segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9508: Notas de leitura (335): Os Últimos Guerreiros do Império (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Janeiro de 2012:

Queridos amigos,
Trata-se de uma recolha de depoimentos de militares condecorados por bravura. Um bom número deles passou pela Guiné. Há recordações tocantes e fica-se com a prova provada que os mais bravos guerreiros não esquecem os outros combatentes, a quem por vezes devem a vida. O tenente-coronel Nogueira Ribeiro não esquece o soldado 38, um felupe de quase 2 metros, que lhe disse algo que registou para toda a vida: Nosso Alfere não pode morrer, senão nosso ficar órfão. Ontem, no hospital dos Capuchos, nos cuidados intensivos, a olhar para o meu guarda-costas, Cherno Suane, em coma, esta frase cirandava-me entre a memória e um ponto obscuro do coração. Aquela comissão fazia-se de missões e algumas delas prosseguem toda a vida.

Um abraço do
Mário


Os últimos guerreiros do Império (1)

Beja Santos

“Os últimos guerreiros do império”, coordenação de Rui Rodrigues, Editora Erasmos, 1995, é uma coletânea de depoimentos de oficiais e sargentos ex-combatentes, de um modo geral possuidores das mais altas condecorações militares. São 18 depoimentos, 11 dos quais de combatentes que possuem (ou possuíam, alguns já faleceram) a “Torre e Espada”, militares de carreira e milicianos. Obviamente que nos vamos circunscrever à Guiné.

Damos a palavra em primeiro lugar a Hélio Felgas, ao tempo Brigadeiro. Este oficial- general destacou-se como escritor, foi professor catedrático da Academia Militar e fez duas comissões na Guiné, entre outras. No princípio de 1963 foi comandar um batalhão aquartelado em Bula e na segunda comissão, entre 1968 e 1969, chefiou o Estado-Maior do setor de Mansoa, comandou o batalhão de artilharia de Tite e depois o setor Leste,em Bafatá. Diz ter conhecido a Guiné a pé e de jipe, comandou 84 operações, sofreu 26 emboscadas e meia dúzia de flagelações nos aquartelamentos por onde pernoitava. No final de 1968 enviou um relatório a Spínola onde defendia a concessão da independência à Guiné-Bissau e transcreve uma passagem desse relatório:

“Neste final de 1968 a situação militar na Guiné chegou a um ponto tal que só muito dificilmente, e com muito otimismo, se poderá antever uma melhoria significativa.
Nos gabinetes em frente da carta talvez não seja difícil encontrar uma solução vitoriosa. No mato, porém, é muito difícil, e quem escreve isto tem três anos de mato.
Mesmo que venham mais helicópteros, mais páras, mais artilharia e mais aviação e ainda que os efetivos das forças terrestres sejam aumentados e estas sejam adequadamente dotadas com as granadas, munições e armas coletivas que ora lhes faltam, mesmo que isso suceda em breve prazo, nem assim o nosso êxito militar será garantido. O inimigo está demasiado bem armado, bem apoiado pela população, bem organizado e bem enraizado num terreno que lhe é favorável, para poder ser batido e expulso.
Realize-se uma operação em larga escala e veja-se o resultado: uns mortos e uns feridos, umas armas apreendidas, uns acampamentos destruídos e que mais? Mais nada. Se ao inimigo não convier o contato, basta esconder-se no mato e esperar que as nossas tropas se retirem. Ele lá ficará e reaparecerá quando quiser.
Aliás, o que se entende por uma operação em larga escala? Talvez 4 ou 5 Companhias de forças terrestres, 1 ou 2 de Páras e Comandos e a aviação. Que faremos com estes efetivos? Uma operação, mais nada. Alguns dias depois tudo estará na mesma”.

Hélio Felgas sugere mudanças drásticas na atividade militar, abandono de território e concentração de meios. Seria preciso definir bem o problema da população civil. E questiona: “Dezenas de milhares de nativos vivem nas regiões sob domínio do IN, em tabancas perfeitamente visíveis do ar. Deve ou não deve a aviação atacar e destruir estas tabancas e a sua população? Valerá a pena um tal massacre ou não valerá? Isto é que é preciso saber”. Acrescenta, categórico: “Eu bem sei que quem não conhece o mato da Guiné, nem as dificuldades deste tipo de guerra, sente-se inclinado a considerar exageradas as minhas palavras. Infelizmente, tenho a certeza do que afirmo. Deixou-se o IN inchar demais para se poder, agora, desalojá-lo com os meios que temos”. O brigadeiro Felgas considerava que se devia dizer verdade, na Guiné estava-se apenas a aguentar a situação: “Estamos à espera que o IN adquira suficiente estrutura e capacidade militar para correr connosco. Mostramo-nos incapazes de o desalojar definitivamente seja de que área for”.-

Temos agora o Fuzileiro Comando João Seco Mamadu Mané, foi Segundo Comandante de um grupo de 25 homens na 3.ª Companhia de Comandos. Refere operações, ferimentos, lutas duríssimas, estará presente na operação a Kumbamory, em maio de 1973 a “Ametista Real”. Logo no primeiro dia perderam dois alferes, mortos a tiro, no meio das dificuldades, apareceu Marcelino da Mata que terá provocado grandes destruições. Em 1974 entrou em Canquelifá, um quartel quase destruído, há um mês que não se tomava banho, não se podia cozinhar, vivia-se de enlatados. Depõe o seguinte: ”Canquelifá fica no Nordeste, perto da fronteira com a Guiné-Conacri. Piche fica 30 quilómetros para o interior, e para fazer esta distância, em coluna, eram precisos 2 dias. Estava tudo minado. Às vezes com umas minas muito perigosas, que rebentavam se alguém se aproximava com qualquer coisa de metal. Para lá chegarmos não fomos por essa estrada, abrimos nós uma estrada com as viaturas, com o Batalhão dividido em pequenos grupos… Quando lá chegou a 2.ª Companhia, comandada pelo Alferes Bari (que depois mataram em 1977), capturou 3 morteiros pesados de 120mm. Nunca, durante toda a guerra da Guiné, tinham sido capturadas armas dessas. Estavam lá dois cubanos para regular o tiro. E foi preciso um dia para apanhar os morteiros. Avançava-se, recuava-se”.

Queixa-se das barbaridades dos fuzilamentos dos Comandos: “No mês de março de 1975 começaram as prisões. Foi um mês negro para os Comandos. Eu fui preso. E fui torturado. Como muitos outros camaradas. Obrigaram-nos a carregar pneus gigantescos, pneus de Berliet, com jantes e tudo. Era uma das torturas, mas havia outras: como pendurar uma pessoa pelos pés, e dar-lhe chicotadas. Dentro da prisão obrigavam as pessoas a andar despidas, só com as cuecas… Houve camaradas que estiveram presos, 6, 7 e 8 anos. Alguns já tinham sido fuzilados e os familiares continuavam a levar-lhes comida e cigarros. Às vezes, os guardas pediam cigarros, as famílias estranhavam, diziam que eles não fumavam e eles respondiam que tinham passado a fumar,  já estavam mortos. Outros ficaram aleijados para sempre, por causa dos maus tratos. Uma vez fui passar férias à Guiné e encontrei um soldado da minha Companhia, que tinha sido muito valente, chamado Mumó Sissé. Quando me viu começou a chorar. Contou-me que passou seis meses numa cela onde não se podia pôr de pé nem estender as pernas. Quando de lá saiu tinha uma perna e uma mão paralíticas. De vez em quando compro aqui uma camisa e uns calções e mando-lhe… Houve camaradas que foram presos no Senegal, na Gâmbia e na Guiné-Conacri. Foram mandados para a Guiné como se fossem peixe, para serem fuzilados… Eu tenho a minha vida mais ou menos resolvida. Mas muitos deles estão muito pobres. Não há mês nenhum que eu não passe duas ou três declarações a pessoas, para pedirem autorizações de residência. Muitos desses camaradas têm as suas condecorações e os seus louvores e às vezes nem autorização de residência têm… Se alguma organização fez alguma coisa por nós foi a Associação de Comandos, tem ajudado muitos camaradas a conseguir emprego, e eu sou um deles. Mas muitos, muitos dos que passaram connosco maus tempos, dormem por aí, na rua”.

Temos ainda os depoimentos de Marcelino da Mata, Nogueira Ribeiro, Maurício Saraiva e Almeida Bruno.

(Continua)
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 17 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9498: Notas de leitura (334): O Ultramar Português, o que se dizia sobre a Guiné e se oferecia na Feira Popular em 1945 (Mário Beja Santos)

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9507: Em busca de... (184): Camaradas do Fur Mil Hércules de Sousa Lobo, natural da ilha do Sal, Cabo Verde, gravemente ferido pelo primeiro fornilho acionado no CTIG, em julho de 1963, na estrada São João-Fulacunda (Maria Luísa Sousa Lobo)


Guiné > Região de Quínara > Mapa da província (Escala 1/500 mil) > 1961 > Detalhes > Terá sido na estrada Fulacunda-São João que o Fur Mil Hércules de Sousa Lobo, natural do Sal, Cabo Verde, terá sido gravemente ferido pelo 1º fornilho a ser utilizado pelo PAIGXC, em julho de 1963.


1. Comentário do Poste P8311, assinado por uma nossa leitura, Lulita, caboverdiana;:

Algum dos senhores conheceu um furriel Hercules de Sousa Lobo que foi ferido na Guiné,  em Julho de 1963? Sou a irmã, Maria Luisa Sousa Lobo

2. Mail que circulou, no dia 17 do corrente,  internamente pela Tabanca Grande:

Camaradas do caqui amarelo:  Alguém conheceu o Furriel Hércules de Sousa Lobo que foi ferido na Guiné em Julho de 1963 ? A pergunta é da irmã Maria Luisa Sousa Lobo, que vive e trabalha em Cabo Verde... Obrigado pela eventual ajuda. LG

3. Tivemos até à data apenas uma resposta, a do nosso camarigo Manuel Amante da Rosa [, foto à esquerda]:

Meu Caro Luís,

Das minhas muitas idas ao nosso blogue  lembro-me de ter visto uma vez um poste que relatava o seu ferimento [, do Fur Mil Hércules de Sousa Lobo,], numa GMC, saída, salvo erro, de Fulacunda, que teria sido arrebentada por um fornilho. 

Se me lembro,  a GMC levava na carroçaria um bidão da gasolina que teria arrebentado e queimado o furriel caboverdeano. Isto o que li no Poste.

O que soube por fora, de um administrador, é que ele teria ficado muito queimado. Foi evacuado com muito custo para Bissau e depois transportado por um DC6 (?) para Lisboa com escala no Sal onde toda a família vivia e que não terá sabido da passagem desse familiar.

Terá sido o primeiro fornilho ativado na Guiné. Pelo menos contra viaturas militares. Foi acionado a muita pouca distância e o susto do guerrilheiro foi tanta que terá deixado os chinelos e tudo o que tinha tal o estrondo, onda de vento e incêndio que provocara.

Conheço bem a família. O furriel era primo irmão do célebre cantor Ildo lobo, irmão do cantor Mirri Lobo e primo da cantora Ritinha Lobo. É uma família muito conceituada da ilha do Sal e de Cabo Verde.

Recebe um forte Abraço
Manuel

4. Comentário do editor:

Obrigado, Manuel Amante... Em quase 10 mil postes publicados, em 8 anos, não dá para reter todos os detalhes, como é fácil de entender... Confio na tua memória seletiva. Eu tenho uma vaga ideia de se ter falado nessa história, ou no blogue ou nalguma troca de emails contigo (E infelizmente nem tudo é publicável...). 

Sabe-se que o primeiro fornilho, na Guiné, foi acionado em julho de 1963, na estrada São João-Fulacunda...  Ora quem estava na região de Quínara em 1963 era o nosso camarada George Freire (ex-capitão QP, que vive hoje nos EUA desde outubro de 1963 e que já aqui publicou diversos postes interessantes sobre a escalada da guerra no 1º semestre de 1963)... Ele era o 2º comandante da CCAÇ 153 (1961/73) mas depois foi comandar a 4ª CCAÇ, tendo andado pelo leste (Nova Lamego) e depois pela região de Tombali (Bedanda). Voltou, no entanto, a Portugal em 26 de maio de 1963. Já aqui publicámos notas do seu diário bem como um vídeo.

O nosso camarada Hércules de Sousa Lobo pode ter pertencido (mas não me parece provável...)  à CCAÇ 153 (que estava em Fulacunda) ou então à CCAÇ 154 (que estava em Buba). Estas companhias eram independentes. Mas havia ainda o BCAÇ 237 (cujo comando e CCS estavam sediados em Tite, no período de julho de 1961/outubro de 1963). No entanto, a CCAÇ 153 em julho de 1963 já não devia estar na região de Quínara, estando a aguardar embarque em Bissau.

Segundo a informação que temos no nosso blogue, a CCAÇ 153 foi mobilizada pelo RI 13 de Vila Real, era  comandada pelo Cap Inf  José dos Santos Carreto Curto, embarcou para Bissau em 27Mai61 (por via aérea) e regressou em 24Jul63.

A 26Jul61 foi colocada em Fulacunda destacando forças para Empada, Cufar, Catió e Bolama, por periodos variáveis. A 7Fev62 foi rendida pela CCAÇ 274 e foi colocada em Bissau. A 11Fev62 rendeu a CCAÇ 274 em Bissau. A 21Jul63 foi substituida pela CCAÇ 510, ficando a aguardar embarque.  

À CCAÇ 274 (Bissau e Fulacunda, jan 1962/jan 64) pertenceu o nosso camarada Durval Faria. Pode ser que ele nos saiba dizer algo mais sobre este fornilho que feriu gravemente o Fur Mil Hércules de Sousa Lobo.

O  Hércules, em julho de 1963, deveria estar num companhia sediada em Fulacunda ou então em Tite... Qualquer informação adicional será bem vinda.

 Em 1962, as unidades mobilizadas para o TO da Guiné foram as seguintes, para além da CCAÇ 274:

BCAÇ 356: Mobilizada pelo BCAÇ 5, partiou em 17/1/1962 e regressou em 17/1/1964. Esteve em Bissau, Cufar e Catió. Comandante: Ten Cor Inf João Maria da Silva Delgado.

CCAÇ 273: Mobilizada pelo BII 17, partiou em 17/1/1962 e regressou em 17/1/1964. Esteve em Bissau, Catió, Cacine e Cabedu. Comandante: Cap Inf Jerónimo Roseiro Botelho Gaspar

EREC 385: Mobilizada pelo RC 8, partiou em 17/1/1962 e regressou em 17/1/1964. Esteve em Bissau e Fulacunda. Comandante: Cap Cav José Olímpio Caiado da Costa Gomes.

[Fonte: Gomes, C.M.; Afonso; A.- Os anos da guerra colonial: volume 3: 1962: optar pela guerra. Matosinhos: QuidNovi, 2009, p. 126. ]

Guiné 63/74 - P9506: Blogpoesia (179): Os Unidos de Mampatá: Do Zé Manel Lopes (Josema) para o seu camarigo António Carvalho, hoje com 62 anos

1. O Josema (José Manuel Lopes) não nos leva a mal se a gente pegar num dos versos do seu poemário de Mampatá, já aqui publicados, e dedicá-lo ao António Carvalho, na semana em que as nossas tabancas (a Grande e a Pequena) celebram os seus jovens 62 anos... [Foto do António,à direita]

Nada disto foi combinado: conheci o António Carvalho depois do Zé Manel, ambos pertencentes aos Unidos de Mampatá (a CART 6250, 1972/74).


Tenho pena de não poder estar no almoço da próxima 4ª feira, na Tabanca Pequena de Matosinhos, para cantar em coro os parabéns ao Carvalho de Mampatá, considerado por todos os tabanqueiros de Lisboa, Porto e arredores como "um bom camarada e um melhor amigo".

Talvez ninguém melhor que o Josema [, foto à esquerda,] traduziu,  em versos diários, espontâneos, sinceros e singelos, esse sentimento de "camarigagem" que, de Mampatá a Buruntuma, de Guidage a Guileje, todos experimentámos no TO da Guiné, a par da saudade da nossa terra em tempo de guerra... 

Parabéns aos "unidos de Mampatá" pela sua lição de vida, traduzida hoje numa cultura sã de amizade, camaradagem, convívio e solidariedader que já vem dos tempos duros da Guiné.

  
Calor, cansaço, suor,

saudades de tudo
e de um rio...
mas podia ser pior,
pois há ali o Corubal
com sombras e água boa;
nem tudo é mau afinal,
não é o Douro, eu sei,
nem o Tejo de Lisboa,
são outros os horizontes,
falta o xisto e o granito,
as encostas e os montes,
mas diga-se na verdade
há o Carvalho, há o Rosa,
há um hino à amizade,
há o Gomes e o Vieira,
a sonhar com a Madeira,
há o Farinha e o Polónia,
gestos e solidariedade,
há o Esteves e o Pinheiro,
amigos e sinceridade,
há o Nina e até amor,
também sofrimento e dor,
há o desejo de voltar
e um apelo à liberdade.

Josema
Mampatá, 1974

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Nota do editor:

 Último poste da série > 14 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9482: Blogpoesia (178): No tempo em que eu colhia rosas nas covas do teu rosto... (António Graça de Abreu)

Guiné 63/74 - P9505: Memória dos lugares (176): Buruntuma, lá no "cu de Judas"...




Guiné > Zona leste > Região de Gabu > Carta de Buruntuma (escala 1/50 000)> 1957  > Detalhe > A estrada, a vermelho, que se vê no mapa, atarvessava todo o leste, desde o Xime, Bambadinca, Bafatá, até Nova Lamego, Piche e Buruntuma (na fronteira com a República da Guiné-Bissau). O aquartelamento (e povoação) de Buruntuma foi ocupado pelo PAIGC em 5 de julho de 1974.


1. Escreveu Luís Graça em comentário ao poste P9499:


(...) "O caso de Buruntuma merece um poste com destaque para a destemperada atuação do comandante da Frente Leste, o antigo futebolista Bobo Keita (ou Queta), de que já aqui falámos diversas vezes, a propósito do livro de Norberto Tavares de Carvalho ("De campo em campo: conversas com comandante Bobo Keita", edição de autor, 2011).


"O Bobo Keita tinha feito parte da delegação do PAIGC, na 1ª ronda de negociações de paz, em Argel... Depois de Argel, regressou à Frente Leste. E deve-lhe ter subido à cabeça a mania do protagonismo...


"Aqui, no leste, foi claramente 'mais papista que o Papa'", passando a perna à direção política do PAIGC. Foi ele quem teve a iniciativa de (i) colocar barragens para controlos dos nossos veículos militares, nas estradas do leste, (ii) forçar a desocupação do quartel de Buruntuma... para além de (iii) ter resolvido, através do terror (3 fuzilamentos e diversas prisões), um conflito em Paunca com mílicias (ou não seriam antes os militares da CCAÇ 11 ?)...


"Ele próprio reconheceu, antes de morrer, na altura em que foi entrevistado para o livro, que a chantagem feita aos tugas de Buruntuma era mero bluff, que não era sua intenção atacar nenhum quartel...


"A verdade é que este homem podia ter originado uma tragédia de consequências imprevisíveis e incalculáveis... A sua atitude de fanfarrão obrigou à intervenção pessoal do Fabião e do Juvêncio Gomes (delegado do PAIGC em Bissau)...


"Veja-se o seu depoimento nas pp. 222 e segs."


2. Disse o cor cav Carlos Matos Gomes:


(...) "Pois. Porque Buruntuma era o pior sítio da Guiné. Aliás, quando lá esteve o general Schultz, Buruntuma era o 'cu de judas' da Guiné. É no vértice superior direito do [mapa] e era, de facto, um buraco infecto onde os soldados deviam pedir aos inimigos para os mandarem embora. [Apartes sobre Buruntuma e a sua localização] ".


[In: Arquivo de História Social. [Em Linha] ICS -Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, 2011. Estudos Gerais da Arrábida: A descolonização portuguesa: Painel dedicado à Guiné (29 de Agosto de 1995). Depoimentos do General Mateus da Silva, Coronel Matos Gomes, José Manuel Barroso e  Coronel Florindo Morais. [Consultado em 18 de fevereiro de 2012]. Disponível em http://www.ahs-descolonizacao.ics.ul.pt/docs/guine_1995_08_29.pdf ]


3. Temos poucas referênicas a Buruntuma. Menos de duas dezenas. Temos poucos camaradas que lá tenham estado ou por lá tenham passado. Conheci um, em tempos, ex-operário da Sorefame, na Falagueira. Falámos de Buruntuma num dia que, por acaso, era o Dia Mundial da Poesia. O Carlos Matos Gomes, por seu turno,  chama-lhe o "cu de Judas da Guiné". 


Não sei, nunca lá estive. Mas ouvi dizer, ouvi contar histórias... Eu estava na outra ponta da zona leste. E como a Guiné era pequena, 36 mil quilómetros quadrados, 8 mil de água, 28 mil de terra!... (Ou não era assim tão pequena quanto isso ?!). Não, nunca fui a Buruntuma.  


Procurei na Net.  Encontrei, no nosso blogue, o nosso camarada Luís Guerreiro, ex-Fur Mil, emigrado no Canadá, que andou um mês por terras de Buruntuma com o seu Pel Caç Nat 65, "Os Leões Negros", no 1º trimestre de 1970... E de Buruntuma tenho aqui uma foto dele, junto à capela, ao pau da bandeira e aos monumentos das companhias que por lá passaram... É pena que seja em formato pequeno, e portanto tenha fraquíssima resolução...


Na Net, e num blogue de família, encontrámos duas fotos de 1973: são de um camarada que vive no Porto, Manuel Cortez Lopes. Espero que ele, e o editor do blogue, não levem a mal a reprodução das imagens... É por uma boa causa. E, por outro lado, talvez alguém se lembre deste camarada, que pertence à família Cortez..







Manuel Cortez Lopes, Buruntuma, 14 de Junho de 1973 ("ao fundo, a República da Guiné Conakri")


[In: Blogue Família Cortez >  15 de fevereiro de 2011 > Manel, 1973. Reproduzido com a devida vénia...]
 
Quem também passou por Buruntuma, mas nos primórdios da guerra, em 1962, foi o nosso camarada Alberto Nascimento. É um dos velhinhos do nosso blogue, ainda do tempo da Mauser e do caqui amarelo... 


Que estas imagens, e estas referências, despertem ao menos a curiosidade e a vontade de mais camaradas, enriquecendo o nosso arquivo de memórias sobre este topónimo... Buruntuma era mesmo no "cu de Judas" ? (LG)


Guiné > Zona leste > Região do Gabu > Buruntuma > CCAÇ 84 > Fevereiro ou Março de 1962 > "Na zona dos Bucurés, a malta da companhia, com a G3"




Foto (e legenda(: © Alberto Nascimento (2008). Todos os direitos reservados.



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Nota do editor:
 
 Último poste da série > 8 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9459: Memória dos lugares (175): Gadamael em 1969 (Luís Guerreiro)

sábado, 18 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9504: Parabéns a você (384): António Carvalho, ex-Fur Mil Enf.º da CART 6250 (Guiné, 1972/74)

1. Ontem, dia 17 de Fevereiro de 2012 esteve de parabéns o nosso camarada António Carvalho. Porque o ano passado se fez um poste de parabéns no dia 19 de Fevereiro, fui induzido em erro. Como vale mais tarde do qeu nunca, vamos então saudar o nosso tertuliano e desejar-lhe uma longa vida com saúde.

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 17 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9497: Parabéns a você (383): Fernando Chapouto, ex-Fur Mil da CCAÇ 1426 (Guiné, 1965/67)

Guiné 63/74 - P9503: Em busca de... (183): Manuel da Conceição Clemente, a viver em França, procura um seu camarada ex-1.º Cabo Radiomontador, de Cantanhede ou Anadia, ambos ex-combatentes do Esq Rec 693 (Bafatá, 1964/66)

1. Mensagem do nosso camarada Joaquim Mexia Alves, fundador e grande mentor da Tabanca do Centro, com data de 17 de Fevereiro de 2012:

Meus caros camarigos
Recebemos da Liga dos Combatentes de Leiria, que de quando em vez se fazem presentes nos nossos almoços, o seguinte pedido:

Temos um associado da Liga que pretende encontrar um camarada dos tempos da Guiné.
O associado é o sr. Manuel Conceição Clemente que tinha o nº 1049 de 64.
Ele procura um Primeiro Cabo Radiomontador de Cantanhede ou da Anadia que esteve em Bogotá, na Guiné, no esquadrão de Cavalaria 8-693. Parece que era Ourives.


Obviamente que pedi esclarecimento pois não poderia ser Bogotá, (salvo o erro capital da Colômbia), mas sim Bafatá.
Responderam dizendo que muito provavelmente seria essa a localidade e que este associado da Liga esteve na Guiné em 64/65

É pouco, (e aliás tenho algumas dúvidas sobre o número do Esquadrão da Cavalaria, pois parece-me muito elevado para essa data), mas enfim é a informação que nos é dada.

Com efeito, pelo menos no meu tempo, havia um Esquadrão da Cavalaria em Bafatá.
O camarada que faz esta procura reside agora em França.
Podem colocar a pergunta na Tabanca Grande que tem mais audiência?

Um abraço camarigo do
Joaquim Mexia Alves


2. Nota do editor:

Com a devida vénia reproduzimos a págin 553 do 7.º Volume - Fichas das Unidades - Tomo II - Guiné, da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África (1961-1974), Edição do Estado-Maior do Exército:


Assim, quase pela certa, o nosso camarada Manuel Conceição Clemente, que vive em França, procura um seu camarada com o posto/especialidade 1.º Cabo Radiomontador, de Cantanhede ou Anadia, provavelmente com a profissão de ourives, que esteve com ele no Esq Rec 693 em Bafatá nos anos de 1964/66.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 2 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9436: Em busca de... (182): Identificação dos dois Oficiais na foto (Armando Pires)

Guiné 63/74 - P9502: História da CCAÇ 2679 (47): Um Brigadeiro de visita a Bajocunda (José Manuel Matos Dinis)

1. Em mensagem do dia 16 de Fevereiro de 2012, o nosso camarada José Manuel Matos Dinis* (ex-Fur Mil da CCAÇ 2679, Bajocunda, 1970/71), enviou-nos a descrição de um episódio estranho, vivido na primeira pessoa.



HISTÓRIA DA CCAÇ 2679 (47)

UM BRIGADEIRO DE VISITA A BAJOCUNDA

Corria a manhã a meu favor: estava deitado entregue a uma qualquer leitura, interrompida aqui ou ali por algum voo do pensamento, que atravessava fronteiras e punha-me em contacto com as recordações da metrópole.

Este "dolce fare nienta" foi subitamente interrompido com uma aproximação em corrida, e uma frase gritada para alguém: procura tu aí na enfermaria. Entrou então um militar que se me dirigiu com a voz estorvada pelo cansaço:
- Furriel, chegou agora um Brigadeiro, e não está cá ninguém para o receber.

Surpreendido ainda retorqui:
- E que tenho eu a ver com isso?
- É que não está cá ninguém, nem o nosso Capitão, nem os alferes, nem os sargentos.

Percebi imediatamente que tinha que ir fazer as honras da casa, e receber sua excelência. Estranhei, no entanto, o insólito da situação: naquele momento eu seria o Comandante de Bajocunda. Vesti uma roupinha, tão depressa quanto a tropa me treinara, e saí preparado para enfrentar as responsabilidades. Dobrei uma vedação e dirigi-me para a pista. O Brigadeiro, mais dois ou três militares da Companhia que o acompanhavam, já vinha por alturas da casa do Silva. Dei uns passos, perfilei-me e bati a palada da ordem, ao que o Oficial-General me correspondeu com um cumprimento militar, um aperto de mão e um sorriso de bons dias. A primeira etapa estava ganha, a seguir era aguentar-lhe a simpatia.

Com mais ou menos lata adiantei, pelo que entretanto ouvira, que o nosso Capitão saíra para Pirada, que se assim o entendesse mandaria uma mensagem para o COT-1, e que estava ao dispor para lhe mostrar e dar alguma informação sobre o que entendesse, na medida em que também eu estava surpreendido naquela condição. O senhor Brigadeiro mostrou-se muito cordial, e a seu pedido, dirigi-me para o celeiro, que funcionava como Depósito de Géneros. Entrámos, e com o choque das diferenças de luz, levámos um bocadinho a localizar a origem do som da viola e de um cantar engasgadote. Logo reconheci a figura do Calvo, Vaguemestre, que indiferente, ensaiava com a viola notas e canções da beatlemania.

O meu camarada deu um pinote quando se apercebeu da ilustre visita. Saiu de cima do saco de batatas, perfilou-se, e bateu a correspondente pala, mas com a cabeça descoberta. O Brigadeiro mostrava-se muito bem disposto com a atrapalhação. Protegidos da torreira do sol, e confortados pela frescura do ambiente, ficámos ali uns momentos numa conversa informal e irrelevante.

Quando saímos do Depósito de Géneros, perguntei ao senhor Brigadiero se pretendia visitar a área de aquartelamento, as instalações, o que me ocorreu, mas não manifestou essa vontade. Também não me recordo se lhe ofereci de beber. Sei que o acompanhei à pista, e que abalou, sempre afável e bem disposto.

Do Capitão, alferes e sargentos, não me lembro que notícias vim a ter, se as tive. Porém, o meu Capitão Trapinhos era um maricas de primeira, não saía do aquartelamento, senão por motivo imperativo. O mesmo se diga em relação aos sargentos. E terem saído todos em conjunto, cheira-me a que tiveram conhecimento prévio da chegada do Brigadeiro, e que não quiseram correr riscos sobre a acção de enriquecimento ilegítimo que ali desenvolviam. Já os alferes teriam as suas actividades de mato, e um deles teria que acompanhar e escoltar a ladroagem. Naquele dia, se eu estava no aquartelamento, os outros alinhavam. Por isso, tenho que focar a atenção naqueles três. Também ninguém me perguntou sobre a motivação do visitante.

Vem isto a propósito de competências, e incompetências. Não posso fazer ideia da razão para a visita do Brigadeiro. Para mais desacompanhado e a viajar de DO. Se viesse em missão de ordem estritamente militar, nada mais natural que fazer-se acompanhar, pelo menos, do Major Comandante do COT-1 de Pirada. Se viesse em missão de inspecção, deveria ser acompanhado de um ou mais oficiais de Intendência. Também não houve notícias que resultassem daquela visita.

Mas posso fazer deduções: se a viajem foi anunciada, os responsáveis bajocundenses fugiram ao visitante; se receberam aviso prévio, também fugiram ao visitante. É (era) absolutamente inimaginável, que o Capitão e os sargentos saíssem em conjunto. Também não estou seguro que fossem a Pirada. Podem ter ficado em Tabassai por um qualquer pretexto. E, nesse caso, porquê aquela seita em conjunto? E, também não estou seguro que tivessem saído em conjunto - embora tenha sido essa a informação - mas, nesse caso, algum sargento ficou acoitado em algum abrigo, e concominado com o pessoal.

Por último, resta-me acusar de incompetência o simpático Brigadeiro: de facto, fosse qual fosse o motivo da deslocação, devia ter tirado ilações sobre a óbvia ausência daqueles profissionais da tropa. Se algum estivesse de férias, ou doentes, ou em trânsito em Bissau, enfim, mas nada disso acontecia, e eu próprio manifestei a minha surpresa pela situação. Ora, um aquartelamento não pode ficar entregue a um Furriel Miliciano que não tinha conhecimento dessa condição. Assim, também o senhor Brigadeiro terá mostrado incompetência, se não soube, ou não quii, tirar as devidas conclusões, e proceder como a situação aconselhava.

Como diz o povo: não há maior cegueira, como a de não querer ver.
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 25 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9400: Notas de leitura (326): Anticolonialismo e Descolonização, por Luís Filipe de Oliveira e Castro (José Manuel Matos Dinis)

Vd. último poste da série de 14 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9353: História da CCAÇ 2679 (46): SEXA COMCHEFE visitou Tabassi (José Manuel Matos Dinis)

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9501: (Ex)citações (175): Retalhos de uma guerra - BCaç 4512/72 - Farim/Guidage (8 e 9 de Maio de 1973) (Amílcar Carreira)

1. Ainda a propósito do dossiê Guidaje 1973, recebemos mais esta mensagem do nosso camarada Amílcar Carreira* (ex-Fur Mil Inf Op da CCS/BCAÇ 4512, Farim, 1972/74), com data de 14 de Fevereiro de 2012:


RETALHOS DE UMA GUERRA

GUIDAGE - Adenda 1 Fevereiro de 2012**

Permiti-me chamar a atenção para a necessidade dos camaradas, ex-combatentes, serem verdadeiros nos seus relatos de guerra, como exemplo referi as discrepâncias sentidas nos diversos relatos contando o sucedido com a 1ª coluna de Farim/Guidage, em Maio de 1973, acabei por ser chamado de mentiroso e acariciado com outros mimos…
Respeito a memória dos que tombaram e reconheço o empenho, o sacrifício e a lealdade daqueles que estiveram em todas as frente de combate e por maioria de razão os de Guidage. No entanto não existe como alterar os factos.
Não tenho qualquer dúvida de que a operação Guidage resultou numa vitória para as NT, apesar de muito, muito sangue, suor e lágrimas derramados, porque foi garantido o acesso terrestre com o resto do território e o quartel foi reabastecido de munições e víveres. Espero que ninguém tenha dúvidas nisso.

Agora os factos:

A OP (ordem de operações), a OB (ordem de batalha), ou a acção militar, designem-na como quiserem determinava: o quartel de Farim faria chegar, via terrestre, à guarnição de Guidage munições por esta se encontrar em estado crítico, devido ao desgaste que tinha estado sujeita, provocado pelos frequentes ataques e flagelações do IN.
Para segurança e escolta das munições e viaturas foram escalados grupos de combate pertencentes à Ccaç 14 e à 1ª compª do BCaç 4512/72.
(Anotação minha: esta foi a 1ª coluna.)


Descrição/relatório sobre a coluna a Guidage
(suportada por mensagens militares)

A coluna que seguia na picada Binta/Guidage, no dia 8/5/1973, ao final da tarde/noite, sofreu uma emboscada do IN que impediu a sua progressão. As NT pernoitaram junto às viaturas. Ao raiar do dia, 9/5, as hostilidades recomeçam. As NT tinham caído numa violenta emboscada do IN. Passado algum tempo são pedidos reforços para as NT. Decorre o combate e é pedido mais ajuda pois referiam que alguns elementos IN estavam em cima das viaturas a roubar o seu conteúdo. Mais tarde, ainda na manhã desse dia, por determinação do QG, de Bissau, os aviões, da Força Aérea Portuguesa, bombardeiam e destroem as nossas viaturas e seu conteúdo (munições). As NT envolvidas nesta acção militar regressam a Binta. Dos confrontos as NT sofrem 4 mortos e muitos feridos, entre graves e ligeiros e o IN sofre 12 mortos e um número indeterminado de feridos, mas muitos.
(Anotação minha: esta foi a 1ª coluna.)
Conclusão
… (convido que cada ex-combatente a faça de uma forma desapaixonada e mais neutra possível)
Conclusão -1 (minha)
As munições não só não chegaram a Guidage como tiveram de ser destruídas. A coluna não chegou a Guidage porque o IN não permitiu, logo o objectivo da OP não foi conseguido.

Quem tiver duvidas consulte as mensagens militares trocadas entre a frente de combate, o Comando do BCaç 4512/72, em Farim, o QG em Bissau e as respostas que receberam. Tudo estava lá registado. Elas devem existir em qualquer parte, ou na sua falta, deve existir um documento credível que relate o que aconteceu.
Os camaradas ex-combatentes têm o direito de defender a sua posição, mas permitam-me que lhes diga que é exactamente esse direito que estou a exercer e estribado em documentos militares oficiais.
Demonstrem, com documentos, ou outros, como os acontecimentos referidos não foram estes. Deixemo-nos de generalizações. A OP não obteve êxito. Não se pode confundir o fundamental com o que é acessório.

Ninguém mais do que eu gostaria de poder dizer que os factos foram outros, mas foram estes.

Um abraço
Amílcar
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Notas de CV:

(*) Vd. poste de 31 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9425: O Nosso Livro de Visitas (125): Amílcar, ex-Fur Mil Inf Op da CCS/BCAÇ 4512 (Farim, 1972/74)

(**) Vd. poste de 2 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9433: (Ex)citações (172): Ainda o dossiê Guidaje - Maio de 1973 (Manuel Marinho / Amílcar Carreira)

Vd. último poste da série de 9 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 – P9465: (Ex)citações (174): A mágoa de, no meu País, os bravos, os vivos e os mortos, não terem o reconhecimento e o respeito do seu sacrifício, que merecem (Rui Dias Moreira)

Guiné 63/74 - P9500: Fotos à procura de... uma legenda (17): Bambadinca ("a cova do lagarto"), abril de 1972, ao tempo do BART 3873 (1971/74)




Guiné > Zona leste > Setor L1 > Bambadinca > Abril de 1972 > Vista aérea parcial de Bambadinca. Foto de autor não identificado. Foto nº 3888.jpg. Tipologia: Diapositivo de película cor acetato 35 mm encaixilhado.  Proveniência: Agência Geral do Ultramar. Copyright: Instituto de Investigação Científica Tropical, Arquivo Histórico Ultramarino, Calçada da Boa-Hora, nº 30. 1300-095 Lisboa Portugal .

Fonte: ACTD - Arquivo Científico Tropical - Digital Repository (Com a devida vénia...)

Legendas: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné

1. A fotografia não é de grande qualidade, tem pouco resolução,  mas é mais uma vista aérea da nossa amada Bambadinca, ao tempo do BART 3873 (1971/74). Temos mais fotos aéreas desta localidade (que era a sede do Setor L1), no nosso blogue, mas esta é interessante (*), pelo ângulo: é tirada quando a aeronave, vinda de leste (possivelmente Bafatá) se fazia à pista (a oeste) ou passava por cima  de Bambadinca a caminho de Bissau. 



Já não me lembrava deste pequenos afluente do Rio Geba Estreito (vd. margem esquerda, em frente à bolanha de Finete). É, por outro lado,  perfeitamente visível a "circular", alcatroada,  de Bambadinca, início da estrada para Bafatá (a leste) e Xime (a oeste). Estava em construção, esta circular  no final da nossa comissão (em Março de 1971), bem como a estrada (alcatroada) para o Xime... Tudo a cargo da Tecnil, a cujos trabalhos, máquinas e pessoal fizemos constante segurança (a CCAÇ 12, a minha companhia, Bambadinca, 1969/71). A mesma Tecnil onde, regressado de Angola, virá a trabalhar o nosso camarigo António Rosinha, anos depois, no tempo do Luís Cabral.

Ao tempo do BART 2917 (1970/72), Bambadinca tinha cerca de 1500 habitantes recenseados, um pouco menos que o reordenamento de Nhabijões (um dos maiores da Guiné, com cerca de 3 três centenas e meia de moranças).  Posto administrativo e sede de comando de batalhão, Bambadinca ("a cova do lagarto", em língua mandinga) dispunha de um porto fluvial que constituía na época a principal fonte de escoamento dos produtos das circunscrições de Bafatá e Gabu (mancara, madeira e coconote e artigos de artesanato) e de entrada de quase todos os reabastecimentos para as tropas da Zona Leste. Dispunha de sete lojas comerciais e tinha então tendências para aumentar a sua população bem como o seu comércio e a sua importância.

No Setor L1 viviam 15 mil pessoas, sob controlo das NT. Outras 5 mil viveriam sob controlo do PAIGC, segundo a mesma fonte (comando do BART 2917).A malta que conheceu Bambadinca, que acrescente mais elementos informativos... (LG)




O PINT (Pelotão de Intendência) de Bambadinca, na margem esquerda do Rio Geba, junto ao porto fluvial... Assinalado com um círculo a amarelo... Em primeiro plano, a tabanca de Bambadinca, na encosta do planalto onde estava situado o posto administrativo, a capela, o edifício dos correios, a escola, o aquartelamento...



A famosa rampa de acesso ao aquartelamento de Bambadinca...


O planalto de Bambadinca, tendo ao fundo a grande bolanha... Do lado direito, a pista de aviação.  Ao centro, a capela de Bambadinca e as principais instalações militares...




O reordenamento de Bambadincazinha... A estrada (em construção) de Xime-Bambadinca...





Em primeiro plano, as máquinas da TECNIL em operação, na construção da estrada do Xime-Bambadinca, fazendo a ligação ao troço, já alcatroado, Bambadinca-Bafatá... À esquerda, o  morro onde se situava o aquartelamento e o posto administrativo...  Fotos de 1969/70, do ex-Fur Mil Op Esp Humberto Reis (CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)

Fotos: © Humberto Reis (2006) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné. Todos os direitos reservados. 
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Nota do editor:


Último poste da série > 5 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9445: Fotos à procura de... uma legenda (16): Tabanca de Gadamael, 1973 ? (José Sales, CCAÇ 4743, Gadamael e Tite, 1972/74)

Guiné 63/74 - P9499: Situação Militar no TO da Guiné no ano de 1974: Relatório da 2ª REP/QG/CTIG: Transcrição, adaptação e digitalização de Luís Gonçalves Vaz (Parte IX): pp. 47/54









Reprodução das páginas 47 a 54 (de um total de 74) o relatório da 2ª rep/CC/FAG, publicado em 28 de fevereiro de 1975, e na altura classificado como "Secreto".

Digitalização do documento: Luís Gonçalves Vaz (2012) / Edição das imagens: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné (2012)


1. Continuação da publicação do relatório da 2ª Rep/CTIG, sobre a situação político-militar em 1974, documento esse que foi digitalizado pelo Luís Gonçalves Vaz, membro da nossa Tabanca Grande [, foto à direita], a partir de um exemplar pertencente ao arquivo pessoal de seu pai, cor cav CEM Henrique Gonçalves Vaz (1922-2001), último Chefe do Estado-Maior do CTIG (1973/74).


[Foto à esquerda: O então maj cav Henrique Gonçalves Vaz em missão de reconhecimento pelo rio Chiloango, no desempenho das funções de Chefe da Secção de Planeamento e Controle da 4º Repartição do QG de Luanda, com apoio dos Fuzileiros, Angola, Cabinda, 1964].

O presente relatório, datado de 28 de Fevereiro de 1975, é assinado pelo chefe da 2ª Rep do CC/FAG [, Comando Chefe das Forças Armadas da Guiné, comando unificado criado em 17 de Agosto de 1974], o maj inf Tito José Barroso Capela.


Publica-se hoje o ponto c (Situação interna) da segunda parte do relatório (B. Período de 25Abr74 a 15Out74), pp. 47 a 54: (b) Síntese da atividade da guerrilha: 1. Ações de guerrilha realizadas pelo PAIGC após 25abr74 (pp. 47/52); 2. Ações de controlo às viaturas das NT (p. 52); 3. Ocupação dos aquartelamentos das NT e povoações pelo PAIGC (pp. 52/54).

Relembramos, mais uma vez, a posição de independência dos editores face a documentos político-militares como este. A análise crítica desta documentação (incluindo o rigor da informação factual) compete apenas aos nossos leitores, e muito em particular aos nossos camaradas que conheceram, de perto (,porque estavam lá), o período terminal da guerra.


Índice do relatório [que tem 74 páginas]


A. Período até 25Abr74


1. Situação em 25Abr74

a. Generalidades (pp.1/2)

b. Situação política externa:
(1) PAIGC e organizações internacionais (pp. 2/5)
(2) Países limítrofes (pp. 5/8)
(3) O reconhecimento internacional do “Estado da G/B em 25Abr74 (pp.8/9).

c. Situação interna:

1. Situação militar
(a) Actividade do PAIGC (pp. 10/12)
(b) Síntese da atividade do PAIGC e suas consequências (pp.13/15)
(c) Análise da actividade de guerrilha (pp. 16/18)
(d) Dispositivo geral do PAIGC e objetivos (pp. 18/19)
(e) Potencial de combate do PAIG (pp.19/20)
(f) Possibilidades do PAIGC e evolução provável da situação (p. 21)

2. Situação político-administrativa (pp. 22/24).


B. Período de 25Abr74 a 15Out74

2. Evolução da situação após 25Abr74

a. Generalidades (pp. 25/26)

b. Situação política externa (pp. 26/28)
(1) PAIGC (pp. 29/32)
(2) Organizações internacionais (pp. 32/34)
(3) Países africanos (pp. 34/35)
(4) Outros países (pp. 35/36)

c. Situação interna
(1) Situação militar
(a) Aspetos gerais (pp.37/46)
(b) Síntese da actividade de guerrilha
1. Ações de guerrilha realizadas pelo PAIGC após 25abr74 (pp. 47/52)
2. Ações de controlo às viaturas das NT (p. 52)
3. Ocupação dos aquartelamentos das NT e povoações pelo PAIG (pp. 52/54)

[Continua]

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Nota do editor:

(*) Restantes postes da série:






4 de fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9443: Situação Militar no TO da Guiné no ano de 1974: Relatório da 2ª REP/QG/CTIG: Transcrição, adaptação e digitalização de Luís Gonçalves Vaz (Parte V): pp. 10/21


31 de Janeiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9424: Situação Militar no TO da Guiné no ano de 1974: Relatório da 2ª REP/QG/CTIG: Transcrição, adaptação e digitalização de Luís Gonçalves Vaz (Parte IV): pp. 1/9


Guiné 63/74 - P9498: Notas de leitura (334): O Ultramar Português, o que se dizia sobre a Guiné e se oferecia na Feira Popular em 1945 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem de Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, Comandante do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 23 de Janeiro de 2012:

Queridos amigos,
É para dizer que há horas felizes, andava eu remexer num daqueles caixotes com papéis avulsos e apareceu-me este manjar dos deuses, nunca me passaria pela cabeça que se promovia o império na Feira Popular, por lá andei em catraio, não me recordo destas operações de dinamização cultural. O mapa da Guiné é a todos os títulos surpreendente, e nenhum de nós acredite que a Agência Geral das Colónias não pudesse ir buscar informação hodierna. A verdade é que o mapa tem o seu quê de exótico. E para quem está esquecido o nome da capital era mesmo aquele, S. José de Bissau.

Um abraço do
Mário


O que se escrevia sobre a Guiné e se oferecia na Feira Popular, em 1945

Beja Santos

A Feira Popular apareceu em 1943, em Palhavã, por ali esteve muitos e bons anos. A Agência Geral das Colónias tinha um pavilhão nesta feira onde, em 1945 se distribuía uma brochura de 40 páginas aos visitantes. Tive muita sorte de a encontrar nas minhas deambulações pela Feira da Ladra. Duas coisas me impressionam: o que se diz sobre o império colonial e a revelação de um mapa da Guiné para nós totalmente impensável, cerca de duas décadas depois, quando nós por lá andámos.

Na apresentação da brochura diz-se: “Lisboa é o centro de toda a vida nacional de onde partem as forças orientadoras das atividades de cerca de 11 milhões de portugueses, brancos, mestiços, pretos e amarelos, que trabalham para honrar a nação e deixá-la mais feliz aos que hão de vir a receber a nossa herança”. Na apresentação do território guineense referem-se as etnias (fulas, balantas, manjacos, papéis, mandingas, brames, banhús ou mancanhas, felupes, nalús, baiotes, biafadas e cassangas e logo se adverte: “Mas não pensem que a gente destas raças deixa de ser portuguesa. Depois de se apaziguar em rebeldias, - devido ao valor de Teixeira Pinto -, provocadas mais por divergências de raças e até por intrigas de estranhos, toda a população nativa da Guiné está perfeitamente assimilada e, mercê dos trabalhos progressivos de fomento de e de boa educação realizados nos últimos 15 anos, todos ali são excelentes portugueses e a Guiné é boa terra de Portugal. Quem desembarca na Guiné portuguesa, vê nos edifícios modernos, na vida local e no aspeto prazenteiro de todos que os maus tempos do clima doentio pertencem ao passado, porquanto a metódica atividade dos governadores tem sabido e podido dar combate à doença pelo emprego de processo de higiene pública, que as brigadas de saúde e as missões científicas aconselham e dirigem, já alguém disse que a Guiné Portuguesa é um jardim encravado na costa ocidental francesa”. E os autores da brochura despediam-se assim de quem vinha à Feira Popular: “O nosso Império é o resultado do esforço secular de muitos, conjugado com a cooperação dos nativos, chamados ao nosso convívio. O indígena, bem orientado e bem educado, sabe ser e mostra, sempre querer continuar a ser português. O progresso do Império não pode fazer-se desordenadamente, em obras de acaso, porque o progresso é movimento numa direção definida. Ora, a nossa direção está de há muito traçada, desde a primeira hora: levar a toda a parte, através de sacrifícios, de trabalhos duros, de lutas constantes com os elementos adversos, a civilização cristã. Aqueles que queiram ir para o Ultramar, não com o sonho mentiroso de riquezas fáceis e fantásticas, mas para trabalhar honradamente, metodicamente, fazer colonização natural e normal, precisam preparar-se (convém repetir) para esse combate pacífico e pacificador, onde há também heróis e onde não deixa de haver vencidos: os que não souberem vencer-se a si próprios, os seus vícios, a rotina, a falta de confiança nas suas possibilidades e a falta de fé na juventude de Portugal”.


O mapa da Guiné é muito mais do que uma curiosidade. O que aqui se mostra é pouco mais do que a Guiné dos presídios e praças, do século XIX. No Leste, nem uma só uma menção a populações fronteiriças, não se fala no Boé nem no Gabu; Geba tem mais importância que Bafatá; Sambel Nhantá neste tempo já não existia; e toda a região do Corubal é pura omissão, como o Xime; a região Centro-Norte não refere Mansoa, nem Bula nem Bissorã nem Mansabá, eram vilas com algum desenvolvimento neste tempo; não há uma referência à cidade de Bolama no arquipélago dos Bijagós; no Sul, fala-se de Bolola certamente por influência do passado, não existem nem Catió, nem Fulacunda, Bedanda, Gadamael. É facto que é no tempo de Sarmento Rodrigues, portanto logo a seguir a esta brochura, que se dão passos seguros para o levantamento topográfico moderno, mas o que aqui vem é um descaro cultural, a Agência Geral das Colónias bem podia ter solicitado um mapa do tempo, este seguramente que não era.

Documento bom para refletir sobre a farronca e linguagem altaneira de uma certa proposta imperial em contraste com o pindérico e o anacronismo cultural do produto apresentado.
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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 13 de Fevereiro de 2012 > Guiné 63/74 - P9477: Notas de leitura (333): Maria Helena Vilhena Rodrigues, mulher de Amílcar Cabral (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P9497: Parabéns a você (383): Fernando Chapouto, ex-Fur Mil da CCAÇ 1426 (Guiné, 1965/67)

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Nota de CV:

Vd. último poste da série de 16 de Fevereiro de 2012 Guiné 63/74 - P9491: Parabéns a você (382): António Eduardo Carvalho, ex-Cap Mil das CCAÇ 3 e 19 (Guiné, 1974)

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Guiné 63/74 - P9496: Lições de artilharia para os infantes (3): Fazer a rotação, de 180º, do obus 14, para apoiar Jemberém (C. Martins, CMDT do Pel Art, Gadamael, 1973/74)



Guiné > Região de Tombali > Bedanda > CCAÇ 6 > 1970 > Resposta do Obus 14 a um ataque,. noturno,  de foguetes Katiusha, de 122 mm.

Foto: © Hugo Moura Ferreira (2006) / Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
. Todos os direitos reservados. 


1. Comentário do nosso camarada C. Martins, último artilheiro de Gadamael (1973/74), ao poste P9329:

Caro camarada Manuel Vaz:

Excelente trabalho.

Informo que o que fizeram serviu e muito para todos nós que estivemos aí em alturas posteriores.

Entre agosto de 73 até à data da entrega ao PAIGC em 74 a dotação do aquartelamento era constituído por:



3 companhias, 
1 pelotão de canhões s/r, 
1 pelotão de morteiros 81, 
2 pelotões de milícias, 
e 1 pelotão de artilharia de obus 14 com 3 obuses.


Outros tempos.


O Pel Art tinha os 3 obuses, no enfiamento entre o abrigo de transmissões no fundo da pista e o posto de vigia junto ao cais, todos com espaldão e abrigo, e virados obviamente para a fronteira.


Várias vezes foi necessário fazer uma rotação de 180º para apoiar Jemberém, o que causou alguns estragos, de pouca monta, em infra-estruturas do aquartelamento devido à onda de choque provocada pelos disparos.

Um grande alfa bravo

Um artilheiro de Gadamael (*)

C.Martins

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Nota do editor:


(*) Último poste da série > 8 de fevereiro de 2012 _ Guiné 63/74 - P9460: Lições de artilharia para os infantes (2): Cada granada de obus 14 pesava 45 kg e custava 2500$00 (C. Martins, ex-comandante do Pel Art, Gadamael, 1973/74)