segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Guiné 63/74 - P7013: Blogues da nossa blogosfera (37): Os Abutres de Cabuca, 2ª CART / BART 6253, 1973/74



O blogue de Os Abutres de Cabuca, a rapaziada da 2ª CART / BART 6523 (1973/74), que esteve num Bu...rako chamado Cabuca, um sítio onde o diabo perdeu as botas, na região do Gabu.  Em Maio de 2009, estes camaradas reencontraram-se 34 anos depois do seu regresso a casa (em Setembro de 1974).

Um blogue despretensioso, "criado com o intuito de recordar os bons momentos do pessoal que esteve em Cabuca em 1973/74",  servindo naturalmente para  "inserir e trocar mensagens, fotos e principalmente saber quando nos reunimos em almoçaradas" (sic).

Toda a correspondência deve ir para o e.mail: cabuca6523@gmail.com.



Aqui está a fotografia do reencontro dos "abutres de Cabuca", 34 anos depois... Foi tirada no "almoço da 3ª Companhia [do BART 6253] no dia 6.9.2008 em Vilar do Pinheiro"... Atenção que isto é tudo rapaziada que ainda  não pertence ao Clube dos SEXA (embora  já estejam lá a bater à porta)...

Legenda da foto: "Foi no almoço da 3ª Companhia, no dia 6 Setembro de 2008,  que se reuniram em Vilar do Pinheiro,  perto de 20 abutres, e onde se decidiu fazer o almoço do dia 20.1.09 para comemorar os anos do nosso amigo Franquelim e os 35 anos dos foguetes em Cabuca!"... Descodificando: (i) Franquelim  é o nome do ex-Cap Mil Inf que os comandou (de seu nome completo, Franquelim Bartolomeu Viçoso Vaz); (ii) foguetes de Cabuca: referência ao ataque do PAIGC, com foguetões 122 mm, no dia dos anos do capitão (20 de Janeiro de 1974).

 O "grande encontro"  da 2ª CART  seria, uns meses depois, em Janeiro de 2009. Mais recentemente, a 5 do corrente, realizou-se o convivio comemorativo do 36º aniversário do regresso do batalhão. Juntou-se o pessoal da 2ª e  da 3ª CART.  A notícia foi dada no nosso blogue pelo nosso camarada António Barbosa (ex- Alf Mil Op Esp).




Guiné > Zona Leste > Gabu > Cabuca > 2ª CART / BART 6523 (1973/74 > 20 de Janeiro de 1974 > O dia de aniversário do Cap Mil Inf Franquelim Vaz, comemorado a preceito pelo PAIGC com um ataque de foguetões 122 mm (O Franquelim é o terceiro, da primeira fila, a contar da esquerda; o nosso camarada António Barbosa parece-me ser o 3º da fila de trás, de pé, a contar da direita para a esquerda)... Na foto vêem-se restos dos famosos Katyusha... A foto é do Victor Machado, ex-1º cabo operador cripto da companhia, e fundador do blogue (Bancário reformdo, vive em Lisboa; de seu nome completo, Victor Manuel Franco Machado).

Cortesia de Os Abutres de Cabuca






Cabuca vista do ar... As fotos são de um camarada, anónimo, da CCAV 3404 (Cabuca, 1971/73)


Fotos: Cortesia de Os Abutres de Cabuda





Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Cabuca > Brasão da CCAV 3404 / BCAV 3854...  Este batalhão embarcou em 4 de Julho de 1971 e regressou à Metrópole em  5 de Outubro de 1973... Esteve sediado (comando e CCS) em Lamego (Comandante:  Ten Cor Cav   António Malta Leuschner Fernandes). A CCAV 3405 esteve em Mareué e Nova Lamego. A CCAV 3406 em Madina Mandinga.  


Fotos: Cortesia de Os Abutres de Cabuca




Antes da 2ª CART / BART 6523 (1973/74) e da CCAV 3404 (1971/73), passou por Cabuca a madeirense CCAÇ 2680 (Cabuca e Nova Lamego, 1970/71)... Mobilizada pelo  BII 19, era comandada pelo  Cap Mil Art  Emílio Jerónimo Pimenta Guerra. Embarcou em 2 de Fevereiro de 1970 e regressou a  27 de Dezembro de 1971... 

No tempo do nosso camarada José Martins, ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5 (Canjadude, 1968/70), havia apenas um pelotão dos Gatos Pretos destacado em Cabuca... Entretanto, a correlação de forças no Gabu setentrional mudou com a retirada de Beli, Madina do Boé e Cheche... entre finais de 1968 e princípios de 1969...

Foto: © José Vieira Castro / Cortesia de Carlos Silva, Guerra na Guiné 63/74

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Nota de L.G.:

(*) Último poste da série > 14 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6982: Blogues da nossa blogosfera (36): A Tabanca do Montijo, de João Manuel Félix Dias (ex-Fur Mil SAM, CCAV 2539 e CCAÇ 3, 1969/71)

Guiné 63/74 - P7012: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (1): Paludismo (Rui Silva)

1. Mensagem de Rui Silva* (ex-Fur Mil da CCAÇ 816, Bissorã, Olossato, Mansoa, 1965/67), com data de 16 de Setembro de 2010:

Caros amigos Luís Graça, Vinhal, M. Ribeiro e Briote:
Recebam desde já um grande abraço e o maior desejo de que estejam bem de saúde e boa disposição.

Junto, envio um trabalho que se virem de algum interesse publiquem no Blogue.
Qualquer vossa decisão será sempre bem aceite.

Há mais histórias para contar do meu “Páginas Negras com salpicos cor-de-rosa” (no presente não é o caso) e também dos salpicos alguma coisa.

Mais um abraço.
Até sempre
Rui Silva


2. Como sempre as minhas primeiras palavras são de saudação para todos os camaradas ex-Combatentes da Guiné, mais ainda para aqueles que de algum modo ainda sofrem de sequelas daquela maldita guerra.

DOENÇAS E OUTROS PROBLEMAS DE SAÚDE (ou de integridade física) QUE A CCAÇ 816 TEVE DE ENFRENTAR DURANTE A SUA CAMPANHA NA GUINÉ PORTUGUESA (Bissorã, Olossato, Mansoa - 1965-67)

(I) Paludismo
(II) Matacanha
(III) Formiga “baga-baga”
(IV) Abelhas
(V) Lepra
(VI) Doença do sono


- Não é minha intenção ao “falar” aqui de doenças e outros problemas de saúde que afligiam os militares da 816 na ex-Guiné Portuguesa imiscuir-me em áreas para as quais não estou habilitado (áreas de Medicina Geral, Medicina Tropical, Biologia, etc.) mas, tão só, contar aquilo, como eu, e enquanto leigo em tais matérias, vi, ajuizei e senti.

Assim:

As 4 primeiras, a Companhia sentiu-as bem na pele (ou no corpo); as 2 últimas (Lepra e Doença do Sono), embora as constatássemos - houve mesmo contactos directos de elementos da Companhia com leprosos (foram leprosos transportados às costas, do mato para Olossato nas tais operações de recolha de população acoitada no mato para as povoações com protecção de tropa) –, não houve qualquer caso com o pessoal da Companhia, ou porque estas doenças estavam em fase de erradicação (?), ou porque a higiene e a profilaxia praticadas pela Companhia eram o suficiente para as obstar.


PALUDISMO - I

Esta doença não demorou a entrar na 816 ou não começássemos logo a ser atacados pelo agente causador (o Anopheles) mal pusemos os pés na Guiné.
Pele branquinha e sangue fresco, bom pasto para aqueles sanguessugas.
Os 13 primeiros dias em Brá (trampolim para o mato) foram dormidos sem mosquiteiros. Foi um tal atacar! O pessoal passava a vida a “tocar harpa”, como dizia o meu amigo Furriel Baião (já falecido) ao apontar um camarada a coçar-se desesperadamente com as unhas das mãos, logo ao limiar do dia. Afinal aprendemos todos a tocar harpa (uns mais desesperados que outros). A picada do mosquito, em alguns quase não se via sinais da dita, noutros era cada verdugo(!). Curiosa a reacção tão diversa da epiderme no pessoal. Mas todo o mundo se coçava. Já o nosso Primeiro (1.º Sargento Rodrigues, também já falecido) era alérgico, ou parecia ser, às picadas dos mosquitos, pois era vê-lo à noite (altura do ataque em massa) vestido de pijama de algodão fininho e de chinelos de tira, com o peito desnudado e de calças arregaçadas qual turista usufruindo da frescura da noite. Mosquitos não eram com ele. Seria de ele ser da terra dos presuntos (Lamego) e aqui estaria o antídoto? Fazia-nos cá um asco, pois a maioria à noite vestia-se do pescoço às pontas dos pés para não deixar um milímetro da pele à mostra.

Era um suplício querer desfrutar da frescura da noite e estar vestido quase “à inverno”.
Concluímos que a cor preta nas camisas ou nas meias ainda os atraíam mais.
Vínhamos então a saber que era através da picadela do mosquito que podíamos apanhar o Paludismo.

O meu amigo açoriano Furriel Vieira dormia todo vestido, isto ainda em Brá e, como se disse, sem mosquiteiros. As meias verdes militares, compridas, apanhavam as calças do pijama bem até cima e uma outra meia fazia de gorro. Só ficavam as narinas e a boca ao ar livre… para respirar. O medo não era do Paludismo mas sim o da irritação
Que quadro! Aquele calor e um homem todo tapado. Mas dormia, dormia até mais do que os outros.

Havia mosquitos por todo o lado, todos de longa palhinha para nos sugar. Apareciam mais à noite, muitos mais perto das Bolanhas e de outras águas estagnadas. E Uaque, mais lá para diante na comissão, com água por todo o lado. O rio ali tão perto e bolanhas alagadiças por todo o lado.

Ali em Uaque os mosquitos eram às carradas e até o “Lion Brand” dava a impressão que os alimentava.
Quando deixamos Brá para Bissorã aqui já passamos a ter mosquiteiros.

Houve vários casos de Paludismo na Companhia, mas, que eu soubesse, ninguém precisou de ser hospitalizado. Da Icterícia já não se podia dizer o mesmo e no Hospital via-se por ali muita gente amarelinha, alguns em trânsito para a metrópole para uma cura mais cuidada. De comprimidos a injecções, o Paludismo desaparecia logo, o que era preciso era ser bem diagnosticado, o que não parecia difícil, e a terapêutica, logo aplicada, era eficaz.

Era corrente dizer-se que até 38º de temperatura uma dose de comprimidos chegava. Para além daquele valor só de injecção.
Apenas conheci (foi-me contado) um caso de morte por Paludismo e no Hospital Militar de Bissau, que foi de um Fuzileiro que morreu do Paludismo.
Dizia-se que só se morria por desleixo ou incúria, por pavor a injecções e outras fobias, isto é, se se deixasse andar…

A febre, sintoma típico desta doença, era alta, e por vezes, em casos não valorizados, subia até o mercúrio encostar no valor mais alto do termómetro e então aqui a malta dizia que fulano tinha “rebentado” o termómetro.

O Paludismo era por vezes confundido com Dengue mas julgo que esta doença (viral) de sintomas semelhantes aos do Paludismo (parasitária) era mais uma doença sazonal (após chuvas) enquanto o Paludismo era uma presença constante ou não houvesse mosquitos todo o tempo e a toda a hora.

Às quintas-feiras lá tomávamos a nossa pastilha de Quinino como medida preventiva. O Furriel enfermeiro Molhinho (Ludgero) lá se encarregava disso. Mas havia quem não o tomasse. Fiquei ali a saber que havia quem tivesse aversão à tomada de pastilhas, uma espécie de fobia. Não as conseguiam engolir…

A conclusão que se tirou é que era uma doença perigosa e mortal, mas de cura relativamente fácil, daí…


O que se segue foi retirado da Internet cuja reprodução, com a devida vénia, se pede a autorização devida ao autor

O paludismo (malária) é uma infecção dos glóbulos vermelhos causada pelo mPlasmadiu, um organismo unicelular.

O paludismo transmite-se através da picada do mosquito Anopheles fêmea infectado, por uma transfusão de sangue contaminado ou então por uma injecção dada com uma agulha previamente utilizada numa pessoa infectada.

Existem 4 espécies de parasitas (Plasmodium vivax, Plasmodium ovale, Plasmodium falciparum e Plasmodium malariae) que podem infectar os humanos e causar paludismo.

Os medicamentos e os insecticidas têm feito com que o paludismo seja muito raro nos países mais desenvolvidos, mas a infecção continua a ser muito frequente nos países tropicais. As pessoas originárias dos trópicos em visita a outros países ou os turistas que regressam dessas áreas estão por vezes afectados e causarão, possivelmente, uma pequena epidemia.

O ciclo de vida do parasita começa quando um mosquito fêmea pica um indivíduo infectado. O mosquito aspira sangue que contém parasitas do paludismo, os quais chegam às suas glândulas salivares.

Quando o mosquito pica outra pessoa, injecta parasitas com a sua saliva.
Uma vez dentro da pessoa, os parasitas depositam-se no fígado, onde se multiplicam. Amadurecem no decurso de 2 a 4 semanas e depois abandonam o fígado e invadem os glóbulos vermelhos.
Os parasitas multiplicam-se dentro dos glóbulos vermelhos, o que finalmente faz com que eles rebentem.

Plasmodium vivax e Plasmodium ovale podem permanecer nas células do fígado enquanto vão, periodicamente , libertando parasitas maduros para a corrente sanguínea, provocando ataques com os sintomas do paludismo. Plasmodium falciparum e Plasmodium malariae não permanecem no fígado. Contudo, se a infecção não for tratada ou receber uma terapêutica inadequada, a forma madura do Plasmodium falciparum pode persistir na corrente sanguínea durante meses e a forma madura do Plasmodium malariae durante anos, provocando ataques repetidos com os sintomas do paludismo.



Sintomas e complicações

Os sintomas costumam começar entre 10 e 35 dias depois de um mosquito ter injectado o parasita na pessoa.
Em geral, os primeiros sintomas são febre ligeira e intermitente, dor de cabeça e dor muscular, calafrios juntamente com uma sensação de doença (mal-estar geral).
Às vezes os sintomas começam com arrepios e tremores seguidos de febre, os quais duram entre 2 e 3 dias; confundem-se frequentemente com a sintomatologia da gripe. Os sintomas subsequentes e os padrões que a doença segue variam para cada tipo de paludismo.


Dados para recordar acerca da malária

- Os medicamentos preventivos não são 100% eficazes.
- Os sintomas podem começar um mês ou mais depois o indivíduo ter sido infectado por uma picada do mosquito.
- Os primeiros sintomas são inespecíficos e costumam confundir-se com os da gripe.
- É importante estabelecer um diagnóstico rapidamente e começar o tratamento, particularmente para a malária por P. falciparum, que é mortal, chegando a 20% das pessoas infectadas.

No Paludismo por Plasmodium falciparum pode verificar-se uma alteração da função cerebral, complicação denominada malária cerebral. Os sintomas consistem em febre de pelo menos 40º C, dor de cabeça intensa, vertigens, delírio e confusão. O paludismo cerebral pode ser mortal. Em geral afecta as crianças, as mulheres grávidas e os turistas que se dirigem para zonas de alto risco.
No paludismo por Plasmodium vivax pode haver delírio quando a febre estiver alta mas, se não for esse o caso os sintomas cerebrais não são frequentes.

Em todas as variedades de paludismo, o número total de glóbulos brancos costuma ser normal, mas o número de linfócitos e de monócitos, dois tipos específicos de glóbulos brancos, aumenta.
Em geral, se o paludismo não for tratado, aparece icterícia ligeira e o fígado e o baço aumentam de volume. É frequente que a concentração de açúcar no sangue (glicose) diminua ainda mais nas pessoas que têm uma grande quantidade de parasitas. Os valores de açúcar no sangue podem descer posteriormente naqueles que são tratados com quinina.

Às vezes o paludismo persiste apesar de no sangue aparecerem apenas números baixos de parasitas. Os sintomas incluem apatia, dores de cabeça periódicas, sensação de mal-estar, falta de apetite, fadiga e ataques de calafrios e febre. Os sintomas são consideravelmente mais ligeiros e os ataques não duram tanto como o primeiro.

Se um indivíduo não receber tratamento, os sintomas do paludismo por Plasmodium vivax, por Plasmodium ovale ou por Plasmodium malariae regridem espontaneamente em 10 a 30 dias mas podem recorrer com intervalos variáveis. O paludismo por Plasmodium falciparum é mortal, chegando a 20% dos afectados.

A febre hemoglobinúrica é uma complicação rara do paludismo causada pela ruptura de uma grande quantidade de glóbulos vermelhos. Em seguida liberta-se um pigmento vermelho (hemoglobina) na corrente sanguínea. A hemoglobina, que é logo excretada com a urina, faz com que esta apresente uma cor escura. Esta febre ocorre quase exclusivamente nos doentes com malária crónica por Plasmodium falciparum, especialmente nos que foram tratados com quinina.


Diagnóstico

O médico suspeita que um indivíduo apresenta malária quando este tem ataques periódicos de calafrios e febre sem causa aparente. A suspeita é maior se, durante o ano anterior, a pessoa visitou alguma zona na qual o paludismo é frequente e se, além disso, o seu baço aumentou de volume. O facto de se identificar o parasita numa amostra de sangue confirma o diagnóstico.
É possível que sejam necessárias mais do que uma amostra par estabelecer o diagnóstico, porque a taxa de parasitas no sangue varia com o passar do tempo. O resultado do laboratório deve identificar a espécie de Plasmodium encontrado no sangue, porque o tratamento, as complicações e o prognóstico variam conforme a espécie.


Prevenção e tratamento

As pessoas que vivem em zonas endémicas ou então que viajam para lá devem tomar as suas precauções. Podem utilizar insecticidas com efeitos de longa duração quer dentro das suas casas quer nas zonas anexas, colocar redes nas portas e janelas, usar mosquiteiro sobre as suas camas e aplicar repelente contra mosquitos na pele. Também devem usar roupa suficiente, em particular depois do pôr-do-sol, protegendo a pele o mais possível contra as picadas dos mosquitos.

É possível iniciar algum tipo de medicação para prevenir o paludismo durante a viagem a uma zona endémica. O medicamento começa a ser tomado uma semana antes, continua-se durante toda a estada e prolonga-se durante mais um mês depois de ter abandonado a zona. O fármaco mais frequentemente utilizado é a cloroquina. Contudo, muitas zonas do mundo têm espécies de Plasmadium falciparum que são resistentes a este fármaco. Outras medicações compreendem a mefloquina e a doxiciclina. No entanto, a doxiciclina não pode ser tomada por crianças menores de 8 anos ou mulheres grávidas.

Nenhuma terapêutica é completamente eficaz no momento de evitar a infecção. Os turistas que tenham febre enquanto se encontram numa zona infestada de malária deverão ser examinados de imediato por um médico. O indivíduo pode começar a tomar, por conta própria, uma combinação de fármacos como a pirimetamina-sulfadoxina, até conseguir ajuda médica.

O tratamento depende do tipo de malária e de, na zona geográfica em concreto, existirem espécies de parasitas resistentes à cloroquina. Para um ataque agudo de malária por P. falciparum numa zona que se sabe possuir espécies resistentes à cloroquina, a pessoa pode tomar quinina ou receber quinidina endovenosa. Noutros tipos, a resistência à cloroquina é menos frequente e, por consequência, a pessoa afectada toma-a, habitualmente, seguida de primaquina.

Segue: MATACANHA (II)
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Nota de CV:

(*) Vd. poste de 12 de Junho de 2010 > Guiné 63/74 – P6579: Páginas Negras com Salpicos Cor-de-Rosa (Rui Silva) (10): Golpe-de mão à “casa-de-mato” de Cussondome

Guiné 63/74 - P7011: Álbum fotográfico de António Barbosa (2ª CART / BART 6523, Cabuca, 1973/74) (2): Cabuca e os "abutres de Cabuca"...










































Guiné > Zona Leste > Região de Gabu > Cabuca > 2ª CART / BART 6523 (1972/74) > Aspectos da "vida" em Cabuca... As fotos vieram sem legendas (*)... Mas também estas são falantes...


Fotos: © António Barbosa (2010) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados.



Continuação da publicação do álbum fotográfico de António Barbosa (ex-Alf Mil Op Esp,  comandante do 1º Pelotão da 2.ª CART do BART 6523, Cabuca, 1973/74), natural de Santarém (Não confundir com o António Brabosa, de Gondomar). As fotos, embora de fraca qualidade, têm interesse documental. Foram obtidas a partir de "slides". Algumas das imagens estavam demasiados azuladas, pelo que decidimos editadas apenas a preto e branco. Sobre Cabuca, temos muito poucas referências no nosso blogue. Cabuca ficava a sudeste de Nova Lamego, perto do Rio Corubal e da fronteira com a Guiné-Conacri. Era, com Canjadude, um dos dois baluartes de defesa, a sul, de Nova Lamego (onde está sediado o comando do BART 6523/73, unidade que embarcou na Metrópole em 6/7/1973 e regressou em 7/9/1974).  A 2ª CART esteve em Cabuca e  Xime; a 1ª CART em Madina Mandinga e Bambinca; a 33ª CART esteve sempre em Nova Lamego. O Comandante da 2ª CART era o Cap Mil Inf Franquelim  Bartolomeu Viçoso Vaz.

Há um blogue, que se publica desde Maio de 1969, sobre a 2ª CART do BART 6523, que esteve em Cabuca, de 1973/74, e que eram conhecida como os Abutres de Cabuca. O pessoal desta subunidade encontrou-se pela primeira vez em 2008, ao fim de 35 anos, após o regresso. A iniciativa de criação do blogue foi de Vitor Machado, que vive em Penafiel, e a quem mandamos um abraço. Falaremos, com mais detalhe deste blogue, muito oportunamente.

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domingo, 19 de setembro de 2010

Guiné 63/74 - P7010: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (18): Terceiro ataque ao Olossato

1. Mensagem de Raul Albino, ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, , Mansabá e Olossato, 1968/70, com data de 17 de Setembro de 2010:

Caríssimo Carlos Vinhal,
Descobri que ainda me faltava enviar o relato do 3.º ataque ao Olossato, por sinal o último, durante a permanência da CCaç 2402 naquela localidade.

Por essa razão envio-te em anexo um relato referente a esse evento.

Pedia-te que solicitasses a alguma das nossas enfermeiras pára-quedistas, o favor de tentar identificar quem recolheu, assistiu e auxiliou na evacuação dos feridos graves desse ataque e se encontra empoleirada no cimo do avião Dakota visível na foto que incluo no artigo. A figura dela está um pouco afastada, mas creio que alguma delas a vai conseguir identificar.

Um grande abraço para ti e restantes editores. Que tenham um bom fim de semana.
Raul Albino


História da CCAÇ 2402 (18)

Terceiro Ataque ao Olossato

Descrição do Ataque

A 6 de Fevereiro de 1970, pelas 18,50 horas, deu-se o terceiro e último ataque ao Olossato durante a permanência da CCaç 2402 nesta localidade.

O inimigo foi avaliado em cerca de 10 a 15 elementos e flagelou o quartel e povoação com Morteiro 82 e armas automáticas ligeiras durante um período não muito longo. As nossas tropas, em colaboração com os milícias nativos, repeliram o inimigo que não chegou a causar baixas nas nossas tropas nem consequências para o aquartelamento.

Este ataque, relatado desta maneira crua, parece ter-se tratado de mais um ataque igual a tantos outros, mas infelizmente não o foi, por uma razão simples.

Em que é que este ataque não se diferenciou muito dos anteriores? Primeiro, uma vez mais o nosso Comandante não estava presente, encontrando-se em Bissau. Devo confessar que enquanto estive na Guiné nunca me apercebi desta esperteza do inimigo em escolher os momentos de ausência do nosso Comandante para desencadear os seus ataques ao quartel. Esta coincidência, só me apercebi dela, ao longo da escrita deste livro, mais precisamente durante a segunda metade. E, felizmente que assim foi, porque se na Guiné soubéssemos que as ausências do capitão conduziam a ofensivas do inimigo ao quartel, nem ele saía descansado nem nós ficávamos tranquilos após a sua partida. A segunda semelhança aos outros ataques foi a hora que normalmente o inimigo escolhia. À excepção do primeiro ataque a Có, todos os outros foram desencadeados ao anoitecer, o que significa que o inimigo se deslocava durante o dia, instalava-se até ao anoitecer e então efectuava o ataque. Esta escolha do final do dia tinha ainda as vantagens para o inimigo, de impedir que as nossas tropas pedissem apoio aéreo, visto os aviões e helicópteros existentes não terem condições para apoio nocturno, e ainda porque qualquer reacção das nossas tropas em perseguição ao inimigo estava condenada ao insucesso. De noite, com negros num lado e noutro dos contendores, ninguém de bom senso faria uma perseguição.

Curiosamente os nossos ataques a objectivos do inimigo, eram normalmente feitos ao amanhecer, com a deslocação das nossas tropas a ser feita durante a noite. É que deslocando-nos de noite dificilmente o inimigo nos surpreendia e ao amanhecer as suas sentinelas estavam sonolentas e com a vigilância enfraquecida.

Então em que é que este ataque foi dramático? Pela simples razão de duas granadas de morteiro terem caído no centro da povoação, perto do local onde a etnia balanta realizava uma cerimónia tradicional de casamento. O resultado foi desastroso, sofrendo a população 7 mortos, 36 feridos graves e 55 feridos ligeiros.

Nunca um ataque tinha provocado tamanho número de baixas. A população chorava os seus mortos e feridos e a consternação era geral. O nosso pessoal de saúde não tinha mãos a medir, para atender todos aqueles que pediam socorro. As nossas tropas multiplicavam-se para assistir, dentro do que lhes era possível, a toda a população aflita. As nossas instalações de messes e sala do soldado foram convertidas em extensões auxiliares da enfermaria. O serviço de primeiros socorros foi efectuado durante toda a noite, num esforço inestimável de toda a equipa de enfermagem, até que ao amanhecer se pudesse proceder à evacuação para Bissau, por avião, dos feridos mais graves.


A evacuação dos feridos

Evacuação dos feridos

Pela manhã assistimos pela primeira vez no Olossato à aterragem de um avião “Dakota” (em cima na imagem), com dimensão suficiente para evacuar tão elevado número de feridos. De louvar a perícia e coragem dos pilotos para aterrarem na nossa pista, que, em princípio, só estava dimensionada para pequenos aviões.

Vemos na foto em baixo, a presença da enfermeira pára-quedista, que para nós era vista como um anjo caído dos céus, tal era a consideração que tínhamos pelo seu abnegado trabalho de socorrer os feridos em combate, física e muitas vezes também psicologicamente. Que a sua missão no teatro de guerra nunca seja esquecido, pelo menos até ao fim das nossas vidas de ex-combatentes.

Agradecia que algum dos nossos bloguistas, pertencente à Força Aérea, identificasse na foto em baixo, a nossa enfermeira pára-quedista empoleirada no cimo do Dakota.




Acontecimento Trágico-Cómico

No meio de tanta tragédia, ainda se pode contar uma pequena história que seria cómica se não acontecesse neste ambiente de sofrimento.

O Alferes Brito que mais uma vez se viu na posição de comando do aquartelamento, nervoso e cansado, via os feridos mais graves alinhados ao longo da sala do soldado, com ligaduras, pensos e pedaços de corpos por todo o lado, incluindo uma perna.

Vai daí, o Alf. Brito, com a sua característica simples, directa e prática, ordena a um soldado que limpasse todo aquele lixo que ali estava, que já quase não se podia passar. Só que a perna que se encontrava junto aos outros resíduos dos tratamentos, era uma perna artificial articulada pertencente a um dos feridos, que num momento de lucidez ainda conseguiu deitar a mão à sua perna artificial, impedindo assim de ela ir parar ao lixo.

Se pensarmos na dificuldade que ele teve em adquirir aquela, podemos imaginar o que ele não teria de penar para obter outra igual.

Uma pequena sorte no meio do infortúnio.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 21 de Julho de 2009 > Guiné 63/74 - P4719: História da CCAÇ 2402 (Raul Albino) (17): Segundo ataque ao Olossato

Guiné 63/74 - P7009: Efemérides (51): 17 de Setembro, Dia das Transmissões (José Martins)

1. Mensagem de José Marcelino Martins* (ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70), com data de 16 de Setembro de 2010:

Boa noite
Segue um texto a propósito do Dia das Transmissões, que se festeja a 17 de Setembro.

Um abraço
José Martin


17 de Setembro
Dia das Transmissões


Ocorre no dia de hoje, ano de 2010, o 137.º aniversário da inauguração da Rede Telegráfica Militar no território português.

Para trás ficavam outras formas e meios de comunicação entre exércitos e/ou as suas subunidades, em campanha ou em tempo de paz.

Pensamos que a primeira forma utilizada de comunicar à distância, foi o estafeta. Desses, ficou-nos o relato sobre a batalha de Maratona, travada entre gregos e persas numa planície perto de Atenas, ocorrida em Setembro de 490 a.C., durante a Primeira Guerra Médica, quando os gregos se encontravam enfraquecidos e não conseguiram apoio de Esparta.

Foi após esta batalha que Milcíades, o general grego, enviou Fidípides para avisar a cidade de Atenas, que ficava a cerca de 42 quilómetros, da vitória dos gregos sobre os persas.

Mas voltemos ao nosso país e, concretamente, à criação das Transmissões no nosso Exército, ainda dependente da Arma de Engenharia, uma das razões porque ainda ostenta, nos seus brasões, o castelo ameado

A origem dos telegrafistas militares reporta ao ano de 1810, ano em que é criado o Corpo Telegráfico, que em 1830 ficaria sob a superintendência do Corpo Real de Engenheiros.

No final do terceiro quartel do século XIX, em 1873, com a inauguração da Rede Telegráfica Militar, é criado, simultaneamente e de carácter permanente, o Serviço Telegráfico Militar, entre guarnições fixas.

Em 1880 são instalados os primeiros pombais militares, remontando a 1884 a Companhia de Telegrafistas, a primeira Unidade de Transmissões de campanha.

No virar do século XIX para o século XX, em 1900, são instalados os primeiros telefones militares e, no ano seguinte, 1901, é criada a Companhia de Telegrafistas de Praça [Ordem do Exército 01, 8JAN1902], que ocupa o Quartel na Penha de França (Lisboa) e apoia a Inspecção do Serviço Telegráfico Militar [Ordem do Exército 11, 26MAI1911-1.ª Série]. As Transmissões passam a depender da Arma de Engenharia, e iniciam-se as primeiras experiências em TSF – Telegrafia Sem Fios.

Já com o país em regime republicano, em 1911, é criado o Grupo de Companhias de Telegrafistas, onde é incorporada a nova Companhia de Telegrafistas Sem Fios. Dois anos depois, 1913, o Grupo de Companhias recebe o nome de Batalhão de Telegrafistas de Campanha [Ordem do Exército 11, 18JUL1913], indo fixar-se no Quartel da Ajuda, em Lisboa.

Em substituição do Batalhão de Telegrafistas de Campanha, que é extinto em 1925 [Ordem do Exército 06, 24ABR1925], surge o Batalhão de Telegrafistas [Ordem do Exército 08, 16JUN1925], com duas Companhias de TSF e TPF. No ano seguinte é criado um Batalhão de Telegrafistas de Campanha [Ordem do Exército 06, 14JUN1926].

Em 1927, com a criação do Regimento de Telegrafistas [Ordem do Exército 12, 30SET1926], as Transmissões passam a estar instaladas no aquartelamento da Cruz dos Quatro Caminhos (Sapadores - Lisboa), integrando esta nova Unidade o Batalhão de Telegrafistas de Campanha [Ordem do Exército 06, 14JUN1926], a Inspecção do Serviço Telegráfico Militar [Ordem do Exército 11, 26MAI1911-1.ª Série] e a Companhia de Telegrafistas de Praça. Nesta data é criado o Depósito Geral de Material de Transmissões (Quartel na Penha de França), que fica na dependência do Regimento de Telegrafistas [Ordem do Exército 12, 30SET1926] que, em 1937 passa a designar-se Batalhão de Telegrafistas [suplemento a Ordem do Exército 12, 31DEZ1937] e, em 1951, passa a designar-se Serviço de Telecomunicações Militares.

A esta Unidade – Batalhão de Telegrafistas – são atribuídas as funções de Escola Prática, em 1959, até que, em 1971 é criada a Escola Prática de Transmissões [Ordem do Exército 07, 31JUL1971], que, em 1977 passa a designar-se Regimento de Transmissões [Ordem do Exército 05, 31MAI1977], mantendo as funções e o aquartelamento, herdando as tradições dos diversos serviços de Transmissões.

O dia da Unidade é o dia 17 de Setembro e o seu Patrono é o Arcanjo S. Gabriel [Decreto de Pio XII em 12JAN1951], cuja comemoração litúrgica se festeja a 29 de Fevereiro.

ARMAS
ESCUDO: de azul, uma almenara de oiro, iluminada e aberta de vermelho e acesa do mesmo perfilado de oiro.
ELMO: militar de prata, forrado de vermelho, a três quartos para a dextra.
CORREIA: de vermelho, perfilada de oiro.
PAQUIFE E VIROL: de azul e oiro.
TIMBRE: uma garra de leão de vermelho empunhando seis raios eléctricos de oiro.
DIVISA: num listel de branco, ondulado, sobreposto ao escudo, em letras de estilo elzevir, maiúsculas, de negro: SEMPRE MELHOR.

Simbologia e Alusão das Peças
A almenara (torre de sinais) é o símbolo das comunicações
Os Esmaltes Significam
Oiro: fé e nobreza.
Prata: riqueza e eloquência.
Vermelho: ardor bélico e força.
Azul: ar, espaço, lealdade


José Marcelino Martins
17 de Setembro de 2010

Ver:
Patrono das Transmissões (P5423)
Grito das Transmissões (P6967)
__________

Notas de CV:

(*) Ver poste de 16 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6995: In Memoriam (54): O meu amigo António Santos partiu (José Martins)

Ver último poste da série de 5 de Agosto de 2010
Guiné 63/74 - P6829: Efemérides (50): Acontecimentos de 3 de Agosto de 1959 no cais do Pindjiguiti, Bissau (3) (Leopoldo Amado)

Guiné 63/74 - P7008: (In)citações (8): Comércio Justo: Sim, obrigado (Luís Graça)

Guiné-Bissau > Bissau > 5 de Dezembro de 2009 > Uma cena pouco idílica, pouco turística,  das ruas da capital... As bideiras, vendedoras ambulantes,  que calcorreiam a  cidade, com os balaios à cabeça, tentando fazer alguns CFA (moeda local)...

Foto: © João Graça (2009) / Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados


1. Diz o CIDAC que o conceito de Comércio Justo (Fair Trade, em inglês) se baseia em 12 princípios:

(i) O respeito e a preocupação pelas pessoas e pelo ambiente, colocando as pessoas acima do lucro;

(ii) O estabelecimento de boas condições de trabalho e o pagamento de um preço justo aos produtores e produtoras (um preço que cubra os custos de um rendimento digno, da protecção ambiental e da segurança económica);


(iii) A disponibilização de pré-financiamento ou acesso a outras formas de crédito;


(iv) A transparência quanto à estrutura das organizações e todos os aspectos da sua actividade, e a informação mútua entre todos os intervenientes na cadeia comercial sobre os seus produtos ou serviços e métodos de comercialização;


(v) O fornecimento de informação ao consumidor sobre os objectivos do CJ, a origem dos produtos ou serviços, os produtores e a estrutura do preço;


(vi) A promoção de actividades de sensibilização e campanhas, quer junto dos/as consumidores/as (para realçar o impacto das suas decisões de compra), quer junto das organizações (para provocar mudanças nas regras e práticas do comércio internacional);


(vii) O reforço das capacidades organizativas, produtivas e comerciais das produtoras e dos produtores através de formação, aconselhamento técnico, pesquisa de mercados e desenvolvimento de novos produtos;


(viii) O envolvimento de todas as pessoas (produtores/as, voluntárias/os e empregados/as) nas tomadas de decisão que os afectam no seio das suas respectivas organizações;


(ix) A protecção e a promoção dos direitos humanos, nomeadamente os das mulheres, crianças e povos indígenas, bem como a igualdade de oportunidades entre os sexos;


(x) A protecção do ambiente e a promoção de um desenvolvimento sustentável, subjacente a todas as actividades;


(xi) O estabelecimento de relações comerciais estáveis e de longo prazo;


(xii) A produção tão completa quanto possível dos produtos comercializados no país de origem.


Pessoalmente desconfio de todas as ideias que me querem vender como panaceias para todos os males da humanidade,  do tipo "Ou Nós ou o Dilúvio", "Temos a solução (final)", "Nunca tivemos tantas certezas", "Escolha agora o céu na terra e pague depois" e outras balelas do pensamento único..

O Comércio Justo pode não passar de mais uma utopia, recebida com ironia e cinismo pelos professores de economia... Por mim, acho que é uma ideia que, no mínimo,  tem pernas para andar... É um pouco como todos os grandes rios, que começam por uma gota de água... Um dia muitas destas ideias libertar-se-ão do conceito (que não é mais do que um objecto abstracto-formal, um construído intelectual) e hão-de materializar-se em coisas concretas e palpáveis, úteis, que podem ajudar a resolver os pequenos grandes problemas de muita gente, como ter ou não ter água potável para beber, por exemplo...

Pequenas iniciativas locais como a loja do Cabaz di Terra, em Bissau,  devem ser acarinhadas. Em Bissau, em Luanda, em Lisboa, em toda a parte.. Não sei se esta é uma verdadeira  loja do Comércio Justo, com todos os ff e rr....Rege-se pelo menos por alguns dos seus princípios...E isso me basta, para já.

Em louvor do Comércio Justo, e dos nossos  pequenos projectos de solidariedade para com o povo guineense; em louvor de tanta gente, boa, solidária, que ajuda os outros que são vítimas do círculo vicioso da pobreza e do subdesenvolvimento - como alguns membros da nossa Tabanca Grande, portugueses e guineenses,  que eu não vou citar para mão ferir susceptibilidades, correndo sempre o risco de parcialidade, ao evocar uns nomes e omitir  outros - compus este texto poético a que chamei "Comércio Justo, Sim,  obrigado"...


2. Comércio Justo: Sim, obrigado!


Andei por aí
À procura de lojas
Do Comércio Justo:
Queria comprar dez cêntimos de equidade;
Acabei por encontrar uma,
A custo,
Já à saída da cidade.

Ao lado, havia um hipermercado,
Com a bandeira, verde-rubra,  de Portugal;
E, mais à frente,
Uma Loja dos Trezentos;
E a seguir, uma outra, a do Chinês;
E às tantas perdi-me,
Só de contar as lojas
De artigos de marca
Que havia na Grande Superfície Comercial.
Pensei cá para mim:
- Eh!, pá,
Já não vives na era de Quinhentos,
Ó Português de cá e lá,
De torna viagem,
O mundo está mais global,
Está mais quentinho,
O planeta,
Mais próximo,
Mais aconchegadinho,
Com o PIB a crescer,
A taxas de dois dígitos,
O que é obra,
Seus pobretanas!
Só não sei é se esse mundo
É mais fraterno,
Mais livre,
Mais justo,
Mais viável,
Mais plural.
Nem sei qual é a nossa margem
De manobra,
Que a economia é uma treta,
E a realidade é execrável,
Com tantos centos e centos
De milhares e de milhões,
Sem a mais elementar água potável.

Entrei na loja do Comércio Justo,
E ouvi histórias
De gente de mil e uma cores
E sabores:
- Sou uma pobre viúva da Índia
E faço bonecos de pano,
Comprem, comprem,
Meus senhores,
Ganham mais vocês num só dia
Do que eu em todo o ano.

Dez cêntimos de equidade
Embrulhada em papel de jornal...
- Essa coisa da equidade
Que o senhor vem à procura,
Eu não vendo nem nunca vi;
Não é por ter a pele escura
Mas a verdade, a verdade,
É que só conheço a ruindade
Da ilha do Haiti
Onde nasci.

Equidade não é justiça,
Mas igualdade de oportunidades,
Tento eu explicar, a medo,
À mulata africana:
- O pensamento, senhor,
Até pode ser bem profundo,
E tão fecundo
Como o meu ventre
De mestiça...
Mas que me adianta, a mim,
Ser bonita e  ser roliça,
Sem direitos nem liberdades,
Sem remédio para a minha dor,
Neste sítio do fim...
Do mundo.

A OIT, sabe,  vem agora falar
De trabalho decente,
Tanto nos campos como nas ciades...
- Tu, estrangeiro,
Que me acusas de dumping social,
Por extrair o carvão da mina:
Silicótico,
Ex-mineiro,
Fiz a revolução cultural,
E mudei p'ra mensageiro
Do Grande Negócio da China.

A seguir entra em cena
O dono da loja,
Que parece ser o ideólogo
De serviço:
- Tu, meu amigo, sociólogo,
Que és um consumidor responsável,
E vives na parte do planeta,
No hemisfério norte,
Que é a mais habitável,
Põe sempre o olho na etiqueta,
Que o desenvolvimento sustentável
É a minha...
E a tua meta.

Oiço algures um apelo,
Que me deixa desarmado:
- Sê solidário comigo
Que estou há dias sem vender,
E sem dinheiro para comer,
E portanto esfomeado,
Compra-me esta estatueta,
Que o politicamente correcto
Não enche a barriga da gente;
Já sei o que me vás dizer,
Que se a peça é de pau preto,
É mau para o ambiente.
E se alimento pai e mãe,
Na Indonésia ou no Brasil,
Dizes-me que é crime também,
Por ser trabalho infantil.

Fico sem jeito,
Ao ouvir todas estas histórias
E lições de geografia
Da pobreza:
- Não sabes onde fica o Benim,
Mas podes ajudar-me,
Ao meu povo,
Aos meus irmãos,
Não quero que tenhas pena de mim,
Basta ambos darmos as mãos.

- A mão invísivel do mercado,
Diz o meu professor, economista,
Que encontro no hipermercado,
Há-de chegar a todo o lado,
Mais devagar ou mais depressa,
De avião, de carro ou a pé,
E poderá fazer-te até
Um pequeno capitalista.

Fico baralhado,
Até sem pinga
De sangue,
Não sei se o negócio é bom ou mau,
Mas, para resumir a lição,
Ouvida na loja do Comércio Justo,
Presto um pouco mais de atenção
Ao meu amigo, mandinga,
Da Guiné-Bissau
Que toca Kora:
- Nossa ideia nasce agora
Mas já  vinga,
Tu és consumidor, solidário,
Eu produtor, acreditado,
Do Comércio Justo és partidário,
Amigo, manga de obrigado.

Luís Graça

________________

Nota de L.G.:

(*) Poste anterior desta série > 16 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6998: (In)citações (7): Inauguração da Loja Cabaz di Terra, em Bissau (Pepito / AD - Acção para o Desenvolvimento)

Guiné 63/74 - P7006: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (5): Portugal nem explorava nem desenvolvia, colonizava pouco e mal

1. Mais umas notas do caderno de um velho colon (*):


Escreveu Amílcar Cabral, que Salazar nunca daria a independência às colónias, porque não tinha poder de manter o neocolonialismo, como faziam as outras potências.

E Salazar não deu mesmo essas independências. Caiu da cadeira em 1968.

A exemplo de Amílcar Cabral, todos os outros portugueses ultramarinos desde os auto-intitulados brancos de 2ª (penso que era assim que o Otelo Saraiva de Carvalho se referia a ele próprio), até aos atletas que vinham para cá (por ex., Rui Mingas e Coluna, Bonga e outros artistas como o Ouro Negro), até ao contínuo bailundo da minha repartição em Luanda, que fez a 4ª classe de adulto, eram todos politizados, assim como o ponta esquerda que veio para o Belenenses e deixou uma vaga para mim.(Algumas vezes repito-me, apenas para localizar e datar factos).

Estas constatações são antes de 1961, sem guerra, sem PIDE, com um à vontade que existia só em África, sem fome, sem frio, também, e principalmente nas sanzalas em ambiente absolutamente tribal (notava-se abastança aos olhos de quem ia das nossas aldeias),  a pouca tropa com as balas contadas e os canos da arma cheios de massa contra a ferrugem.

Porque lá, desde a presença de empresas estrangeiras, os vários portos frequentadíssimos, as missões católicas e protestantes,  alemãs, italianas e americanas, e uma natural fome de informação dos africanos, que na Europa não existe essa fome, é a explicação que eu posso dar para tanta politização.

Mas entre Angola e Guiné há muita diferença na politização do povo das tabancas que vivia e vive tradicionalmente dentro do ambiente puramente étnico.

Enquanto em Angola as etnias são territorialmente muito fechadas e de "costas viradas umas para as outras", na Guiné estão muito em comunicação umas com as outras, e, devido à religião muçulmana e àquele comércio à maneira árabe, toda a Guiné fica aberta interiormente e também com todos os vizinhos desde a Mauritânia até à Serra Leoa.
Quando se fala da carta de Amílcar Cabral para Salazar, essa carta seria totalmente desnecessária, pois que diariamente, no caso em Angola, todos os angolanos dos meios urbanos eram de opinião que,  havendo tanta riqueza nas colónias, Portugal só dificultava a exploração e o desenvolvimento.

Falava-se em ouro, diamantes, petróleo, etc. e "que lhe dessem a independência", que eles sabiam governar melhor.

Isto eram discussões por exemplo na minha recruta, malta com  19/20 anos,  em 1959, em Nova Lisboa, onde éramos 1000, e que no CSM [, Curso de Sargentos Milicianos,], éramos 3 pelotões de infantaria e 1 pelotão de artilharia. Portanto não era conversa em voz baixa.

Mas enquanto que na ignorância devido à idade e desconhecimento do que era África, de quem recentemente tinha chegado àquelas paragens, ficávamos entre calados sem saber se discordar ou concordar, ou até incrédulos se falavam a sério no que diziam "aqueles independentistas". Até tomavam a iniciativa de jogos de futebol Metrópole x Angola, em que só faltava o hino nacional.

Alguns, penso que sonhavam à maneira sulafricana, mas com o tal "lusotropicalismo", em vez do apartheid.

Às vezes ouvia-se falar em novos Brasis, e notava-se urgência nessas intenções. E não misturavam colonialismo com salazarismo nem com comunismo, como cá as pessoas, estudantes principalmente,  faziam. Eles eram mais pragmáticos.

Mais tarde, na Guiné, verificava-se que tinha sido conversa de todos os movimentos, aquela conversa da abundância do ouro,  diamantes e petróleo, pela Europa, Rússia e Américas.

E, notava-se que foi uma propaganda bem montada, no caso da Guiné, que ajudou o PAIGC a "vender a sua luta" interior e exteriormente, tal entusiasmo internacional, na "cooperação", tanto em gente como financeiramente, principalmente durante o governo de Luís Cabral.

Cheguei a conhecer pessoalmente, na pensão da Dª Berta, já no tempo de Nino Vieira, gente que foi de propósito daqui, com indicações "fidedignas" obtidas no Rossio, em Lisboa, que havia algures no Sul da Guiné um lugar onde se viam diamantes a olho nu. Mas isto são outras estórias.

É muito célebre a exploração selvagem de diamantes em Angola, durante a guerra de 27 anos que se seguiu à independência, onde havia garimpeiros e negociantes semiclandestinos desde a Rússia, Checoslováquia, portugueses e africanos de países vizinhos, tudo por causa dessa propaganda das riquezas.

Aquilo foi mais uma invasão do que cooperação, tal a quantidade e variedade de gente, muitas vezes a sobreporem-se. Assistia-se,  por exemplo em Bissau, ver aplicar cabos para telecomunicações, por uma cooperação sueca, e passados uns tempos, a Visabeira portuguesa estava a substituir esses cabos por outros da Telecom.

Mas, como é que Amílcar Cabral sabendo da disposição de Salazar de não dar a independência às colónias, como é que se lembrou de lutar ele próprio por duas colónias simultaneamente?

É que é uma atitude tão ambígua, que até aos caboverdeanos, embora admirassem o conterrâneo (ou descendente de caboverdeano), não cabia na cabeça da maioria aquela ideia. Não eram só uns tantos guineenses que duvidaram do PAIGC, e alguns pagaram com o fuzilamento; em Caboverde já se sabe, alguns caboverdeanos tiveram menos azar, foram reabrir o Tarrafal, quando já fechado, após o 25 de Abril. (Falta comprovar se essa reabertura foi feita pelos governantes portugueses, se pelo PAIGC, ou pelos dois).

Agora, só para nós, que já há muita gente que nos lê, era normal ouvir na nossa praça que,  se "Angola, que era o bom e já vai embora, para que devemos ficar com aquelas ilhas desérticas"?
Igualmente ideias com o mesmo sentido eram emitidas a respeito da Guiné.

É que havia uma explicação do nosso Ministro dos Negócios Estrangeiros daquele tempo, quando lhe perguntavam da urgência da entrega das colónias, que era a seguinte (frase mais ou menos textual,  ouvida na rádio): «Em democracia é assim, se o próprio Algarve diz que quer a independência, temos que lha conceder».

Será que o PAIGC/PAICV arranja alibi para a reabertura do Tarrafal? Eu quero ser imparcial, mas têm que ser eles a escrever também, se não sujeitam-se eles a ouvir.

Enquanto os fundadores do PAIGC/PAICV não escreverem toda a história, que só eles conhecem, podem-se fazer mil conjecturas, as mais imaginativas.

Por exemplo, se alguém disser que o pouco e mal que Portugal colonizou na Guiné em 500 anos, (por falar em 500 anos, no Zimbabué e na Zâmbia, só se pode atribuir 400) foi exponencialmente agravado em prejuízo dos guineenses, por aquele grupo de caboverdeanos do PAICV, de 1963 a 1980 (17 anos).
Com consequências posteriores que se agravam com o tempo.

Podem-se imaginar coisas muito negativas, se não explicarem como foi, desde o julgamento dos assassinos de Cabral, até ao abandono do projecto deste.

Se explicassem se foram eles que usaram a ajuda de Che Guevara e Fidel, ou se foram estes que usaram o PAIGC, para atingir alvos mais importantes, e que os guineenses não passavam de carne para canhão.
Por nunca os dirigentes do PAIGC/PAICV terem explicado as verdades e as mentiras em que basearam a sua luta, é que o povo da Guiné reagiu de braços caídos aos anos de governação de Luis Cabral, até este ser derrubado por velhos combatentes que também não se sentiam enquadrados naquela independência.

Havia uma verdade repetida antes, durante a luta e após a independência, que era a incapacidade de Portugal desenvolver e enriquecer aquela terra, nem fazer universidades, e não fazer o que outras potências importantes faziam nas suas colónias.

Havia uma mentira dita antes, durante a luta e após a independência, que os guineenses logo que fossem independentes não precisavam nada do colon, porque iam fazer tudo "à nossa maneira"... e "os nossos amigos vão-nos ajudar".

Como,  depois, tudo estava a ser feito à maneira alheia ao povo e aos velhos combatentes, e a ajuda dos amigos era dirigida ao Partido e não ao povo, este baixou os braços, e a reação dos velhos combatentes manifestou-se da maneira mais desorientada que se reflete até aos dias de hoje.

Havia também verdades difusas, como por exemplo a tal justiça colonial do Chefe de Posto desumano, com reguadas e cipaios, e que acabariam com a saída do colon, mas ninguém compreendeu qual foi a alternativa que Luís Cabral e aqueles dirigentes  preconizavam.

Evidentemente que,  com dirigentes como aqueles em que até alguns eram advogados, a justiça seria com advogados, juízes de toga e prisões de grades de ferro nas janelas, aí ficaria muito caro sustentar à sombra por exemplo um ladrão de vaca ou ladrão de bajuda ou um desordeiro de tabanca ou bairro.

E, como não aparecia alternativa, enchiam-se as esquadras de Bissau com multidões numa desordem insuportável para qualquer autoridade.

E como Luis Cabral e ministros eram realmente dinâmicos, e julgavam-se intocáveis, mandavam prender sem contemplações de uma maneira que seria inimaginável por um chefe de posto. Rusgas em Bissau caçando indocumentados e sem trabalho, testemunhadas por inúmeros estrangeiros da ONU, soviéticos, suecos..., não podiam acabar bem.

Talvez estas incongruências, tão visíveis, ajudaram  a que houvesse pouca reacção ao golpe de Nino Vieira e àqueles comandantes que se foram suicidando até hoje.

Nunca se devem condenar os africanos de qualquer país, que violentamente têm governado os seus paises, sem atribuir a responsabilidade a quem voluntária ou involuntariamente os levou a tomar o poder.

Muitas vezes foi a própria ONU, a ter essa responsabilidade.

Em suma, há bandeiras conquistadas, há bandeiras impostas e há bandeiras escolhidas democraticamente. Caboverde já tem uma bandeira escolhida democraticamente.

Cumprimentos,
Antº Rosinha
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Nota de L.G.:

(*) Último poste da série > 11 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6971: Caderno de notas de um Mais Velho (Antº Rosinha) (4): Guerra Colonial : dividir para reinar...Quem dividiu quem?

sábado, 18 de setembro de 2010

Guiné 63/74 - P7005: Estórias do Juvenal Amado (31): Desse amor ficou só a nostalgia daquela idade

1. Mensagem de Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1972/74), com data de 17 de Setembro de 2010:

Caros Luís, Carlos, Virgínio, Magalhães e restante Tabanca Grande.
As nossas mulheres acompanharam-nos durante aqueles anos e quando regressámos, de muitos aturaram e trataram as feridas da alma que carregámos.
O alcoolismo, os traumas de muitos, foram duras batalhas que para as quais só elas disseram presente.
Primeiro ficaram chocadas, incrédulas com a agressividade e maus tratos, vinda de quem o regresso tanto tinham desejado.
O seu sofrimento deu lugar à resignação ao abandono.
A História tinha-as usado e deitado fora.
Também elas estiveram na guerra e muitas nunca alcançaram a Paz.
É para elas esta estória, também a dedico à minha mulher que há trinta e um anos me atura e equilibra a minha vida.

Um abraço para todos
Juvenal Amado


Estórias do Juvenal Amado (31)

DESSE AMOR FICOU SÓ A NOSTALGIA DAQUELA IDADE

O Unimog da escolta aparece e desaparece entre as nuvens de pó que a coluna formada por Berliets, Chaimites e Whites levantam quando se dirige ao Saltinho. Serve a dita também para reabastecer Mansambo e Xitole dois destacamentos do Batalhão de Bambadinca.

No Saltinho e a pescaria

Mansambo, Xitole e Saltinho fazem segurança nas respectivas zonas de influência e o aspecto barbudo, os cabelos demasiado grandes bem com o fardamento descuidado dos homens, quase faz o nosso Comandante ter um ataque de «caspa».
O ar reprovador que nós bem lhe conhecemos, deve ter chegado aos ouvidos dos graduados e posteriormente ao próprio Comandante na sede do Batalhão, a que as duas Companhias pertencem.

Viaja normalmente entre os homens da escolta sem galões e de espingarda como qualquer soldado, não vá o diabo tecê-las e ele ser referenciado como alvo importante que é.

Não foi pois de admirar um alferes ou o furriel, ver-se interpelado por um militar cheio de pó, que salta de uma viatura da escolta e grita com ar bem azedo:

- Oh nosso alferes não há barbeiros nesta Companhia?

Escusado será dizer-se que o homem quando chegou ao Saltinho, bem tentou apanhar alguém com o cabelo ou a barba fora dos regulamentos, para descarregar assim a fúria contida.

Estavam os nossos camaradas do Saltinho bem avisados!
Os que não estariam nas melhores condições desviaram-se do seu caminho e evitaram assim algumas chatices.

Mas voltando ao caminho, o pó cobria-me todo. Valem-me os óculos e o lenço no nariz e na boca para me proteger.

Os meus pensamentos voavam para casa, porque a Maria vai chegar depois de sete anos de ausência e eu não a vou poder ver nem estar com ela.
Foi uma paixão tímida de adolescente, pois sendo ela amiga da minha irmã e eu querendo escapar à troça, desmentia a evidência da minha paixoneta que todos conheciam.

Ela era mais velha e eu pensava não estar ao meu alcance essa relação.
Tinha eu dezassete anos quando ela emigrou para outro continente. Passamos a escrevermo-nos, mas a distância e os anos, fizeram esfriar os sentimentos tão pouco amadurecidos.

O rosto dela, a sua recordação e dos bailaricos onde tudo fazia para poder dançar com ela, fizeram-me companhia muitas noites, quando aguardava a rendição no posto de sentinela.
Fazia planos e sonhava acordado.
Pensava no que lhe iria dizer finalmente quando a voltasse a ver.
O que é que haveria afinal entre nós?
Será que recuperaria os sete anos de afastamento onde outros relacionamentos tinham eclodido e esmorecido, como os dias naquelas paragens, onde o dia nasce e morre rapidamente?

Estamos a atravessar uma ponte. Temos de passar com as rodas em cima de travessas de madeira.
Só passa uma viatura de cada vez.

E se nos atacassem agora lá do fundo da bolanha quando eu vou a meio da ponte?

A viagem é lenta por razões de segurança, mas também por causa da picada. Quando chegar ao Saltinho, vou logo tomar um banho no rio. Não estou habituado a ter abundância de água como ali há.

As estações das chuvas estão à porta e eu só regressarei depois quando as picadas ficarem novamente transitáveis.

A vontade de rever a Maria tinha-me levado quase a pedir aos meus pais, que me arranjassem o dinheiro da passagem. Seria um pedido irracional sabendo eu, que eles não têm dinheiro para isso. Irão pedi-lo, se eu levar as minhas pretensões em frente.

Lá está o Saltinho com a sua ponte de arcos em cimento, que parece deslocada na paisagem.
Moderna de mais para as necessidades, parece um monumento ao absurdo, pois começava e acabava em trilhos de terra batida por onde pouco trânsito se faz.
Quando a mandaram construir viram com certeza outro futuro para ela.

No Saltinho a banhos

O rio Corubal corre abundante debaixo dela. A água tão racionada praticamente em toda a zona Leste é ali um bem à mão.

O meu reencontro com a Maria está definitivamente adiado, mas aquelas paragens, iram ajudar a suportar a impossibilidade de a abraçar e regressar ao passado, quando a sua presença me punha o coração aos saltos.
Talvez um dia quando regressar e a encontrar, lhe diga o que foi para mim a sua recordação, as suas cartas bem como as cassetes com a sua voz, nos anos em que estivemos separados, especialmente nos dias e noites do Leste da Guiné.

Voltei a vê-la 12 anos depois.
O passado não se repetiu quando a encontrei.
O meu coração tinha outra dona, que conheci depois de regressar e com quem dividi a vida e os anseios futuros.

Ficou assim por se cumprir uma vida, a certa altura sem queres ou por opção, ou porque fomos empurrados, tomamos caminhos diferentes, que não tiveram retorno.
Restou assim a nostalgia de um amor não concretizado e para sempre perdido na voragem dos dias e anos.

Juvenal Amado

Catroga e a Ponte do Saltinho
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 4 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6931: Estórias do Juvenal Amado (30): Quando o passado vem ao nosso encontro

Guiné 63/74 - P7004: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (3): A grande lição do baptismo de fogo

1. Mensagem José Ferreira da Silva* (ex-Fur Mil Op Esp da CART 1689/BART 1913, , Catió, Cabedu, Gandembel e Canquelifá, 1967/69), com data de 16 de Setembro de 2010:

Caros Camaradas
Junto nova história (Baptismo de fogo), vivida no Oio, para ser registada na série "Outras memórias da minha guerra".

Segue, também em anexo, uma das fotos tiradas, à civil, em Fá Mandinga, no primeiro Domingo de Guiné que, apesar do espanto (e contestação) do Capitão, serviram para acalmar as nossas famílias, com a aparente boa disposição de um grupo de militares amigos em "gozo de férias" na Guiné.
Publiquem se julgarem oportuna.

Um abraço e Parabéns pelos DOIS MILHÕES.
do Silva


Outras memórias da minha guerra (3)

Baptismo de fogo – A grande lição

Fá Mandinga, primeiro domingo na Guiné

A nossa Companhia (Cart 1689) havia chegado a Fá Mandinga nos primeiros dias de Maio de 67. Fizemos treino de adaptação na zona do Xime, em Ponte Varela e no Enxalé. Andámos por lá relativamente à vontade e chegámos a não alvejar o IN, apanhado desprevenido em deslocação, o que serviu de chacota na sede de Bambadinca, ao qual a nossa Cart 1689 estava adstrita (que não era o nosso BART 1913, que fora colocado em Catió).

O certo é que, de repente, apesar da inexperiência de combate, fomos mandados para o OIO (zona de Samba Culo), que era uma das zonas mais perigosas da Guiné, sendo a progressão apeada feita a partir do destacamento de Banjara.

Transportados em viaturas desde Bafatá, chegámos a Banjara, onde fizemos um grande jogo de futebol, no Estádio do Capim, que, apesar de muito aquém das medidas regulamentares, não impediu a nossa vitória expressiva de 7 a 2 contra os desgraçados residentes, que viviam ali mais limitados que o melro enjaulado do meu vizinho. Digamos que com 5 semanas de Guiné, ainda tínhamos bastantes reservas energéticas acumuladas na santa terrinha da Metrópole.

Já passava da meia-noite quando saímos virados a norte. Fomos logo aconselhados a poupar a água, visto que só teríamos hipóteses de reabastecimento, lá para o meio-dia, quando se atingisse um rio.

Ninguém estava habituado a tanto calor, especialmente no interior da mata, onde, de noite, o oxigénio rareava. Daí que a água transportada nos cantis e pelos carregadores que nos acompanhavam, foi desaparecendo com o amanhecer.

Outras 2 ou 3 Companhias também andavam lá pela mesma zona, integradas na mesma operação (Op Inquietar), dando-nos uma confiança ilimitada nos êxitos iminentes. E como durante a instrução na Metrópole, se incutia que o que era difícil era apanhar os “turras” porque, “cobardemente”, fugiam, nós já tínhamos alguns valentões capazes de correr atrás deles, logo que os ataques começassem. Quem os ouvia, incluindo alguns graduados, ficava com a ideia de que a guerra não passava de uma caça ao homem, apanhá-los à mão (descalços, desnutridos, mal treinados e desmilitarizados).

Samba Culo, localizada a sul do Rio Canjambari

Recordo aqui que no RASP (V.N.Gaia), unidade onde foi formado o nosso BART 1913, como despedida, foi efectuado um ataque demonstração, em que eu fui designado para comandar o grupo de assalto. Eu, que sempre trazia bala real na câmara desde os “Rangers” de Lamego (onde as “desviei”), fui advertido e instruído pelo Comandante de Batalhão para que se tirasse o “pau-bala” das cápsulas e fosse substituído por algodão. Mais – foram dadas instruções para agir, segundo a guerra clássica, de capacetes, com os postos marcados e os braços estendidos, a indicar a “metralhadora à esquerda” ou “à direita”, sempre a correr para envolver e aniquilar o IN.

Todos os militares eram dignos discípulos de Marte e tinham também aprendido, mais ou menos, a teoria da cautela e caldos de galinha, que lhes tinham ensinado, mas, com tanta gente e tanta confiança, pensava-se: coitados dos “turras”, se a gente os descobre…

Todavia, também havia alguém que passava o tempo a advertir os soldados dos perigos que poderiam surgir e, também, sobre a falta de água, conforme se veio a verificar com alguns militares, ainda nas primeiras horas da madrugada. Tudo parecia estar a ser descuidado. Era o barulho, as conversas, os espaços demasiado curtos entre os homens, a desatenção, etc. Como reacção às minhas manifestas preocupações, era normal os visados encherem o peito e, até, gozarem:

- Calma, ó meu Furriel. Parece que está com medo.

Cruzámos com malta de outra(s) Companhia(s) e, então, a algazarra parecia a do reencontro dos ciganos na Feira de Espinho, às Segundas de manhã. A dada altura até se perguntava em voz alta:

- Onde está o Alferes tal? Está aqui fulano do Curso de Vendas Novas?

Mais uma horita de progressão e muitas reclamações, eis que se parou, para descanso. Uns instalaram-se logo nesse local e outros foram-se deslocando, à procura de uma sombra das poucas árvores e muitos arbustos. E como se amontoavam, procurei afastar um pouco o nosso Pelotão para a direita e mais para norte. Assistiu-se então ao barulho típico de um pic-nic. Só faltou ouvir-se perguntar pelo presunto e pelo garrafão do “binho berde”. Todos, ou quase todos, estavam de tronco nu, sendo de salientar um alferes que até as calças tirou. As armas encostadas (quase) à balda e as roupas, a enxugar do suor, penduradas nos arbustos, ao sol, transmitiam uma imagem de verdadeira paz e alegria que nem na "Aldeia da Roupa Branca". Digamos até, que com um Cimbalino e um cheirinho a pingar, ficaríamos por ali umas horitas em alegre convívio.

Tudo bem… seria uma maravilha se a guerra fosse assim. Mas (lá vem sempre o filho da puta do “mas”), quando menos se esperava, inicia-se um tiroteio tão perto de nós e a envolver-nos, que parecia que nos estavam já a apanhar à mão, ao mesmo tempo que se ouviam alguns gritos de Colonialistas, Filhos da puta, Salazaristas, fora daqui, ide para Lisboa.

Estávamos todos desprevenidos (alguns dormiam a sesta). Recordo que foram relativamente poucos os que responderam de imediato ao fogo, mas estou seguro que foram esses que, sem pararem, utilizando as armas e munições que apanhavam, evitaram o assalto. A confusão era geral, os gritos permanentes; uns de joelhos pediam a Deus, à querida Mãezinha e ao Senhor Santo Cristo, para lhes valer e outros à Senhora da Saúde e à Nossa Senhora de Fátima. Muitos, desorientados, nem sabiam onde tinham a arma, outros não eram capazes de a apontar e, ainda outros, descarregavam os cartuchos com a arma virada para o céu. E os que estavam perto de uma árvore maior, furavam por baixo dos colegas, amontoados, para ficarem por debaixo, provocando a subida dos outros que, ao verem-se, de novo, por cima, repetiam a operação. Enquanto isso, o “valentão da Lixa”, agarrado ao tubo do morteiro 60, desesperado, sem prato, sem granadas e sem saber o que fazer, gritava:

- Ai querida mãezinha que vamos morrer aqui todos - e pedia, também em voz alta, o apoio da Nossa Senhora de Fátima, com quem, seguramente, havia firmado o contrato do feliz regresso…

Claro que pouco a pouco, todos foram reagindo e assumindo o controlo da situação. Não morreu ninguém, nem sequer houve feridos nesse embate (aparte algumas pequenas escoriações e queimadelas com as armas mais utilizadas). Alguém estava a apontar, por engano, para os nossos camuflados pendurados nos arbustos, porque o dólmen do furriel Cepa tinha 11 (onze!) buracos.

Na mesma operação houve outros embates mas, aí já não eram os mesmos periquitos a reagir. Antes pelo contrário, graças à aflição do Baptismo de Fogo, iniciou-se ali um comportamento responsável e eficaz, que nos acompanhou por toda a comissão de serviço, tendo a Cart 1689 alcançado a Flâmula de Honra em Ouro do CTIG e um prestígio que nos acompanhou até ao fim da comissão.

Silva da Cart 1689
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 8 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6951: Memórias boas da minha guerra (José Ferreira da Silva) (7): O Miranda e a sua adoração pelo Fê Cê Pê

Vd. último poste da série de 3 de Setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6926: Outras memórias da minha guerra (José Ferreira da Silva) (2): Alferes do QP Henrique Ferreira de Almeida da CART 1689 / BART 1913