poucas palavras, mas que depois explanarei nas estórias:
1 - Não compreendi quando dizes que o 2.º ataque a Bambadinca pode ter sido provocado pelas NT. Um dia me contarás.
2 - Na 1.ª estória (os três oficiais) inclui duas fotos aéreas de Bafatá. Claro que ainda hás-de ver muitas mais, aéreas e não só.
3 - Sobre o Sr. Teófilo hei-de contar umas coisas, civis e de guerra pois durante quase um ano morei em frente ao seu boteco numa casa onde a minha mulher passou duas temporadas. Uma estorieta sobre a sua filha, a Ritinha, é deliciosa.
4 - No tema comércio poderei contar uma estorieta sobre o Infali, empregado da Transmontana. Mas o mais significativo que tenho será uma série de fotos sobre todas as actividades no Mercado de Bafatá, desde a vendedora de bolinhos de mancarra, passando por um gila a vender peles de cobra, até a um vendedor de cola. Lembras-te do Xame com os dentes de ouro feitos por ele próprio?
5 - Era sócio do Sporting Clube de Bafatá pois ficavam-me mais baratos os bilhetes do cinema. Isso vai dar mais umas estórias. O porteiro Braima, com quem tinha longas conversas, tinha sempre à sua espera, no meu frigorífico, (desculpa esta mordomia) umas Fantas, pois ele era muçulmano.
6 - Como deves compreender, vindo cá três vezes de férias e a minha mulher indo lá duas temporadas, não era frequentador do Bataclâ, que penso que seria uma casa perto da saída para Bambadinca. Sobre isso também haverá umas estorietas.
7 - Quanto à caça, só adianto por agora, que de dia, tanto ia sozinho como acompanhado mas sempre até um máximo de 1 Km da pista, para Norte. À noite ia sempre acompanhado. Como depois estoriarei, nos últimos meses nunca mais fui à noite, em parte por obra do Sr. Teófilo. Um dia ainda hás-de ver a foto de mim mesmo, que aparece no princípio das minhas estórias mas completa, sem ser recortada.
8 - Quando algures referi o Pel Rec Inf estava a reportar-me a Mafra. No Agrupamento estava exclusivamente como oficial de informações.
9 - Vou gostar de perguntar ao Humberto Reis se quando esteve em Madina Xaquili ainda lá estava o forno que eu próprio construí.
10 - O som, (não o filme como dizes), aí há-de chegar e por mim será incluído no último episódio da estória de Madina Xaquili.
Aproveito para lembrar (como é recomendado no blog) que a 4.ª estória, 3.ª parte
da de Madina Xaquili, enviada há 10 dias, ainda não foi postada. Acrescento que
toda a estória, a meu ver, vai melhorando à medida que se aproxima do fim.
Esta estória, por ser muito extensa, foi dividida em partes por sugestão do Carlos Vinhal. Por um lado acho bem, por outro considero que tem mais piada se for lida do princípio ao fim e não cada parte com intervalo de uma semana ou mais.
Tenho-a toda escrita. Se quiseres posso mandar as partes restantes e publicam-nas, seguidas ou não.
Um abraço.
Fernando Gouveia
Vista da parte principal de Bafatá. No quarteirão, em primeiro plano situava-se a sede do Batalhão
Foto e legenda: © Fernando Gouveia (2009). Direitos reservados
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 19 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4382: Memória dos lugares (24): Ponte João Landim, sobre o Rio Mansoa, (Carlos Silva)
Guiné 63/74 - P4386: O Nosso Livro de Visitas (63): B. Parreira, ex-Fur Mil da CCAÇ 16 (1972/73)
i - Caros Camaradas,
Estive em Bachile, como Fur Mil na CCaç 16 de Jun/72 a Fev/73, sob o comando inicial do Capitão Martins e posteriormente do Capitão Afonso.
Estive na situação de diligência visto que a minha Companhia estava sediada em S. Domingos.
Regressei à Metrópole em Março de 1973.
Um abraço.
Parreira - Faro
ii - Camarada António Branco
Graças a este blogue vamos tendo notícias dos amigos que fizemos e que pensvamos não mais encontrar.
´
Pois de facto partilhámos bons momentos juntos, e longas conversas, eu tu e o Sargento Guerreiro, de quem não tive mais notícias. Também me lembro do Miranda, outro grande amigo.
O António Graça a que te referes deve ser o Furriel Mecânico, porque o Alferes António G. Abreu estava em Teixeira Pinto.
Foi com grande emoção que vi a foto da Ponte Alferes Nunes e o Rio Costa, onde tantas vezes afoguei as minhas mágoas.
Era com os banhos no Rio e com os jogos de futebol, que jogava pela companhia CCaç 16, em Teixeira Pinto, que aliviava o meu stress.
Também tenho saudades dos camaradas africanos, e foram tantos os amigos que lá deixei.
Pode ser que um dia nós nos encontremos, ou nos contactemos, através de e-mail ou do blogue.
Gostava de ver uma fotografia tua aqui publicada, que eu também vou providenciar a digitalização da minha, para ver se nos vamos recordando das caras que há 36-37 anos deixámos de ver.
Um abraço
B. Parreira - Faro
2. Mais um comentário do nosso camarada Barreira, deixado no dia 19 de Maio de 2009, no poste Guiné 63/74 - P4353: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (1): O início do Serviço Militar
Camarada José da Câmara
Informo que não tenho raízes nos Açores, mas gosto muito do povo açoriano. Sou algarvio, de Faro, e toda a minha família é do Algarve.
Em 1970, quando fiz a recruta e especialidade em Tavira, como já havia dito, convivi muito com a malta das ilhas, talvez tu fosses um desses camaradas.
Antes de ir para o Bachile em Junho de 1972, fiz Estágio Unidades Africanas em Bolama.
A guerra de que fui obrigado a fazer parte, foi feita em S. Domingos, fronteira com o Senegal 1.º ano, e 2.º ano em Bachile.
Confesso que em S. Domingos a situação era muito mais perigosa e tivemos muito mais mortos e feridos.
Apesar de tudo, por todo o lado que andei deixei amigos, quer na população africana quer nos camaradas militares. Tenho a minha consciência muito tranquila.
Só tenho pena dos camaradas militares africanos que foram obrigados, tal como nós, a fazer a guerra e depois foram abandonados à sua sorte. Muitos foram fuzilados após a independência do seu país, e isso devia ter sido acautelado por Portugal.
Um abraço e até um dia destes.
B. Parreira
3. Comentário de CV:
Caro Barreira
Muito obrigado por nos seguires e por comentares os nossos postes.
No entanto ser só comentador é muito pouco. Podes ser mais activo se aderires à nossa Tabanca Grande e começares a falar da tua vivência em S. Domingos, zona de que temos poucos camaradas.
Se tiveres algum tempo disponível, manda uma foto do teu tempo de tropa e outra actual, tipo passe de preferência, em formato JPEG, anexa um texto falando de ti e da tua Unidade e serás apresentado formalmente à Tertúlia, ficando assim apto a colaborares connosco na feitura deste espólio histórico.
Como acho que conheces bem o nosso Blogue, não preciso de estar com muitas particularidades. Esperamos, isso sim, as tuas próximas notícias.
Recebe um abraço do camarada
Carlos Vinhal
__________
Nota de CV:
Vd. último poste de série de 16 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4355: O Nosso Livro de Visitas (62): José Rocha emitindo a sua opinião sobre a retirada de Guileje
Guiné 63/74 - P4385: Estórias de Jorge Picado (5): A minha passagem pelo CAOP 1 - Teixeira Pinto (I): Reunião com o Secretário Geral
Assunto: Estadia no CAOP 1
Caríssimos editores e co-editores
Tendo-me posto a dedilhar no teclado saíu-me uma pequena prosa do tempo do CAOP 1 que envio para vossa apreciação, juntamente com um anexo duma nota de reunião de trabalhos anterior à minha chegada.
Como sempre, se julgarem com algum valor para arquivo do Blogue, é de todos.
Abraços
Jorge Picado
Algo sobre a minha passagem pelo CAOP 1
Tendo deixado, para grande consolo e descanso meu, a CArt 2732 em MANSABÁ, em 29ABR71, depois de 52 dias de ali ter chegado e, 38 após receber a Nota do QG a comunicar a colocação no CAOP 1, arribei – desculpem este termo náutico, mas apesar de não querer nada com o mar, sou duma terra de “ex-homens do mar” – a Teixeira Pinto cerca das 13H de 4MAI, depois duma travessia por JOÃO LANDIM, DINGAL, CÓ e PELUNDO, sob a protecção de pessoal da CCaç 2660? ou 2658? Não tenho a certeza qual era a CCaç encarregada de efectuar as colunas a BISSAU, mas era sem dúvida do BCaç 2905, então em T. Pinto.
O pessoal da CArt 2732 que me perdoe por este intróito, mas não julguem que os menosprezei.
Parece que já estou a ouvir o nosso co-editor e amigo Carlos. “Olha para este malandro. Não gostou da companhia e tratou de se safar. Mas que grande s..... me saiu”.
Nada disso. Não foi pela companhia (não confundir com Companhia), mas antes… pelo clima… ou os ares do campo que, por aquelas bandas (como diz o Zé povinho), não eram muito saudáveis. E quem me tinha “aberto definitivamente os olhos” ainda em BISSAU, tinha sido o “Ex”…
A prova de que sempre senti algo por esse pessoal, está no que transmiti ao papel em 2003, quando tentei alinhavar umas recordações, sem sequer me passar pela cabeça que viria a reencontrar alguém desse tempo. Pois se nessa época os que comigo mais tempo conviveram não me tinham reencontrado, como poderia alimentar a ideia de encontrar alguém de MANSABÁ? Passo a transcrever então algumas passagens do que escrevi:
[…despedi-me daqueles camaradas de infortúnio, que tão pouca sorte tinham tido com o “seu” Cmdt.
Na verdade não o mereciam porque eram todos bons rapazes e fixes.
Usei a expressão “camaradas de infortúnio”? Sim.
Afinal também não lhes notei qualquer motivação para desempenharem os papéis que lhes tinham atribuído.
Não os via, como igualmente não me reconhecia, com motivos para fazerem a guerra.
Pressentia que o que a maioria desejava era voltar às suas terras, às suas casas, às suas Famílias.]
Já chega de devaneio, voltemos ao CAOP 1.
Como já disse num dos escritos sobre esta zona, era adjunto do Oficial responsável pelos assuntos da ACAP/POP, sem qualquer actividade operacional, bem como livre de actividades de “quartel”, isto é, não entrava nas escalas de serviço, como acontecia em MANSOA, já que essas eram tarefas da competência da unidade de quadricula, o BCaç 2905 até DEZ71 e o BCaç 3863 depois. Era pois, convenhamos, uma situação muitíssimo mais tranquila do que até aí tinha sucedido.
Ao mesmo tempo o ambiente que se vivia entre os componentes daquele mini-EM era completamente diferente do chamado “ambiente de caserna”. Tudo muito afável, duma grande correcção e “espíritos muito abertos” que, confesso, me deixavam surpreso.
O meu camarada de quarto, que não tinha curso de EM e tinha cumprido uns anos antes uma 1.ª comissão à frente duma CCaç na área de BULA, manifestava-se já tão descrente e dizia tão mal, que eu, passei a manter-me sempre na defensiva, convencido que a sua intenção era fazer-me “abrir a boca” para confidências politicamente comprometedoras. E quanto às minhas competências não militares, aconselhava-me a não me manifestar. Tinham-me mandado para ali como militar? Era porque se estavam nas tintas para os outros meus conhecimentos, ia-me dizendo. O seu azedume era tal que usava uma assinatura de tal modo estilizada, na documentação oficial, que até um ponto colocava na extremidade, para ficar mais semelhante a um falo, como provocatoriamente me segredava.
Mando hoje, digitalizado, uma cópia dum relatório de 4 folhas, das notas de uma reunião efectuada em BULA em 02MAR71, portanto anterior à minha chegada a este Agrupamento.
Tenho dúvidas se, dada a impressão ser tão ténue, o documento será legível. Por isso resolvi transcrevê-lo.
“ REUNIÃO EFECTUADA EM BULA EM 02MAR71 SOB A PRESIDÊNCIA DO SENHOR SECRETÁRIO-GERAL
- Razão da reunião (Cor. Amaral) – despachos do Secretário-Geral, voltaram atrás os processos de Veterinária e Agricultura por terem mudado os respectivos Chefes de Serviço.
- Pedreiros – apresentado o pedido ao Pes. Log. (faltam e não há na área)
- Agricultura – não está a trabalhar em pleno!
- Problema da estrada T.PINTO-ALF. NUNES, má asfaltagem
- Problema da falta de arroz
(a) falta no mercado - Não
(b) falta dinheiro para o comprar
A segunda hipótese é garantida (desmatações) e trabalhos na estrada. Em vista disto não deve constituir problema.
- Apresentado a falta de dinheiro em P.CONSOLAÇÃO para compra de arroz.
- Problema dos estrangeiros (no Chão Manjaco). N/General vai fazer uma campanha de nacionalização. Ficam suspensos de pagamento.
- O CAOP e a Administração devem ver as áreas com vista a abolição (dispensa) do imposto, devido à seca. Ter atenção às áreas afectadas, J.LANDIM, A.BARROS, P.CONSOLAÇÃO.
- Apresentado pelo BCaç 2905, falta de homens nos reordenamentos, caso concreto BATUCAR, ida dos homens para a estrada do CACHEU – o Administrador prometeu resolver o assunto.
- os reordenamentos estão em ritmo aceitável apenas o de CHUROBRIQUE, está mais atrasado.
- O delegado do ComChefe afirma que nas reuniões do mesmo dizem que os reordenamentos na área de T.PINTO estão excedidos na previsão pelo que talvez sejam de tirar lá especialistas.
- Contraproposta imediata do BCaç 2905 e CAOP.
- O Comandante do CAOP apresentou três problemas
- Arroz – já tratado
- Peixe – frigorífico no CACHEU
- Carne – existe muita dificuldade. Preconizou a sua regularização se possível com frigorífico.
- O Secretário-Geral sobre a carne disse: o Veterinário fez um relatório onde abordava este assunto.
O CTIG está a tentar resolver o problema dado que a FA o tem resolvido e a Marinha também.
- Problema do BCaç do PELUNDO.
- Estrada J.LANDIM-T.PINTO (bermas e capinagem – alcatrão) apresentou a solução de Angola e Moçambique. (ver nota já enviada ao CAOP).
O Secretário-Geral falou na utilização das máquinas da agricultura, podendo ser aproveitadas na solução apresentada pelo Ten. Cor.
- Reordenamentos:
- JOLMETE – Regresso ou afluxo das POP às povoações. Mais 35 casas, as já construídas estão muito juntas, ver a construção das futuras.
- PELUNDO – Quintais no Bairro P. Ramos
- Mesquita
- Posto Sanitário (falta o apetrechamento).
- CÓ – Tratar dos arruamentos – Cozinha nas ruas
- Controle de população – apresentou a notícia que a população vem do mato para o PELUNDO via BISSAU. Preconizou uma estrutura de controle.
- Urbanização e desenvolvimento do PELUNDO. Tem clube? Tem Centro de Convívio? Há quem queira fazer um café.
- Iluminação da ILHA de JETE.
- O Secretário-Geral resumiu os problemas apresentados.
- Dinheiro
- Luz
- Posto Sanitário
- Mesquita
- Centro de Convívio (apresentou propostas)
- Destronca da estrada
- Reordenamento de JOLMETE – Azeredo
- Escola de JOLMETE (cento e tal contos)
Bat. BULA
- Tem os mesmos problemas expostos e mais alguns! Dada a actividade operacional tem certas dificuldades.
- Obras Públicas – asfaltagem da estrada BULA-BINAR.
- O problema da estrada BULA-S.VICENTE – desmatagem e barreiras (o problema está posto).
- Reparação de buracos da estrada J.LANDIM-BULA.
- Abordou o problema de P.CONSULAÇÃO e dos reordenamentos em geral da desmatação dentro dos reordenamentos.
- Água nos reordenamentos
- Acessos aos reordenamentos PLACO-A.BARROS e de acesso a P.CONSOLAÇÃO.
BULA – Água e luz. São os geradores militares que a fornecem.
Problema apresentado pelo Capelão. Fazer um Centro de Convívio para os miúdos.
Secretário-Geral: o padre deveria oferecer os préstimos à Missão para ser essa a tomar conta disso.
Toda a vantagem dos esforços concorrentes.
- A.BARROS não colabora (diz que tem fome!)
- DINGAL é só da tropa. Falou sobre o nº de casas.
- Problema das carreiras de autocarros
- T.PINTO e
- S.VICENTE
- Ciclo das inaugurações – Se o Ministro vier será nessa altura. Se não... quando for.”
Como se pode constatar são umas notas muito sucintas e não sei quem as tomou. Comigo a assistir a reuniões destas e desde que encarregado de tomar apontamentos, estes seriam muito mais precisos.
Deve ter sido uma reunião prolongada, já que se abordaram numerosos assuntos e, pelos vistos, era um ponto da situação que se estava a fazer, pois previa-se uma visita Ministerial e era necessário apresentar e mostrar obras feitas, ou não fosse aquela zona a “sala de exposição” principal da Politica de “Uma Guiné Melhor”.
Quando se fala no Bat. BULA, deve ser o BCaç 2928 a que pertenciam os camaradas Luís Faria, Matos e outros.
Por hoje é tudo, mas estou a procurar preparar mais 4 documentos que recuperei daqueles tempos em T. Pinto.
Jorge Picado
__________
Notas de CV:
(*) Vd. último poste de 17 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4364: Memória dos lugares (22): Fortim e Ponte Alferes Nunes, sobre o Rio Costa, entre Canchungo e Bachile (Jorge Picado)
Vd. último poste da série de 12 de Julho de 2008 > Guiné 63/74 - P3051: Estórias de Jorge Picado (4): Como cheguei a Comandante da CART 2732 (Jorge Picado)
Guiné 64/74 - P4384: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (5): O nº 48, Dezembro de 1972, dedicado à 'visita da OUA às regiões libertadas no sul'
2 de Fevereiro de 2009 >Guiné 63/74 - P3828: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (1): O nº 54, Outubro de 1973, dedicado à proclamação da independência: pp. 1-2
5 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3846: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (2): O nº 54, Outubro de 1973, dedicado à proclamação da independência: pp. 3-4
10 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3864: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (3): O nº 54, Outubro de 1973, dedicado à proclamação da independência: pp. 5-6
17 de Fevereiro de 2009 > Guiné 64/74 - P3905: PAIGC Actualités (Magalhães Ribeiro) (4): O nº 54, Outubro de 1973, dedicado à proclamação da independência: pp. 7-8
Guiné 63/74 - P4383: Homenagem ao Serviço de Saúde das nossas Forças Armadas (Luís Faria)
Amigo Vinhal
Envio-te um e (hi)stória não muito comum creio, que publicas se achares.
Com um abraço
Luís Faria
Embarques e desembarques
Ou o homem que não quis morrer
À altura julgo que era do conhecimento comum dizer-se que, ferido que conseguisse chegar vivo ao Hospital de Bissau, se safava!
Seria um bocado de exagero mas, para além de moralizador e aliado ao facto de por norma mediar escasso tempo entre o ferimento e a evacuação, sentia-se um certo apoio e segurança! De qualquer dos modos e ao que sei, o palmarés do Hospital era sobremaneira positivo.
Aquando de uma operação a Ponta Matar, passámos por violento recontro em que sofremos infelizmente um morto e cinco feridos.
Um Homem meu foi um desses feridos, com gravidade. É a e(hi)stória destes momentos que resolvi contar, talvez por ter estado demasiadamente envolvido e pela invulgaridade creio, do que aconteceu.
O confronto era aceso, os rebentamentos e os tiros sobravam!
O dada altura a meu lado cai um soldado meu, que fica prostrado e a esvair-se, traçado no pescoço por, salvo erro, quatro tiros.
Ao acercar-me, pede-me num murmúrio entrecortado que comunique com os Pais e lhes diga … ao que, apostando com ele uma grade de bazucas, respondo que não será preciso, pois vai safar-se…!
Desfalece! O héli-evacuação chega e a Enf. Pára apeia-se para a recepção e triagem dos feridos por ter que haver prioridades, atendendo ao número.
Tomo o pulso do meu Homem e sinto-lhe muito espaçadamente a pulsação!
Ainda está vivo!! De imediato é metido no héli.
A Enfermeira vê-o naquele estado, não reconhece sinais de vida e retira-o, para dar lugar a outro ferido. Parece mentira, não acredito, naqueles segundos…apagou-se!!
Por mera confirmação, tomo-lhe novamente o pulso e… sinto-o de novo, muito fracamente!!!
É metido no heli, afirmo à Enfermeira que está vivo… que tem pulso, fraco mas tem!!
Felizmente confirmada a situação, o héli descola para o seu destino, Bissau.
Chegado ao quartel, informam-me que o héli tinha descido em Bula para desembarcar o meu Homem, de novo dado como morto e regressar a P. Matar a buscar outros feridos, mas que o Médico (?) conseguiu aperceber-se novamente de uma réstia de vida e… o héli seguiu para Bissau.
Nunca mais soube nada do meu Homem… considerei-o como morto e na guerra continuei o meu caminho.
Um final feliz
Acabada a comissão e regressado à Metrópole, casei e um dia, acompanhado pela minha mulher seguia na Av. Fontes Pereira de Melo e ouço chamarem-me:
- Furriel Faria… Furriel Faria …!!??
Olhei e não queria acreditar!!! Fiquei parado… estupefacto!! Afinal tinha sobrevivido, graças a Deus!!! Era o meu Homem, ligeiramente rouco mas de boa saúde.
De há dois ou três anos a esta parte, encontramo-nos na reunião da Força e creio que só desde esta altura é que ele soube, não por mim, da história, uma história com um final feliz!
Quero terminar este relato-história com um agradecimento a todos os que exerceram funções no Hospital Militar de Bissau, aos valentes e abnegados da FAP na Guiné, sempre prontos a prestar o seu auxílio incondicional quer nas evacuações quer na segurança às tropas, não esquecendo as nossas Queridas Enfermeiras Pára que para alem de visões celestiais eram visões de Esperança e conforto.
Aos nossos Médicos no terreno.
Aos nossos queridos Enfermeiros que, como o Urbano, o Taia, o Silva o Braga, o Brejo e a todos os outros que andavam connosco na mata, sujeitos aos mesmos sacrifícios e perigos, com a agravante de eventualmente debaixo de fogo terem que se arriscar mais, para irem em socorro de um ferido.
Um bem-haja a todos e o meu Obrigado, ao fim de tantos anos.
Luís Faria
Nesta foto, a nossa querida camarada Enf.ª Pára-quedista Giselda junto de um héli e respectiva tripulação. Quem nunca assistiu a uma evacuação? Sangue-frio e competência, principais atributos destas pessoas que tomavam nas suas mãos algumas vidas presas por ténues fios.
Foto: © Giselda Pessoa (2009). Direitos reservados.
Legenda de CV
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 16 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4361: Viagem à volta das minhas memórias (Luís Faria) (14): Um mês complicado (3) O osso
terça-feira, 19 de maio de 2009
Guiné 63/74 - P4382: Memória dos lugares (24): Ponte João Landim, sobre o Rio Mansoa, (Carlos Silva)
Com o devido agradecimento aos nossos Camaradas J. Câmara e Carlos Silva, por nos permitiram a publicação destes seus e-mails, com mais algumas achegas importantes ao que havia sido dito sobre a Ponte Alferes Nunes:
Amigo Câmara,
Os guinéus não melhoraram a ponte.
Alguém, por acaso não sei quem foram os dadores e construtores, construíram uma nova ponte toda metálica.
Já agora, já que estamos a falar de pontes vê o blogue abaixo e verás a nova ponte sobre o rio Cacheu a ser inaugurada em Junho próximo. Já agora sugiro ao Luís graça para colocar no Blogue a indicação sobre este blogue relativo à ponte. Aproveito também para enviar-te fotos da ponte João Landim sobre o rio Mansoa.
Quanto às nossas pontes Alferes Nunes. De facto, não me apercebi de vestígios da[s] velha[s] pontes sobre o rio Costa quer para jusante, quer para montante do actual local da ponte metálica, bem como, não me apercebi de alteração do traçado da estrada, relativamente à estrada construída por vós em 1971.
Em Março de 2007, a estrada desde Bula>Pelundo>Cantchungo>Cacheu estava a ser objecto de reconstrução, ou seja, estavam a colocar um tapete novo.
Aliás, podes ver através da foto que enviei, onde estou dentro do jipe vermelho em cima da ponte e para trás, na direcção Bachile>Cacheu podes ver o alcatrão levantado.Pois para fazer o percurso acima referido, fiz grandes troços da picada antiga e nas proximidades da ponde não vi absolutamente vestígios de picada antiga, pelo que, passei pela vossa estrada.
Aliás, devo dizer que fomos acompanhados por um amigo guineense que conhecia a zona e foi ele que no levou ao Quartel do Bachile da CCaç 16 e nunca falou nas pontes velhas.
Portanto, creio que não havia outro traçado naquela zona, senão a vossa estrada.
Deve ter havido uma limpeza geral das ruínas.
Contudo, n próximo ano vou tirar todas as dúvidas.
Tal como referi acima, em 2007 andei por troços de picada antiga, devido às obras.
Em 2008 e 2009 fiz todo o percurso sobre um excelente tapete desde Bissau até ao Cacheu, o que se faz em 2 horas.Os 38 kms de terra batida, são do Paulo Bastos do Pel Caç 953 que esteve no Cacheu em 1964/65.
Obrigado pelas fotos.
Com um abraço amigo,
Carlos Silva
___________
Notas de M.R.:
Vd. último poste da série em:
Guiné 63/74 - P4381: Memória dos lugares (23): Ponte Alferes Nunes, sobre o Rio Costa, entre Canchungo e Bachile (Carlos Silva)
Guiné> Fortim e Ponte Alferes Nunes entre Teixeira Pinto e Bachile, sobre o Rio Costa (Pelundo). c. 1968/69. Foto do nosso camarada Albino Silva, ex-Soldado Maqueiro, CCS/BCAÇ 2845 (Teixeira Pinto, Jolmete,Olossato, Bissorã,1968/70). Foto: © Albino Silva (2007). Direitos reservados.
Caro Carlos,
Li com atenção a resposta que destes sobre a Ponte Alferes Nunes. Com todo o gosto fui procurar a tua fotografia, no teu próprio blogue. Claro que a ponte da tua fotografia nada tem a ver com aquela que eu atravessei várias vezes. Para desilusão minha o fortim (uma autêntica fortaleza) desapareceu.
Fiquei sensibilizado pelo facto dos guinéus terem tido a oportunidade de melhorarem a ponte. Mas também digo que é de lamentar o facto de não manterem em condições "turísticas" a história da guerra. Só teriam a ganhar com isso. Sei que não é possível manter tudo. Mas tudo parece destruído. Eles lá sabem!
Mas adiante....
O Jorge Picado fala numa outra ponte ou o que restava dela. De facto, para quem estava na ponte virado para o Bachile, e a uns metros acrescentados para a direita havia uma ruína daquilo que parecia ter sido uma ponte. Aí o rio era pouco largo e pouco profundo. Parto do princípio que haveria um outro traçado de estrada, de terra batida, que nada tinha a ver com a estrada que ajudamos a construir.
Atravessei a ponte Alferes Nunes, pela primeira vez, no dia 6 de Abril de 1971. Pernoitamos no Bachile. No dia seguinte fomos para o nosso primeiro acampamento, a cerca de 10 Km do Bachile.
O traçado da estrada era aberto com máquinas, ao mesmo tempo que a descapinação era feita à catanada, com cerca de 100 metros para cada lado. Mais atrás, avançava o leito da estrada. Este era nivelado com máquinas niveladoras, em várias camadas de macadame e comprimidas com auto tanques de água e cilindros de vibração. De imediato era feita a alcatroamento.
Quando o Carlos, na viagem de 2008, se refere a 38 Km de terra batida, está a dizer-me que essa estrada se degradou a esse ponto? Ou, resolveu seguir o traçado antigo?
Junto algumas fotografias do tempo. Possivelmente usarei algumas para a pequena história que estou a escrever. Da minha parte use aquilo que lhe interessar.
Um abraço do,
J. Câmara
___________
Notas de M.R.:
Vd. ultimo poste da série em:
17 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4364: Memória dos lugares (22): Fortim e Ponte Alferes Nunes, sobre o Rio Costa, entre Canchungo e Bachile (Jorge Picado)
Guiné 63/74 - P4380: Bibliografia de uma guerra (45): Entre o Paraíso e o Inferno, de Abel de Jesus Carreira Rei (CART 1661, 1967/68)
Folha de rosto da página na Net do Abel de Jesus Carreira Rei, autor do livro Entre o Paraíso e o Inferno: de Fá a Bissá. Memórias da Guiné. O autor nasceu na Marinha Grande, em 1945.
1. Mensagem de Abel Rei (*), ex-combatente da Guiné, CART 1661/BCAÇ 1912, 1967/68, com data de 3 de Janeiro de 2009:
Assunto: Início de contacto(s) sobre o tema "Livro - Entre o Paraíso e o Inferno", Diário escrito na Guiné entre princípios de 67 e fins de 68.
Meu caro amigo ex-combatente da Guiné:
Em primeiro lugar, quero pedir licença pela minha intromissão no seu blogue, e dizer-lhe que só agora dei início aos conhecimentos e navegação pela Internet, tendo desde logo o prazer de ver o vosso trabalho, que felicito e desejo uma boa continuação, oferecendo desde já os meus préstimos, se isso for necessário.
Receba os meus agradecimentos, pelo interesse demonstrado em registar e divulgar alguns dos pormenores do meu Diário sobre minha passagem pela Guiné, que segundo me apercebi, o amigo e camarada, só teve conhecimento dele através do Portal da Cidade da Marinha Grande.
Então passo a apresentar-me:
(i) Fui para a Guiné integrado na CART 1661/BCAÇ 1912.
(ii) Esta Companhia foi render, no Enxalé, a CCAÇ 1439, em princípios de 1967.
(iii) Fizemos o nosso percurso por Fá, Enxalé, Missirá, Porto Gole e Bissá, tendo-nos juntado ao Pel Caç Nat 54, os quais fui encontrar, fazendo parte duma secção do 4.º Pelotão da nossa Companhia, em Porto Gole, criando alguns laços de amizade com o seu comandante, Alf Mil Marchant, Fur Mil Viegas, entre outros do Continente, assim como com os próprios combatentes nativos, a quem, sobretudo àqueles que foram mortos ou feridos, faço referência no meu Diário.
(iv) Estive até ao ano de 2007 na Direcção do Núcleo da Marinha Grande da Liga dos Combatentes, exercendo o cargo de Tesoureiro, que abandonei por motivos de saúde.
Sendo o autor e editor, ainda não esgotei a edição do meu Livro, pelo que me vou apoiando nalguns amigos e Direcções doutros Núcleos de Combatentes, para promover a venda do mesmo, pelo que tomo a liberdade, se isso me for permitido, de lançar nesta página a sua publicidade! (Custo de cada unidade: 10,00€+1,50€ p/ portes de envio).
Também posso enviar à cobrança.
Saudações de ex-combatente
Abel Rei
2. No dia 17 de Maio, Luís Graça enviava ao Abel a seguinte mensagem:
Abel:
Até que enfim, que te encontro!... Ao fim de quase quatro anos... Por lapso, só agora dei conta da tua mensagem, que enviaste para o meu endereço pessoal... Já lá vão quase quatro meses e meio... Nesse lapso de tempo, já deves ter vendido o resto dos exemplares do teu livro... Olha, eu gostaria de o adquirir. Podes mandá-lo à cobrança para o meu endereço.
Parabéns pelo teu trabalho. Na altura gostei da tua escrita singela, espontânea... Andei também pelos mesmos lugares que tu (só não fui a Bissá). Há aqui outros camaradas (ligados ao Pel Caç Nat 52 e ao 63) que irão gostar de ler o teu livro...
Desde já convido-te a aderir formalmente a nossa Tabanca Grande, e a intervir, com fotos e textos... Para já vamos apresentar o teu livro, na série Bibliografia de uma Guerra.
Boa sorte, bom trabalho, boa saúde...
Luís Graça
__________
Notas de CV:
(*) Sobre Abel Rei ver postes de:
1 de Maio de 2005 > Guiné 69/71 - X: Memórias de Fá, Xime, Enxalé, Porto Gole, Bissá, Mansoa
30 de Novembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXV: CCART 1661 (Porto Gole, Enxalé, Bissá, 1967/68)
22 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1871: Tabanca Grande (15): Henrique Matos, ex-Comandante do Pel Caç Nat 52 (Enxalé, 1966/68)
Vd. último poste da série de 12 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4330: Bibliografia de uma guerra (44): Memórias de um Prisioneiro de Guerra, de António Júlio Rosa (M. Beja Santos)