Foto 1 > Guiné > 1965 > Fuzileiro especiais durante uma operação militar, com percurso na água, [foto retirada da Net, com a devida vénia: sítio Lugar do Real: autor não identificado; recolhida por Sara Viana Caseiro; cedida por Manuel de Sousa Caseiro].
Foto 2 > Guiné > 1966 > Manuel de Sousa Caseiro, fuzileiro especial, natural de Antas, concelho de Esposende, atravessa, com outros militares, um rio, na Guiné, durante uma operação militar. [Foto retirada da Net, com a devida vénia: sítio Lugar do Real: autor não identificado; recolhida por Sara Viana Caseiro; cedida por Manuel de Sousa Caseiro].
Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger, CART 3494 (Xime-Mansambo, 1972/1974); coeditor do blogue desde março de 2018
ENSAIO SOBRE AS MORTES POR AFOGAMENTO DE MILITARES DO EXÉRCITO DURANTE A GUERRA NO CTIG (1963-1974): Parte I - CORPOS 'RECUPERADOS' E 'NÃO RECUPERADOS'
1. INTRODUÇÃO
Como sobrevivente no naufrágio tido pela minha secção (+) do 1.º Gr Comb da CART 3494 (1972-1974), no qual participou também o camarada Cap Art [hoje Cor] Pereira da Costa, de que resultaram, lamentavelmente, três baixas, duas das quais não recuperadas, ocorrido em 10Ago1972 (5.ª feira), no rio Geba, na zona do Xime, por influência do «macaréu» [P10246 e P13482], tomei a iniciativa de proceder a um "ensaio", quantitativo e qualitativo, sobre o número de militares do Exército que morreram afogados nos diferentes planos de água existentes na Guiné, durante o conflito armado (1963-1974), dividindo-o em dois grupos: "recuperados e "não recuperados" e as suas Unidades.
Com efeito, o levantamento que hoje trago ao conhecimento do fórum é resultado dessa pesquisa, efectuada através da consulta a diferentes fontes, entre oficiais e não oficiais. Porque se trata, como foi referido, de um "ensaio", este apuramento pode vir a ser alterado em função de outras colaborações e/ou informações complementares que possam, eventualmente, surgir após a avaliação realizada por cada um de vós.
Por razões metodológicas e estruturais do presente trabalho, nesta primeira parte não se referem os nomes dos naufragados em cada uma das diferentes ocorrências, opção que será alterada a partir da segunda parte, com a identificação das Unidades que não conseguiram recuperar os corpos dos seus náufragos [último quadro desta parte I], bem como a descrição, a possível, do contexto em que as mesmas tiveram lugar.
2. A HIDROGRAFIA DA GUINÉ-BISSAU
A grande maioria da actividade operacional das NT era planeada e executada em função da geografia e hidrografia de cada local. Cada situação era um caso particular, pois o seu território, constituído por zonas do litoral e do interior, apresenta-se mapeado por uma linha (a do limite das marés) dividindo-o em duas zonas hidrograficamente distintas, que influenciavam a mobilidade daqueles que nelas tinham de circular, desafiando a vida de cada um, com particular incidência dos menos preparados e dos mais descuidados.
De acordo com a literatura consultada, a primeira, a do litoral, é a zona das planícies, das rias, dos vales muito largos, invadidos pelas marés de água salgada, enquanto a segunda, para o interior, só existem rios de água doce, não navegáveis, devido às cheias e rápidos.
Foto 3 > Guiné-Bissau > Região de Bafatá > Saltinho > Rio Corubal > 18 de Abril de 2006, dia 8 (da viagem Porto-Bissau) > 19h16 > Os banhistas de fim da tarde. Foto do nosso amigo e grã-tabanqueiro Hugo Costa.
Foto (e legenda): © Hugo Costa / Albano Costa (2006). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Lu+is Graça & Camaradas da Guiné]
Esta linha marca o limite da navegação e separa os tipos de vegetação. Há uma área enorme - cerca de 4.000 Km2, mais de 10% da totalidade do território - que fica coberta de água, o que ocorre entre a praia-mar e a baixa-mar, cuja amplitude chega a ser próxima dos 7 metros, em alguns locais. Durante as "marés da conjunção", encontro das águas dos rios com a praia-mar, observa-se nos rios Geba e Corubal - o mais extenso da Guiné - o chamado fenómeno do "macaréu", que consiste numa grande onda, como um depósito de água corrente que, num instante, enche o leito do rio que transborda e inunda de água salgada extensas zonas das baixas margens daqueles rios.
3. OS DADOS DO "ENSAIO" – QUADROS ESTATÍSTICOS
Partindo da coleta de dados apurada, o tratamento estatístico que seguidamente se dá conta está representado por quadros de distribuição de frequências, simples e acumuladas, conforme se indica em cada um dos títulos. Cada quadro relata os valores quantitativos de cada um dos elementos das variáveis categóricas ou quantitativas relacionadas, tendo em consideração os objectivos que cada contexto encerra.
Quadro 1 – Da análise ao quadro supra, verifica-se que o número total de militares do Exército que morreram por afogamento no CTIG (1963-1974), e que constituíram a população deste estudo, é de 144.
Verifica-se, também, que desse total, 113 (78.4%) eram soldados; 22 (15.3%) 1.ºs cabos; 7 (4.9%) furriéis; 1 (0.7%) 2.º sargento e 1 (0.7%) major. Quanto aos anos em que se registaram maior número de casos: em 1.º lugar está o de 1969, com 51 (35.4%) mortos.
Para esta cifra contribuiu significativamente o episódio da «Jangada de Ché-Che», ocorrido em 06Fev1969, no Rio Corubal, com 47 mortos. Em 2.º lugar está o ano de 1965, com 20 (13.9%) mortos, dos quais 8 pertenciam ao PMort 980 registados na sequência do acidente no Rio Cacheu, em 05Jan1965, durante a «Operação Panóplia». No ano de 1972, verificou-se um outro acidente, o 3.º, desta vez no Rio Geba, em 10Ago1972, envolvendo o 1.º GrComb da CArt 3494, com 3 mortos.
Quadro 2 – Da análise ao quadro supra, verifica-se que o número total de militares do Exército que morreram por afogamento no CTIG (1963-1974) cujos corpos não foram recuperados é de 63 (43.8%).
Verifica-se, também, que desse total, 48 (76.2%) eram soldados; 10 (15.9%) 1.ºs cabos; 4 (6.3%) furriéis e 1 (1.6%) 2.º sargento. Quanto aos anos em que se registaram maior número de casos: estes correspondem aos mesmos indicados no quadro 1, ou seja: 1969 com 49 (77.8%) casos, 47 dos quais relacionados com a «Jangada de Ché-Che», no Rio Corubal; 1965 com 4 (6.3%) casos, 3 dos quais na «Operação Panóplia», no Rio Cacheu, e 1972 com 3 (4.8%) casos, sendo 2 no Rio Geba (CArt 3494) e 1 no Rio Cacheu (CArt 3417).
Quadro 3 – Da análise ao quadro supra, verifica-se que o número total de militares do Exército que morreram por afogamento no CTIG, durante o 1.º triénio (1963-1965) é de 34 (23.6% do total).
Verifica-se, também, que desses, 24 (70.6%) eram soldados, 6 (17.6%) 1.ºs cabos, 3 (8.8%) furriéis e 1 (3.0%) 2.º sargento. O número de corpos não recuperados neste período foi de 7 (20.6%). O número de Unidades Militares que contabilizaram estas perdas foi de 24.
Quadro 4 – Da análise ao quadro supra, verifica-se que o número total de militares do Exército que morreram por afogamento no CTIG, durante o 2.º triénio (1966-1968) é de 27 (18.8% do total).
Verifica-se, também, que desses, 25 (92.6%) eram soldados e 2 (7.4%) furriéis. O número de corpos não recuperados nesse período foi de 3 (11.1%). O número de Unidades Militares que contabilizaram essas perdas foi de 24, número igual ao período anterior (quadro 3).
Quadro 5 – Da análise ao quadro supra, verifica-se que o número total de militares do Exército que morreram por afogamento no CTIG, durante o 3.º triénio (1969-1971) é de 63 (43.7% do total).
Verifica-se, também, que desses, 49 (77.8%) eram soldados; 11 (17.4%) 1.ºs cabos; 2 (3.2%) furriéis e 1 (1.6%) major. O número de corpos não recuperados nesse período foi de 50 (79.4%). O número de Unidades Militares que contabilizaram essas perdas foi de 18, menos 6 do registado nos anteriores trimestres (quadros 3 e 4).
Quadro 6 – Da análise ao quadro supra, verifica-se que o número total de militares do Exército que morreram por afogamento no CTIG, durante o 4.º triénio (1972-1974) é de 20 (13.9% do total).
Verifica-se, também, que desses, 15 (75%) eram soldados e 5 (25%) 1.ºs cabos. O número de corpos não recuperados nesse período foi de 3 (15%). O número de Unidades Militares que contabilizaram estas perdas foi de 18, menos 6 do registado nos dois primeiros triénios (quadros 3 e 4) e igual ao triénio período anterior (quadro 5).
Quadro 7 – Da análise ao quadro supra, verifica-se que o número total de militares do Exército que morreram por afogamento no CTIG (1963-1974) cujos corpos não foram recuperados é de 63 (43.8% do total).
Quanto aos corpos não recuperados, verifica-se que a CCaç 1790, com 26 (41.3%) casos, e a CCaç 2405, com 19 (30.1%) casos, foram as Unidades Militares que contabilizaram maior número, sendo estes consequência do acidente da «Jangada de Ché-Che» em que elementos das duas Companhias de Caçadores estiveram envolvidos. Segue-se o PMort 980, com 3 corpos não recuperados, no Rio Cacheu, na «Operação Panóplia", e a (minha) CArt 3494, com dois, no Rio Geba (Xime), durante uma missão, não cumprida, a Mato Cão, situado na margem direita desse rio. Das 16 Unidades Militares que não conseguiram recuperar os corpos dos seus naufragados, 11 (17.5%) tiveram apenas um caso.
Nota:
Em função das fontes consultadas, não nos foi possível completar todas as variáveis categóricas, como é o exemplo dos locais (n/n) de alguns afogamentos. Caso alguém disponha de informações mais precisas, faça o favor de dizer.
Por outro lado, considerando que são referidos nomes de rios, que desconheço, transcritos como o indicado nos documentos oficiais, é possível que alguns deles contenham erros ortográficos. Aguardo a sua correpção.
Continua…
Fontes consultadas:
Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 6.º Volume; Aspectos da Actividade Operacional; Tomo II; Guiné; Livro I; 1.ª edição, Lisboa (2014); pp 16-17.
Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 8.º Volume; Mortos em Campanha; Tomo II; Guiné; Livro 1; 1.ª edição, Lisboa (2001); pp 23-569.
Estado-Maior do Exército; Comissão para o Estudo das Campanhas de África (1961-1974). Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África; 8.º Volume; Mortos em Campanha; Tomo II; Guiné; Livro 2; 1.ª edição, Lisboa (2001); pp 23-304.
Outras: as referidas em cada caso.
Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
01Abr2019.
Outras: as referidas em cada caso.
Termino, agradecendo a atenção dispensada.
Com um forte abraço de amizade e votos de muita saúde.
Jorge Araújo.
01Abr2019.