Lourinhã > Praia da Areia Branca > 2 de dezembro de 2017 > Almoço de um grupo de amigos de Timor-Leste, no restaurante Foz: em primeiro plano, Rui Chamusco e Gaspar Sobral, cofundadores e líderes da ASTIL
Foto (e legenda): © Luís Graça (2017). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]
Viagem a Timor: maio/julho de 2016 - Parte I: as primeiras emoções e impressões
por Rui Chamusco
Descrição pormenorizada – acontecimentos e peripécias dos amigos Gaspar Sobral e Rui Chamusco
Depois de muitos trabalhos de preparação (vacinas, consultas, contactos, marcação de dias da viagem, obtenção de bilhetes e outras coisas mais) eis-nos a caminho: a primeira etapa da consagração do projeto de solidariedade “ uma escola em Timor “.
As expectativas são muitas, as dificuldades muitas mais, mas a força e o querer que isto aconteça superam qualquer intento de desânimo ou de desistência.
Dia 5, 6 e 7 (quinta, sexta e sábado), maio de 2016
Fundadores: Rui Chamusco, Glória Sobral e Gaspar Sobral |
Em casa dos amigos Tó Barroco e Mila em Odivelas, pelas 6 da manhã começam os primeiros rumores com os serviços da casa de banho que um a um utiliza, antes de um ligeiro pequeno almoço e da partida para o aeroporto da Portela (Lisboa).
Às 8.30h começamos o chek-in e o controle de bagagens. Às 11.00h entrada para o avião da British Airways rumo a Londres. Aí permanecemos até às 20.00h, seguindo depois até.ao aeroporto de Singapura durante um percurso de mais de 13 horas de avião.
Chegada ansiada ao mundo indonésio e que ali nos albergou até às 9.00h do dia seguinte, com partida para Dili (Timor) onde chegamos pelas 14 horas, contando com as horas do fuso horário respetivo.
Em Dili descemos da aeronave sob um calor sufocante, tal o grau de humidade da temperatura ambiente. Mesmo assim nada que nos impedisse do grande regozijo de pisar o solo timorense.
Grande expectativa, depois de cumprirmos as formalidades exigidas, de conhecermos a família do amigo Gaspar que, antecipadamente avisada, estava a nossa espera. Beijos e abraços, com momentos fortes de emoção. É que o Gaspar há 16 anos que não visitava à sua terra natal.
Surpresa ou coincidência
Enquanto esperávamos pela realização do check-in Singapura / Dili, surge precisamente à minha frente uma figura conhecida e com a qual em tive contatos há quase meio ano na preparação desta visita a Timor. Nada mais nem nada menos que o frei Padre Fernando Cabecinhas, provincial dos Capuchinhos de Portugal, que vem em visita às comunidades missionárias de Tíbar e Laleia.
Foi uma alegria imensa de parte a parte pois, para além de recordarmos tempos passados, eu como diretor do seminário menor e ele como aluno, pusemos em dia a conversa sobre a vida de capuchinhos que outrora foram meus companheiros.
Ficou logo ali delineada uma visita a Tibar, a fim de encontrar e abraçar o Pe. António Pojeira. Por razões de circunstância a visita ficou adiada mas que, logo que possível será concretizada.
Surpresa nº2
Tinha que ser! Por mais voltas que desse a passadeira das bagagens as nossas malas não apareceram. Revisão dos espaços, contatos telefónicos não serviram de nada. À nossa preocupação juntaram-se muitos outros que abnegadamente tentaram resolver a situação, mas o único que nos garantiram é que no próximo sábado (oito dias depois) as malas seriam entregues. A ver vamos!...
Amanhã, domingo, dia 8, iremos à Plaza de Timor ( supermercado ) a fim de comprarmos algumas roupas, pois o calor húmido que se faz sentir obriga-nos a mudar de trajes com frequência. Entretanto, como diz um ditado timorense, “ nada se perde; apenas se esquece” (Saçan lá lácon; só halu han deit). Que assim seja…
A visita ao cemitério de Santa Cruz
Com a família Soveral como guia, fomos de imediato visitar esta lugar de memórias, e particularmente a campa do pai desta família José Alves Sobral, vítima de doença em 1975. Muita emoção, lágrimas e choro sobretudo por parte do Gaspar.
A mim impressionou-me imenso o facto de se verem ainda em várias campas (também do sr. Sobral) as marcas dos tiros que no ataque de 12 de Novembro de 1992 o exército indonésio disparou e matou mais de 200 timorenses.
De seguida fomos de karreta até à zona habitacional da família, em Ailok laran – aldeia da Ribeira Maloa, também conhecido por suco de Bairro Pitê (nome do administrador que lhe deu o nome).
Muita gente à espera do Gaspar e do malae (português), que sou eu. Irmã, irmãos, cunhadas, filhos, sobrinhos, vizinhos, amigos… um corrupio de gente e sobretudo de crianças que, em face dos visitantes, tudo querem ver e saber.
Um ambiente stressante mas que sabe bem. Todos se desfazem em simpatia, mesmo que a linguagem falte. Vendo e ouvindo os seus clamores e as suas histórias até às tantas da noite, mesmo que caindo de sono. O tempo é pouco para tanta vida pujante. Só crianças à nossa volta são treze. Ou seja, crianças e adultos da família Sobral são mais de 20 pessoas a fazer serão.
A vida e o bem estar desta gente
Há 14 anos que Timor é independente, com órgãos próprios de governação. Muita coisa já foi feita mas muito mais há que fazer. Tenho o privilégio de estar a viver com as pessoas do povo e não em hotel. Isto permite-me embarrar-me, comer e beber, cantar, tocar, estar com eles à conversa, escutar as ânsias e anseios das pessoas quiçá mais desprotegidas. Nada que possa alterar as características deste povo que nasce, vive e morre com o sorriso sincero nos rostos.
Hoje observei as três crianças do Anô que iam ser batizadas. A mais pequena, que nem dois anos tem, desfaz-se em sorriso impossível de descrever. Como não ficar ligado a esta gente? Não há nada que pague esta oferta.
Faltam muitas condições de conforto e de bem estar a que um europeu está habituado. Mas sobram valores e relações humanas que são riqueza e património deste povo.
Destaco em particular o valor da família. Viver em família é um processo natural. Na família Sobral todos são de todos, não há portas nem barreiras, os maiores cuidam dos mais pequenos, o respeito dos mais velhos está garantido com o beijo e reverência (beija e encosta a cabeça na mão do adulto), gesto repetido todos os dias ao fazer o cumprimento.
Tenho a sorte de já ter entrado no coração desta gente. Sou tratado como o Ti Rui ou, melhor ainda, como irmão Rui. Nada melhor que me possam oferecer do que esta fraternidade voluntária.
A empatia com a natureza
Aqui nada se perde. O aproveitamento da natureza é feito com respeito pela mesma, que tudo nos dá. É mãe… Ervas, plantas, aves, animais pessoas tudo aqui convive numa perfeita harmonia e promiscuidade. Sem agressões, com mútuo respeito. Gostaria que assim fosse em todo o mundo. Não se estraga, não se abusa. Não se vive em opulência, serve-se o necessário, chega para toda a gente.
Que bom saborear os pratos típicos tradicionais! Sedok (arroz com feijão fore), mostarda em planta, papaia, folha de abóbora, betal, areca, calai, etc… etc… que para além de alimentação se utilizam também com fins terapêuticos. A envolver este cenário há um jardim natural bem conhecido dos residentes pelos seus nomes e utilidades.
Um verdadeiro hino ao Criador.
A vontade enorme de aprender português
Quase todos os dias me deparo com crianças que, servindo-se de um manual escolar, tentam fazer os trabalhos de casa seja onde for, até em cima da campa da avó Felismina Sobral. Posso confirmar que estas crianças têm avidez de saber. A ler, a cantar, sozinhas ou em grupo mas quase sempre em português. É por isso que não posso ficar indiferente.
Com a guitarra do irmão Eustáquio tento ensinar canções através do melhor processo de aprendizagem: lendo em voz alta, mandando repetir, tocando a melodia, fazendo os gestos, acompanhando… O resultado está à vista. Estão gostando tanto que já dizem: “ quando irmão Rui for embora a gente vai chorar”. Derretem-me literalmente o coração…
Hoje de manhã, dia 8, fui encontrar a Adobe, uma das filhas do Eustáquio, quase deitada no chão de mosaico sobre um livro e a soletrar palavras em português. Não aguentei mais. Chamei o pai e a mãe e propus-lhes: ” Eu gostava de ser padrinho desta menina. Apoiar os seus estudos e seguir o seu desenvolvimento. Aceitam?”
De imediato foi dado o consentimento. Um beijo e um abraço selaram este acordo. De agora em diante procuraremos o que for melhor para a Adobe.
Dia 10 (terça-feira): encontro informal com ex-combatentes da resistência
Quase podemos dizer que, desta gente que habita o bairro, não há ninguém que direta ou indiretamente não tenha estado envolvida com a invasão indonésia. A casa que habitamos da família Sobral foi totalmente destruída e arrasada. Hoje está reconstruída.
Igual sorte tiveram as casas em redor. De modo que é muito fácil encontrar testemunhos e antigos combatentes normalmente afetos à Fretilin. Todos têm a sua história mas destaco em particular alguns ex-prisioneiros que com coragem e inteligência aguentaram e escaparam (sobreviveram) às torturas infligidas.
Abeca Sobral, homem de estatura franzina que o vento pode levar, relata que na prisão era torturado com socos no estômago que, segundo ele, só por milagre não o mataram.
Diz que à frente das grades da prisão passou alguém de cujas botas se desprendeu um pequeno papel (recorte de revista ou jornal que ainda hoje guarda consigo e que me foi mostrado) que habilmente conseguiu obter e onde estava (está) escrita uma oração a Santo Exposito. Diz Aveca que esta oração lhe deu a força necessária para resistir a tudo: “davam-me socos no estômago e nada sentia; parecia que estavam batendo em borracha”.
Aveca está vivo, com a sua família no bairro Ailok laran, como a maioria dos irmãos e com um cargo de funcionário público na administração do Estado: chefe de serviços no registo predial de Dili.
Eustáquio (alcunha de João Moniz Sobral), outro dos irmão que nos alberga, é taxista e conta que ele, a mãe, os irmãos tiveram que fugir e se refugiar na montanha durante três anos. Caminhavam de noite e de dia escondiam-se.
Numa certa noite uma tempestade de chuva se anunciava. A mãe e os filhos procuravam refúgio para se albergarem do mau tempo. Foi então que a mãe lhes diz: “vamos para aquela casa que ficaremos a salvo”. Aí descansaram até de manhã e, surpresa das surpresas, quando acordaram não viram casa nenhuma. A mãe, já falecida, e os irmãos ainda presentes testemunham que isso foi verdade. Milagre talvez, mesmo que os psicólogos e psicanalistas digam que foi alucinação coletiva. Ouvir para crer, é o que nos resta…
No entanto quero salientar a convicção de quem passou por isso e relata o acontecimento. O final desta fuga não foi feliz. Acabaram por ser apanhados pelas forças indonésias que os reportaram para Dili. Já na sua terra (arredores de Dili) constataram com tristeza que a casa de família tinha sido completamente arrasada e queimada. O Eustáquio prometeu que iria recuperá-la, o que hoje em dia é jáum facto.
Felisberto é um dos vizinhos do casal Sobral, foi preso pelos indonésios que o levaram para uma prisão na Indonésia. Já na cela bem apertada teve de socorrer-se da sua imaginação para se poder livrar dos calabouços. Quem não quiser ler feche os olhos porque o que vem a seguir nem todos os estômagos suportam. O Felisberto teve uma ideia de merda. Foi ao balde para onde fazia as necessidades, e com as mãos cobriu a cabeça de merda. Uma, duas, três vezes…até que os responsáveis da prisão o consideraram maluco e o libertaram. Dizem os vizinhos que ele ficou mesmo afetado, não regula bem. Ainda agora o avistei no seu território.
José Sobral, já falecido, também foi preso pelos indonésios e, segundo contam os irmãos, foi sujeito a uma série de perguntas em linguagem Bahasa da qual ele nada entendia. Pelo sim pelo não decidiu responder sempre sim com aceno de cabeça. Cada resposta, cada sessão de pancadaria.
Enfim estes e outros testemunhos são para entender o que esta gente sofreu por quererem continuar a ser portugueses. O amor e a paixão por tudo o que se relaciona com Portugal é impressionante.
Dia 10 (terça feira) – Viagem em microleta até Dili rumo à escola de Taibessi
Como já relatei anteriormente decidi apadrinhar uma menina do casal Eustáquio/Aurora e seguir o seu percurso. Adobe está no 4º ano de escolaridade na Escola Farol.
Devido ao seu interesse pela língua portuguesa procuramos uma escola de referência onde Adobe possa aprender corretamente o português. Indicaram-nos a escola de Taibessi para onde nos dirigimos em microleta.
Bem atendidos pelo porteiro timorense e pelas duas professoras que nas suas salas lecionavam , expusemos a situação que não foi logo resolvida porque a professora coordenadora –Teresa Nora – já não estava. Por contato telefónico foi marcado encontro no dia seguinte às 8.00 horas. Esta viagem teve a particularidade de entrar na microleta com uma cabeçada estrondosa que me ativou as ideias, e uma grande chuvada ao chegarmos a casa em que os chinelos de dedo no pé são a melhor solução para não molhar os sapatos.
Não posso deixar de registar o grande jogo de futebol a que assisti no largo da casa Sobral: seis miúdos do bairro, sem camisa, descalços e com os calções a cair jogavam desalmadamente sob chuva intensa com dribles impressionantes, fintas e defesas corajosas, em que o único interesse é o jogo pelo jogo, sem árbitros, sem limites de campo, sem faltas. Um verdadeiro jogo de amigos e de convívio.
Dia 11 (quarta feira) – De novo rumo a Taibessi
Eram 7 horas da manhã e já estávamos prontos para o arranque. Foi então que avistei o Eustáquio com a sua mota e dois capacetes. Só então compreendi que um era destinado para mim.
Nunca pensei correr a cidade de Dili em mota. Eustáquio a conduzir, eu atrás do condutor e a Adobe à frente lá fomos de novo a caminho de Taibessi. Muito bem recebidos pela professora Teresa Nora. que compreensivamente resolveu o problema. A Adobe vai ficar na Turma B do 4º ano e hoje mesmo fomos tratar do boletim de transferência á escola de Farol. Amanhã iremos de novo entregar os documentos solicitados para conclusão do processo.
Dia 12 (quinta feira)
Dito e feito! A Zinigia (Adobe) já está na Turma do 4º ano B. Foi logo integrada na aula de ginástica. Mais uma vez realço pela positiva a forma amável e interessada da Professora Teresa Nora, bem como do professor da Turma. Orgulho-me da classe profissional a que pertenço, embora na reforma.
Noite atribulada deste dia 12!
A partir das 3 horas da manhã tive de sair da cama e ir para o exterior porque o amigo Gaspar (raios o partam!... ) resolveu pôr-se à conversa vom o mano Eustáquio. Mais parecia um monólogo que um diálogo pois só ele é que pregava. Irritado com as sua baixas frequências, tomei a decisão de me livrar desse ruído perturbador e fui sentar-me no canto mais sossegado do recinto.
Dormi um pouco mas os mosquitos (melgas) começaram a zunir, pelo que me levantei de mansinho na intenção de regressar à minha tarimba. Azar dos azares, todas as portas estavam fechadas. Daqui até o sol raiar foi um pandemónio de mudança de cadeiras, de posições, de pensamentos de revolta e eu sei lá que coisas mais. Sei que não foi por mal, pois pensavam que eu já estaria dentro, mas lá que custou a passar a noite custou.
Hoje mesmo vou tentar recuperar a energia pois este santo corpinho ficou todo amassado das andanças da noite.
Viagem em Táxi
Mais uma experiência de viagem, em táxi, do mano Eustáquio à escola de Taibessi.
Pensando que seria melhor do que o transporte de ontem, tenho de concluir que, apesar das confusões de trânsito, a viagem de mota foi mais segura e agradável. Estranhei que o carro andasse, mesmo a cair aos bocados, mas lá fomos ao nosso destino e chegamos sãos e salvos a casa..
Tantas dificuldades materiais que esta gente suporta, mas nada que os impeça de chegar onde querem chegar. Cada um tenta desenrascar-se como pode, mesmo que para isso seja necessário dar um murro no carro para que uma porta se abra.
Aqui é assim: oficinas e mecânicos pouco se vêem. Cada um tenta ser mecânico à sua conta. Por isso não é de admirar que os carros e as motas estejam tão mal tratados. O que importa é que andem, porque de comodidades ninguém esteja à espera. Se o motor não arranca empurra-se, pois mão de obra é coisa que aqui não falta. E viva o desenrascanço!...
Mais uma vítima (política) inocente
Hoje o Gaspar estava atónito a pensar no que o irmão (Eustáquio) lhe contara. Um amigo foi interrogado (talvez por alguém das secretas indonésias, pelos vistos realidade existente em Timor), se conhecia o Gaspar Sobral. Como negou que o conhecia, levou tanta pancada que o deixaram cego.
O Gaspar, profundamente chocado e desconhecedor do acontecimento, manifestou de imediato a vontade de conhecer esse senhor e de lhe agradecer ter-lhe salvo a pele. Parece que este episódio e esta procura pelo Gaspar remonta aos tempos da Expo Sevilha, onde Gaspar e mulher (Glória Sobral, que é ntaural do Sabugal) participaram ativamente na manifestação Pró Timor contra a Indonésia.
Postal de Timor
Gostaria de uma pincelada poder descrever o que por aqui se passa mas não é nada fácil prescindir de pormenores que constantemente nos atraem pela positiva ou pela negativa.
Dalguns já dei conta mas muitos mais afloram sempre que ouvimos alguém. Por exemplo, o fosso existente entre a classe política e o povo. Sabiam que um assessorde ministro ganha 5.000 dólares enquanto que um contínuo do ministério no escalão máximo ganha 200$?
As estruturas do Estado e da Igreja são as mais vistosas da cidade; a classe média vive em bairros na periferia onde o desenvolvimento e as condições sociais deixam muito a desejar. Existe lixo espalhado por todo o lado e a sensibilidade para a preservação e limpeza do ambiente é coisa de futuro. Muito caminho há a fazer…
O trânsito é intenso e bastante desordenado. Mesmo assim condutores de toda a classe de veículos manifestam grande destreza e habilidade pois o número de acidentes é pouco relevante. Os produtos locais chegam a todo o lado, ainda que não haja carros e câmaras de frio que acondicionem os materiais. Todos os dias, a toda a hora, são músicas e reclames a anunciarem o que se vende: carnes, peixes, hortaliças, sementes, água, roupas, bugigangas, cada vendedor com o seu estilo e meio próprio. Mas o que mais me chamou a atenção, pelos sons que produziam, eram dois leitões pendurados em vara levada ao ombro, que se desfaziam em gemidos apelando a socorro. Dói de ver, mas é assim a cultura deste povo.
Hoje, dia 12, véspera da Senhora de Fátima, anunciam-se procissões noturnas por todo o lado. O sentimento religioso deste povo é grande e creio que sincero. Crianças e adultos todos trauteiam melodias portuguesas a Nossa senhora bem conhecidas. Nas casas, nos carros, nas mikroletas avistam-se imagens de santos e santas que nos fazem crer estar numa grande igreja. Não têm medo nem vergonha de mostrarem a sua fé e aquilo em que acreditam. Fé ou religião… Mas quem somos nós para criticar ou julgar a convicção dos outros? Respeito meus senhores!...
Dia 13, sexta feira – O reencontro com as malas e a visita a Tíbar
Como diz o ditado timorense “as coisas não se perdem; apenas se esquecem”. Finalmente chegaram as nossas malas. Por onde andaram ninguém sabe mas, logo que se avistaram, os donos até sorriram. Foi uma alegria enorme poder tocar-lhes, abri-las e confirmar que nada faltava, mesmo tendo sido abertas. A simpatia dos funcionários do aeroporto foi imensa, (claro que houve gorgeta!), tudo facilitando para que a nossa alegria fosse completa.
Do aeroporto dirigimo-nos para Tíbar, visitar a comunidade de Capuchinhos que aí está radicada. Outra enorme alegria ao poder abraçar o meu amigo Pe. António Pojeira,colegas de seminário e de fraternidades durante bastantes anos. Foi uma conversa para recordar vivências e episódios das nossas vidas em comum, reforçada pelas intervenções do caro amigo Pe. Fernando, provincial do capuchinhos em Portugal e pelas intervenções adequadas do amigo Gaspar, seu irmão chaufer do táxi e sobrinhos Anô e Rosana que tanto nos ajudaram na recuperação das maletas e outras démarches.
A chegada ao pátio foi como já se esperava: uma curiosidade enorme em ver e ouvir o acordeão e depressa se transformou no “pátio das cantigas”. Toda a criançada acudiu deimediato e as canções já aprendidas desfilaram pelas gargantas de todos os presentes:saia velhinha, as pombinhas da Cat’rina, o mar é lindo e mais modas de que esta gentemuito gosta. Deu bem para suar… Logo a seguir tanta chuva, tanta chuva de que não hámemória no meu cérebro.
(Revisão / fixação de texto, negritos: LG)
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Conta solidária da Associação dos Amigos Solidários com Timor Leste (ASTIL)IBAN: PT50 0035 0702 000297617308 4
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Nota do editor: