Guiné > Zona Leste > Sector L1 > Bambadinca > 1970 > Espectacular vista aérea do aquartelamento, tirada no sentido leste-oeste, ou seja, do lado da grande bolanha de Bambadinca.
Do lado esquerdo da imagem, para oeste, era a pista de aviação (1) e o cruzamento das estradas para Nhabijões (a oeste), o Xime (a sudoeste) e Mansambo e Xitole (a sudeste). Vê-se ainda uma nesga do heliporto (2) e o campo de futebol (3).
A CCAÇ 12 começou também a construir um campo de futebol de salão (4), com cimento roubado à engenharia nas colunas logísticas para o Xitole. De acordo com a fotografia, em frente, pode ver-se o conjunto de edifícios em U: constituía o complexo do comando do batalhão (5) e as instalações de oficiais (6) e sargentos (8), para além da messe e bar dos oficiais (8) e dos sargentos (9).
Apesar do apartheid (leia-se: segregação sócio-espacial) que vigorava, não só na sede dos batalhões, como em muitas unidades de quadrícula, uns e outros, oficiais e sargentos, tinham uma cozinha comum (19). Do lado direito, ao fundo, a menos de um quilómetro corria o Rio Geba, o chamado Geba Estreito, entre o Xime e Bafatá.
O aquartelamento de Bambadinca situava-se numa pequena elevação de terreno, sobranceira a uma extensa bolanha (a leste). São visíveis as valas de protecção (22), abertas ao longo do perímetro do aquartelamento que era todo, ele, cercado de arame farpado e de holofotes (24). A luz eléctrica era produzida por gerador... Junto ao arame farpado, ficavam vários abrigos (26), o espaldão de morteiro (23), o abrigo da metralhadora pesada Browning (25). Em 1969/71, na altura em que lá estivemos, ainda não havia artilharia (obuses 14).
A caserna das praças da CCS (11) ficava do lado oeste, junto ao campo de futebol (3). Julgava-se que o pessoal do pelotão de morteiros e/ou do pelotão Daimler ficava instalado no edifício (12), que ficava do outro lado da parada, em frente ao edifício em U. Mais à direita, situava-se a capela (13) e a secretaria da CCAÇ 12 (14). Creio que por detrás ficava o refeitório das praças. Em frente havia um complexo de edifícios de que é possível identificar o depósito de engenharia (15) e as oficinas auto (16); à esquerda da secretaria, eram as oficinas de rádio (17).
Do lado leste do aquartelamento, tínhamos o armazém de víveres (20), a parada e os memoriais (18), a escola primária antiga (19) e depósito da água (de que se vê apenas uma nesga). Ainda mais para esquerda, o edifício dos correios, a casa do administrador de posto, e outras instalações que chegaram a ser utilizadas por camaradas nossos que trouxeram as esposas para Bambadinca (foi o caso, por exemplo, do Alf Mil Carlão, nosso camarada da CCAÇ 12).
Esta reconstituição foi feita pelo Humberto Reis, completada por mim (LG).
Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).
A CCAÇ 12 começou também a construir um campo de futebol de salão (4), com cimento roubado à engenharia nas colunas logísticas para o Xitole. De acordo com a fotografia, em frente, pode ver-se o conjunto de edifícios em U: constituía o complexo do comando do batalhão (5) e as instalações de oficiais (6) e sargentos (8), para além da messe e bar dos oficiais (8) e dos sargentos (9).
Apesar do apartheid (leia-se: segregação sócio-espacial) que vigorava, não só na sede dos batalhões, como em muitas unidades de quadrícula, uns e outros, oficiais e sargentos, tinham uma cozinha comum (19). Do lado direito, ao fundo, a menos de um quilómetro corria o Rio Geba, o chamado Geba Estreito, entre o Xime e Bafatá.
O aquartelamento de Bambadinca situava-se numa pequena elevação de terreno, sobranceira a uma extensa bolanha (a leste). São visíveis as valas de protecção (22), abertas ao longo do perímetro do aquartelamento que era todo, ele, cercado de arame farpado e de holofotes (24). A luz eléctrica era produzida por gerador... Junto ao arame farpado, ficavam vários abrigos (26), o espaldão de morteiro (23), o abrigo da metralhadora pesada Browning (25). Em 1969/71, na altura em que lá estivemos, ainda não havia artilharia (obuses 14).
A caserna das praças da CCS (11) ficava do lado oeste, junto ao campo de futebol (3). Julgava-se que o pessoal do pelotão de morteiros e/ou do pelotão Daimler ficava instalado no edifício (12), que ficava do outro lado da parada, em frente ao edifício em U. Mais à direita, situava-se a capela (13) e a secretaria da CCAÇ 12 (14). Creio que por detrás ficava o refeitório das praças. Em frente havia um complexo de edifícios de que é possível identificar o depósito de engenharia (15) e as oficinas auto (16); à esquerda da secretaria, eram as oficinas de rádio (17).
Do lado leste do aquartelamento, tínhamos o armazém de víveres (20), a parada e os memoriais (18), a escola primária antiga (19) e depósito da água (de que se vê apenas uma nesga). Ainda mais para esquerda, o edifício dos correios, a casa do administrador de posto, e outras instalações que chegaram a ser utilizadas por camaradas nossos que trouxeram as esposas para Bambadinca (foi o caso, por exemplo, do Alf Mil Carlão, nosso camarada da CCAÇ 12).
Esta reconstituição foi feita pelo Humberto Reis, completada por mim (LG).
Foto do arquivo de Humberto Reis (ex-furriel miliciano de operações especiais, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71).
© Humberto Reis (2006)
Texto de Luís Graça (ex-furriel miliciano Henriques, com a inútil especialidade de armas pesadas de infantaria, pião das nicas ou pau para toda a obra da CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)(1)
- Ó Pimbas, estou aqui, não tenhas medo! – esta terá sido a expressão, patética, gritada pelo major, o segundo comandante (2), de Walther em punho, o rosto iluminado pelo clarão das explosões, ao comandante do BCAÇ 2852, o tenente-coronel Pimentel Bastos, que rastejava em trajes menores no corredor do edifício do comando, naquela noite em que o céu desabou sobre o aquartelamento de Bambadinca…
Eu não estava lá, não posso testemunhar para a história, nem muitos menos confirmar ou infirmar os detalhes… Não estava lá nem sou voyeurista… Mas esta foi a expressão que ouvi, alguns dias depois, da boca de soldados e milicianos de Bambadinca.
Havia um sentimento misto e contraditório, de alívio, de regozijo e de révanche, nesta expressão dos militares de Bambadinca que faziam do Pimbas e do seu amigo o bode expiatório do grande susto, do cagaço monummental, que todos apanharam nessa noite sem jamais o admitirem… É na desgraça que se vê a relação de amor-ódio dos povos pelos seus líderes, dos subordinados pelos seus chefes…
A história repetia-se, grotesca, desta vez num dos mais belos cenários da Guiné, que era o quartel de Bambadinca, inscrutado num pequeno planalto defronte de uma magnífica bolanha, e com o Geba a seus pés, tortuoso, pérfido, assassino, como uma surucucu…
Texto de Luís Graça (ex-furriel miliciano Henriques, com a inútil especialidade de armas pesadas de infantaria, pião das nicas ou pau para toda a obra da CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)(1)
- Ó Pimbas, estou aqui, não tenhas medo! – esta terá sido a expressão, patética, gritada pelo major, o segundo comandante (2), de Walther em punho, o rosto iluminado pelo clarão das explosões, ao comandante do BCAÇ 2852, o tenente-coronel Pimentel Bastos, que rastejava em trajes menores no corredor do edifício do comando, naquela noite em que o céu desabou sobre o aquartelamento de Bambadinca…
Eu não estava lá, não posso testemunhar para a história, nem muitos menos confirmar ou infirmar os detalhes… Não estava lá nem sou voyeurista… Mas esta foi a expressão que ouvi, alguns dias depois, da boca de soldados e milicianos de Bambadinca.
Havia um sentimento misto e contraditório, de alívio, de regozijo e de révanche, nesta expressão dos militares de Bambadinca que faziam do Pimbas e do seu amigo o bode expiatório do grande susto, do cagaço monummental, que todos apanharam nessa noite sem jamais o admitirem… É na desgraça que se vê a relação de amor-ódio dos povos pelos seus líderes, dos subordinados pelos seus chefes…
A história repetia-se, grotesca, desta vez num dos mais belos cenários da Guiné, que era o quartel de Bambadinca, inscrutado num pequeno planalto defronte de uma magnífica bolanha, e com o Geba a seus pés, tortuoso, pérfido, assassino, como uma surucucu…
A expressão que eu ouvi na caserna – ó Pimbas, não tenhas medo! -, era para todos efeitos reveladora do baixo moral em que as NT se encontrava na Guiné, mau grau o efeito do fenómeno Spínola e do seu populismo…
Para uma grande parte dos militares, do contingente geral, e até e para muitos dos meus camaradas milicianos, ele era uma espécie de anjo justiceiro que vinha, de heli, castigar os maus (os incompetentes oficiais superiores que estavam à frente dos nossos batalhões) e encorajar o Zé Soldado, lídimo representante do bom povo português… Em breve, o BCAÇ 2852 seria decapitado pelo raio fulminante da justiça spinolista, para gaúdio da populaça…
Chovia torrencialmente nessa noite de 28 de Maio de 1969 – por ironia, uma efeméride, sempre grata aos homens do regime, embora o 28 de Maio de 1926, que instaurara Ditadura Militar, e abrira o caminho ao Estado Novo, já nada dissesse ao comum dos meus camaradas de armas, de camuflado novinho em folha, a caminho de Contuboel que ninguém sabia onde ficava…Uma efeméride que –anoteu eu – também foi comemorada, à sua maneira, pelos homens do PAIGC…
Umas horas antes tínhamos nós atravessado o Trópico de Câncer, a caminho da Guiné, a caminho de Bissau, Bambadinca, Bafatá e Contuboel…
- Fomos todos apanhados as calças na mão! – contou-me, ainda em alvoroço, um conterrâneo meu, 1º cabo telegrafista de infantaria – se não me engano - , mostrando-me um monte de cápsulas de granada de canhão sem recuo com inscrições em russo e em chinês.
- Podíamos ter morrido todos! – concluiu, hiperbólico, o meu amigo Agnelo Ferreira por cujas mãos havia passado, três meses antes, a terrível lista negra dos mortos do Che-Che, no Corubal, na sequência da retirada de Madina do Boé, em 6 de Fevereiro de 1969…
Depois da Lança Afiada, toda a gente dormia de cu para o ar: a Browning, junto à pista de aviação, não tinha munições; não havia segurança próxima nem valas de comunicação entre os abrigos; faziam-se quartos de sentinela sem arma; e até os básicos eram escalados como aquele maluco das cozinhas que costumava ver elefantes a pastar ao fundo da pista…
- Os gajos vieram em peso (talvez mais de duzentos!) retribuir-nos a visita que tínhamos feito ao Fiofioli… Por sorte, não houve mortos!
Ainda deu tempo para espreitar um dos quartos dos furriéis, e ver o céu estrelado: o forro tinha sido atingido por uma morteirada; a granada explodiu em cima de uma das camas; por sorte, o tuga que a ocupava, tinha-se posto a milhas, dois minutos antes...
- Por sorte não houve mortos… - comentava eu, em voz alta, para o furriel que ia a meu lado, quando a coluna retomou a marcha, agora em estrada asfaltada, em direcção à próxima paragem, em Bafatá, a capital da zona leste…
- O meu conterrâneo é capaz de ter razão: afinal nesta guerra só morre quem tem de morrer… - ironizava eu.
- Fala a voz do reviralho – interveio o Noronha que seguia à frente, ao lado do condutor – Mas olha lá, ó Camarada Sov, tu com essas ideias derrotistas e dissolventes aqui não vais longe – proferiu o Alferes, em tom de velada ameaça…
- Só espero que a sorte esteja do meu lado…
- Fia-te na Virgem e não corras!... O problema nem é esse: nesta guerra morre-se mais por erros nossos do que por mérito do inimigo… São as estatísticas que o dizem – acrescentou o Ranger, que se meteu na conversa.
- Pelo muito pouco que já vi, não me atreveria a subestimara assim tanto o adversário que temos pela frente – respondi eu.
- Deixa-te de tretas. Os turras não passam de uns cães rafeiros, que ladram mas não mordem… E os cães quando mordem, também se abatem…
- Fico a saber que não gostas de cães…
- Nem muito menos de barrotes queimados – finalizou o Noronha, já agastado com o rumo da
conversa… Por ironia do destino, iria ter que aprender a lidar, durante vinte e meses, com os barrotes queimados que lhe calharam em sorte...
Demagógico e racista, o Noronha aproveitou para contar a última que tinha ouvido, no QG, em Santa Luzia:
- Sabes como é que Deus fez o preto ?... Ao sétimo dia, depois de completada a obra da criação, Deus foi descansar mas, por esquecimento, deixou ao sol o barro com que tinha feito Adão… Quando acordou, e como já não tinha mais nada que fazer, entreteve-se a fazer bonecos, à imagem e semelhança do homem mas, para haver confusões, pintou-os de preto e mandou-os para a floresta onde já estavam os macacos…
- Grande cabrão! – não pude deixar de rosnar, para mim mesmo, ao ouvir o alarve do Noronha por quem, desde Santa Margarida, eu não podia nutrir qualquer simpatia…
E foi assim, aos solavancos, sentados costas contra costas no dorso de um mastodonte, que a nossa conversa prosseguiu, aqui e ali mais azeda, não tanto pelas diferenças de idiossincrasia, como sobretudo pela tensão e pelo cansaço da viagem, até chegarmos a Contuboel, à hora em que o sol raiava de vermelho a savana arbustiva e os bandos se macacos-cães, na orla da floresta, se organizavam para proteger os filhotes das ciladas do leopardo…
Fonte: (Pre)texto: Na Guiné, longe do Vietname (inédito) (Os nomes o pessoal da CCAÇ 12, meus companheiros de viagem, são fictícios.... As restantes personagens são verdadeiras: o Pimbas e o Agnelo, por exemplo).
Luís Graça (1981-2005)
___________
Notas de L.G.
(1) Vd. posts anteriores:
13 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - CLXXXVIII: A galeria dos meus heróis (1): o Campanhã
14 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXLII: A galeria dos meus heróis (2): Iero Jau
12 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXLIV: A galeria dos meus heróis (3): A Helena de Bafatá
13 de Setembro de 2005 > Guiné 63/74 - CLXXXVIII: A galeria dos meus heróis (1): o Campanhã
14 de Outubro de 2005 > Guiné 63/74 - CCXLII: A galeria dos meus heróis (2): Iero Jau
12 de Janeiro de 2006 > Guiné 63/74 - CDXLIV: A galeria dos meus heróis (3): A Helena de Bafatá
1 de Agostod e 2006 > Guiné 63/74 - P1011: A galeria dos meus heróis (4): o infortunado 'turra' Malan Mané
(2) O 2º comandante, na altura, era o major Manuel Domingues Duarte Bispo, transferido para o Q.G., substituído pelo major Herberto Alfredo do Amaral Sampaio.
(2) O 2º comandante, na altura, era o major Manuel Domingues Duarte Bispo, transferido para o Q.G., substituído pelo major Herberto Alfredo do Amaral Sampaio.