sábado, 8 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3426: Álbum fotográfico do Renato Monteiro (5): Bafatá, 1969: a igreja, o hospital, o mercado, as mulheres, o pilão

Guiné > Zona Leste > Bafatá > 1969 > Foto 6 > "Acaso não tropeçasse nesta foto, diria nunca ter entrado numa das igrejas de Bafatá, num dia de Junho do ano de 1969".

Guine > Zona leste > Bafatá > 1969 > Foto 16 > "Camarata de uma instituição religiosa, em Bafatá. As bonecas por cima das camas podiam lembrar namoradas à espera"... [Renato: Não seria o hospital de Bafatá, que pertencia uma congregação religiosa ? LG]

Guiné > Zona leste > Bafatá > 1969 > Foto 17 > "Mercado de Bafatá. Os tomates e os limões eram pouco maiores que as nozes. Mas rivalizavam com o colorido das vestes das mulheres"

Guiné > Zona leste > Bafatá > 1969 > Foto 8 > "Uma vendedeira de peixe, com o filho ao colo, no mercado de Bafatá".

Guiné > Local desconhecido [ Contuboel, Piche, Xime, Bafatá ?]> 1969 > Foto 15 > "O batucar do pilão ouvia-se por toda a Guiné…ainda hoje o ouço!

Fotos (e legendas): © Renato Monteiro (2007). Direitos reservados (*)

(Continuação da publicação do álbum fotográfico do Renato Monteiro (**), ex-Fur Mil da CART 2479, depois CART 11/CCAÇ 11, Contuboel e Piche, 1968/69, e da CART 2520, Xime, 1969) (***)

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Notas de L.G.:

(*) Vd. postes de:23 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P898: Saudades do meu amigo Renato Monteiro (CART 2479/CART 11, Contuboel, Maio/Junho de 1969)

23 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P899: Diga se me ouve, escuto! (Renato Monteiro)

(**) Vd.postes anteriores desta série:

13 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3199: Álbum fotográfico de Renato Monteiro (1): Contuboel (1968/69)

16 de Setembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3210: Álbum fotográfico de Renato Monteiro (2): O mítico cais do Xime (1969)

2 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3263: Álbum fotográfico do Renato Monteiro (3): Xime, o sítio do meu degredo

30 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3382: Álbum fotográfico de Renato Monteiro (4): Rio Udunduma, destacamento do Xime

(***) Vd. posts relacionados com a CART 2479 (que deu origem à CART 11 e depois CCAÇ 11) e o meu amigo Renato Monteiro, com quem privei, durante um mês e meio, em Contuboel (Junho/Julho de 1969):

28 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1001: Estórias de Contuboel (i): recepção dos instruendos (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)

30 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P1005: Estórias de Contuboel (ii): segundo pelotão (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)

2 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1017: Estórias de Contuboel (iii): Paraíso, roncos e anjinhos (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)

4 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1026: Estórias de Contuboel (iv): Idades sem lembrança (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)

4 de Agosto de 2006 > Guiné 63/74 - P1027: Estórias de Contuboel (V): Bajudas ou a imitação do paraíso celestial (Renato Monteiro, CART 2479 / CART 11, 1969)

6 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2412: História de vida (8): Renato Monteiro, um homem de múltiplos... fotografares (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P3425: O Nosso Livro de Visitas (40): A.Gaudêncio, filha do nosso camarada Gregório Gil Gaudêncio

1. Comentário deixado por A. Gaudêncio, filha do nosso camarada Gregório Gil Gaudêncio, já falecido, no poste 922 (*).

Ao pesquisar este blogue foi com alegria e muita saudade que encontrei uma foto do meu querido pai Gregório Gil Gaudêncio.
Ao reler estes textos, que me fizeram relembrar as histórias um pouco mais fantasiadas que o meu pai contava da guerra na Guiné, deixaram-me saudosa, pois o meu pai infelizmente já não se encontra entre nós e agora faz parte do nosso imenso céu como uma brilhante estrela.

Gostaria de ter mais fotos onde ele aparecesse se fosse possível.

Obrigada
A.Gaudêncio


Guiné > Zona Leste > Nova Lamego > 1972 > No Cine Gabu, da esquerda o Gregório Gil Gaudêncio, o António e o Graça (mais tarde seu compadre, padrinho do seu filho Pedro).

Foto de António Santos, editada por Carlos Vinhal


2. Comentário de CV

São mensagens como esta que nos dão forças para continuar este trabalho tão absorvente, mas compensador.

Apelo ao António Santos para, no caso de ter mais fotos onde apareça o Gaudêncio ou outros pormenores que julgue úteis para dar a conhecer a esta nossa nova amiga, faça chegar até nós para publicarmos.

À nossa nova filha pedimos, se nos ler, que nos contacte para luisgracaecamaradasdaguine@gmail.com para fazermos chegar até si o que se conseguir obter sobre o seu pai.
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Nota de CV

(*) Vd. poste de 29 de Junho de 2006 > Guiné 63/74 - P922: Memórias do Pel Mort 4574 (A. Santos): O mauzão do Hitler de Nova Lamego

Guiné 63/74 - P3424: 16.000 minas montadas entre Bula e S. Vicente (António Matos, ex-Alf Mil, CCAÇ 2790, Bula, 1970/72)

Como sobrevivi a um campo de minas 

António Matos ex-Alf Mil CCAÇ 2790 Bula, 1970/72

Já por várias vezes referi neste blog à minha interferência na montagem dum campo de minas no terreno que ladeava a estrada Bula - S.Vicente, mas para uma melhor compreensão de quem o não saiba, vou tentar dar uma ideia mais precisa dessa realidade.

A estrada Bula-S.Vicente tinha uma extensão de cerca de 16 kms e ao longo dela realizavam-se caravanas de transporte de populações para além das patrulhas militares. A Guiné é constituída por uma morfologia de terreno plano, sendo que a maior altitude se cifra nos 300 metros, num planalto do maciço do Futa Djalon o que, em termos militares, dificultava a orientação por falta de referências. De um e de outro lado da referida estrada existiam dois pontos estratégicos: Ponta Matar, a oeste, e Choquemone, a leste.

Ao tempo, 1970/72, estes locais albergavam guerrilheiros que procuravam mantimentos perto de Bula (tabancas de Capunga, Pete, Ponta Consolação, Augusto Barros e Mato Dingal). A minagem justificava-se para obrigar o IN a utilizar as passagens que estivessem "vigiadas" 24 horas por dia pelas nossas tropas. Para essa tarefa formaram-se várias equipas de especialistas uma das quais, liderada por mim.

Estávamos em Outubro de 1971

Estratégicamente, pretendia-se minar todo o lado leste da estrada, desde o km 4 até ao km 13. Tecnicamente, a implantação das minas seria em duas fiadas mais ou menos paralelas. Obtido o azimute desde o ponto de referência inicial do troço até ao ponto final do mesmo, mediam-se os primeiros 3 metros nessa linha imaginária; aí, e perpendicularmente a essa linha, mediam-se 1,5 metros onde se abria um buraco com a ajuda da faca do mato, que albergasse a mina anti-pessoal de fragmentação, portuguesa, ficando apenas a descoberto, as 3 finas pontas finais as quais, uma vez pisadas, despoletariam toda a sequência de deflagrações por simpatia até que a última, a do bloco de trotil onde se encaixava o detonador, faria os piores e mais hororosos estragos à infeliz vítima. Uma vez colocada esta mina, metálica e detectável com o detector eléctrico, mediam-se novamente 1,5 metros quer para a esquerda, quer para a direita quer ainda para a frente dela e, em cada uma destas localizações, montava-se uma mina anti pessoal de sopro, italiana, de seu nome Encrier.

as mãos...

Regressando à linha imaginária entre as duas referências, mais 3 metros e repetia-se toda esta sequência, embora para o lado contrário. Se se imaginar agora que, paralelamente, seguia uma outra linha imaginária com o mesmo esquema e número de minas, fácil é de calcular que a densidade por metro quadrado não dava grandes hipóteses de se passar sem accionar um destes engenhos. Todo este trabalho era simultâneamente acompanhado da feitura dum croqui que permitisse a todo o momento procurar, verificar, substituir, ou levantar o que fosse necessário. Claro que as precauções eram imensas! Desde logo porque todo o manuseamento dos engenhos era, já de si, susceptível de disparo inadvertido; depois porque as Encrier eram quase que deixadas à superfície o que não impedia que qualquer bicho ao farejá-las não levasse com ela nos queixos e por ali ficasse; a própria época das chuvas se encarregaria de as deslocar (dificultando perigosamente a sua localização à posteriori); os azimutes tinham de ser extremamente bem conseguidos sob pena de 1 grau de desvio representar uma grande amplitude de erro ao longo da linha imaginária; finalmente, a formação do bagabaga em cima das ditas tornava a operação de resgate uma tarefa imprópria para cardíacos! No total montaram-se cerca de 16.000 minas e, a par de alguns indígenas, e de diversos macacos, houve também vários camaradas acidentados.

a imagem Google (clicar para ver em tamanho mais aceitável) mostra esquematicamente a localização e extensão deste campo de minas. Infelizmente, na guerra, a "cunha" era tão omnipresente como no quotidiano e, como sempre, ganha o mais poderoso ainda que, posteriormente, não se evitem lágrimas de crocodilo para aligeirar "os remorsos".

Os campos de minas não se levantam, passam-se

Quero eu com isto dizer que, sendo dos livros que um campo de minas não se levanta, passa-se (para isso existem os croquis), aparecem sempre ombros estrelados que, por cagaço, incompetência e/ou mera prepotência, mandam os livros às malvas e impõem a lei do mais forte! Foi também o que aconteceu com esse campo de minas o qual teve que ser levantado (antes da guerra acabar!!!) apenas porque sim! Essa operação tornou-se um verdadeiro inferno em muito ajudado pela incompreensível condescendência admitida aos comandos dos piriquitos numa altura em que o fim da nossa comissão estava a chegar. Diariamente seguíamos para o campo com um espírito negativista devido à cadência dos acidentes e não raras vezes os vivi a uma distância de alguns poucos metros e mesmo alguns centímetros. E PUM!

Uma vez mais por meros motivos de memória futura destapo o baú das minhas más recordações e relato uma dessas ocasiões.

O Alf António Matos com o detector...

Tinha sido já detectada (por detector) a mina de fragmentação e propunha-me descobrir as outras à base de picagem do terreno. Simultâneamente, outro elemento de outra equipa (Furriel José Abreu, sapador) ocupava-se de idêntica operação no cacho (conjunto das 4 minas) contíguo; mais ao lado, um terceiro camarada (Furriel Santos) num 3º cacho. Eram evidentes as dificuldades em encontrá-las uma vez que essas minas estavam todas deslocadas das posições habituais por via das chuvas que, entretanto, tinham caído. Uma operação que normalmente demorava uns escassos minutos a neutralizar, prolongava-se, neste caso, há mais de 1/2 hora! Ordenei várias paragens para verificação de possíveis más colocações nossas mas não era o caso.

Repentinamente, PUM! e dou por mim caído no chão com o Abreu muito perto também estatelado . Os primeiros momentos foram de horror com a perspectiva das consequências. Recuperada a lucidez possível, perguntei ao Abreu se tinha sido ele a pisá-la, e o pânico apoderou-se dele perante essa expectativa. Não teve coragem para confirmar e então comecei eu a temer pela minha sorte. A dúvida de ambos é algo impossível de descrever pelos sentimentos provocados. Era imperioso esclarecer a situação e a muito medo cada um teve de certificar-se se ainda era possuidor de ambos os pés ou mesmo de ambas as pernas. É nessa altura que o camarada Santos, ali do outro lado, começa a dar sinais de ter sido ele a vítima. Havia que o ajudar de imediato mas não podia esquecer que estávamos caídos num campo de minas e qualquer gesto menos pensado podia transformar a ocasião num verdadeiro mar de sangue pelo possível rebentamento de vários outros engenhos. Tratei de localizar a nossa posição ao camarada enfermeiro (Aprígio) e "conduzi-lo" até nós via rádio. Esta tentativa demonstrou-se pouco prudente e optámos por levar o Santos para a estrada afim de ser socorrido. Uma vez aí, e perante um odor nauseabundo a carne humana assada, conseguimos pô-lo a soro e proceder à sua evacuação. A adrenalina só descarregou um par de horas mais tarde, no quartel, mas no dia seguinte, qual trapezista de circo que cai, voltamos para desafiar a sorte. Deus ajudou-me ! Estou inteiro! António

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  Notas: 1. Imagens e texto de António Matos.

2. Sublinhados e subtítulos da responsabilidade do editor. 2. artigos do autor em 1 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3390 Tabanca Grande (95): António Garcia de Matos, ex-Alf Mil da CCAÇ 2790, Bula (1970/72)

Guiné 63/74 - P3423: Notícias da trasladação de José Maria Fernandes Carvalho


1. Caros Tertulianos. Só uma pequena nota para dar conta de mais um adiamento na chegada dos restos mortais do nosso camarada José Maria Fernandes Carvalho a Portugal.

Segundo o que me disse o camarada Albano Costa, só no Aeroporto Sá Carneiro, a família e os amigos tomaram conhecimento de mais este adiamento. Problemas burocráticos ligados à falta da assinatura de alguém da Polícia local, impediram que o nosso camarada regresse ao seu definitivo repouso.

Lamentamos, pela família, estas horas difíceis que estão a viver. Para quando um luto em paz e definitivo?
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Vd. poste de 7 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3421: In Memoriam (12): Cerimónias fúnebres do nosso camarada José Maria Fernandes Carvalho

Guiné 63/74 - P3422: O Tigre Vadio, o novo livro do Beja Santos (2): O exemplar nº 1, autografado, dedicado à malta do blogue

Dário da Guiné, 1969/70: O Tigre Vadio. Dedicatória do Beja Santos: "Exemplar nº 1 do Luís e de toda a malta do blogue. Para o Luís Graça, querido camarada, verdadeiro impulsionador deste livro, grande responsável pelo que aconteceu na minha vida nos últimos 2 anos, o muito obrigado e a profunda admiração do Mário Beja Santos" (*).

O livro, com 440 pp., tem um prefácio (pré-texto) de Luís Graça e é profusamente ilustrado com fotografias dos seguintes amigos e camaradas da Guiné (por ordem alfabética):

A. Marques Lopes, Albano Costa, Carlos Marques dos Santos, Cristina Allen, David J. Guimarães, Henrique Matos Francisco, Humberto Reis, Jales Moreira, Joaquim Mexia Alves, José António Viegas, José Teixeira, Luís Moreira, Mário Beja Santos, Maurício Esparteiro, Raul Albino, Sousa de Castro, Sousa Pires, Torcato Mendonça.

O autor agradece "penhoradamente aos camaradas que publicaram as suas fotografias no blogue 'Luís Graça & Camaradas da Guiné' e deram autorização [, na pessoa do editor Luís Graça,] para a sua publicação neste livro que igualmente lhes pertence". Há uma menção "muito especial ao 'fotógrafo' militar ao Humberto Reis, pois, em muitas circunstâncias, foram as suas imagens que ambientaram e avivaram o regresso ao passado" (p. 8).

Penso que é chegada a altura de homenagear aqui a Cristina Allen, a ex-esposa do nosso camarada Beja Santos, e mãe das suas duas filhas. Foi graças à preservação e à posterior cedência das cerca de 500 cartas e areogramas que ele lhe mandou, que o nosso amigo e camarada Mário Beja Santos pôde escrever este e o anterior livro sobre a sua experiência humana e militar na Guiné (1968/70). Ao longo de dois anos, a Cristina esteve de tal maneira presente no nosso blogue, que vamos agora ter saudades dela, e sentir o vazio que será a sua ausência no futuro.


Para compensar ou prevenir essa perda, tomo a liberdade de anunciar que é uma honra, para nós, tê-la como membro da nossa Tabanca Grande. Seja bem vinda, Cristina! Espero que não interprete como intrusivo e abusivo o nosso gesto. O Mário e a Cristina viveram uma história de amor em tempo de guerra, que nós acompanhámos semana a semana, durante dois anos. Retrospectivamente. Uma história bonita, como todas as histórias de amor, que tivemos o privilégio de conhecer através das suas cartas e areogramas. Não é, não foi voyeurismo. Você e o Mário deixaram-nos entrar na vossa intimidade. Com elegância, com discrição. Muitos de nós revivemos igualmente as nossas histórias de amor. Temos para consigo uma dupla dívída, o ter deixado partilharmos esse período das vossas vidas, e o ter salvo esse notável espólio documental, que é a colecção das suas cartas e areogramas, de que sou fiel depositário, com a obrigação de um dia doá-lasao Arquivo Histórico-Militar. Por tudo isto, que é muito, o nosso muito obrigado, Cristina.

Contracapa do último livro do Beja Santos, Diário da Guiné, 1969-1970, O Tigre Vadio. O lançamento da obra será no próximo dia 11 de Novembro, 3ª feira, às 18.30h, no Museu da Farmácia, sito no Bairro Alto, Rua Marechal Saldanha, nº 1. A apresentação será feita pelo jornalista António Valdemer e pelo general na reforma Mário Lemos Pires. Este acto será antecedido, às 1630h, pela cerimónia da doação de peças históricas ao Museu da Farmácia e visita E às 18h, por um concerto de korá com o guineense Braima Galissá.





Ciclo de conferências "Memórias Literárias da Guerra Colonial". Biblioteca-Museu República Resistência, Lisboa, 19 de Outubro de 2008. Apresentação do livro do Beja Santos: "Diário da Guiné, 1968-1969: Na Terra dos Soncó". Excerto.

Vídeo: © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Vídeo (10' 59') alojado em: You Tube >Nhabijoes

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Nota de L.G.:

*) Vd. poste anerior desta série > 5 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3409: O Tigre Vadio, o novo livro do Beja Santos (1): Entrevista à Gazeta das Caldas

sexta-feira, 7 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3421: In Memoriam (12): Cerimónias fúnebres do nosso camarada José Maria Fernandes Carvalho, Soldado da CCAÇ 1566, falecido por motivo de doença em Agosto de 1966

José Maria Fernandes Carvalho, Soldado da CCAÇ 1566, que faleceu por motivo de doença em Agosto de 1966. Esteve sepultado até agora na campa n.º 25 do Cemitério de Bolama.


1. Caros camaradas e amigos tertulianos:

De acordo com as últimas informações fornecidas pelo nosso tertuliano Albano Costa, os restos mortais do nosso camarada José Maria Fernandes Carvalho chegam ao Aeroporto Sá Carneiro amanhã, dia 8, pelas 9 horas da manhã, seguindo para a Capela de S. Sebastião, em Travanca, Amarante.

O funeral realizar-se-á na próxima Segunda-feira, dia 10, pelas 15 horas.

2. Transcrevemos parte do resultado das pesquisas do nosso camarada José Martins, sobre a CCAÇ 1566 e a morte do nosso camarada José Maria, inserido no poste 3389 (*).

O Soldado José Maria Fernandes Carvalho era natural da freguesia de Aião concelho de Felgueiras. Era solteiro e filho de Luís Carvalho e Glória Fernandes. Foi mobilizado no Regimento de Infantaria n.º 2, em Abrantes, e incorporado como Soldado Atirador na Companhia de Caçadores n.º 1566.

Esta unidade, comandada pelo Cap Mil Inf António dos Santos Paula, embarcou em 20Abr66, tendo chegado à Guiné a 26 do mesmo mês.

Após curta permanência em Bissau, na dependência do BCaç 1876, a fim de substituir temporariamente a CArt 676 na segurança e protecção das instalações e das populações da área, efectuando, simultaneamente, a instrução de aperfeiçoamento operacional na região de Mansoa.

Em 30Abr66, cedeu, temporariamente, um pelotão para reforço da guarnição de Pelundo, na dependência do BCav 790 e depois do BCaç 1877, onde se manteve até 26Jun66.

Foi durante a permanência em Mansoa, em 22 de Maio de 1966, que a unidade teve contacto com o IN, tendo falecido por ferimentos em combate o Soldado Atirador José Luís da Costa Almeida, natural da freguesia de Moreira de Cónegos, concelho de Guimarães, solteiro, filho de José de Almeida e Laurinda Pereira da Costa, tendo o seu corpo sido inumado no cemitério de Delães, Vila Nova de Famalicão.

Em 30Mai66, iniciou o deslocamento dos seus efectivos para Jabadá, tendo seguidamente rendido a CCaç 797, assumindo, em 03Jun66, a responsabilidade do subsector de S. João, incluindo o destacamento de Jabadá e ficando integrada no dispositivo de manobra do BCaç 1860 e depois do BArt 1914.


Foi neste período, em 25 de Agosto de 1966, que o camarada José Carvalho, veio a falecer vítima de doença.

No mesmo dia e na estrada de S. João – Nova Sintra, faleceu vítima de ferimento em combate, em consequência do rebentamento de um fornilho In o Soldado Condutor-Auto / Transmissões Francisco António Fernandes Lopes, natural de Estombar, concelho de Lagoa, solteiro, filho de Francisco Fernandes Lopes e Maria Rosa Fernandes.

Estes dois militares foram inumados na Guiné, no cemitério de Bolama, cabendo ao Francisco Lopes a campa n.º 24 e a José Carvalho a campa n.º 25.

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Nota de CV

(*) Vd. poste de 1 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3389: In Memoriam (9): Trasladação de José M. Fernandes Carvalho: as diligências de José Martins

Guiné 63/74 - P3420: História da CCAÇ 2679 (6): Piche, novamente (José Manuel Dinis)



1. Mensagem do nosso camarada José Manuel M. Dinis, ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71, com data de 6 de Novembro de 2008, com mais um capítulo da História da CCAÇ 2679.

Carlos,

Volto a dar-te trabalho. Aqui vai um novo conteúdo da 2679, basicamente do 2º. pelotão, na medida em que a minha memória não é tão abrangente quanto gostaria, e, por outro lado, não tenho tido a colaboração desejada sobre os restantes. Ainda assim, porfiando, pode ser que outros venham a terreiro.

Para o pessoal da Tabanca Grande e, para ti em especial, aquele abraço.
José Dinis

Piche, novamente.

O Guerra avisou-me de que faríamos a emboscada nocturna, para compensar outro pelotão que saíra duas noites consecutivas. Logo hoje, pensei, que tivemos uma coluna chata, cansativa, e tinha estado nos copos na expectativa de um resto de dia tranquilo. Como se naquela circunstância fosse possível planear os dias. Não era. O almoço, por tardio, consistia no resto da bianda com estilhaços, e não fora convidativo, pelo que, no bar, tomei uma lata de leite condensado, de origem holandesa, que fazia pof a cair no estômago, e, a seguir, para compensar aquela doçura excessiva, emborquei um whisky duplo. Depois, na conversa, bebi mais um bocado do destilado escocês, vulgo, scotish. Quase não comera durante o dia. Já um pouco enebriado pela acção etilizadora, fui avisar o pessoal na caserna, e pedi que antes da saída fossem ao meu quarto acordar-me, pois ainda tencionava aproveitar uma horita de sono.

Era assim, naquele tempo glorioso da Guiné. A alimentação era má e, por vezes dispensável. Cada um safava-se, ou esperava pela próxima refeição, a ver se compensava. Em contrapartida, em Piche, a qualquer hora do dia dispúnhamos de variadas e boas bebidas, tudo em doses de fartura. O que o governo fazia para nos apaziguar os espíritos.

Quando acordei o dia declinava e achei estranho não ter sido acordado. Pior ainda, pensei que o pessoal tivesse ignorado a saída, e isso representaria uma bronca com o Drácula, sempre pronto para a distribuição de porradas. Nestas dúvidas preparei-me para a noitada, sempre o mais ligeiro possível, apenas com as cartucheiras no cinto, a prender a camisa dentro das calças. Agarrei o quico e a espingarda, fui à parada, onde não havia sinais do pelotão.

Fui à caserna, e informaram-me que tinham saído. Cabrões, abalaram sem me dizer nada, cismei enquanto me dirigia à porta de armas. Aí indicaram-me que o pessoal seguira pela estrada de Buruntuma, e teriam saído um bocado antes.

Fiz-me pela estrada fora à procura de sinais, sem saber se teriam tomado alguma outra direcção a partir da estrada. Em passo apressado, porque a noite anunciava-se iminente, em breve detectei o cagaçal alegre do Foxtrot, e quando me juntei a eles, tratando-os com a elegância de quem se sentia traído por não ter sido acordado, o Guerra lembrou-me que devia estar agradecido por isso, e que só um tonto se metia à estrada quando podia ficar no bem-bom. Se queria outra consideração, que não me embebedasse, que ninguém se esquecera de mim. E que tivesse calma, que havia muita guerra para me distrair.

Futebóis

Um belo dia participei num jogo de futebol. A coisa deve ter corrido bem, pois o pessoal apreciou as minhas qualidades. Logo o major comandante de operações, o tal que frequentava a Praia da Rainha em Cascais, designou-me para capitão de uma equipa, enquanto ele capitaneava a outra, e assim, aos domingos, muito cedo, passámos a praticar entusiásticas partidas de futebol, com início, parece-me, pelas seis da manhã, que às nove horas já a elevada temperatura debilitava as forças.

Por causa disso, quando me calhava fazer emboscadas nocturnas nas noites de véspera, o Foxtrot estava autorizado a regressar mais cedo ao aquartelamento, para que fosse assíduo e não atrasasse os jogos. Aconteceu uma vez ou duas, ora pela rotação da escala, ora por não ter poiso certo na área do Sector. As renhidas partidas, onde pontuavam caceteiros, trapalhões, esgazeados, e alguns habilidosos, empolgavam os participantes, apesar da falta de prémios de jogo, ou outras compensações, apesar da escassez de público apoiante e gerador de entusiasmos, já que a hora matutina mais aconselhava cama, do que ver os galfarros em correrias desconexas, perseguindo a maltratada bola nas direcções mais inesperadas.

À falta de uma comissão de árbitros, a tarefa da arbitragem era superiormente desempenhada por um valoroso cabo da CCS, homem judicioso e nada intimidável, que cortava a direito, conforme o seu ponto de vista. Apreciei-o, como sempre apreciei quem assumia esse papel, pois concitava inúmeros ódios e provocações, minimizando-os com a parcimónia do uso do apito.

Em certa partida, daquelas em que uma das equipes não consegue distinguir-se da outra através do resultado, com o pessoal empenhado na consecussão da vitória, um dos meus adversários, lançado em corrida desenfreada, entrou com os pés e o resto do corpo, por um dos elementos da minha equipa, que volteou em caprichoso contorcionismo e, por via disso, perdeu o complicado domínio do esférico. Nem esperei pelo apito do árbitro. Arreganhei a dentuça e dirigi-me ao agressor, disposto a esclarecer e empatar a jogada com picardia. Do outro lado do campo, o defesa central, que jogava durinho e estimulava os companheiros com umas entradas que, se passava a bola, não passava o inimigo, despojado dos galões, não conteve a calma perante o meu ar determinado, e gritou-me:
- Oh Dinis, olha que isto não é a guerra!

Pronto no controle da situação, com voz firme e decisiva, o excelente árbitro dirigiu-se-lhe com autoridade:
- Oh major, aqui quem manda sou eu!

Do resultado não reza a história, resta apenas a lembraça de momentos magníficos de camaradagem, pois, independentemente dos resultados e dos intervenientes, os jogos acabavam sempre bem.

Foto de duas equipas de futebol de cinco (?), onde sou o único da 2679, e não aparece o major

O Ribeira Brava

O Virgílio de Sousa era oriundo da Ribeira Brava, pelo que, assim associado, ficou alcunhado pelo nome terra atravessada pela ribeira, que, durante as chuvas intensas, fazia deslocar furiosos caudais, em turbilhão por estreitas margens alcantiladas, onde confluiam inúmeras linhas de água com origem nas encostas da serra , e contribuíam para evidenciar a violência dos elementos, que o homem nem sempre pode controlar. Ali fora às sortes que ditariam a mobilização.

O Virgílio não rejeitava as características da ribeira, mas era muito bem educado, sem subserviência, e dedicado ao serviço, condições refinadas pela profissão de empregado de mesa, com aspirações a desenvolver para singrar. Pensava emigrar para exercer esse mister com melhor proveito. Complementava essas qualidades com a instrução escolar obrigatória, que o habilitava na ajuda da troca de correspondência que os camaradas menos afortunados mantinham com familiares.

Entroncado, disponível e bem disposto, tornou-se um dos elementos-chave para a coesão entre o Foxtrot. Não revelava grande iniciativa, mas não virava a cara aos diferentes afazeres, e sempre se mostrou intuitivo e determinado nas acções militares, pelo que granjeou a confiança de todos.

Alguns elementos do 2.º Pelotão - Foxtrot, de pé, da esquerda para a direita: Dinis, Abreu, Teresa e França. Em baixo: Lamarão (condutor), Rodrigues, Martins e Virgílio Sousa
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Nota de CV

Vd. último poste da série de > 27 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3362: História da CCAÇ 2679 (5): Canquelifá, duas histórias e um ataque frustrado (José Manuel Dinis)

Guiné 63/74 - P3419: Zona de intervenção, zona de perdição da CCaç 2790. António Matos.


Um cronista profissional que se preze deverá ter um método de trabalho que prime pela catalogação dos assuntos, pela calendarização dos mesmos, pela hierarquização de interesses e pela documentação que os suporta.

Depois virá a apresentação.

Pois bem, mas eu não sou um cronista profissional e, como tal, deixo-me levar mais pelo entusiasmo da recordação que no momento aflorou à memória RAM do meu cérebro e não tanto pelos critérios tão eloquentemente expressos atraz.

Aliás os temas são muitas vezes sugeridos por analogia de situações relatadas aqui no blogue por outros camaradas e depois é deixar divagar ao sabor da corrente da consciência ...
Posto este ponto prévio como justificativo do porquê de ora agora falar de minas e amanhã referir um acontecimento relacionado com a chegada à Guiné, passarei, sempre que possível, a documentar as minhas intervenções com uma ou outra foto na tentativa de melhor enquadrar as histórias.




Zona de intervenção, ou zona de perdição do António Matos e Camaradas da CCaç 2790. Google Image.

emblema do BCaç 2928 ( a que pertenceu o António Matos).




uma parede do quartel de Bula com:

a) - à direita vê-se o emblema do Batalhão 2868 ( Os Chicotes ) que íamos render ( de cavalaria como se nota pelos cavalos )
b) - Ao lado o emblema do BCaç 2928 que tinha as companhias 2789 / 2790 / 2791 e que mais tarde é reforçado por 2 outras companhias independentes ( 3420 do Salgueiro Maia e a 3328 ).

"Excelentes e Valorosos" (lema do batalhão) só podia ser um autêntico ASTERIX!


CCaç 2789, os Vigilantes.



CCaç 2790, a Cª do António Matos.




CCaç 2791.

Sendo assim, hoje tenho apenas como missão, dar a conhecer a todos a zona de perdição dos meus 24 meses de ultramar fazendo votos que os ilustres camaradas editores consigam colocar a fotografia do Google onde marquei os sítios-limite das nossas actuações.

Abraços,

António Matos

ex-Alf MilCCAÇ 2790
Bula, 1970/72

PS - naquela altura já havia o célebre conceito de mobilidade ( hoje tão em voga mas agora de autoria de Sócrates ) que fez com que a CCaç. 2791 fosse deslocada temporariamente para Teixeira Pinto cuja actividade não é aqui mencionada.

___________

Notas:

1. Imagens e texto de António Matos.

2. artigos da série em

6 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3415: Histórias engraçadas (António Matos) (2): Bifes, ratos, Irish Coffee e até o IN em dia de anos (António Matos)

1 de Novembro de 2008 > Guiné 63/74 - P3390 Tabanca Grande (95): António Garcia de Matos, ex-Alf Mil da CCAÇ 2790, Bula (1970/72)

Guiné 63/74 - P3418: Álbum fotográfico de Manuel Bastos Soares (1): Bambadinca, a festa da comunhão solene, Dona Violete e a malta da CCAV 678 (1965/66)


Guiné > Zona Leste > Região de Bafatá > Bambadinca > Foto nº 5 > Abril de 1965 (?) > Festa da primeira comunhão > A menina branca, filha do chefe do posto de Xitole, ladeada pela Professora Primária Dona Violete (à esquerda, de óculos escuros) e a esposa de um dos comerciantes locais (à direita).




Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Bambadinca > Foto nº 3 > Abril de 1965 (?) > Capela local > Um grupo de meninos e meninas (só uma das quais é branca, filha do chefe de posto do Xitole, a frequentar a escola primária em Bambadinca), no dia da comunhão solene, devidamente enquadrados por uma freira, católica, muito possivelmente missionária e estrangeira.
 

Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Bambadinca > Foto nº 6 > 1965 > Festa de 1º. aniversário da CCAV 678, em Bambadinca. Na mesa dos oficiais e sargentos, o 1º de frente e da esquerda é o Fur Mil At Manuel Bastos Soares, autor destas fotografias, natural de Vila Nova de Gaia e residente na Maia.


Guiné > Zona Leste > Bambadinca > Foto nº 10 > Fevereiro de 1966 > Vista aérea de Bambadinca, tirada do lado do Rio Geba e da estrada Bafatá-Bambadinca, vendo-se em primeiro plano a tabanca, atravessada a meio pela estrada; e em segundo plano, a íngreme (e poeirenta, no tempo seco) rampa de acesso ao aquartelamento e aos edifícios administrativos da localidade (posto administrativo, correios, escola, capela...); em terceiro plano, a tabanca de Bambadincazinho (à esquerda da estrada) e do outro lado, a pista de aviação e o cemitério local; em quarto plano a bifurcação da estrada: para a esquerda, Xitole (não havia ainda Mansambo, só construído em 1968); para a direita, Xime. Ao fundo, do lado direito, talvez o Rio Udunduma, afluente do Rio Geba...


Guiné > Zona leste > Bambadinca > Foto n º 11 > Fevereiro de 1966 > Vista aérea da tabanca de Bambadinca, à esquerda, e do Geba Estreito, à direita; em segundo plano, o morro, onde se situava o quartel e outras instalações civis e administrativas. Estas duas fotos foram tiradas de um Cessna, dos TAG - Transportes Aéreos da Guiné, fretado pelo Cap da CCAV 678 para trazer víveres, de Bissau, para o pessoal.

Fotos (e legtendas): © Manuel Bastos Soares (2008). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar. Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1.Mensagem de Beja Santos, de 4 de Novembro último:


Queridos amigos:

Aqui vão fotos históricas do nosso camarada Manuel Bastos [Soares]. Oxalá ele entre na nossa tabanca grande e nos preste relevantes serviços, como estas imagens abonam. Esta é mesmo a D. Violete, que eu conheci, mais amadurecida. Comoveu-me muito esta lembrança, transfiro-a já para o nosso blogue. 

Até breve, um abraço do Mário.


2. Mensagem de 31 de Outubro de 2008, enviada por Manuel Bastos [Soares] ao Beja Santos:


Assunto: FOTOS DE BAMBADINCA - D. VIOLETE

Caro Beja Santos :

Antes de mais as minhas cordiais saudações. Como é meu dever e obrigação, passo a apresentar-me: de nome, chamo-me Manuel Bastos Soares, sou natural de Santa Marinha, Vila Nova de Gaia (aqui nasceu o nome Portugal), fui militar na Guiné-Bissau de Julho de 1964 a Abril de 1966, e resido na cidade da Maia.

O motivo que me leva a escrever-lhe está relacionado com a sua prosa (dou-lhe os meus parabéns pela mesma), que fui lendo, desde que sou cliente, e assíduo, do
blogue do Luís Graça. 

Tal como eu, o Beja Santos também esteve em Bambadinca e nos seus escritos fala muito de determinada senhora, a D. Violete, com a qual tinha óptimo relacionamento, mas da qual nunca vimos nenhuma foto dela.

Na minha posse, tenho várias fotos, tiradas em Bambadinca no dia da comunhão solene em Abril de 1965 (?), e numa das quais está uma senhora, cujo nome se me varreu por completo da memória, e que na época era a professora da escola primária de Bambadinca.

Será esta senhora a D. Violete? Na hipótese de querer confirmar, se é ou não a dita senhora, terei imenso gosto em enviar-lhe, via e-mail, a foto digitalizada, assim como outras de Bambadinca.

Com os melhores cumprimentos:

Manuel Bastos


Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > O nosso fotógrafo-mor, o ex-Fur Mil Op Esp Humberto Reis, da CCAÇ 12 (1969/71), tirou um slide com os memoriais das unidades que passaram por Bambadinca. Havia no nosso tempo vários memoriais, no meio da parada, junto ao pau da bandeira, frente à escola local (onde ensinava e vivia a misteriosa Dona Violete). 

Como a imagem original que possuímos em arquivo, tem uma boa resolução (2,5 Mb), procedemos à sua edição. Neste excerto, o Humberto tem à sua direita o memorial do Pel Mort 1192 (Bambadinca, Maio de 1967/ Março de 1969) e, se não me engano, o da CCAV 678 (que não vem na lista do Benjamim Durães). O Manuel Bastos  Soares também reconheceu, nesta foto, o brazão da sua companhia. Logo me confirmará se o meu raciocínio está certo. Sabemos, pela lista do Durães (**), que nessa altura também esteve em (ou passou por) Bambadinca a CCAV 1482 (Nov-65 Bambadinca Abr-66 Xime Jul-67 / Jan-67 Ingoré).



Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Parada do aquartelamento, frente à escola primária > Memoriais de unidades que passaram por Bambadinca > Pormenor: um primeiro plano, ao centro, o momento evocativo da passagem do BCAÇ 1888, o primeiro batalhão com sede em Bambadinca (Mai-66 Fá Mandinga Nov-66 Bambadinca Jan-68), de acordo com a lista do nosso camarada Benjamim Durães (**). A CCAV 678 deve ter sido rendida pela CCAÇ 1551 / BCAC 1888 (Mai-66 Bambadinca Nov-66 Fá Mandinga Jan-68 Fev-67 Xitole).


Por detrás vê-se o monumento do Pel Rec Daimler 2046 (Bambadinca, Maio de 1968/ Março de 1970). E do lado esquerdo, o BCAÇ 2852 (Bambadinca, 1968/70), cuja CCS teve um morto, o Sold Cond Auto Manuel Guerreiro Jorge.

Fotos (e legendas): © Humberto Reis (2005). Todos os direitos reservados. [Edição e legemdagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


3. Mensagem de 3 de Novembro de 2008, enviada ao Beja Santos pelo Manuel Bastos

Caro Amigo Beja Santos:

As minhas cordiais saudações.

Na posse do seu e-mail, cá estou a responder ao mesmo, e naturalmente também
à sua curiosidade e ansiedade. Entretanto vou contar-lhe rapidamente a história destas fotografias.

Corria o Ano da Graça de 1965, e calculo eu, por volta do mês de Abril, realizou-se em Bambadinca a comunhão solene dos meninos e meninas da comunidade católica local.
De entre as meninas do grupo, fazia parte a única menina branca que está em duas das
fotos que lhe envio.

E quem era essa menina? De nome varreu-se-me da memória, mas sei que era filha do chefe de posto do Xitole, e como não havia escola na localidade, o pai colocou-a em Bambadinca. Hospedou-a em casa de uns comerciantes brancos (creio eu, empregados da casa Gouveia), estando a esposa numa das fotos, com uma criança ao lado.

Como eu tinha bom relacionamento com o dito comerciante, pediu-me para tirar as respectivas fotografias da comunhão da menina. Num gesto de retribuição e simpatia convidou-me para o almoço da festa da comunhão. Naturalmente que aceitei e agradeci. Nesse mesmo almoço esteve presente a Professora da escola primária de Bambadinca, que é a senhora que está de óculos escuros na foto nº. 5, e que creio eu será a D.Violete.

Dada a explicação quanto ao motivo que me levou a ser repórter fotográfico, passemos ás fotos.

Já se apercebeu que além das fotografias da comunhão, em anexo tenho o prazer de lhe enviar algumas mais, de locais que lhe farão lembrar os seus tempos passados pelas terras quentes e vermelhas de Bambadinca. Como as fotos não têm legenda passo a descrever:

Foto 3: Meninos e meninas da Comunhão Solene, em Bambadinca com a Irmã freirinha.

Foto 5: A menina filha do chefe de posto do Xitole, com a Professora e esposa do comerciante.

Foto 6: Festa de 1º. aniversário da CCAV 678, em Bambadinca. Na mesa dos oficiais e sargentos sou o 1º de frente e da esquerda.

Fotos 10 e 11: Vistas aéreas de Bambadinca, quando regressava de férias [de Bissau] em Fevereiro de 1966.

Julgo que por agora ser tudo, não deixando contudo de lhe formular um convite: se por acaso viajar cá por estes lados, terei imenso prazer em recebê-lo em minha casa. Em anexo envio-lhe o meu cartão para melhor cá chegar.

Sem mais, um abraço do amigo ao dispor:

Manuel Bastos

P.S. Caro Beja Santos, vai-me desculpar, mas não consigo enviar-lhe as fotos todas juntas, pois os ficheiros são demasiado pesados, por esse motivo vão seguir em vários e-mails.

4. Comentário de L.G.:

Falei, há umas duas ou três horas, ao telefone, com o Manuel Bastos. A cumplicidade da Guiné e o conhecimento de Bambadinca vieram logo ao de cima. Passado 30 segundos, já estávamos a falar como velhos camaradas, e a tratarmo-nos como deve ser, entre camaradas da Guiné, ou seja, por tu...

Fiquei a saber que o novo membro da nossa Tabanca Grande (vai entregar as fotos da praxe e as notas biográficas), andou primeiro por Cacine e Cabedú, no Cantanhez, noutra unidade (cujo não nº não consegui fixar, mas penso que foi a CCAÇ 555, do Norberto Costa) (*), antes de vir para Bambadinca, para a CCAV 678.

Esteve na construção do destacamento da Ponta do Inglês, passou por Fá, pelo Xime e pelo Enxalé. "No meu tempo ainda não havia o cais do Xime, nem a estrada Bambadinca-Bafatá era alcatroada"... Teve mortos no Buruntoni e em Ponta Varela... Fez colunas logísticas ao Xitole, sempre com porrada... Nunca foi ao Saltinho.

As melhores memórias que guarda, são as de Bambadinca... "Ainda gostaria de lá voltar um dia", confessou-me ele ao telefone. Da próxima vez que eu for ao norte, estou convidado a procurá-lo. Mora na Maia, Gueifões, próximo de camaradas nossos como o Zé Teixeira, de São Mamede de Infesta. Incentivei-o a passar a frequentar a Tabanca de Matosinhos, às 4ªs feiras. Está reformado, há 3 anos, depois de 40 e muitos anos de trabalho. Era formador numa escola profissional (CENFIM).

Fiquei com uma bela impressão do camarada Manuel Bastos... Estivemos à conversa mais de meia hora. Disse-lhe que foi comovente para mim e para o Beja Santos revisitarmos Bambadinca, através das suas fotos, a nossa Bambadinca comum... Numa próxima oportunidade ele irá assinalar-nos as diferenças existentes em 1965/66 por comparação com as fotos de 1969/70, do Humberto Reis.

Desejei-lhe as boas vindas ao nosso blogue que ele, de resto, conhece e acompanha há mais de um ano, silenciosamente... (Sentindo-se mais disponível depois da reforma, há um ano escreveu a palavra Guiné no Google e foi dar com o nosso blogue, cuja leitura, frequente, já não dispensa).

Sobre a CCAV 678, tínhamos até agora poucas referências no nosso blogue. Por exemplo, encontrei informação, na lista do A. Marques Lopes, sobre dois mortos desta unidade, que ficaram sepultados na Guiné:

(i) José Augusto Silva Pereira, Soldado / CCav 678 /30.08.65 / HM241, Bissau / Ferimentos em combate / Xime / Vilar da Maçada, Alijó / Cemitério de Bissau, Campa 1953, Guiné.

(ii) Nuno da Costa Moreira, 1.º Cabo / CCav 678 / 10.11.65 / Galomaro / Acidente de viação / Pedorido, Castelo de Paiva / Cemitério de Bissau, Campa 2038, Guiné.

Mas fiquei com a ideia de o Manuel Bastos me ter dito que, no cemitério de Bambadinca, no seu tempo (1965/66), havia pelo menos um morto, branco, da sua unidade ou de outra unidade que passou por Bambadinca (CCAV 1482 ?), e cujo nome não constava da lista dos mortos sepultados na Guiné, organizada pelo A. Marques Lopes.

Pelas fotos que o Manuel Bastos nos manda percebe-se que houve posteriormente uma escalada da guerra que terá levado à saída das famílias portuguesas e ao aumento dos efectivos militares. No seu tempo ainda não havia nenhum batalhão sediado em Bambadinca. O primeiro terá sido o BCAÇ 1888 (1966/68).

_________

Notas de L.G.:

(*) Vd.postes de:






quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Guiné 63/74 - P3417: Em bom português nos entendemos (4): Ele há histórias e estórias... (Norberto Gomes da Costa / Luís Graça)

Há tempos (21 de Outubro de 2008), o camarada António Varela que foi Fur Mil Sapador na CCS/BART 2865, Catió, 1969/70, e já aqui nos contou a estória do seu baptismo de fogo (agora, deve-se escrever batismo, sem p), mandou-nos o seguinte mail (deve-se dizer: mensagem de correio electrónico):
Caro Luis, Carlos e Virgínio: Em anexo segue um artigo do Correio da Manhã de Dez/2006 sobre "Pulo genético une Portugal á Guiné Bissau", que eu penso ter interesse para o Blogue.
Um abraço. António Varela

Respondi-lhe no dia seguinte, nos seguintes termos:
António: Obrigado pela tua atenção. Claro que a divulgação da investigação neste domínio (biologia das populações) nos interessa. Mas é preciso ter cuidado com os nossos jornais... Aqui o jornalista queria dizer "pool" genético... Pool=base, e não pulo=salto... Este erro (grosseiro) ficou "gravado" na Net, replicado, reproduzido noutros jornais... Um grande abraço. Luís
Reproduz-se acima o infeliz título de caixa alta... (Na foto, o então investigador da Universidade da Madeira, Doutor Hélder Spínola, que não teve nada a ver com o erro grosseiro do jornalista).

Foto: Correio da Manhã, 30 de Dezembro de 2006. (Cortesia do António Varela).


1. Mensagem de Norberto Gomes da Costa, com data de 22 de Outubro último:


Assunto - A malfadada 'estória'

Meus caros Luís Graça, Carlos Vinhal e V. Briote,

Leio sempre com muito interesse todas as mensagens que os amigos tertulianos enviam para o nosso blogue. Pode dizer-se que a grande maioria, se não a quase totalidade dos textos tem interesse; estão até, relativamente, bem escritos. Porém, é raro haver um que não contenha a malfadada palavra "estória".

Confesso que "encanito" deveras com essa pseudo-palavra, que não faz parte do léxico português de Portugal, que não consta de nenhum dicionário sério da língua portuguesa, que, segundo penso, só é usada pelos nossos amigos brasileiros e para se referirem aquelas histórias que as avós contam (ou contavam) aos seus netos, à lareira nas noites de Inverno. Ou seja, histórias que nunca existiram, sendo, portanto, inventadas.

Ora, as nossas histórias em terras da Guiné são bem reais, aconteceram e algumas delas bastante dramáticas, como sabemos. Assim sendo, merecem ser "histórias" e não essa "coisa" que não é nada e só, francamente, nos diminui.

Meus amigos, eu tenho hesitado em desabafar do modo que estou a fazer, até porque quem sou eu para dar lições a quem quer que seja. Mas custa-me ver os gloriosos e, por vezes, heróicos acontecimentos que, de uma maneira ou de outra, todos vivemos nas matas e bolanhas da Guiné, alcunhados de "estórias". Gostaria imenso que esse vocábulo fosse banido dos escritos da Tabanca Grande.

Não queria terminar sem antes pedir desculpa pela minha intervenção, podendo
parecer que estou a tentar ser uma espécie de provedor da língua de Camões, o que, de modo algum, corresponde à realidade. Mas, este impulso "anti-estorial" é mais forte que eu.

Um grande abraço a todos,
Norberto Gomes da Costa


2. Fica também aqui a mensagem de António Fernando da Fonseca Moreira , com data de 6 de Março de 2008, a propósito do mesmo tópico (estória/história):

Assunto - Dúvida ortográfica

Exmo. Senhor Luís Graça

Como também fui obrigado a ir para a guerra de Angola, uns amigos meus, que estiveram na Guiné, indicaram-me o vosso blogue para ir visitar.

Acabei de o fazer neste momento e fiquei admirado por aparecer a palavra «estória» que, por não conhecer, fui ver a vários dicionários e não a encontrei.

Por esta razão e apelando à sua boa vontade venho pedir-lhe o especial favor de me dizer em que fonte de saber poderei encontrá-la para assim enriquecer o meu léxico.

Sem mais, fazendo votos de sucesso para o blogue e ficando a aguardar a sua prezada informação, peço aceite os meus melhores cumprimentos.

António Fernando da Fonseca Moreira
Alameda Eça de Queirós, 36-1º centro
4410-282 Canelas VNG

3. Comentário de L. G.:

Meus caros Norberto Gomes e António Fernando, combatentes da mesma guerra (um na Guiné, outro em Angola):

Mais de meio ano para responder à pergunta do António, convenhamos que é muito tempo. Infelizmente não somos editores a tempo inteiro, nem eu nem o Carlos Vinhal nem o Virgínio Briote, meus queridos co-editores.

Como devem imaginar, é-nos humanentemente impossível responder a toda a correspondência que nos chega. Usamos, por isso, critérios de oportunidade e interesse editoriais, priveligiando as coisas e as loisas da Guiné… Mas já que ambos levantam a questão da estória 'versus’ história, vou dar-vos a minha opinião…

(i) Uma coisa é uma estória (com elementos ficcionais ou não, com alguma efabulação, e preocupações literárias; escritores lusófonos gostam do termo e cultivam-no…);

(ii) outra coisa é a história, enquanto disciplina científica, ou a nossa história de vida (biografia), mais factual, mais memorialística… Ou a ainda história da nossa unidade, mais documental, mais técnica, em linguagem mais neutral…

(iii) Temos, no blogue, várias séries que operam esta distinção: estórias (ficção, inspirada na realidade vivida, texto mais livre, em que o rigor factual não é tão importante, em que há uma certa reconstrução do real, do vivido…) e história (narrativa, depoimento, relato mais documentado, mais factual, mais detalhado, com mais precisão, com números, datas, lugares…); por exemplo, "estórias cabralianas" e "história de vida"... mas também "estórias de Guileje"!

(iv) O Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa (em 6 volumes, que é um dos meus livros de... cabeceira, e que é, em minha opinião, uma verdadeira obra-prima da lexicografia da nossa língua...) diz o seguinte a respeito do termo estória:

Vocábulo que remonta ao Séc. XIII. O mesmo que História. No Brasil, a partir de 1912, passa a designar 'narrativa de cunho popular e tradicional; história'. Etimologicamente, vem do inglês story (Séc. XIII-XIV): 'narrativa em prosa ou verso, fictícia ou não, com o objectivo de divertir e/ou instruir o ouvinte ou o leitor'. Story, por sua vez, vem do anglo-francês estorie, do francês antigo estoire, e este do latim historia,ae.

(v) O termo história é polissémico, tendo vários sentidos ou sinónimos: (a) biografia, história de vida; (b) confusão, trapalhada, problema, embrulhada...; (c) enredo, intriga, trama...; (d) evolução, desenvolvimento (por ex., história da guerra, da literatura da guerra colonial); (e) melindre, escrúpulo, hesitação..; (f) mentira, conversa, fábula, invenção... (Vd. Dicionário Houaiss de Língua Portuguesa).

(vi) Eu sei que os historiadores não gostam da palavra estória, optando por lembrar a distinção que os ingleses fazem entre history e story... Esta última remeteria mais para a ideia de conto, mito, narrativa ficcional... enquanto history é a narrativa estrutura, sistemática, objectiva, dos acontecimentos, dos factos, dos feitos, etc. de um povo... Em português, seriam apenas grafias diferente de um mesmo vocábulo. A forma estória não se justificaria...

(vii) Também sei que os especialistas do Ciberdúvidas da Língua Portuguesa detestam o vocábulo estória... que não seria mais do que uma grafia, antiga, medieval de história. O nosso grande Camões não tem pejo em falar de histórias a respeito das aventuras (reais ou imaginárias) dos portugueses... (Devo dizer que tenho muito apreço pelo trabalho feito pela equipa do Ciberdúvidas em defesa da língua portuguesa, e é também um dos sítios a que recorro quando tenho dúvidas, e se tenho muitas!...).

(viii) A favor do uso do vocábulo estória/estórias, poderíamos, todavia, usar um outro argumento de autoridade (embora eu não goste muito de invocar e sobretudo de usar deste tipo de argumento): grandes escritores da língua portuguesa como o angolano Luandino Vieira (n. 1935, Lagoa do Furadouro, Portugal; Prémio Camões 2006) usam (e popularizaram) o termo estória… ou o moçambicano Mia Couto (n.1955, filho de colonos portugueses, e que escreveu, por exemplo, em 1994, as Estórias Abensonhadas)

Luandino Vieira é autor, por exemplo, de Velhas Estórias (Lisboa, Caminho, 2006; Col ‘Outras Margens’, 51), um dos seus livros recentes, com o termo “estórias” no próprio título…

Mas o título mais conhecido e que o consagrou foi Luaanda – Estórias, um livro de contos a que foi atribuído, em 1965, pela júri da Sociedade Portuguesa de Escritores, o Grande Prémio da Novelística… Acontece que o então jovem escritor, ‘contador de estórias’, militante do MPLA, José Luandino Vieira, estava preso no Tarrafal a cumprir uma pena de prisão de 14 anos por ‘práticas terroristas’ (sic)... Como classificar estes três estórias que foram escritas no pavilhão prisional da PIDE em São Paulo, Luanda, no ano de 1963, quando o escritor ainda não tinha sido transferido para o Tarrafal ? Não são seguramente histórias da carochinha... O Luuandino Vieira ousou na altura violar os códigos linguísticos da sua língua... Hoje é considerado um inovador...

O livro foi publicado pelas Edições 70 em 1972, sendo a sua 2ª edição apreendida pela PIDE/DGS e a Editora multada em 30 contos, por despacho assinado pelo director-geral da Informação da época. Grandes escritores portugueses como Ferreira de Castro e Jorge de Sena vieram em defesa da obra e do autor: este último salientou, por exemplo, o seu papel primordial no “desenvolvimento da literatura angolana de expressão portuguesa»…

(viii) Confesso que eu também não tenho (ou não teria) pejo em usar histórias em vez de estórias... Mas não me apetece banir nem menos proibir o seu uso, no nosso blogue... Além disso, seria uma maçada rever todos os postes em que estória deveria ser substituída por história... Mais importante ainda: não sou (nem me sinto) dono da língua portuguesa...

(ix) Mas aqui fica o conselho, aviso ou advertência do nosso camarada Norberto Gomes da Costa: "as nossas histórias em terras da Guiné são bem reais, aconteceram e algumas delas bastante dramáticas, como sabemos" , [pelo que] merecem ser 'histórias' e não essa 'coisa' que não é nada e só, francamente, nos diminui"... (Estou-lhe grato por levantar esta questão, e de frontal e saudavelmente discordar dos editores - pelo menos de um deles, o L.G. - que toleram ou até consagram o uso do vocábulo estória. (O Carlos Vinhal, esse, já manifestou publicamente as suas reservas).

(x) No entanto, e para finalizar, e antes de voltar a rever este pequeno pomo de discórdia, gostava de ouvir a opinião (sábia, serena...) de alguns membros da nossa Tabanca Grande, menos ortodoxos ou mais desalinhados , que escrevem aqui no blogue: o Jorge Cabral, por exemplo, que já escreveu 40 saborosíssimas, fantásticas, picarescas, divertidas, grotescas, absurdas... estórias cabralianas; ou os nossos amigos guineenses, formados por universidades portugueses, e com excelente domínio da escrita, o Leopoldo Amado e o Pepito, por exemplo. Ao Jorge Cabral aproveito, inclusive, a oportunidade para lhe recomendar a leitura do recorte de jornal acima citado: pode ser que o "pulo genético" (sic)... que une portugueses e guineenses lhe inspire mais uma desconcertante, desalinhada, heterodoxa, marginal, absurda, quase porno-humorística e quiçá inconveniente, politicamente incorreta, estória cabraliana...

Guiné 63/74 - P3416: Album fotográfico de Santos Oliveira (2): Tite, Tempestade tropical

1. Dando continuidade ao Álbum fotográfico do nosso camarada Santos Oliveira, ex-2.º Sarg Mil Armas Pesadas Inf do Pel Mort 912, Como, Cufar e Tite, 1964/66, apresentamos estas fotos com o título Tempestade tropical, tiradas em Tite, numa noite do mês de Junho do longínquo ano de 1965.

Todos nos lembramos de quanto eram bonitas e medonhas estas tempestades acompanhadas de violentas trovoadas. Quantas vezes os relâmapagos foram a única luz que tínhamos para nos ajudar nas progressões nocturnas. As fotos não precisam de legendas, mas os nossos camaradas podem comentar, relatando as suas impressões e emoções ao passarem por situações parecidas. CV










Fotos: © Santos Oliveira (2008). Direitos reservados


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Nota de CV

Vd. primeiro poste da série de 15 de Outubro de 2008 > Guiné 63/74 - P3318: Album fotográfico de Santos Oliveira (1): Tite

Guiné 63/74 - P3415: Histórias engraçadas (António Matos) (2): Bifes, ratos, Irish Coffee e até o IN em dia de anos (António Matos)

Aquele aniversário > 10 de Novembro 1970


Faltam 4 dias... para comemorar o meu 60º aniversário.



Mas naquele dia alguns camaradas de armas que comigo partilhavam aquele SPA em Augusto Barros, recordarão também outras peripécias dignas de uma taça de champagne bem levantada numa verdadeira exortação à vida!

As histórias da guerra não podem nem devem ser só com referências a um qualquer Requiem ainda que a memória dos que já partiram deva ser respeitada e recordada para efeitos de memória futura.

A história passa por todos nós e este blogue, quero crer, terá uma divulgação cada vez maior, e extravasará as fronteiras da comunidade dos ex-combatentes da Guiné e tornar-se-à um documento vivo e na 1ª pessoa para um dia poder pertencer ao acervo, quiçá, duma Torre do Tombo...

Mas voltemos a recuar 38 anos...

A manhã despertara com um céu azul e, às primeiras horas, um grupo de indígenas da tabanca dirigiram-se ao destacamento para oferecer ao alferes uma peça de carne digna de referência.


Augusto Barros, com Bula a Norte. Depois de passar João Landim, era sempre a andar até Bissau e à civilização, electricidade, o frango assado no Solar dos 10, o ar condicionado, enfim outras guerras...

O desenrolar do dia viria a demonstrar, porém, que a amabilidade escondia uma acção muito pouco prazenteira e que um menisco ainda hoje a incomodar, é o sinal mais evidente.

A rotina e contra-rotina diária a que eu me obrigava por motivos de segurança, não deixou de ser seguida nesse dia mas, entretanto, ia-se preparando a festa. O jantar não seria arroz com arroz mas sim bifes! Suculentos!

Uma terrina cheia foi alocada ao buraco cognominado de messe onde havia uma mesa rectangular com bancos corridos e onde a terra lateral funcionava de guarda-louça.

À noite era reconvertido em casino e lugar de tertúlia onde as entradas, não sendo reservadas, eram, contudo seleccionadas dia-a-dia.

Naquela noite, entre outros, o Asdrúbal era visita da messe.

Ao fim da tarde esperava-se a chegada do capitão que se deslocara a Bissau afim de trazer vitualhas a condizer com o dia. Chegou, enfim, e logo deu a sua lição de homem sabedor destas coisas.Comprou natas e 1/2 dúzia de copos de cristal e café de 1ª categoria....

Entretanto os bifes começaram a cheirar e a tal terrina foi posta no tal guarda-louça...

Um visitante inesperado, ou nem tanto

Por verdadeiro acaso, tive necessidade de entrar na messe e eis senão quando deparo com um cenário horrendo. Um rato de dimensões absolutamente assustadoras passeava-se na borda da terrina e ia lambericando a bifalhada.... C'os diabos! Que fazer?

Tive alguma contenção premeditada limitando-me a enxutar o paquiderme... A ideia era não fazer alarido do que vira sob pena de estragar o jantar a toda a malta.

Pela minha parte, restava-me contentar com o arroz na esperança de que esse não tivesse sido detectado por tamanho terrorista!

Como verdadeiro jantar estival numa esplêndida varanda dum qualquer hotel 5 estrelas, os convidados começaram a chegar...

Recordo o Asdrúbal num sumptuoso traje de calção curto e botas de lona sem atacadores, camisa aberta e com grandes manchas de suor debaixo dos braços, fralda meio saída, mas com uma extraordinária boa disposição e uma alma cheia de bom homem. Depois chega o capitão...

Entrámos no salão...Dei uma olhadela de soslaio à terrina dos bifes e nada fazia supor o espectáculo de há uns momentos atrás.

O manjar foi digno de reis e até fiquei na dúvida se uma bela lambuzadela de rato não delicia ainda mais um bom e suculento bife...

Passámos aos finalmente. O whisky, como todos nos recordámos, existia em quantidades suficientes e a preços de LIDL, naquelas paragens. E o capitão explicou...Íamos beber Irish Coffee!

Claro que Irish Coffee, à semelhança de champagne, não podia ser bebido em taças de alumínio! A mistura em partes iguais de café e bom whisky era fundamental.

A bebida tinha que ser coada pelas natas que aderiam às bordas do copo de cristal. O protocolo naquele ambiente não primava pela cerimónia, razão pela qual o Asdrúbal (e não só) bebeu o 2º Irish Coffee imediatamente a seguir ao 1º, altura em que o capitão informa que aquilo era uma bomba de efeito retardado.

O efeito Irish Coffee

Só o confirmámos mais tarde quando, acabada a sessão de lerpa que se seguia ao repasto, os convidados se começavam a levantar.

Foi assustador pois as pernas não obedeciam ao normal esquerdo-direito-op-2 e vai daí, registou-se o coma alcoólico do Asdrúbal que duraria 48 horas! A pedrada foi tal que passou várias horas debaixo do chuveiro de campanha (bidão com água e com furos no fundo) durante as quais aconteceu um ataque [do PAIGC] ao qual respondemos com galhardia, evitando baixas mas ouvindo alguns ai-ais do lado de lá a entusiasmarem-nos por estarmos a acertar no objectivo!

Eu completara 22 anos e aquilo não era maneira de comemorar tão fantástica idade, bolas!

Se eles me estiverem a ouvir, daqui vai um abraço ao Sucena, ao Cardoso, ao Barros Leite, ao Benigno Abreu, ao Asdrúbal, ao Salvador, ao Reis, ao Guedes Vaz, ao Alves Matos e não sei se caberia mais alguém no buraco...

António Matos

ex-Alf Mil
CCAÇ 2790
Bula 1970/72

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Notas de vb:



1. Negritos e títulos da responsabilidade do editor.