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Barro > 1968> Um prisioneiro do PAIGC.
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A. Marques Lopes (2005). Direitos reservados.
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Hugo Moura Ferreira (2007). Direitos reservados. (Com a devida vénia... Do
sítio do Moura Ferreira > Fotografias Fotografais cedidas ao HMF pelo pessoal da CCAÇ 1621).
PAMI NA DONDO, A GUERRILHEIRA (1)
por Mário Vicente
Prefácio: Carlos da Costa Campos, Cor
Capa: Filipa Barradas
Edição de autor
Impressão: Cercica, Estoril, 2005
Patrocínio da Junta de Freguesia do Estoril
Nº de páginas: 112
Edição no blogue, devidamente autorizada pelo autor, Mário Vicente Fitas Ralhete (ex Fur Mil Inf Op Esp, CCAÇ 726 : Revisão do texto, resumo e subtítulos: Luís Graça.
Parte V - Pami é sujeita ao primeiro interrogatório dos Lassas e sofre com a sua separação de Malan (pp. 40-47) (1)
©
Mário Fitas / 2007). Direitos reservados.
Resumo do episódio anterior (2):
Madrugada de 24 de Agosto de 1965, Pami e Malan dormiam nos braços um do outro quando a tabanca, Cobumba, sofre um golpe de mão do exército português, que tem a assinatura dos Lassas.
No grupo de prisioneiros que são levados para Cufar, estão Malan e Pami que terão destinos diferentes. Pami estão integrada num grupo de cinco mulheres e procura nunca denunciar a sua condição de professora. Em caso algum falará recusará falar em português ou em crioulo. Mas os seus olhos de águia vão observado tudo, no caminho até ao quartel dos Lassas. No rio Cadique o grupo embarca em lanchas da Marinha. O Alferes Telmo não deixa que ninguém toque nas mulheres. Fala em psico, uma palavra que Pami desconhece. O grupo é entregue à guarda ao Furriel Mamadu.
Pami mal recinhece a antiga fábrica de descasque de arroz, a Quinbta de Cufar, onse se instalaram os Lassas. Os prisioneiros são recebidos por militar dos óculos que, mais tarde Pami vem a saber tratar-se de Carlos, O Leão de Cufar, comandante do aquartelamento. Homens e mulheres são instalados em sítuios diefrentes. Malna e Pami entrecuzram o olhar, sem se denunciaram. Sabem que dizem ali adeus para sempre. Lágrimas nos olhos, Pami sente a dor da separação. )Pami e as prisioneiros ficam à guarda da milícia de João Bacar Jaló. Recusa-se a comer, bebe só água. No dia seguinte, a vida no aquartelamento retoma o seu ritmo. Pami pode agora ouvir e até ver perfeitamente, por entre as frestas das paredes de capim ao alto entrançado com lianas, tudo o que acontece por fora da palhota onde tinha passado a noite.
(i) Os olhos de águia da prisioneira
Aos poucos, a prisioneira começa a sentir o incómodo da situação em que se encontra. Mostra o pano empapado em sangue a uma companheira, e esta, não tendo em atenção o que se passa, mas julgando tratar-se de auto agressão, grita. Imediatamente por entre o pano que servia de porta à improvisada prisão, aparece uma cara escura de G3 em punho. Troca de palavras entre as mulheres, e a situação é clarificada e explicada ao vigilante. Passados poucos minutos, aparece um militar. Pami reconhece nele, um dos que muito se tinha movimentado junto do Leão de Cufar.
- Que aconteceu Amadu? - Pergunta o branco.
O carcereiro informa em crioulo meio português o que se passa. O militar ouve, e ordena:
- Diz à tua mulher que vá com a prisioneira junto do poço para que ela se lave!
- Eh... Arferes Palmeiro, e se mulher foge? - Pergunta aflito, o guarda das prisioneiras.
- Não foge! - Responde o que Pami fica a conhecer como alferes Palmeiro.
Aparece, então, uma mulher já de certa idade, que tenta falar crioulo. Mas em vão, pois tudo se mantém mudo. Começa então, a dirigir-se em balanta, às mulheres, pelo que Pami se levanta, e segue a mulher velha. Passam pela frente da casa principal da Quinta. Observando tudo, a professora verifica tratar-se da casa onde estaria instalado todo o comando. Olhos de águia observadora, Pami vai vendo onde ficam as transmissões e a enfermaria. Passando a estrada, contornam o edifício que mais tarde fica a saber tratar-se da messe de sargentos. Por detrás deste, situa-se um poço que abastece os soldados, para tudo quanto é lavagens. Param, e a velha sorridente dirige-se a um soldado que sobre a parede do poço se abastece:
- É, pessoal, parte água, para pessoal ali lavar catota!
O soldado dá uma gargalhada e returque:
- Só tiro água, se partires catota comigo!
- Chi! Minino, a mim belho! Esse pessoal lá é pisoneiro! Não pode faze esse cumbersa! Capitão num deixa!
- Olha! Mas ela é maneta!... Mas com a mão direita ainda tocava uma punheta! Toma lá a água, e se ela quiser mais, chama pessoal ali do abrigo!
O soldado, tirando a pulso uma lata de dez litros de água, entrega-a à velha e desaparece em direcção a um abrigo que Pami verifica ser colectivo. Paredes de adobos, com dois metros de terra pela frente. Por cima, troncos de palmeira e chapas de bidões cobertos com cerca de cinquenta centímetros de terra. Uma cobertura de colmo faz a protecção da chuva e do sol..
Pami retira o pano que lhe cobria o corpo, e coloca-o no chão. Flecte-se, dobrando os joelhos, e com uma pequena concha - feita de meia cabaça -, vai tirando água da lata, fazendo a sua higiene pessoal. Após as ablações feitas, pega no pano, colocando-o sobre uma pedra, e deita-lhe por cima o resto da água. Com uma mão apenas ajudada pelo coto esquerdo vai lavando até as manchas desaparecerem. Enrola ao corpo o pano molhado, e faz sinal que está pronta à mulher do milícia. Em silêncio, regressam ao improvisado cárcere.
Ao atravessar o arruamento que dividia o Aquartelamento, Pami olha para a esquerda e vê surgir da porta de armas um grupo de nativos acompanhado de dois militares armados. Fica a saber que se trata de pessoal das tabancas a Sul, que vêm convidar os militares para estarem presentes no Choro. Tempos mais tarde analisa este acto e confirma tratar-se de técnica de efeito psicológico, feita pelos militares junto dos moradores a Sul. Seria honra convidar os militares, que se tornavam pródigos, carregando uma viatura, com rações de combate e alguns garrafões de vinho,
água de Lisboa, que depois eram distribuídos pelos homens grandes e família do morto. Oportunamente, aproveitavam todos os pormenores para conquistar a confiança das populações.
Voltando ao cárcere, verifica que apenas a bajuda e outra mulher de meia-idade - a qual não lhe era desconhecida - se encontram no interior. As outras duas companheiras tinham-se ausentado. Uma hora depois, aproximadamente, as ausentes regressam. Pela troca de olhares e pelas meias palavras, pronunciadas muito baixinho, verificam que tinham começado os interrogatórios. Quem se seguiria?
(ii) O Alferes Telmo e o Furriel Mamadu interrogam Pami
Pami Na Dondo segue-se na lista. Um soldado milícia faz-lhe sinal para que o acompanhe. Pelo curto caminho até onde funcionam os interrogatórios, Pami decide-se por mentir e, mentalmente, vai gizando um estratagema para não cair em nenhuma cilada ou, de forma alguma, denunciar Malan.
Contornando pela parte de trás o edifício do comando, é introduzida num quarto onde se encontra o sujeito milícia que parecia conhecer de Catió. Os de nome Telmo e Mamadu - este último apresentava-se de farda amarela, com a boina preta, mas sem lenço e, pendia-lhe à cintura um cinturão de lona de onde caía um coldre com uma pistola de grande calibre -, também estão presentes.
Virando-se para o milícia, Telmo começa:
- Quêba! Pergunta-lhe lá o nome?
O milícia Quêba olha para Pami e pergunta-lhe o nome em crioulo. Pami já tinha delineado manter-se firme e responder só na língua balanta, fazendo-se ignorante a qualquer outra. Pelo que não responde. Quêba torna a insistir, sem resultado.
Virando-se para Telmo informa:
- Este gaja só fala balanta, arferes Telmo!
- Está bem! Então fala em balanta! Qual o nome dela?
Quêba volta à carga, agora em Balanta. Pami hesita um pouco, olha o milícia e responde:
- Sanhá Na Cunhema.
O ora identificado alferes Telmo continua, fazendo perguntas e escrevendo:
- Idade?
- Num sabe! Mas deve ter vinte anos!
- Onde nasceu?
- Num sabe! Pai e mãe morreu quando rebentou guerra!
- Onde?
- Na Ilha do Como.
- O que é que ela fazia em Cobumba?
- Nada!
O da boina preta, mete a mão no punho da pistola, e retirando-a diz:
- Pergunta-lhe lá se sabe o que é isto, e para que serve?
- Diz que é coisa com que militar mata!
Quêba suava por todos os poros, e irritado, disse para o da boina preta:
- Furriel Mamadu este gaja está a enganar pessoal!
Pami confirmou assim a identificação do boina preta, mas não devia ser este o seu verdadeiro nome. Deveria ser nome de guerra. Não havia branco com nome de preto.
Telmo, desculpa lá! Deixa ver a reacção dela!
Pegou na pistola, e enfiando o cano no ouvido de Pami, ordenou ao milícia:
- Pergunta-lhe lá onde é que ficou a mão esquerda dela?
Pami sentiu o frio do aço da arma no ouvido e, com um gesto brusco, fugiu ao contacto. Estremeceu, pela primeira vez começou a ter medo. Este militar, com olhos fundos, não deve ser bom. A barba dele e o olhar faz medo. Um pouco trémula, a professora respondeu ao milícia e este traduziu:
- Não sabe! Quando era minino pequinina, cobra mordeu nela, e pai teve de cortar mão a ela!
O furriel Mamadu meteu a arma no coldre e sorriu para o alferes dizendo:
- Parecia fácil, não era? Aí está uma gaja que sabe muito e se está a armar em parva, ou então é mesmo louca.
O alferes olhou para o furriel e disse-lhe:
- Rafael, vamos utilizar outra forma, põe-na lá a rir!
Ficou desvendada a alcunha, Rafael era o verdadeiro nome de Mamadu.
Mamadu sentou-se no chão, puxou do bolso um maço de cigarros, tirou um e acendendo-o, de imediato ofereceu à prisioneira. Esta olhou e fez negação com a cabeça. Rafael olhando para ela, sorriu de uma forma aberta e descontraída e disse para Quêba:
- Diz-lhe lá que eu gosto do nome dela! Se ela quiser eu caso com ela!
O intérprete repetiu em balanta, e Pami descontraiu um pouco. Rafael voltou de novo ao ataque, enquanto o alferes começava a fumar também.
- Então a gaja não diz nada?
O intérprete insistiu.
- Diz que não, furriel. Branco não gosta de preta!
- Ah, sim? Mas diz-lhe lá, que aqui não há mulher branca! Espera!... Diz-lhe que os soldados brancos dizem que ao fim de quinze dias na Guiné as pretas começam a ficar brancas!
O à vontade do furriel e a forma engraçada como disse aquilo iam traindo a prisioneira, que quase esboçou um sorriso. O interprete como sempre voltou a repetir as palavras do furriel. Nestes momentos a mente de Pami trabalhou e pensou seguir um caminho que, embora perigoso, poderia transformar as coisas, e respondeu. O interprete começou a rir e voltando-se para o alferes disse:
-Ai! Arferes Telmo! Este gaja é mesmo maluco! Diz que não casa, mas que faz muito
conversa giro!
- Queres ver que nos saiu uma puta na rifa! Estamos fodidos com esta merda! - Exclamou o furriel.
- Não! Espera! Vamos explorar esta situação!
Diz Telmo:
- Quêba, pergunta-lhe com quem é que ela faz
conversa giro?
- Com homem! Diz ela!
Retorquiu Quêba.
- Certo! Então diz-lhe, que vai fazer
conversa giro com os Militares todos do Quartel!
Pami viu que tinha ido longe demais, não se sentiu com capacidade para resistir. Pensou em Malan, e começou a chorar.
Telmo e Rafael olharam um para o outro e os seus olhares entenderam-se. Enquanto Quêba ria e ia dizendo:
- Gaja mesmo maluco! Cá tem cabeça!
- Quêba, leva a mulher para junto das outras, amanhã vamos explorar isto melhor. OK, Rafael?
- Certo! Se for uma puta para serviço da guerrilha, pode ser uma boa fonte!
O alferes e o furriel saíram, enquanto o milícia levava a prisioneira para junto das suas companheiras.
(iii) Pami não quer trair os ideais de seu pai e de Malan
Pami estava exausta, a cabeça fervilhante, não a deixava coordenar o pensamento. Sentia que tinha embrulhado tudo, e que os militares não tinham acreditado em nada do que dissera. Coisa horrível! Como seria com Malan? Tinha de saber, havia que fazer qualquer coisa para tentar no mínimo saber o que lhe estava acontecendo. Ouviu vozes fora da
palhota prisão, e por entre as frestas do capim, verificou que vários soldados conversavam na varanda da casa da Quinta, agora Comando. A prisão distava uns quinze metros da varanda, e as conversas poderiam ser perfeitamente audíveis. Com extremo cuidado afastou um pouco mais o capim, e ficou com um ângulo visual mais alongado. Desta forma, poderia não só ouvir, como também ver os soldados. Lá estavam o Leão, os alferes Telmo e Palmeiro, e mais quatro. Dos restantes quatro, observou que dois tinham nos ombros a graduação, a qual tinha aprendido em Simbele, na República da Guiné. Um, já de idade mais avançada que os outros, tinha as divisas de sargento; o outro, pequenino, vestindo calções e camisa de farda amarela, tinha os galões de tenente.
Estes momentos de espionagem, acalmaram-na um pouco. Mas... logo voltou à preocupação por Malan. Fechou os olhos e recostou a cabeça no tronco do canto que servia de prumo e sustentação do cárcere. O pensamento voou e pensou em seu pai, e como tinha tido coragem de trocar o seu nome pelo de sua saudosa mãe. No amolecimento da dor e do calor, adormeceu naquele silêncio de meio do dia.
Antes de anoitecer, os milícias trouxeram mais arroz com carne. Já pela noite dentro, chegaram dois milícias que levaram a Bajuda. Pami receou o pior, concerteza iriam violá-la, e chorou de novo. Embrenhando-se nos pensamentos de lama desta guerra, sentiu que estava a fraquejar. Não!... Não poderia ser, tinha de criar forças, nunca poderia trair os ideais de seu pai e de Malan.
(Continua)
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Notas de L.G.:
(1) Vd. episódios anteriores:
23 de Novembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2298: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (2) - Parte I: O balanta Pan Na Ufna e a sua filha (Mário Fitas)
(...) A acção decorrer no sul da Guiné, entre os anos de 1963 e 1966, coincidindo em grande parte com a colocação da CCAÇ 763, como unidade de quadrícula, em Cufar (Março de 1965/Novembro de 1966)…
No início da guerra, em 1963 Pan Na Ufna, de etnia, balanta, trabalha na Casa Brandoa, que pertence à empresa União Fabricante [leia-se: Casa Gouveia, pertencente à CUF]. A produção de arroz, na região de Tombali, é comprada pela Casa Brandoa. Luís Ramos, caboverdiano, é o encarregado. Paga melhor do que a concorrência. Vamos ficar a saber que é um militante do PAIGC e que é através da sua influência que Pan Na Ufna saiu de Catió para se juntar à guerrilha, levando com ele a sua filha Pami Na Dono, uma jovem de 14 anos, educada das missão católica do Padre Francelino, italiano.
O missionário quer mandar Pami para um colégio de freiras em Itália mas, entretanto, é expulso pelas autoridades portugueses, por suspeita de ligações ao PAIGC (deduz-se do contexto). Luís Ramos, por sua vez, regressa a Bissau, perturbado com a notícia de que seu filho, a estudar em Lisboa, fora chamado para fazer a tropa.
É neste contexto que Pan Na Una decide passar à clandestinidade, refugiando-se no Cantanhês, região considerada já então libertada.(...)
28 de Novembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2307: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (3) - Parte II: A formação político-militar (Mário Fitas)
(...) De etnia balanta, educada na missão católica, Pami Na Dondo, aos catorze anos, torna-se guerrilheira do PAIGC. Fugiu de Catió, com a família, que se instala no Cantanhês, em Cafal Balanta. O pai, Pan Na Ufna entra na instrução da Milícia Popular. Pami parte, com um grupo de jovens, para a vizinha República da Guiné-Conacri para receber formação político-militar, na base de Sambise. O pai, agora guerrilheiro, na região sul (que é comandada por João Bernardo Vieira 'Nino') , encontra-se muito esporadicamente com a filha. Num desses encontros, o pai informa a filha de que a mãe está gravemente doente. Pami fica muito preocupada e quer levá-la clandestinamente a Catió, enquanto sonha com o dia em que se tornará companheira do pai na Guerrilha Popular.
Entretanto, o destino prega-lhe uma partida cruel: na instrução, na carreira de tiro, tem um grave acidente, a sua mão esquerda fica decepada. No hospital, conhece Malan Cassamá, companheiro de guerrilha de seu pai, que recupera de um estilhaço de morteiro, que o atingiu na perna, no decurso da Batalha do Como, em Janeiro de 1964 (Op Tridente, Janeiro-Março de 1964, levada a cabo pelas NT) . Malan fala a Pami da coragem e bravura com quem seu pai se bateu contra os tugas.
Pami é destacada para dar aulas ao pessoal do Exército Popular e da Milícia Popular, em Flaque Injã, Cantanhês. No dia da despedida, canta, emocionada, o hino do Partido, 'Esta é a Nossa Pátria Amada', escrito e composto por Amílcar Cabral. Segue para Flaque Injã, com o coração em alvoroço, apaixonda por Malan Cassamá. De regresso à guerrilha, a Cansalá, Malan fala com o pai da jovem, e de acordo com os costumes gentílicos, Pami torna-se sua mulher. (...).
5 de Dezembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2328: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (4) - Parte III: O amor em tempo de guerrilha (Mário Fitas)
Na actual região de Tombali (Catió), no sul da Guiné, o PAIGC, logo no início da guerra, ganha terreno e populações (nomeadamente, de etnia balanat). A resposta das autoridades portuguesas não se fez esperar, com uma grande contra-ofensiva para reconquista a Ilha do Como (Op Tridente, Janeiro-Março de 1964). Entretanto, começam a chegar a Catió chegam reforços significativos. O Cantanhês, zona libertada, assusta o governo Português. Em contrapartida, no PAIGC, Nino, o mítico comandante da Região Sul, manda reforçar os acampamentos instalados nas matas de Cufar Nalu e Cabolol.
Em finais de 1964, Sanhá, a mãe de Pami, morre de doença na sua morança na tabanca de Cadique Iála. O guerrilheiro Pan Na Ufna, acompanhado da sua filha, faz o respectivo choro, de acordo com a tradição dos balantas.
Em Março de 1965, os homens da CCAÇ 763 - conhecidos pela guerrilha como os Lassas (abelhas) - reconquistam ao PAIGC a antiga fábrica de descasque de arroz, na Quinta de Cufar, e respectiva pista de aterragem em terra batida. Nino está preocupado com a actuação dos Lassas, agora instalados em Cufar, juntamente com o pelotão de milícias de João Bacar Jaló, antigo cipaio, agora alferes de 2ª linha.
Entretanto, Pami e Malan continuam a viver a sua bela estória de anor, em tempo de guerra, de sacrifício e de heroísmo. Ela, instalada em Flaque Injá, onde é professora. Ele, guerrilheiro, visita-a sempre que pode.
A 15 de Maio de 1965, os Lassas destroem o acampamento do PAIGC na mata de Cufar Nalu. A guerrilha sofre baixas mas, durante a noite, consegue escapar com o equipamento para Cabolol. Na semana seguinte, os militares de Cufar tentam romper a estrada para Cobumba. Embrenham-se na mata de Cabolol, destruem várias tabancas na zona.
Em princípios de Junho de 1965, os Lassas (abelhas) (3) vão mais longe, destruindo o acampamento de Cabolol. Em Cafal, o comando político-militar do PAIGC está cada vez mais preocupado. Em Julho, Pami chora de dor, raiva e revolta ao ver a sua escola destruída, em Flaque Injã. Grande quantidade de material desaparece ou fica queimado. As casas de Flaque Injã ficam reduzidas a cinzas.
Mas a luta continua... Psiquicamente recuperada, a população começa a reconstrução de Flaque Injã e Caboxanque. A guerrilha recebe mais reforços e armamento novo. Pami entra voluntariamente numa coluna de reabastecimento que a leva à República da Guiné. Segue o corredor de Guilege, e sobe de Mejo para Salancaur, daqui para o Xuguê [Chuguè, segundo a carta de Bedanda,] terra de seus avós paternos. Desce até Cansalá, onde se encontra com seu marido. Não encontra seu pai, pois este fora transferido para o Cafal, e ali integrado numa companhia do Exército Popular.
Em meados de Agosto de 1965, Pami Na Dondo desce com Malan Cassamá até Cobumba. Malan e o seu grupo levam a cabo várias acções contra a tropa e o quartel de Bedanda. O grupo regressa a Cansalá. Uma delegação da OUA visita as zonas libertadas, a convite do PAIGC.
(2) Vd. último post desta série > 10 de Dezembro de 2007 >
Guiné 63/74 - P2340: Pami Na Dondo, a Guerrilheira, de Mário Vicente (5) - Parte IV: Pami e Malan são feitos prisioneiros (Mário Fitas)