1. O nosso Camarada Santos Oliveira, ex-2.º Sarg Mil Armas Pesadas Inf, Pel Mort 912, Como, Cufar e Tite, 1964/66, enviou-nos a seguinte mensagem com data de 11 de Junho de 2009:
Camaradas,
Hoje vou-vos contar como num verdadeiro dia de caça, por pouco não nos caçamos a nós mesmos, em Cufar.
Embora eu tenha sido um dos intervenientes activos nesta Aventura, entendo que devia ser o Mário Fitas a contar este pequeno episódio em que, os Caçadores, estiveram em vias de ser caçados pelos seus “pares”.
Cerca de Março/Abril de 65, um Grupo constituído pelo Santos Oliveira, do PMort. 912, pelo Fur. Milº Alves, chefe da Equipa do Destacamento da CEngª 447, pelo Srgº da Sec AM Daimler e um outro Furriel (que não lembro o nome – seria o Fitas?) com um conjunto de mais 14 Cabos e Soldados, “destinamo-nos a ir á caça aos patos” (ou ao que quer que fosse comestível).
Ao lado e quase na extensão da Pista, havia uma bolanha, há muito abandonada, que mais se assemelhava a uma lagoa.
Deixei instruções ao Pessoal dos Morteiros; o Srgt AM Daimler deixou aos seus e para ali seguimos, não tanto com o sentido de caçar mas de desanuviar um pouco o ambiente que sempre se vive num Quartel, na sua quase totalidade constituído de abrigos subterrâneos, sem camas, mosquiteiros ou outras benesses, mas com o Ar Condicionado ligado quer de dia, quer de noite, tal como a Natureza nos proporcionava com as suas cambiantes.
Se apanhássemos algo que desse para mastigar, tanto melhor, já que a massa e o feijão-frade seriam certamente o prato base.
Foi um andar sem paragens, vagarosamente, para fazer render o tempo. Falava-se de tudo: das saudades, dos projectos, das ansiedades, dos desejos…
Pelo regresso, mais ou menos pelo bordo da lagoa, capim ainda macio, já a subir rapidamente e com um bom meio metro de altura, que convidava a um rebolar refrescante.
Num repente, sem aviso prévio, os Praças que nos seguiam a uns 30/40 metros, desataram a disparar as G3, de rajada, na direcção de nós quatro.
Lançamo-nos de imediato para ao chão, gritando ordens de suspensão de fogo, e rastejando como nunca, continuávamos a ver os ricochetes a lamber a parte superior do Capim e isso trazia-nos á lembrança a possibilidade aterradora de sermos massacrados pelos nossos.
Quase como começou (uma eternidade depois) tudo acabou, pudera, cada um dos soldados havia acabado de disparar os seus 5 carregadores! Mais não tinham!
Só que, agora o alarido era tremendo.
O que terá acontecido, interrogávamo-nos?
Quase de imediato ficou tudo esclarecido.
Uma Grande Gibóia, a quem devemos ter incomodado o sossego da sua sesta, ou caça, depois que passarmos (os quatro), ergueu-se um metro acima do Capim a lamentar-se haver perdido a perninha de qualquer um de nós.
A reacção dos Militares, foi espontânea, embora impensada; é que estávamos na linha do seu enfiamento de tiro. Não havia por onde sair com a rapidez necessária.
Uns 400 metros adiante, no início da Pista e entrada do Quartel, já nos aguardava, praticamente, tudo o que sobrava da CCaç763 e Adidos.
Por mim, ainda hoje sinto o gelo daquela pele, nas costas do meu dedo indicador.
Foi um Ronco de tirar fotografias ao, e com, o Bicho. Para mim, ou comigo, não!
O mais impressionante foi ver a arte como, com a minha faca, os elementos do Pelotão Nativo, cortavam finíssimas tiras e comiam crua aquela carne rosada e linda, mas que eu, meus amigos, ainda não estava à data, nunca estive durante todos estes anos e jamais estarei preparado, para tal experiência.
Estou a escrever “isto”, mas literalmente com pele de galinha.
Uma galinha seria decerto uma boa refeição a disputar: por nós e… pela esbelta e arrepiante Gibóia.
Ehrr, fiquei enjoado, agoniado, ou... já nem me apetece Galinha!
Cufar-Esquadra de Morteiros com Guia Nat.,sobre o abrigo, sem cama e mosquiteiro, mas com Ar Condicionado (Conforme o Tempo). Abr65.
Fotos: © Santos Oliveira (2009). Direitos reservados
Abraços,
Santos Oliveira
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Nota de M.R.:
Vd. último poste da série em:
11 de Junho de 2009> Guiné 63/74 - P4501: Fauna & flora (22): A fobia das cobras (Magalhães Ribeiro)