1. Mensagem de António G. Matos (*), ex-Alf Mil MA da CCAÇ 2790, Bula, 1970/72, com data de 21 de Maio de 2009:
Meus caros camaradas ex-combatentes da guerra do ultramar,
Temo sinceramente que muitos de nós tenhamos feito deste blog um verdadeiro muro de lamentações do qual não já não conseguimos libertar o espírito e tenhamos transformado um hobby que se pretendia salutar, numa doentia carpideira que em nada contribuirá para amenizar esta etapa final das nossas vidas.
É certo que temos histórias que nos fazem sorrir, umas, e rir a bandeiras despregadas, outras;
É certo que temos bons momentos vividos e relatados que nos enchem a alma;
Mas as angústias, os medos, os desgostos, as saudades, as lutas, a morte enfim, ressaltam como o leit motive das nossas mensagens de África.
Apercebi-me que temos que ter consciência disso sob pena de nos estarmos a infernizar e a infernizar a vida de outros...
Acho que temos de nos consciencializar que aquela época que todos nós vivemos é algo que, tendo deixado marcas incontornáveis nos nossos corpos e nas nossas almas, não podem ser as que comandam o resto das nossas vidas, sob pena de nos declararmos vencidos perante a enormidade que na altura vencemos!
Força malta! Arrebitemos para a vida e deixemos que uma reflexão do Picasso nos sirva de alibi para sabermos dar a volta POR CIMA!
Um abração,
António Matos
Receita de jovialidade de Pablo Picasso… (?)
Deita fora todos os números não essenciais à tua sobrevivência. Isso inclui idade, peso e altura. Deixa o médico preocupar-se com eles. É para isso que ele é pago. Frequenta, de preferência, amigos alegres. Os de "baixo astral" põem-te em baixo. Continua aprendendo...
Aprende mais sobre artesanato, jardinagem, qualquer coisa. Não deixes o teu cérebro desocupado. Uma mente sem uso é a oficina do diabo. E o nome do diabo é Alzheimer.
Curte coisas simples. Ri sempre, muito e alto. Ri até perder o fôlego. Lágrimas acontecem. Aguenta, sofre e segue em frente. A única pessoa que te acompanha a vida toda és tu mesmo.
Mantém-te vivo, enquanto vives! Rodeia-te daquilo de que gostas: família, animais, lembranças, música, plantas, um hobby, o que for. O teu lar é o teu refúgio.
Aproveita a tua saúde; Se for boa, preserva-a. Se está instável, melhora-a. Se está abaixo desse nível, pede ajuda. Não faças viagens de remorso. Viaja para o Shopping, para a cidade vizinha, para um país estrangeiro, mas não faças viagens ao passado.
Diz a quem amas, que realmente os amas, em todas as oportunidades. E lembra-te sempre de que: A vida não é medida pelo número de vezes que respiraste, mas pelos momentos em que perdeste o fôlego: de tanto rir... de surpresa... de êxtase... de felicidade...
"Há pessoas que transformam o Sol numa simples mancha amarela, mas há também as que fazem de uma simples mancha amarela o próprio Sol".
2. Comentário de CV:
Oportuna esta mensagem, com mensagem, do nosso camarada António Matos.
Criamos, por vezes, questiúnculas que exaltam os ânimos de maneira menos própria entre camaradas, com palavras ou frases acutilantes, desnecessárias, às quais o melhor destino é a indiferença.
Recentemente dois camaradas (?) dirigiram-se aos editores, de modo tão pouco cordial, por razões tão mesquinhas, que nos deixou sem palavras. Replicar para quê?
Por outro lado, não façamos da guerra que vivemos há tantos anos, um drama permanente da nossa vida. Ao longo da existência, todo e qualquer ser humano sofre perdas irreparáveis, mas o subconsciente tem defesas próprias para as colmatar. A família e os amigos precisam de nós sãos, física e mentalmente. Façamos um esforço para nos darmos a eles.
Quanto à receita atribuída a Picasso, enviada pelo camarada António, é bom que a sigamos à letra. Gozemos a vida em pleno, cada um a seu modo, deixemos de implicar com os que nos são mais chegados, família e amigos, porque estes são o nosso maior tesouro. Cuidemos da saúde e tratemos da azia que não nos deixa ver com clarividência os problemas do dia-a-dia.
Digamos frontalmente ao nosso interlocutor que discordamos dele, mas respeitêmo-lo. Se ele estiver errado, chamêmo-lo à atenção, cordialmente. É tão bonita a cortesia.
Termino com:
"Há pessoas que transformam o Sol numa simples mancha amarela, mas há também as que fazem de uma simples mancha amarela o próprio Sol".
Um grande e sentido abraço para todos os camaradas e amigos tertulianos, assim como para os milhares de leitores do nosso Blogue, em nome dos editores que tudo fazem para agradar.
Carlos Vinhal
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4427: "Restolhada", uma Operação da CCAÇ 2790 no Choquemone (António G. Matos)
Vd. último poste da série de 21 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4392: Blogoterapia (103): Coisas lindas de Guileje / que guardo num cantinho do meu coração (J. Casimiro Carvalho)
Em tempo
Nota às 20 horas e 45 minutos.
Como os leitores devem ter reparado, durante a edição deste poste, aconteceu uma publicação intempestiva. A mesma saiu sem número, sem autor, com o título incompleto, com o texto empastado, etc.
Do facto peço desculpa. Acrescentei todos os elementos identificativos do autor e um pequeno comentário meu, que estava já feito noutro rascunho criado em duplicado pelo sistema.
Blogue coletivo, criado por Luís Graça. Objetivo: ajudar os antigos combatentes a reconstituir o "puzzle" da memória da guerra colonial/guerra do ultramar (e da Guiné, em particular). Iniciado em 2004, é a maior rede social na Net, em português, centrada na experiência pessoal de uma guerra. Como camaradas que são, tratam-se por tu, e gostam de dizer: "O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande". Coeditores: C. Vinhal, E. Magalhães Ribeiro, V. Briote, J. Araújo.
quinta-feira, 28 de maio de 2009
Guiné 63/74 - P4430: Estórias Jorge Picado (6): A minha passagem pelo CAOP 1 - Teixeira Pinto (II): Reunião com o Secretário Geral - Agricultura
1. Mensagem de Jorge Picado (*), ex-Cap Mil da CCAÇ 2589/BCAÇ 2885, Mansoa, CART 2732, Mansabá e CAOP 1, Teixeira Pinto, 1970/72, Engenheiro Agrónomo, com data de 22 de Maio de 2009:
Caros amigos, Luís, Carlos, Briote e MRibeiro
Na continuação da transcrição de papeis dos tempos de Teixeira Pinto, envio mais um para apreciarem e darem o encaminhamento que julgarem melhor (*).
Abraços para todos vós para todo o pessoal da Tabanca.
Jorge Picado
PS: Vai seguir dentro em pouco uma nota sobre a "Ponte" e as "estradas", prometo.
2. Na continuação da minha comunicação anterior segue agora a transcrição duma cópia, duma reunião, que fiz à mão intitulado “Agricultura”, reunião essa realizada no final de 1970 ou nos primeiros dias de 71, provavelmente em TEIXEIRA PINTO, portanto, quando ainda me encontrava algures por terras de MANSOA.
Agricultura
1. Cultura do Arroz.
Bolanha de Churobrique: Aproveitaram-se só 72kg. (Só a sementeira). Num Ano Bom poderia dar 6.000kg.
Arroz filipino – Foi dado à POP em todos os Reordenamentos
Vai começar a recolha da sementeira em Bajope – Capol a partir da 2.ª quinzena de Janeiro de 71. (reaver as sementes que o SAF deu para a sementeira). Depois seguir-se-ão os outros Reordenamentos.
2. Palmeiras.
Em Dezembro havia 170 sementes germinadas para irem para o viveiro. Depois sai para o lugar definitivo. Pretende-se com estas sementes aumentar os Palmares dos Reordenamentos
3. Árvores de Fruto e Outras Árvores.
Daqui a 2 meses já há novas Plantas para distribuir à população.
4. Granja de Teixeira Pinto.
A ideia do Regente Agrícola é que a Granja de Teixeira Pinto ficasse só com o Palmar. Abrir uma nova Granja, talvez em Calequisse ou Cajegute (depois de Bugulha->Fancate). Primeiro era preciso abrir uma estrada (eram precisos 1 D7 + 3 motosserras). O problema foi levantado em Fev70.
5. Granja de Calequisse.
Desenvolver ou a Granja de Fancate ou de Calequisse. Para desenvolver a de Calequisse, é o mesmo problema -> maquinaria (D7 + 3 motosserras).
6. Granja de Caió.
Só reservada a árvores de fruto. Desde que tivessem 1 tractor já poderiam começar os trabalhos.
7. Ensino à população de novas técnicas.
8. A verba para o ensino na Granja de Teixeira Pinto foi posta ao SAF. Já foi accionada?
9. Recuperação de Bolanhas.
Dar pelo menos 1 Ha.
A divisão ser feita de acordo com o escoamento das águas (-> obriga a que o Sr. Dias faça um estudo).
10. Reparação das cercas dos Reordenamentos (dizem que a população não colabora).
11. Palmar de Balombi. São precisas 3 motosserras + tractor.
Perguntar ao SAF:
verba para alimentação na Granja de Teixeira Pinto
3 motosserras
1 tractor
1 debulhadora-enfardadeira
1 autotanque
Pedir o maior número possível de novas Britadeiras
Pedir o maior número possível de Prensas para o óleo (a prensa pode ser acopulada à Britadeira)
12. Britadeira.
Para quebrar o quenoque. Falar com o Soldado José Carlos (do CAOP).
A população de BARÁ +
13. Palmar de PELUNDO.
O Palmar foi feito pelo Estado, pelos SAF. A exploração feita através dos SAF e em proveito da população do Pelundo.
Ressalta do rascunho, pois era escrito a lápis e esferográfica, que se tratou duma reunião para balanço da actividade desenvolvida no sector da actividade agrícola e no esboço duma programação para novas etapas a desenvolver, na zona de acção do BCaç 2905, pois todas aquelas povoações mencionadas pertenciam à área do Posto Administrativo cuja sede era TEIXEIRA PINTO e aos Regulados de: CHURO; COSTA DE BAIXO; CALEQUISSE; CAJEGUTE; BUGULHA; CAIÓ e PELUNDO.
Pelos vistos a cultura do arroz em CHUROBRIQUE (ponto 1) falhou. Teria sido bom procurar as causas, mas nada se diz.
Tinham sido criadas várias unidades para adaptação e demonstração de novas variedades de árvores de fruto e outras designadas por “GRANJA” e tentava-se criar ainda outras, para as quais seriam necessárias mais máquinas, incluindo Prensas para extracção do óleo de palma, e o que designavam por Britadeiras, para quebrar o quenoque. Note-se que para esta finalidade referem um soldado do CAOP, José Carlos. Seria o encarregado de trabalhar com as Britadeiras?
No ponto 11 refere-se o Palmar de BALOMBI, mas a grafia deve estar incorrecta, uma vez que julgo não existisse este nome, mas sim BALOMBE, a Sul da estrada TEIXEIRA PINTO – CALEQUISSE, mais próximo desta última e no Regulado de CATI.
Quando se fala num Sr. Dias, para fazer um estudo tendo em vista a divisão das bolanhas recuperadas, de acordo com o escoamento das águas, só se podem referir ao Regente Agrícola que, salvo erro, era o responsável pelo sector das bolanhas dos SAF (Serviços Agrícolas e Florestais da Guiné), que conheci depois no decorrer da minha actividade no CAOP 1.
Aproveito para juntar duas fotografias obtidas numa das muitas visitas que efectuei às Granjas.
Numa sobressaem várias Papaieiras, num dos talhões, que eram de variedade melhorada, para comparação e divulgação, tendo em vista a sua aceitação pela população. Na outra o pormenor do fruto duma palmeira de variedade melhorada em cultura numa das Granjas, para adaptação e demonstração da diferença, para melhor, relativamente às variedades nativas.
Todos as povoações mencionadas e as Granjas visitei-as mais do que uma vez, durante aqueles 8 meses em que percorri a região.
Jorge Picado
Papaieiras
Cacho de palmeira
__________
Nota de CV:
Vd. poste de 20 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4385: Estórias de Jorge Picado (5): A minha passagem pelo CAOP 1 - Teixeira Pinto (I Parte)
Caros amigos, Luís, Carlos, Briote e MRibeiro
Na continuação da transcrição de papeis dos tempos de Teixeira Pinto, envio mais um para apreciarem e darem o encaminhamento que julgarem melhor (*).
Abraços para todos vós para todo o pessoal da Tabanca.
Jorge Picado
PS: Vai seguir dentro em pouco uma nota sobre a "Ponte" e as "estradas", prometo.
2. Na continuação da minha comunicação anterior segue agora a transcrição duma cópia, duma reunião, que fiz à mão intitulado “Agricultura”, reunião essa realizada no final de 1970 ou nos primeiros dias de 71, provavelmente em TEIXEIRA PINTO, portanto, quando ainda me encontrava algures por terras de MANSOA.
Agricultura
1. Cultura do Arroz.
Bolanha de Churobrique: Aproveitaram-se só 72kg. (Só a sementeira). Num Ano Bom poderia dar 6.000kg.
Arroz filipino – Foi dado à POP em todos os Reordenamentos
Vai começar a recolha da sementeira em Bajope – Capol a partir da 2.ª quinzena de Janeiro de 71. (reaver as sementes que o SAF deu para a sementeira). Depois seguir-se-ão os outros Reordenamentos.
2. Palmeiras.
Em Dezembro havia 170 sementes germinadas para irem para o viveiro. Depois sai para o lugar definitivo. Pretende-se com estas sementes aumentar os Palmares dos Reordenamentos
3. Árvores de Fruto e Outras Árvores.
Daqui a 2 meses já há novas Plantas para distribuir à população.
4. Granja de Teixeira Pinto.
A ideia do Regente Agrícola é que a Granja de Teixeira Pinto ficasse só com o Palmar. Abrir uma nova Granja, talvez em Calequisse ou Cajegute (depois de Bugulha->Fancate). Primeiro era preciso abrir uma estrada (eram precisos 1 D7 + 3 motosserras). O problema foi levantado em Fev70.
5. Granja de Calequisse.
Desenvolver ou a Granja de Fancate ou de Calequisse. Para desenvolver a de Calequisse, é o mesmo problema -> maquinaria (D7 + 3 motosserras).
6. Granja de Caió.
Só reservada a árvores de fruto. Desde que tivessem 1 tractor já poderiam começar os trabalhos.
7. Ensino à população de novas técnicas.
8. A verba para o ensino na Granja de Teixeira Pinto foi posta ao SAF. Já foi accionada?
9. Recuperação de Bolanhas.
Dar pelo menos 1 Ha.
A divisão ser feita de acordo com o escoamento das águas (-> obriga a que o Sr. Dias faça um estudo).
10. Reparação das cercas dos Reordenamentos (dizem que a população não colabora).
11. Palmar de Balombi. São precisas 3 motosserras + tractor.
Perguntar ao SAF:
verba para alimentação na Granja de Teixeira Pinto
3 motosserras
1 tractor
1 debulhadora-enfardadeira
1 autotanque
Pedir o maior número possível de novas Britadeiras
Pedir o maior número possível de Prensas para o óleo (a prensa pode ser acopulada à Britadeira)
12. Britadeira.
Para quebrar o quenoque. Falar com o Soldado José Carlos (do CAOP).
A população de BARÁ +
13. Palmar de PELUNDO.
O Palmar foi feito pelo Estado, pelos SAF. A exploração feita através dos SAF e em proveito da população do Pelundo.
Ressalta do rascunho, pois era escrito a lápis e esferográfica, que se tratou duma reunião para balanço da actividade desenvolvida no sector da actividade agrícola e no esboço duma programação para novas etapas a desenvolver, na zona de acção do BCaç 2905, pois todas aquelas povoações mencionadas pertenciam à área do Posto Administrativo cuja sede era TEIXEIRA PINTO e aos Regulados de: CHURO; COSTA DE BAIXO; CALEQUISSE; CAJEGUTE; BUGULHA; CAIÓ e PELUNDO.
Pelos vistos a cultura do arroz em CHUROBRIQUE (ponto 1) falhou. Teria sido bom procurar as causas, mas nada se diz.
Tinham sido criadas várias unidades para adaptação e demonstração de novas variedades de árvores de fruto e outras designadas por “GRANJA” e tentava-se criar ainda outras, para as quais seriam necessárias mais máquinas, incluindo Prensas para extracção do óleo de palma, e o que designavam por Britadeiras, para quebrar o quenoque. Note-se que para esta finalidade referem um soldado do CAOP, José Carlos. Seria o encarregado de trabalhar com as Britadeiras?
No ponto 11 refere-se o Palmar de BALOMBI, mas a grafia deve estar incorrecta, uma vez que julgo não existisse este nome, mas sim BALOMBE, a Sul da estrada TEIXEIRA PINTO – CALEQUISSE, mais próximo desta última e no Regulado de CATI.
Quando se fala num Sr. Dias, para fazer um estudo tendo em vista a divisão das bolanhas recuperadas, de acordo com o escoamento das águas, só se podem referir ao Regente Agrícola que, salvo erro, era o responsável pelo sector das bolanhas dos SAF (Serviços Agrícolas e Florestais da Guiné), que conheci depois no decorrer da minha actividade no CAOP 1.
Aproveito para juntar duas fotografias obtidas numa das muitas visitas que efectuei às Granjas.
Numa sobressaem várias Papaieiras, num dos talhões, que eram de variedade melhorada, para comparação e divulgação, tendo em vista a sua aceitação pela população. Na outra o pormenor do fruto duma palmeira de variedade melhorada em cultura numa das Granjas, para adaptação e demonstração da diferença, para melhor, relativamente às variedades nativas.
Todos as povoações mencionadas e as Granjas visitei-as mais do que uma vez, durante aqueles 8 meses em que percorri a região.
Jorge Picado
Papaieiras
Cacho de palmeira
__________
Nota de CV:
Vd. poste de 20 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4385: Estórias de Jorge Picado (5): A minha passagem pelo CAOP 1 - Teixeira Pinto (I Parte)
Guiné 63/74 - P4429: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (5): Um alferes desterrado em Madina Xaquili, com um cano de morteiro 60 (IV Parte)
1. Mensagem de Fernando Gouveia, ex-Alf Mil Rec e Inf, Bafatá, 1968/70, com data de 27 de Maio de 2009:
Caro Carlos:
[...]
Assim procurando respeitar o intervalo de uma semana, junto em anexo a continuação da estória sobre Madina Xaquili - parte 4, para a série A Guerra Vista de Bafatá.
Um abraço
Fernando Gouveia
A GUERRA VISTA DE BAFATÁ
5 - Um Alferes destacado (desterrado) em Madina Xaquili com um cano (só o cano) dum morteiro 60 - parte 4
Preâmbulo
Como tenho referido, na sequência do agravamento da situação no Cossé, fui destacado para Madina Xaquili, onde vivi uma experiência verdadeiramente inesquecível.
No meu Poste anterior – 4395 (4.º; 5.º e 6.º dias dessa minha experiência), referi que a minha principal preocupação era o problema da falta de segurança. Descrevi como para isso utilizei canas de milho e como pensei dar destino às granadas M/44, atrás dos troncos dos poilões. Tomei também a primeira decisão considerada controversa.
Relato do 7.º dia – 18JUN69:
Manhã cedo lá saí com um GCOMB, rumo a Cantacunda, conforme as ordens recebidas. Como íamos para uma zona calma nem sequer levei o nosso cano de morteiro.
A caminho de Cantacunda
Deu-se instrução de fogo com G3 embora lá só dispusessem de Mausers, mas ordens são ordens.
Debaixo de um mangueiro, no centro da tabanca, tirei uma foto onde se podem ver o João Vieira e o chefe da tabanca de Cantacunda.
Em Cantacunda. O João, eu e o chefe da tabanca, entre outros
No regresso a Madina, surpresa das surpresas… O Capitão Jerónimo (soube o seu nome no último almoço da Tabanca de Matosinhos) mandou-nos, além de novos géneros, mais sete Praças e um Furriel, passando assim para o dobro, as NT metropolitanas em Madina Xaquili. Deve ter ficado com remorsos por anteriormente só me ter fornecido o cano de um morteiro
A chegada a Madina Xaquili vindos de Cantacunda
Almoçámos mais uma vez a habitual comida enlatada.
Preparávamo-nos para reiniciar os trabalhos quando se ouve um tiro para os lados do sentinela instalado na mata. Tocou-se o alarme. Toda a gente, civil e militar, foi para os abrigos conforme o combinado. Fui acariciar o nosso cano de morteiro. O silêncio era total. Nada acontecia. Pedi ao João para mandar um grupo saber o que se tinha passado. Teria sido o IN?
Em pouco tempo veio a resposta. Tendo passado ao alcance do sentinela um porco do mato, aquele abateu-o.
Com pleno acordo do João, o milícia teria que ser castigado, e foi: Deu metade do porco aos metropolitanos e ficou escalado para os próximos serviços. Tirámos assim a barriga de misérias.
Como íamos outra vez ficar sem pão, decidi fazer um forno. Um grupo arranjou barro logo ali e eu próprio o construí. No dia seguinte, já seco, estava a fazer pão. Uma delícia naquele mato. Quando da sua construção, logo um milícia, o Sajuma, sempre com os seus óculos espelhados, veio ter comigo pedir se podia ser ajudante do padeiro. Para ele iria ser uma altíssima promoção.
À noitinha mais uma vez me inteirava dos problemas da tabanca. Fiquei a saber que a razão de estar atrasada a escavação do abrigo para a população se devia em grande parte ao facto de os milícias terem que fazer a lavra para a plantação de mancarra do João, sim, só do João: Mordomias de chefe. Cabe aqui referir que cavavam a terra com umas enxadas de madeira em tudo idênticas a umas que vi mais tarde no Museu Britânico em Londres, datadas de 1.500 a.C.
A lavra do João feita pelos milícias com enxadas de madeira
A enxada que trouxe de lá (JUN69)
As enxadas, no Museu Britânico em Londres, datadas de 1500 anos a.C.
Relato do 8º dia – 19JUN69:
Penso que foi o primeiro dia em que comecei a ficar descontraído, até porque tinha duplicado os efectivos metropolitanos e o Furriel me dava ajuda a nível de comando. Dei uma volta pela tabanca e o que previa aconteceu. Ouve-se o ruído de um héli. O Coronel Felgas chegava. Inteirou-se da nossa situação e de relevante só me disse, muito secamente como era costume:
- Gouveia, só sai daqui quando a população civil tiver abrigos. Como já o conhecia muito bem, sabia que não iria ser bem assim, como mais tarde se verificou.
Antes da noite, nova mensagem. Decifrada dizia: Fazer operação (passados dois dias) até à antiga tabanca de Padada onde se reunirão a um grupo de combate que partirá de …(não recordo) e montar emboscada nessa zona se forem detectados vestígios IN.
Relato do 9º dia – 20JUN69:
Ao café comecei a pensar quem iria comigo no dia seguinte. Quanto ao armamento não tinha dúvidas: Todo, ou seja, o cano do morteiro. À noitinha, na reunião debaixo do mangueiro abriria o jogo.
Em determinada altura, a 1.ª mulher do João veio falar comigo e expôs-me o seguinte:
- Alferes (falava relativamente bem português) venho pedir desculpa mas tenho que ir embora da tabanca pois o João nunca está comigo nem come a comida que eu faço; só está com a outra mulher, a Mariema (2.ª mulher, mais nova); estou à espera que o Bonco faça dois anos para ir embora e me juntar com outro homem.
Fiquei a saber que as mulheres para poderem amamentar os filhos estavam dois anos sem ter relações sexuais. Lá tive que falar com o João mas julgo que ficou tudo na mesma.
Nessa noite aprendia mais sobre os costumes locais e mais preocupado ficava com esta população naquela situação de pré-guerra e de isolamento caso o nosso destacamento de 16 homens viesse a abandonar a tabanca.
Claro que o tema principal dessa noite foi combinar a Operação do dia seguinte.
No próximo dia faremos a Operação programada, com um ataque de abelhas e cruzando muitos trilhos IN. No próximo Poste descreverei tudo isso.
Até para a semana camaradas.
Texto e fotos: © Fernando Gouveia (2009). Direitos reservados
__________
Nota de CV:
Vd. último episódio da série de 21 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4395: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (4): Um alferes desterrado em Madina Xaquili, com um cano de morteiro 60 (III Parte)
Caro Carlos:
[...]
Assim procurando respeitar o intervalo de uma semana, junto em anexo a continuação da estória sobre Madina Xaquili - parte 4, para a série A Guerra Vista de Bafatá.
Um abraço
Fernando Gouveia
A GUERRA VISTA DE BAFATÁ
5 - Um Alferes destacado (desterrado) em Madina Xaquili com um cano (só o cano) dum morteiro 60 - parte 4
Preâmbulo
Como tenho referido, na sequência do agravamento da situação no Cossé, fui destacado para Madina Xaquili, onde vivi uma experiência verdadeiramente inesquecível.
No meu Poste anterior – 4395 (4.º; 5.º e 6.º dias dessa minha experiência), referi que a minha principal preocupação era o problema da falta de segurança. Descrevi como para isso utilizei canas de milho e como pensei dar destino às granadas M/44, atrás dos troncos dos poilões. Tomei também a primeira decisão considerada controversa.
Relato do 7.º dia – 18JUN69:
Manhã cedo lá saí com um GCOMB, rumo a Cantacunda, conforme as ordens recebidas. Como íamos para uma zona calma nem sequer levei o nosso cano de morteiro.
A caminho de Cantacunda
Deu-se instrução de fogo com G3 embora lá só dispusessem de Mausers, mas ordens são ordens.
Debaixo de um mangueiro, no centro da tabanca, tirei uma foto onde se podem ver o João Vieira e o chefe da tabanca de Cantacunda.
Em Cantacunda. O João, eu e o chefe da tabanca, entre outros
No regresso a Madina, surpresa das surpresas… O Capitão Jerónimo (soube o seu nome no último almoço da Tabanca de Matosinhos) mandou-nos, além de novos géneros, mais sete Praças e um Furriel, passando assim para o dobro, as NT metropolitanas em Madina Xaquili. Deve ter ficado com remorsos por anteriormente só me ter fornecido o cano de um morteiro
A chegada a Madina Xaquili vindos de Cantacunda
Almoçámos mais uma vez a habitual comida enlatada.
Preparávamo-nos para reiniciar os trabalhos quando se ouve um tiro para os lados do sentinela instalado na mata. Tocou-se o alarme. Toda a gente, civil e militar, foi para os abrigos conforme o combinado. Fui acariciar o nosso cano de morteiro. O silêncio era total. Nada acontecia. Pedi ao João para mandar um grupo saber o que se tinha passado. Teria sido o IN?
Em pouco tempo veio a resposta. Tendo passado ao alcance do sentinela um porco do mato, aquele abateu-o.
Com pleno acordo do João, o milícia teria que ser castigado, e foi: Deu metade do porco aos metropolitanos e ficou escalado para os próximos serviços. Tirámos assim a barriga de misérias.
Como íamos outra vez ficar sem pão, decidi fazer um forno. Um grupo arranjou barro logo ali e eu próprio o construí. No dia seguinte, já seco, estava a fazer pão. Uma delícia naquele mato. Quando da sua construção, logo um milícia, o Sajuma, sempre com os seus óculos espelhados, veio ter comigo pedir se podia ser ajudante do padeiro. Para ele iria ser uma altíssima promoção.
À noitinha mais uma vez me inteirava dos problemas da tabanca. Fiquei a saber que a razão de estar atrasada a escavação do abrigo para a população se devia em grande parte ao facto de os milícias terem que fazer a lavra para a plantação de mancarra do João, sim, só do João: Mordomias de chefe. Cabe aqui referir que cavavam a terra com umas enxadas de madeira em tudo idênticas a umas que vi mais tarde no Museu Britânico em Londres, datadas de 1.500 a.C.
A lavra do João feita pelos milícias com enxadas de madeira
A enxada que trouxe de lá (JUN69)
As enxadas, no Museu Britânico em Londres, datadas de 1500 anos a.C.
Relato do 8º dia – 19JUN69:
Penso que foi o primeiro dia em que comecei a ficar descontraído, até porque tinha duplicado os efectivos metropolitanos e o Furriel me dava ajuda a nível de comando. Dei uma volta pela tabanca e o que previa aconteceu. Ouve-se o ruído de um héli. O Coronel Felgas chegava. Inteirou-se da nossa situação e de relevante só me disse, muito secamente como era costume:
- Gouveia, só sai daqui quando a população civil tiver abrigos. Como já o conhecia muito bem, sabia que não iria ser bem assim, como mais tarde se verificou.
Antes da noite, nova mensagem. Decifrada dizia: Fazer operação (passados dois dias) até à antiga tabanca de Padada onde se reunirão a um grupo de combate que partirá de …(não recordo) e montar emboscada nessa zona se forem detectados vestígios IN.
Relato do 9º dia – 20JUN69:
Ao café comecei a pensar quem iria comigo no dia seguinte. Quanto ao armamento não tinha dúvidas: Todo, ou seja, o cano do morteiro. À noitinha, na reunião debaixo do mangueiro abriria o jogo.
Em determinada altura, a 1.ª mulher do João veio falar comigo e expôs-me o seguinte:
- Alferes (falava relativamente bem português) venho pedir desculpa mas tenho que ir embora da tabanca pois o João nunca está comigo nem come a comida que eu faço; só está com a outra mulher, a Mariema (2.ª mulher, mais nova); estou à espera que o Bonco faça dois anos para ir embora e me juntar com outro homem.
Fiquei a saber que as mulheres para poderem amamentar os filhos estavam dois anos sem ter relações sexuais. Lá tive que falar com o João mas julgo que ficou tudo na mesma.
Nessa noite aprendia mais sobre os costumes locais e mais preocupado ficava com esta população naquela situação de pré-guerra e de isolamento caso o nosso destacamento de 16 homens viesse a abandonar a tabanca.
Claro que o tema principal dessa noite foi combinar a Operação do dia seguinte.
No próximo dia faremos a Operação programada, com um ataque de abelhas e cruzando muitos trilhos IN. No próximo Poste descreverei tudo isso.
Até para a semana camaradas.
Texto e fotos: © Fernando Gouveia (2009). Direitos reservados
__________
Nota de CV:
Vd. último episódio da série de 21 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4395: A Guerra vista de Bafatá (Fernando Gouveia) (4): Um alferes desterrado em Madina Xaquili, com um cano de morteiro 60 (III Parte)
quarta-feira, 27 de maio de 2009
Guiné 63/74 - P4428: O Nosso Livro de Visitas (64): Carlos Valentim, 1.º Tenente da Armada Portuguesa
1. Mensagem de Carlos Valentim, 1.º Tenente da Armada Portuguesa, com data de 25 de Maio de 2009:
Ex.mºs Senhores,
Antes de mais nada, apresento-me:
Carlos Manuel Valentim, 41 anos, 1.º Tenente da Armada, Professor Efectivo da Escola Naval e Director da Biblioteca, 24 anos de serviço; entre outros interesses, sou um estudioso da vida e da obra do Almirante Avelino Teixeira da Mota: publiquei um livro em finais de 2007 "O Trabalho de uma vida. Biobliografia de A. Teixeira da Mota (1920-1982)", Edições Culturais da Marinha.
Não posso deixar de felicitar V. Ex.as pelo excelente blog que mantém ao longos de anos, e congratular-me, em particular, por ver que há passagens referentes a Teixeira da Mota. Inclusive, grande parte de uma artigo que publiquei na Revista da Armada em 2002, o que é uma grande honra para mim. Refira-se que tive acesso, já há alguns anos, a correspondência interessantíssima, trocada entre Teixeira da Mota e alguns dos participantes do Blog, nomeadamente com o Dr. Beja Santos, quando Teixeira da Mota se encontrava na Guiné, na sua segunda comissão(1969-1970).
Por último, peço perdão pela ousadia, mas gostava de saber se o encontro que V. Ex.as estão a organizar, a ter lugar na Qta. do Paúl, é exclusivamente para os membros do Blog e/ou quem prestou serviço na Guiné, ou também se estende a outras pessoas.
Seria deveras interessante, trocar impressões, recolher testemunhos, e comungar alguns pontos-de-vista sobre Teixeira da Mota; pessoa que não conheci pessoalmente - homem algo reservado mas que teve um lugar de relevo no panorama cultural no século XX.
Desde já, muito obrigado pela atenção!
Subscrevendo-me com elevada consideração e estima,
Carlos Manuel Valentim
2. No mesmo dia era enviada esta mensagem ao 1.º Tenente Carlos Valentim:
Caro Camarada
Permita que o trate assim.
Muito obrigado por nos ter contactado.
Começo por lhe dizer que temos muito prazer em tê-lo connosco em Ortigosa no dia 20 de Junho. Terá que confirmar a sua inscrição e dizer se vai acompanhado.
O nosso Blogue não é de modo nenhum uma sociedade fechada. Temos connosco, não só ex-combatentes, mas também pessoas civis que de alguma maneira se sentem ligadas à Guiné do nosso tempo e à actual Guiné-Bissau. Estão ainda atabancados na nossa Caserna virtual ex-combatentes de Angola e ex-militares que nem sequer são do tempo da guerra colonial. Como vê somos uma panóplia diversificada.
Aproveito a oportunidade para convidá-lo, caso queira, a fazer parte da nossa família. Para tal mande uma foto tipo passe e faça um pequeno texto de apresentação para que o fiquemos a conhecer.
Leia por favor o lado esquerdo da nossa página, onde poderá encontrar as nossas normas de conduta e aquilo que nós (não) somos.
Os camaradas e amigos, neste blogue, em paridade absoluta, tratam-se por tu, independentemente dos seus postos actuais ou antigos e grau de instrução.
Aguardamos as suas próximas notícias.
Em nome dos editores e da tertúlia em geral, deixo-lhe um abraço.
Carlos Vinhal
Co-editor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
3. No dia 26 de Maio recebemos esta mensagem:
Muito obrigado pela pronta resposta, e pela atenção dispensada.
É claro que pode tratar-me por camarada. Tal como referi na anterior mensagem, é para mim um privilégio conviver com pessoas que têm tanto para contar, das suas vivências e experiências.
Sinto-me desconcertado com o acolhimento que me deram. Bem-hajam! Muito Obrigado!
Quanto à inscrição, quero faze-la já, se for possível.
São duas pessoas com refeição e lanche, eu: Carlos Manuel Valentim; e a minha companheira: Margarida Almeida. Se for preciso depositar dinheiro antecipadamente em alguma conta, faça o favor de informar, porque não há problema absolutamente nenhum.
Como vamos viajar da Beira Baixa para Ortigosa, tenciono reservar uma dormida, de Sábado para Domingo - quarto para duas pessoas. Teremos de ser nós a faze-lo
Isto será uma aventura para mim, e para a minha compenheira, mas estou com muita vontade de participar neste IV encontro.
Caro Carlos, só não faço já a inscrição no blog, porque ainda não digitalizei uma fotografia tipo passe, mas garanto-lhe que o farei logo que possível.
Confirme-me por favor a minha inscrição, ou se é necessário alguma coisa.
Deixo aqui um abraço fraterno, para o Carlos e para a tertúlia do blogue,
Carlos Manuel Valentim
4. Comentário de CV
Era bem pequenino o Carlos Valentim quando a guerra colonial e o drama da mobilização forçada chegou ao fim, resultado da Revolução dos Capitães.
É para nós gratificante que gerações pós-guerra queira saber de nós e do nosso passado como combatentes. O interesse manifestado pelo Carlos Valentim em querer confraternizar com estes velhinhos apanhados, mas não caducos, ex-combatentes da Guiné, é notável.
Para quem ainda não reparou, vamos também ter connosco o nosso tertuliano João Carlos Silva (*), ex-Cabo Especialista da Força Aérea, curiosamente com a idade aproximada deste nosso novo amigo.
Jovens amigos, até ao dia 20 de Junho para um abraço.
__________
Notas de CV
(*) Vd. poste de 22 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3923: Tabanca Grande (122): João Carlos Silva, ex-Cabo Especialista da Força Aérea Portuguesa (1979/82)
Vd. último poste da série de 20 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4386: O Nosso Livro de Visitas (63): B. Parreira, ex-Fur Mil da CCAÇ 16 (1972/73)
Ex.mºs Senhores,
Antes de mais nada, apresento-me:
Carlos Manuel Valentim, 41 anos, 1.º Tenente da Armada, Professor Efectivo da Escola Naval e Director da Biblioteca, 24 anos de serviço; entre outros interesses, sou um estudioso da vida e da obra do Almirante Avelino Teixeira da Mota: publiquei um livro em finais de 2007 "O Trabalho de uma vida. Biobliografia de A. Teixeira da Mota (1920-1982)", Edições Culturais da Marinha.
Não posso deixar de felicitar V. Ex.as pelo excelente blog que mantém ao longos de anos, e congratular-me, em particular, por ver que há passagens referentes a Teixeira da Mota. Inclusive, grande parte de uma artigo que publiquei na Revista da Armada em 2002, o que é uma grande honra para mim. Refira-se que tive acesso, já há alguns anos, a correspondência interessantíssima, trocada entre Teixeira da Mota e alguns dos participantes do Blog, nomeadamente com o Dr. Beja Santos, quando Teixeira da Mota se encontrava na Guiné, na sua segunda comissão(1969-1970).
Por último, peço perdão pela ousadia, mas gostava de saber se o encontro que V. Ex.as estão a organizar, a ter lugar na Qta. do Paúl, é exclusivamente para os membros do Blog e/ou quem prestou serviço na Guiné, ou também se estende a outras pessoas.
Seria deveras interessante, trocar impressões, recolher testemunhos, e comungar alguns pontos-de-vista sobre Teixeira da Mota; pessoa que não conheci pessoalmente - homem algo reservado mas que teve um lugar de relevo no panorama cultural no século XX.
Desde já, muito obrigado pela atenção!
Subscrevendo-me com elevada consideração e estima,
Carlos Manuel Valentim
2. No mesmo dia era enviada esta mensagem ao 1.º Tenente Carlos Valentim:
Caro Camarada
Permita que o trate assim.
Muito obrigado por nos ter contactado.
Começo por lhe dizer que temos muito prazer em tê-lo connosco em Ortigosa no dia 20 de Junho. Terá que confirmar a sua inscrição e dizer se vai acompanhado.
O nosso Blogue não é de modo nenhum uma sociedade fechada. Temos connosco, não só ex-combatentes, mas também pessoas civis que de alguma maneira se sentem ligadas à Guiné do nosso tempo e à actual Guiné-Bissau. Estão ainda atabancados na nossa Caserna virtual ex-combatentes de Angola e ex-militares que nem sequer são do tempo da guerra colonial. Como vê somos uma panóplia diversificada.
Aproveito a oportunidade para convidá-lo, caso queira, a fazer parte da nossa família. Para tal mande uma foto tipo passe e faça um pequeno texto de apresentação para que o fiquemos a conhecer.
Leia por favor o lado esquerdo da nossa página, onde poderá encontrar as nossas normas de conduta e aquilo que nós (não) somos.
Os camaradas e amigos, neste blogue, em paridade absoluta, tratam-se por tu, independentemente dos seus postos actuais ou antigos e grau de instrução.
Aguardamos as suas próximas notícias.
Em nome dos editores e da tertúlia em geral, deixo-lhe um abraço.
Carlos Vinhal
Co-editor do Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné
3. No dia 26 de Maio recebemos esta mensagem:
Muito obrigado pela pronta resposta, e pela atenção dispensada.
É claro que pode tratar-me por camarada. Tal como referi na anterior mensagem, é para mim um privilégio conviver com pessoas que têm tanto para contar, das suas vivências e experiências.
Sinto-me desconcertado com o acolhimento que me deram. Bem-hajam! Muito Obrigado!
Quanto à inscrição, quero faze-la já, se for possível.
São duas pessoas com refeição e lanche, eu: Carlos Manuel Valentim; e a minha companheira: Margarida Almeida. Se for preciso depositar dinheiro antecipadamente em alguma conta, faça o favor de informar, porque não há problema absolutamente nenhum.
Como vamos viajar da Beira Baixa para Ortigosa, tenciono reservar uma dormida, de Sábado para Domingo - quarto para duas pessoas. Teremos de ser nós a faze-lo
Isto será uma aventura para mim, e para a minha compenheira, mas estou com muita vontade de participar neste IV encontro.
Caro Carlos, só não faço já a inscrição no blog, porque ainda não digitalizei uma fotografia tipo passe, mas garanto-lhe que o farei logo que possível.
Confirme-me por favor a minha inscrição, ou se é necessário alguma coisa.
Deixo aqui um abraço fraterno, para o Carlos e para a tertúlia do blogue,
Carlos Manuel Valentim
4. Comentário de CV
Era bem pequenino o Carlos Valentim quando a guerra colonial e o drama da mobilização forçada chegou ao fim, resultado da Revolução dos Capitães.
É para nós gratificante que gerações pós-guerra queira saber de nós e do nosso passado como combatentes. O interesse manifestado pelo Carlos Valentim em querer confraternizar com estes velhinhos apanhados, mas não caducos, ex-combatentes da Guiné, é notável.
Para quem ainda não reparou, vamos também ter connosco o nosso tertuliano João Carlos Silva (*), ex-Cabo Especialista da Força Aérea, curiosamente com a idade aproximada deste nosso novo amigo.
Jovens amigos, até ao dia 20 de Junho para um abraço.
__________
Notas de CV
(*) Vd. poste de 22 de Fevereiro de 2009 > Guiné 63/74 - P3923: Tabanca Grande (122): João Carlos Silva, ex-Cabo Especialista da Força Aérea Portuguesa (1979/82)
Vd. último poste da série de 20 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4386: O Nosso Livro de Visitas (63): B. Parreira, ex-Fur Mil da CCAÇ 16 (1972/73)
Guiné 63/74 - P4427: "Restolhada", uma Operação da CCAÇ 2790 no Choquemone (António G. Matos)
1. Em mensagem do dia 19 de Maio de 2009, recebemos de António G. Matos (*), ex-Alf Mil MA da CCAÇ 2790, Bula, 1970/72, este texto referente à Operação Restolhada efectuada no Choquemone:
Há nomes que, só de se ouvirem pronunciar, causam náuseas e mal estar.
Exemplos são, Hitler, Alzheimer, Parkinson, e, mais recentemente um tal de AB que no entanto não tem a categoria dos anteriores que o catapulte para a notoriedade.
Ficará rasteiro, ao nível do chão em terra batida, emporcalhado com um mergulho que o obrigaram a dar na caca que ele próprio largou, mal cheiroso e envergonhado com uns óculos de marca cujas lentes teriam já caído.
Perdeu completamente o estatuto de tio AB e deixou-nos o terreno livre para falarmos dos outros.
Desses, Hitler personifica o Mal;
Alzheimer e Parkinson ligam-se à medicina e às doenças do foro neurológico como sabemos.
Não me sinto minimamente habilitado a dissertar sobre tais figuras, mas são conhecidas as maleitas das doenças que são catalogadas pelos seus nomes; esquecimento, falta de controlo de movimentos, apatia crescente, tudo em crescente e, finalmente a morte.
Ora, enquanto somos poupados a tal diagnóstico, vamos brincando com uma ou outra dificuldade que se nos vai deparando, tentando com isso justificar a falta de ideias para escrever mais posts para o blog.
Seviu toda esta divagação para dizer que tenho apreciado a memória que muitos dos camaradas demonstram ter ao referirem nomes de operações, datas, pormenores, etc., quando comigo não se passa isso.
É claro que recordo as cenas de pancadria, fogachada, acidentes, mas os nomes e as datas, vai lá vai, até a barraca abana !!!...
Por outro lado sempre achei muita piada aos nomes com que se baptizavam as ditas operações e a mim calharam-me algumas cuja designação não associo ao objectivo.
Uma delas foi a "Restolhada" que teve variadíssimas sub-empreitadas uma das quais ao Choquemone.
Se não foi, não vem daí mal ao mundo, mas vamos admitir que foi, ok?
Essa operação tinha como objectivo travar-nos de razões com os lindinhos (agora parece mal dizer nharro, turra, ou escarumba, mas na altura era assim mesmo que eram conhecidos os nossos irmãos e, por outro lado, não parecem nada mal os nomes com que eles nos mimavam, claro, mas isso agora não interessa nada) e depois de os desalojar da toca, apareceriam as tropas especiais (?!) para os apanhar à mão. Manga de ronco!
Mas a estória pretende relatar a aproximação final ao objectivo e tentar dar uma ideia, pálida que seja, às pessoas que não tendo passado por experiência semelhante, tenham a curiosidade de entender o contexto.
Depois de várias horas de progressão durante a noite, fez-se a pausa final, não tanto para descansar, mas para tornar o dispositivo controlável e eficaz.
Uma das artes da guerra era baralhar o inimigo e surpreendê-lo na sua própria casa.
Os nossos handicaps para além de não conhecermos o terreno era a circunstância de não abandonarmos os feridos nem os mortos no local da contenda enquanto essa era a metodologia deles.
Havia, pois, que usar da astúcia considerada mais adequada às circunstâncias e nesse dia (ou melhor, nessa noite), nos momentos anteriores ao assalto final, foi pedido o apoio dos obuses de Bula numa táctica parecida com os miúdos da aldeia que mijam para as tocas dos grilos para eles saírem, sabem?
O problema foi localizar o objectivo do tiro.
Às perguntas do artilheiro de Bula, demos-lhe o que entendemos ser a melhor mira possível mas, pelo sim pelo não, pedimos alguma folga não fosse a canhoada caír-nos na cabeça!
A coisa foi arriscada!
A primeira fogachada caíu entre nós e os lindinhos!
Porra que isto está muito perto!
Eh pá, alarga o tiro senão ninguém chega hoje ao quartel!
De alarga-o-tiro-encolhe-o-tiro, conseguimos desalojá-los e pô-los em debandada.
Não nos coube a missão de correr atrás deles e considerámos isso a cereja no topo do bolo que oferecemos aos especiais.
Havia agora que sair dali antes que o prego torcesse o bico.
Chegados a Bula, houve abraços e uma sensação extremamente agradável de estarmos vivos!
O dia já ia alto e havia que recuperar forças pois a restolhada ia prolongar-se ...
Ainda hoje há muita restolhada por aí .....
António Matos
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 24 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4407: Meu pai, meu velho, meu camarada (4): Não é um elogio fúnebre que te quero dedicar... (António G. Matos)
Há nomes que, só de se ouvirem pronunciar, causam náuseas e mal estar.
Exemplos são, Hitler, Alzheimer, Parkinson, e, mais recentemente um tal de AB que no entanto não tem a categoria dos anteriores que o catapulte para a notoriedade.
Ficará rasteiro, ao nível do chão em terra batida, emporcalhado com um mergulho que o obrigaram a dar na caca que ele próprio largou, mal cheiroso e envergonhado com uns óculos de marca cujas lentes teriam já caído.
Perdeu completamente o estatuto de tio AB e deixou-nos o terreno livre para falarmos dos outros.
Desses, Hitler personifica o Mal;
Alzheimer e Parkinson ligam-se à medicina e às doenças do foro neurológico como sabemos.
Não me sinto minimamente habilitado a dissertar sobre tais figuras, mas são conhecidas as maleitas das doenças que são catalogadas pelos seus nomes; esquecimento, falta de controlo de movimentos, apatia crescente, tudo em crescente e, finalmente a morte.
Ora, enquanto somos poupados a tal diagnóstico, vamos brincando com uma ou outra dificuldade que se nos vai deparando, tentando com isso justificar a falta de ideias para escrever mais posts para o blog.
Seviu toda esta divagação para dizer que tenho apreciado a memória que muitos dos camaradas demonstram ter ao referirem nomes de operações, datas, pormenores, etc., quando comigo não se passa isso.
É claro que recordo as cenas de pancadria, fogachada, acidentes, mas os nomes e as datas, vai lá vai, até a barraca abana !!!...
Por outro lado sempre achei muita piada aos nomes com que se baptizavam as ditas operações e a mim calharam-me algumas cuja designação não associo ao objectivo.
Uma delas foi a "Restolhada" que teve variadíssimas sub-empreitadas uma das quais ao Choquemone.
Se não foi, não vem daí mal ao mundo, mas vamos admitir que foi, ok?
Essa operação tinha como objectivo travar-nos de razões com os lindinhos (agora parece mal dizer nharro, turra, ou escarumba, mas na altura era assim mesmo que eram conhecidos os nossos irmãos e, por outro lado, não parecem nada mal os nomes com que eles nos mimavam, claro, mas isso agora não interessa nada) e depois de os desalojar da toca, apareceriam as tropas especiais (?!) para os apanhar à mão. Manga de ronco!
Mas a estória pretende relatar a aproximação final ao objectivo e tentar dar uma ideia, pálida que seja, às pessoas que não tendo passado por experiência semelhante, tenham a curiosidade de entender o contexto.
Depois de várias horas de progressão durante a noite, fez-se a pausa final, não tanto para descansar, mas para tornar o dispositivo controlável e eficaz.
Uma das artes da guerra era baralhar o inimigo e surpreendê-lo na sua própria casa.
Os nossos handicaps para além de não conhecermos o terreno era a circunstância de não abandonarmos os feridos nem os mortos no local da contenda enquanto essa era a metodologia deles.
Havia, pois, que usar da astúcia considerada mais adequada às circunstâncias e nesse dia (ou melhor, nessa noite), nos momentos anteriores ao assalto final, foi pedido o apoio dos obuses de Bula numa táctica parecida com os miúdos da aldeia que mijam para as tocas dos grilos para eles saírem, sabem?
O problema foi localizar o objectivo do tiro.
Às perguntas do artilheiro de Bula, demos-lhe o que entendemos ser a melhor mira possível mas, pelo sim pelo não, pedimos alguma folga não fosse a canhoada caír-nos na cabeça!
A coisa foi arriscada!
A primeira fogachada caíu entre nós e os lindinhos!
Porra que isto está muito perto!
Eh pá, alarga o tiro senão ninguém chega hoje ao quartel!
De alarga-o-tiro-encolhe-o-tiro, conseguimos desalojá-los e pô-los em debandada.
Não nos coube a missão de correr atrás deles e considerámos isso a cereja no topo do bolo que oferecemos aos especiais.
Havia agora que sair dali antes que o prego torcesse o bico.
Chegados a Bula, houve abraços e uma sensação extremamente agradável de estarmos vivos!
O dia já ia alto e havia que recuperar forças pois a restolhada ia prolongar-se ...
Ainda hoje há muita restolhada por aí .....
António Matos
__________
Nota de CV:
(*) Vd. poste de 24 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4407: Meu pai, meu velho, meu camarada (4): Não é um elogio fúnebre que te quero dedicar... (António G. Matos)
Guiné 63/74 - P4426: Convívios (138): Pessoal da CCAÇ 2367 (Vampiros), dia 23 de Maio de 2009 (Albino Silva)
1. Mensagem de Albino Silva, ex-Soldado Maqueiro da CCS/BCAÇ 2845, Guiné, 1968/70, com data de 26 de Maio de 2009:
Caro Carlos Vinhal
Cá estou de novo para te dar mais trabalho, e desta vez com mais um blog sobre o Convívio da CCAÇ 2367 Vampiros.
Como estes camaradas frequentam a nossa Tabanca, vão ficar de certeza satisfeitos em ver aquilo que com prazer fiz para eles, e que merecem pois são excelentes camaradas.
O endereço do Blog é o mesmo ou seja: batcac2845guineteixeirapinto.blogspot.com
Mais uma vez obrigado, e breve enviarei coisas novas para todos os Tertulianos e a quem mando um abraço, a todos desde já, e em especial para todos os Chefes desta Tabanca.
Albino Silva
__________
Nota de CV:
Vd. último poste sa série de 26 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4419: Convívios (134): O pessoal da CART 3331 (Cuntima, 1970/72), convive em Vila Nova de Famalicão, dia 6 de Junho (Manuel Correia)
Caro Carlos Vinhal
Cá estou de novo para te dar mais trabalho, e desta vez com mais um blog sobre o Convívio da CCAÇ 2367 Vampiros.
Como estes camaradas frequentam a nossa Tabanca, vão ficar de certeza satisfeitos em ver aquilo que com prazer fiz para eles, e que merecem pois são excelentes camaradas.
O endereço do Blog é o mesmo ou seja: batcac2845guineteixeirapinto.blogspot.com
Mais uma vez obrigado, e breve enviarei coisas novas para todos os Tertulianos e a quem mando um abraço, a todos desde já, e em especial para todos os Chefes desta Tabanca.
Albino Silva
__________
Nota de CV:
Vd. último poste sa série de 26 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4419: Convívios (134): O pessoal da CART 3331 (Cuntima, 1970/72), convive em Vila Nova de Famalicão, dia 6 de Junho (Manuel Correia)
Guiné 63/74 - P4425: No 25 de Abril eu estava em... (11): No Xitole, a guerra não acabou no dia 25 de Abril de 1974 (Joaquim Macau)
1. Mensagem de Joaquim Macau, ex-1.º Cabo Radiotelegrafista da 2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616, Xitole, 1973/74, com data de 25 de Maio de 2009:
Camarada Carlos vinhal
É com satisfação que vou responder às questões que me colocavas, mas antes, gostaria de fazer umas pequenas correcções.
Eu e outros camaradas só chegamos à Guiné no último dia do ano de 1973, houve outros que foram chegando até 5 de Janeiro de 1974, se o ingresso na vida militar foi para todos em 1973, alguns de nós só abalaram de Portugal já em 1974. Portanto nós, 2.ª CCAÇ só fomos para Xitole já em 1974.
A entrega do Xitole, não foi feita um mês depois da emboscada, foi muito tempo depois.
A 15 de Junho de 74 foi o primeiro contacto entre (forças inimigas), disso já o Zeferino fez referência anteriormente.
No mesmo dia, um GCOMB já tinha saído do quartel para ir buscar a correspondência, algures, ao rio Corubal, eu, nesse dia, fui com o Grupo como acontecia frequentemente para aquele lugar, onde nunca se consta que tenha havido algum encontro entre as forças inimigas.
Chegados ao local, como era normal, entrei em contacto com o quartel, para anunciar que tínhamos chegado ao destino, sem qualquer problema, foi quando, do quartel, o camarada que comigo trocou de serviço, me informou que o Capitão tinha saído para um encontro com elementos do PAIGC.
Camarada Carlos vinhal
É com satisfação que vou responder às questões que me colocavas, mas antes, gostaria de fazer umas pequenas correcções.
Eu e outros camaradas só chegamos à Guiné no último dia do ano de 1973, houve outros que foram chegando até 5 de Janeiro de 1974, se o ingresso na vida militar foi para todos em 1973, alguns de nós só abalaram de Portugal já em 1974. Portanto nós, 2.ª CCAÇ só fomos para Xitole já em 1974.
A entrega do Xitole, não foi feita um mês depois da emboscada, foi muito tempo depois.
A 15 de Junho de 74 foi o primeiro contacto entre (forças inimigas), disso já o Zeferino fez referência anteriormente.
No mesmo dia, um GCOMB já tinha saído do quartel para ir buscar a correspondência, algures, ao rio Corubal, eu, nesse dia, fui com o Grupo como acontecia frequentemente para aquele lugar, onde nunca se consta que tenha havido algum encontro entre as forças inimigas.
Chegados ao local, como era normal, entrei em contacto com o quartel, para anunciar que tínhamos chegado ao destino, sem qualquer problema, foi quando, do quartel, o camarada que comigo trocou de serviço, me informou que o Capitão tinha saído para um encontro com elementos do PAIGC.
Como devem calcular quando informei o Grupo do que se estava a passar, a alegria e a satisfação de todos era enorme. Assim que recebemos o correio, partimos em festa para o quartel e, quando chegamos, ainda o grupo do Capitão não tinha chegado. Os camaradas que estavam no quartel, também eles estavam em festa. Quando ia a caminho do posto de transmissões, atirei 2 ou 3 tiros de pistola para o ar, eram os foguetes festivos, logo criticados por um sargento do quadro que não me recordo o nome, pensava ele que tinha sido um acidente e não uma comemoração.
Pouco depois chegou o Comandante e seus acompanhantes que nos descreveu como tinha corrido o encontro e que a guerra felizmente tinha acabado.
Nos dias seguintes começamos a receber visitas e a conviver com os, outrora, inimigos. Na altura receava-se que pudesse haver alguma tentativa de aproveitamento por parte de elementos de um grupo há muito inactivo, mas o tempo mostrou que de facto só o PAIGC existia como organização.
Pelo menos uma vez formamos uma equipa de futebol que foi a Bambadinca disputar um encontro na sede do BCAÇ 4616. Na picada onde aconteceu a tragédia de 15 de Maio de 74, combinado com as nossas tropas, estavam os elementos do PAIGC, a fazer segurança para que nada de mal acontecesse.
O convívio com eles foi sempre cordial, nunca houve qualquer tipo de problemas. A única vez que existiu uma situação quase complicada, foi uma tentativa de assalto ao armazém de géneros alimentícios por parte de um grupo de milícias que eram parte integrante das nossas tropas. As nossas forças conseguiram dominar a situação sem incidentes.
Na nossa zona, o primeiro quartel a ser entregue ao PAIGC, foi o do Saltinho. Uma parte significativa do nosso equipamento, ficou nos quartéis, os meios de transmissões ficaram todos, eles, no inicio, tiveram dificuldade em conseguirem utilizá-lo convenientemente. Já depois do Saltinho estar entregue, as baterias dos rádios não recarregavam, as frequências utilizadas não eram as mesmas e logicamente os rádios não funcionavam, foi então enviada uma equipa do Xitole, em missão solidária, ajudar a resolver os problemas que entretanto surgiram. Corrigidas as deficiências, falámos àcerca da guerra já terminada, trocamos peças de fardamentos e fomos ao rio. Terminada a visita, os cumprimentos de despedida e os desejos de felicidade recíprocos, partida de regresso ao Xitole onde chegamos já ao escurecer. Foi uma viagem agradável e a única vez que visitei aquele sítio maravilhoso.
No Xitole tudo corria calmamente, os contactos e o convívio continuavam sem problemas e os acontecimentos menos bons faziam parte do passado, estávamos ansiosos pela nossa vez de partirmos a caminho de Bissau.
A data de partida do Xitole não me recordo, talvez o Zeferino no trabalho que está a preparar, me consiga complementar, mas foi muito tempo depois de 15 de Junho. Estivemos algum tempo em Bambadinca, depois fomos para Bissau, onde estivemos mais alguns dias a aguardar a nossa vez de embarque, o que aconteceu a 12 de Setembro de 74.
Por agora é tudo, se entenderem que alguma parte merece divulgação estejam à vontade.
Gostaria imenso que divulgassem o meu e-mail: joaquimmacau@gmail.com, para possíveis contactos com camaradas da 2.ª CCAÇ 4616, os quais, aguardo esperançado.
Para todos, um grande abraço, até logo.
Joaquim Augusto Pombinho Macau
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 16 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4354: Tabanca Grande (142): Joaquim Macau, camarada do último morto em emboscada do PAIGC (2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616, Xitole, 1973)
Vd. último poste da série de 9 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4311: No 25 de Abril eu estava em... (8): Chugué, num buraco com um tecto de quatro toros (José Pedrosa)
Pouco depois chegou o Comandante e seus acompanhantes que nos descreveu como tinha corrido o encontro e que a guerra felizmente tinha acabado.
Nos dias seguintes começamos a receber visitas e a conviver com os, outrora, inimigos. Na altura receava-se que pudesse haver alguma tentativa de aproveitamento por parte de elementos de um grupo há muito inactivo, mas o tempo mostrou que de facto só o PAIGC existia como organização.
Pelo menos uma vez formamos uma equipa de futebol que foi a Bambadinca disputar um encontro na sede do BCAÇ 4616. Na picada onde aconteceu a tragédia de 15 de Maio de 74, combinado com as nossas tropas, estavam os elementos do PAIGC, a fazer segurança para que nada de mal acontecesse.
O convívio com eles foi sempre cordial, nunca houve qualquer tipo de problemas. A única vez que existiu uma situação quase complicada, foi uma tentativa de assalto ao armazém de géneros alimentícios por parte de um grupo de milícias que eram parte integrante das nossas tropas. As nossas forças conseguiram dominar a situação sem incidentes.
Na nossa zona, o primeiro quartel a ser entregue ao PAIGC, foi o do Saltinho. Uma parte significativa do nosso equipamento, ficou nos quartéis, os meios de transmissões ficaram todos, eles, no inicio, tiveram dificuldade em conseguirem utilizá-lo convenientemente. Já depois do Saltinho estar entregue, as baterias dos rádios não recarregavam, as frequências utilizadas não eram as mesmas e logicamente os rádios não funcionavam, foi então enviada uma equipa do Xitole, em missão solidária, ajudar a resolver os problemas que entretanto surgiram. Corrigidas as deficiências, falámos àcerca da guerra já terminada, trocamos peças de fardamentos e fomos ao rio. Terminada a visita, os cumprimentos de despedida e os desejos de felicidade recíprocos, partida de regresso ao Xitole onde chegamos já ao escurecer. Foi uma viagem agradável e a única vez que visitei aquele sítio maravilhoso.
No Xitole tudo corria calmamente, os contactos e o convívio continuavam sem problemas e os acontecimentos menos bons faziam parte do passado, estávamos ansiosos pela nossa vez de partirmos a caminho de Bissau.
A data de partida do Xitole não me recordo, talvez o Zeferino no trabalho que está a preparar, me consiga complementar, mas foi muito tempo depois de 15 de Junho. Estivemos algum tempo em Bambadinca, depois fomos para Bissau, onde estivemos mais alguns dias a aguardar a nossa vez de embarque, o que aconteceu a 12 de Setembro de 74.
Por agora é tudo, se entenderem que alguma parte merece divulgação estejam à vontade.
Gostaria imenso que divulgassem o meu e-mail: joaquimmacau@gmail.com, para possíveis contactos com camaradas da 2.ª CCAÇ 4616, os quais, aguardo esperançado.
Para todos, um grande abraço, até logo.
Joaquim Augusto Pombinho Macau
__________
Notas de CV:
(*) Vd. poste de 16 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4354: Tabanca Grande (142): Joaquim Macau, camarada do último morto em emboscada do PAIGC (2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616, Xitole, 1973)
Vd. último poste da série de 9 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4311: No 25 de Abril eu estava em... (8): Chugué, num buraco com um tecto de quatro toros (José Pedrosa)
Guiné 63/74 - P4424: (Ex)citações (30): O meu pai só aprendeu as letras que o trabalho lhe ensinou (José da Câmara)
1. José da Câmara, ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Guiné, 1971/73 (*), deixou este comentário no Poste "Guiné 63/74 - P4407: Meu pai, meu velho, meu camar..."(**):
Olá António,
Julgo que sei o que sentes quando, magistralmente, te referes ao amor de pai. O mesmo se passa comigo, mas por motives diferentes. Durante a minha comissão na Guiné eu nunca recebi uma carta de meu pai nem ele leu uma escrita por mim.
Sabes António, o meu pai só aprendeu as letras que o trabalho lhe ensinou. Nunca se sentou numa carteira de escola, mas aprendeu o alfabeto que as lições da vida lhe ensinava todos os dias. Naquele tempo não era obrigatório ir à escola.
Um dia ele decidiu sair da sua ilha, as Flores, para que no Faial os seus filhos pudessem ter acesso ao liceu. Para que pudessem ter uma vida melhor e diferente do que a dele.
Já nos E.U.A. para onde emigrara continuou a incemtivar e ajudar os filhos a melhorarem os seus conhecimentos escolares. De cursos médios a mestrados foram cinco os rebentos que graduaram das universidades americanas.
Muitas foram as vezes que tentamos que ele aprendesse o ABC. Nunca quis aprender. Sempre respondeu com alguma graça:
- Se eu souber tanto como vocês não terei alegria.
Nós bem compreendemos o que ele nos quer dizer. Por amor ele se sacrificou. Por amor ele deu-nos tudo o que tinha para nos dar.
Hoje, com oitenta e dois anos de idade e regressado ao Faial, ele espera a minha visita anual. Ao fim e ao cabo eu ainda sou a carta que ele nunca leu. Dele sempre recebi uma grande lição de amor
Procuro não defraudá-lo.
José Câmara
2. Comentário de CV
Comovente, este comentário do nosso camarada José da Câmara.
Se no Continente, onde tudo era mais perto, as dificuldades para ir à Escola eram imensas, até porque não interessava que o povo soubesse muito, bastando uma elite facilmente manobrada que não queria perder privilégios, para manter o regime à tona, que fará nas ilhas onde o horizonte terrestre quase acabava ao fim da rua.
Lembro-me de o meu pai fazer a 3.ª classe no regime de adultos. A 4.ª fê-la quase a par comigo a fim de manter um miserável emprego na Função Pública.
Tempos difíceis que não obstaram a que eles fizessem sacrifícios para que os filhos tivessem mais do que eles, por pouco que fosse, já que eles não tinham nada.
__________
(*) Vd. poste de 27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4421: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (2): O IAO em Santa Margarida
(**) Vd. poste de 24 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4407: Meu pai, meu velho, meu camarada (4): Não é um elogio fúnebre que te quero dedicar... (António G. Matos)
Vd. último poste da série de 26 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4415: (Ex)citações (29): A Guiné que todos temos um pouco na alma (João Lourenço)
Olá António,
Julgo que sei o que sentes quando, magistralmente, te referes ao amor de pai. O mesmo se passa comigo, mas por motives diferentes. Durante a minha comissão na Guiné eu nunca recebi uma carta de meu pai nem ele leu uma escrita por mim.
Sabes António, o meu pai só aprendeu as letras que o trabalho lhe ensinou. Nunca se sentou numa carteira de escola, mas aprendeu o alfabeto que as lições da vida lhe ensinava todos os dias. Naquele tempo não era obrigatório ir à escola.
Um dia ele decidiu sair da sua ilha, as Flores, para que no Faial os seus filhos pudessem ter acesso ao liceu. Para que pudessem ter uma vida melhor e diferente do que a dele.
Já nos E.U.A. para onde emigrara continuou a incemtivar e ajudar os filhos a melhorarem os seus conhecimentos escolares. De cursos médios a mestrados foram cinco os rebentos que graduaram das universidades americanas.
Muitas foram as vezes que tentamos que ele aprendesse o ABC. Nunca quis aprender. Sempre respondeu com alguma graça:
- Se eu souber tanto como vocês não terei alegria.
Nós bem compreendemos o que ele nos quer dizer. Por amor ele se sacrificou. Por amor ele deu-nos tudo o que tinha para nos dar.
Hoje, com oitenta e dois anos de idade e regressado ao Faial, ele espera a minha visita anual. Ao fim e ao cabo eu ainda sou a carta que ele nunca leu. Dele sempre recebi uma grande lição de amor
Procuro não defraudá-lo.
José Câmara
2. Comentário de CV
Comovente, este comentário do nosso camarada José da Câmara.
Se no Continente, onde tudo era mais perto, as dificuldades para ir à Escola eram imensas, até porque não interessava que o povo soubesse muito, bastando uma elite facilmente manobrada que não queria perder privilégios, para manter o regime à tona, que fará nas ilhas onde o horizonte terrestre quase acabava ao fim da rua.
Lembro-me de o meu pai fazer a 3.ª classe no regime de adultos. A 4.ª fê-la quase a par comigo a fim de manter um miserável emprego na Função Pública.
Tempos difíceis que não obstaram a que eles fizessem sacrifícios para que os filhos tivessem mais do que eles, por pouco que fosse, já que eles não tinham nada.
__________
(*) Vd. poste de 27 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4421: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (2): O IAO em Santa Margarida
(**) Vd. poste de 24 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4407: Meu pai, meu velho, meu camarada (4): Não é um elogio fúnebre que te quero dedicar... (António G. Matos)
Vd. último poste da série de 26 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4415: (Ex)citações (29): A Guiné que todos temos um pouco na alma (João Lourenço)
Guiné 63/74 - P4423: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (2): Parte II
Guiné > Bissalanca > Base Aéreas nº 12 > 1969 > Linha da Frente dos Heli Al III. Foto de António Silva Vieira, Ex-Esp MMA 2ª/67, Guiné (BA12, 1968/70). (O nosso camarada Vieira, de 61 anos, alistou-se na Força Aérea na BA-2, no 2º turno de 1967, como recruta para especialista, jurou bandeira em 25/08/1968, ficou na BA-2 para tirar a especialidade de MMA, foi mobilizado para a Guiné, para prestar serviço na BA-12, embarcou em 02/10/1968, foi integrado na Esquadrilha de manutenção dos Allouette III, teve como Comandante da Base o Cor Tir Pilav Manuel Diogo Neto, ficou no CTIG até 17/05/70, coincidinmdo portanto a sua comissão com o Gen Spínola, enquanto Com-Chefe e Governador Geral).
Foto: Cortesia do blogue do Victor Barata, Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 1965/74
Continuação da publicação das versões, em português e em inglês, do paper que o Matt Hurley, Ten Cor da USAF (na foto, à esquerda), teve a gentileza de nos enviar, com o resumo da sua tese de doutoramento, a decorrer na Universidade do Estado de Ohio, EUA. Tradução do nosso camarada e amigo Miguel Pessoa (na foto, à direita), antigo Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, Guiné (1972/74).
O nosso reconhecimento também aos membros do nosso blogue Alberto Branquinho, João Seabra e Vasco da Gama que puseram à nossa disposição as suas competências linguísticas e deram uma ajudinha ao Miguel, com sugestões de melhoria do texto, em português (*):
Súmula da tese de doutoramento de Matthew M. Hurley,Ten Cor da Força Aérea dos EUA:Departamento de HistóriaUniversidade do Estado de Ohio
Data: 23 de Fevereiro de 2009
Orientador: Prof Guilmartin John F., Jr.
Título do Trabalho:
"O ímpio Grail: O Poder Aéreo do Governo e a Defesa Aérea dos revoltosos na Guiné Portuguesa, 1963-1974". (**)
(...) 4. Questões para orientar a investigação.
A primeira questão que pretendo abordar diz respeito ao valor do Poder Aéreo numa campanha de contra-insurreição. Para atingir este objectivo, irei primeiro analisar os papéis e as missões da FAP na Guiné-Bissau, bem como as provas relativas ao sucesso ou insucesso das operações aéreas.
Talvez mais importante ainda, deve ser considerada a percepção do Poder Aéreo que existia por parte das forças terrestres, especificamente até que ponto elas contavam com o apoio da FAP, e o impacto subsequente, quando esse apoio foi retirado ou reduzido.
Correspondentemente, deve ser também considerada a importância da defesa aérea para os insurrectos. A percepção que o PAIGC tinha do Poder Aéreo Português - e a sua reacção a ele - pode dar-nos a bitola o proporcionar-nos talvez o melhor meio de medir a eficácia das operações da FAP.
Claramente, o PAIGC atribuía uma importância considerável à necessidade de defesa aérea, o que irei esforçar-me por demonstrar na dissertação. A título de exemplo, o PAIGC e o seu líder, Amílcar Cabral, investiram um capital diplomático considerável na aquisição de armas de defesa aérea.
Por conseguinte, também pretendo explorar o impacto do apoio externo aos movimentos insurrectos, bem como as razões que motivaram nações como a União Soviética a fornecer armas cada vez mais sofisticados a grupos de guerrilheiros no território de um membro da NATO.
De uma forma mais crítica, pretendo tentar avaliar a forma como a perda de um punhado de aviões da FAP provocou um impacto tão profundo nas operações aéreas dos portugueses, na guerra na Guiné-Bissau, e em toda a estrutura do império.
Esta questão torna-se ainda mais embaraçosa se se tiver em conta o número muito maior de perdas sofridas pela aviação americana devido ao SA-7, no Vietnam durante o ano de 1972, mas sem qualquer efeito apreciável no seu comportamento global na guerra naquele país.
Algo provocou este impacto diferente nos dois casos, suspeitando eu que envolve uma complexa interacção entre a política nacional, a vontade militar, considerações tácticas, a tecnologia do armamento, a rivalidade das superpotências, a motivação dos insurrectos.
A guerra na Guiné-Bissau, tal como qualquer outra insurreição, foi ricamente complexa, porém cada insurreição é complexa à sua própria maneira. Ao desvendar alguma dessa complexidade, pretendo demonstrar a ligação entre o emprego de um míssil portátil de defesa aérea e o colapso de um império.
5. Esboço dos Capítulos.
Os dois primeiros capítulos de fundo irão explorar as motivações e os objectivos dos antagonistas a um nível global, institucional. No que diz respeito ao lado Português, vou basear-me fortemente na apresentação que escrevi para o mais recente seminário de História 801.2, do Prof Beyerchen, intitulado "A Metáfora do Império: Fazer Identidade, Guerra, e Revolução durante o período do Estado Novo em Portugal".
Este capítulo irá examinar as razões que levaram Portugal a combater para manter o seu Império Africano, com a convicção aparente do Estado Novo de que a futura sobrevivência de uma política portuguesa independente passava pela manutenção da estrutura do império.
Um capítulo idêntico, explorando as motivações do PAIGC, irá analisar o desenvolvimento dos seus programas político e militar, a sua campanha para mobilizar o apoio das populações, e o deliberado desenvolvimento de um nacionalismo inter-étnico para unir etnias antagónicas guineenses contra o inimigo comum colonialista.
Usando o programa do PAIGC como um trampolim, o terceiro capítulo de fundo analisará o início e a condução da guerra a partir de uma perspectiva macro. Em particular, este capítulo analisará as estratégias políticas e militares das forças Portuguesas e do PAIGC, detalhando a forma como as estratégias em conflito se influenciaram mutuamente ao longo do conflito.
O capítulo seguinte irá fazer o mesmo numa perspectiva centrada no campo aéreo. Com base nos trabalhos em curso para o seminário de História 767 do Prof. Mansoor, este capítulo analisará a evolução das operações aéreas da FAP e as actividades de defesa aérea do PAIGC. Requisitos operacionais e estratégicos fluidos, e a resposta do inimigo, todos eles condicionaram as actividades aéreas, com cada lado tentando obter ou manter um controlo suficiente do ar para permitir alcançar os seus objectivos estratégicos mais importantes.
O quinto capítulo irá divergir ligeiramente da narrativa global e examinar a guerra a partir da perspectiva das potências exteriores, sobretudo no que diz respeito ao Poder Aéreo.
Para os portugueses, este foi principalmente um estudo das limitações, dadas as restrições impostas pelos E.U.A. e NATO quanto ao material que a FAP podia desviar para a luta na Guiné.
Para o PAIGC, por outro lado, é essencialmente um avolumar de oportunidades à medida que Amílcar Cabral e os seus sucessores travavam uma cada vez mais bem sucedida campanha pela ajuda militar por parte do bloco comunista.
Este capítulo analisará também o desenvolvimento de sistemas específicos de defesa aérea que foram mais tarde usados na Guiné-Bissau, incidindo sobre a sua adequação à guerra de guerrilha e o seu uso em conflitos anteriores, a fim de fornecer uma perspectiva para o seu posterior emprego pelo PAIGC.
Esta utilização final é objecto do sexto capítulo, que vai analisar a guerra aérea na Guiné-Bissau de 1973 a 1974. Este foi o período em que o PAIGC usou pela primeira vez o míssil portátil soviético ZPRK Strela-2M (Código NATO SA-7 Grail), que inicialmente reduziu a eficácia da FAP; embora as tácticas usadas mais tarde limitassem a eficiência dos mísseis, as perdas sofridas inicialmente e o seu impacto na eficácia da FAP continuaram a limitar as operações aéreas dos portugueses até ao fim da guerra.
Também durante este período, Portugal recebeu relatos de que a União Soviética estaria a treinar pilotos do PAIGC para pilotar MiGs baseados na vizinha Guiné-Conakri, um programa que teria neutralizado definitivamente a superioridade aérea dos portugueses se fosse implementada (a FAP não dispunha de aviões específicos para o combate ar-ar).
O capítulo seguinte, que é o capítulo de fundo final, irá explorar o impacto desses acontecimentos no moral dos militares portugueses, na estabilidade política e no golpe de estado de Abril de 1974 que praticamente trouxe um fim à guerra.
Um capítulo conclusivo tentará retirar lições relevantes para o actuais desafios de insurreição com que se defrontam hoje os Estados Unidos e os seus aliados.
6. Bibliografia corrente.
Por favor, veja o apêndice em anexo, "Bibliografia Provisória."
APROVADO:
O professor John F. Guilmartin, Jr. Professor Alan Beyerchen (...)
[A continuar - Parte III]
______
[Versão original, em inglês. Continuação]
Dissertation Prospectus for Matthew M. Hurley, Department of History, The Ohio State UniversityDate: 23 February 2009. Advisor: Prof. John F. Guilmartin, Jr.
Working Title: The “Unholy GRAIL: Government Airpower and Insurgent Air Defense in Portuguese Guinea, 1963-1974.”
(...) 4. Questions to Guide Research.
The first question I intend to address regards the value of airpower in a counterinsurgency campaign. In order to assess this, I will first examine the FAP’s roles and missions in Guinea-Bissau, as well as evidence pertaining to the success or failure of air operations. Perhaps most importantly, the Portuguese ground forces’ perception of airpower must be considered, specifically the degree to which they relied on FAP support, and the subsequent impact when that support was withdrawn or curtailed. Correspondingly, the importance of air defense to the insurgents must also be considered. The PAIGC’s perception of Portuguese airpower—and their reaction to it—provide perhaps the most persuasive metric by which to measure the effectiveness of FAP operations.
Clearly, the PAIGC attached considerable importance to the requirements of air defense, which I will endeavor to demonstrate in the dissertation. By way of example, the PAIGC and its leader, Amílcar Cabral, invested considerable diplomatic capital in the acquisition of air defense weaponry. Consequently, I also intend to explore the impact of external support to insurgent movements, as well as the factors that motivated nations such as the Soviet Union to provide increasingly-sophisticated arms to guerrilla bands in a NATO member’s territory.
Most critically, I intend to try to assess how the loss of a handful of FAP aircraft exerted such a profound impact on Portuguese air operations, the war in Guinea-Bissau, and the entire imperial enterprise. This question becomes more perplexing in light of the fact that US air arms suffered far more losses to the SA-7 system in Vietnam during 1972, but without any appreciable effect on its overall conduct of the war there. Something accounts for this difference in impact, and I suspect it involves a complex interplay between national policy, military will, tactical considerations, weapons technology, superpower rivalry, and insurgent motivation. The war in Guinea-Bissau, like any other insurgency, was richly complex; however, like Tolstoy’s unhappy families, each insurgency is complex in its own way. By unraveling some of that complexity, I intend to demonstrate the link between the employment of a shoulder-fired air defense missile and the collapse of an empire.
5. Chapter Outline.
The first two substantive chapters will explore the motives and objectives of the antagonists from a macro, institutional level. Regarding the Portuguese side, I will draw heavily from the paper I wrote for Prof. Beyerchen’s latest History 801.2 seminar, entitled “The Empire Metaphor: Making Identity, War, and Rebellion during Portugal’s Estado Novo Era.” This chapter will examine Portugal’s rationale for fighting to maintain its African Empire, including the Estado Novo’s apparent conviction that the future survival of an independent Portuguese polity necessitated the maintenance of imperial stature.
A similar chapter exploring the PAIGC’s motives will examine the development of its political and military programs, its campaign to mobilize peasant support, and its deliberate development of an inter-ethnic nationalism to unite antagonistic Guinean ethnicities against a common colonialist foe.
Using the PAIGC program as a springboard, the third substantive chapter will examine the initiation and conduct of the war from a macro perspective. In particular, this chapter will consider the evolving military and political strategies of the Portuguese forces and the PAIGC, detailing how the contending strategies influenced each other over the course of the conflict.
The following chapter will do much the same from an air-centric perspective. Drawing on work currently in progress for Prof. Mansoor’s History 767 seminar, this chapter will examine the evolution of FAP air operations and PAIGC air defense activities. Available equipment, fluid operational and strategic requirements, and enemy response all conditioned these aerial activities as each side attempted to gain or maintain sufficient control of the air to enable the attainment of their larger strategic aims.
The fifth substantive chapter will diverge slightly from the overall narrative and examine the war from the perspective of outside powers, particularly where airpower was concerned. For the Portuguese, this was largely a study in constraints, given US and NATO restrictions on what the FAP was able to bring to the Guinean fight. For the PAIGC, on the other hand, it is primarily a tale of expanding opportunities as Amílcar Cabral and his successors waged an increasingly successful campaign for military aid from the Communist bloc. This chapter will also examine the development of specific air defense systems that were later used in Guinea-Bissau, focusing on their suitability to guerrilla warfare and their use in earlier conflicts in order to provide context to their later employment by the PAIGC.
That later employment provides the sixth substantive chapter, which will examine the air war in Guinea Bissau from 1973 to 1974. This was the period when the PAIGC first used the Soviet ZPRK Strela-2M (NATO SA-7 GRAIL) shoulder-fired missile, which initially hindered the FAP’s effectiveness; although subsequent Portuguese counter-tactics later curtailed the missile’s efficiency, the initial spate of losses and their impact on FAP effectiveness continued to limit Portuguese air operations for the remainder of the war.
Also during this period, Portugal received reports that the Soviet Union was training PAIGC MiG pilots to be based in neighboring Guinea-Conakry, a program which would have definitively neutralized Portuguese air superiority if implemented (the FAP had no dedicated air-to-air fighters in Guinea-Bissau). The following chapter, the final substantive one, will explore the impact of these events on Portuguese military morale, political stability, and the April 1974 coup d’etat that for all intents and purposes brought the war to an end. A concluding chapter will attempt to distill lessons relevant to the current insurgent challenges facing the United States and its allies today.
6. Current Bibliography.
Please see the attached appendix, “Provisional Bibliography.”
APPROVED:
Professor John F. Guilmartin, Jr. Professor Alan Beyerchen
ADVISOR COMMITTEE MEMBER
[To be continued - Part III]
__________
Notas de L.G.:
(*) Vd. poste 26 de Maio de 2009 >Guiné 63/74 - P4418: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (1): Parte I
Vd. também poste de 16 de Abril de 2009 >Guiné 63/74 - P4197: FAP (23): O poder aéreo no CTIG, 'case study' numa tese de doutoramento nos EUA (Matt Hurley / Luís Graça)
(**) Em inglês, "unholy Grail" também poderia ser traduzido por "ímpio Graal", por oposição a Santo Graal... O autor faz aqui uso de um trocadilho: Grail, nome de código do Strela soviético no campo da Nato, é também Graal... Nas lendas e na literatura da Idade Média, o Santo Graal pode designar várias coisas, mas normalmente refere-se ao cálice usado na Última Ceia por Jesus Cristo. Nas lendas do Rei Artur, cabe aos Cavaleiros da Távola Redonda encontrar o Santo Graal, talismã que vai permitir devolver a paz às terras do Rei... No caso da Guiné, para os portugueses o Graal (o Strela) não é santo mas ímpio, porque traz com ele não a paz, mas a escalada da guerra...
Foto: Cortesia do blogue do Victor Barata, Especialistas da Base Aérea 12, Guiné 1965/74
Continuação da publicação das versões, em português e em inglês, do paper que o Matt Hurley, Ten Cor da USAF (na foto, à esquerda), teve a gentileza de nos enviar, com o resumo da sua tese de doutoramento, a decorrer na Universidade do Estado de Ohio, EUA. Tradução do nosso camarada e amigo Miguel Pessoa (na foto, à direita), antigo Ten Pilav, BA 12, Bissalanca, Guiné (1972/74).
O nosso reconhecimento também aos membros do nosso blogue Alberto Branquinho, João Seabra e Vasco da Gama que puseram à nossa disposição as suas competências linguísticas e deram uma ajudinha ao Miguel, com sugestões de melhoria do texto, em português (*):
Súmula da tese de doutoramento de Matthew M. Hurley,Ten Cor da Força Aérea dos EUA:Departamento de HistóriaUniversidade do Estado de Ohio
Data: 23 de Fevereiro de 2009
Orientador: Prof Guilmartin John F., Jr.
Título do Trabalho:
"O ímpio Grail: O Poder Aéreo do Governo e a Defesa Aérea dos revoltosos na Guiné Portuguesa, 1963-1974". (**)
(...) 4. Questões para orientar a investigação.
A primeira questão que pretendo abordar diz respeito ao valor do Poder Aéreo numa campanha de contra-insurreição. Para atingir este objectivo, irei primeiro analisar os papéis e as missões da FAP na Guiné-Bissau, bem como as provas relativas ao sucesso ou insucesso das operações aéreas.
Talvez mais importante ainda, deve ser considerada a percepção do Poder Aéreo que existia por parte das forças terrestres, especificamente até que ponto elas contavam com o apoio da FAP, e o impacto subsequente, quando esse apoio foi retirado ou reduzido.
Correspondentemente, deve ser também considerada a importância da defesa aérea para os insurrectos. A percepção que o PAIGC tinha do Poder Aéreo Português - e a sua reacção a ele - pode dar-nos a bitola o proporcionar-nos talvez o melhor meio de medir a eficácia das operações da FAP.
Claramente, o PAIGC atribuía uma importância considerável à necessidade de defesa aérea, o que irei esforçar-me por demonstrar na dissertação. A título de exemplo, o PAIGC e o seu líder, Amílcar Cabral, investiram um capital diplomático considerável na aquisição de armas de defesa aérea.
Por conseguinte, também pretendo explorar o impacto do apoio externo aos movimentos insurrectos, bem como as razões que motivaram nações como a União Soviética a fornecer armas cada vez mais sofisticados a grupos de guerrilheiros no território de um membro da NATO.
De uma forma mais crítica, pretendo tentar avaliar a forma como a perda de um punhado de aviões da FAP provocou um impacto tão profundo nas operações aéreas dos portugueses, na guerra na Guiné-Bissau, e em toda a estrutura do império.
Esta questão torna-se ainda mais embaraçosa se se tiver em conta o número muito maior de perdas sofridas pela aviação americana devido ao SA-7, no Vietnam durante o ano de 1972, mas sem qualquer efeito apreciável no seu comportamento global na guerra naquele país.
Algo provocou este impacto diferente nos dois casos, suspeitando eu que envolve uma complexa interacção entre a política nacional, a vontade militar, considerações tácticas, a tecnologia do armamento, a rivalidade das superpotências, a motivação dos insurrectos.
A guerra na Guiné-Bissau, tal como qualquer outra insurreição, foi ricamente complexa, porém cada insurreição é complexa à sua própria maneira. Ao desvendar alguma dessa complexidade, pretendo demonstrar a ligação entre o emprego de um míssil portátil de defesa aérea e o colapso de um império.
5. Esboço dos Capítulos.
Os dois primeiros capítulos de fundo irão explorar as motivações e os objectivos dos antagonistas a um nível global, institucional. No que diz respeito ao lado Português, vou basear-me fortemente na apresentação que escrevi para o mais recente seminário de História 801.2, do Prof Beyerchen, intitulado "A Metáfora do Império: Fazer Identidade, Guerra, e Revolução durante o período do Estado Novo em Portugal".
Este capítulo irá examinar as razões que levaram Portugal a combater para manter o seu Império Africano, com a convicção aparente do Estado Novo de que a futura sobrevivência de uma política portuguesa independente passava pela manutenção da estrutura do império.
Um capítulo idêntico, explorando as motivações do PAIGC, irá analisar o desenvolvimento dos seus programas político e militar, a sua campanha para mobilizar o apoio das populações, e o deliberado desenvolvimento de um nacionalismo inter-étnico para unir etnias antagónicas guineenses contra o inimigo comum colonialista.
Usando o programa do PAIGC como um trampolim, o terceiro capítulo de fundo analisará o início e a condução da guerra a partir de uma perspectiva macro. Em particular, este capítulo analisará as estratégias políticas e militares das forças Portuguesas e do PAIGC, detalhando a forma como as estratégias em conflito se influenciaram mutuamente ao longo do conflito.
O capítulo seguinte irá fazer o mesmo numa perspectiva centrada no campo aéreo. Com base nos trabalhos em curso para o seminário de História 767 do Prof. Mansoor, este capítulo analisará a evolução das operações aéreas da FAP e as actividades de defesa aérea do PAIGC. Requisitos operacionais e estratégicos fluidos, e a resposta do inimigo, todos eles condicionaram as actividades aéreas, com cada lado tentando obter ou manter um controlo suficiente do ar para permitir alcançar os seus objectivos estratégicos mais importantes.
O quinto capítulo irá divergir ligeiramente da narrativa global e examinar a guerra a partir da perspectiva das potências exteriores, sobretudo no que diz respeito ao Poder Aéreo.
Para os portugueses, este foi principalmente um estudo das limitações, dadas as restrições impostas pelos E.U.A. e NATO quanto ao material que a FAP podia desviar para a luta na Guiné.
Para o PAIGC, por outro lado, é essencialmente um avolumar de oportunidades à medida que Amílcar Cabral e os seus sucessores travavam uma cada vez mais bem sucedida campanha pela ajuda militar por parte do bloco comunista.
Este capítulo analisará também o desenvolvimento de sistemas específicos de defesa aérea que foram mais tarde usados na Guiné-Bissau, incidindo sobre a sua adequação à guerra de guerrilha e o seu uso em conflitos anteriores, a fim de fornecer uma perspectiva para o seu posterior emprego pelo PAIGC.
Esta utilização final é objecto do sexto capítulo, que vai analisar a guerra aérea na Guiné-Bissau de 1973 a 1974. Este foi o período em que o PAIGC usou pela primeira vez o míssil portátil soviético ZPRK Strela-2M (Código NATO SA-7 Grail), que inicialmente reduziu a eficácia da FAP; embora as tácticas usadas mais tarde limitassem a eficiência dos mísseis, as perdas sofridas inicialmente e o seu impacto na eficácia da FAP continuaram a limitar as operações aéreas dos portugueses até ao fim da guerra.
Também durante este período, Portugal recebeu relatos de que a União Soviética estaria a treinar pilotos do PAIGC para pilotar MiGs baseados na vizinha Guiné-Conakri, um programa que teria neutralizado definitivamente a superioridade aérea dos portugueses se fosse implementada (a FAP não dispunha de aviões específicos para o combate ar-ar).
O capítulo seguinte, que é o capítulo de fundo final, irá explorar o impacto desses acontecimentos no moral dos militares portugueses, na estabilidade política e no golpe de estado de Abril de 1974 que praticamente trouxe um fim à guerra.
Um capítulo conclusivo tentará retirar lições relevantes para o actuais desafios de insurreição com que se defrontam hoje os Estados Unidos e os seus aliados.
6. Bibliografia corrente.
Por favor, veja o apêndice em anexo, "Bibliografia Provisória."
APROVADO:
O professor John F. Guilmartin, Jr. Professor Alan Beyerchen (...)
[A continuar - Parte III]
______
[Versão original, em inglês. Continuação]
Dissertation Prospectus for Matthew M. Hurley, Department of History, The Ohio State UniversityDate: 23 February 2009. Advisor: Prof. John F. Guilmartin, Jr.
Working Title: The “Unholy GRAIL: Government Airpower and Insurgent Air Defense in Portuguese Guinea, 1963-1974.”
(...) 4. Questions to Guide Research.
The first question I intend to address regards the value of airpower in a counterinsurgency campaign. In order to assess this, I will first examine the FAP’s roles and missions in Guinea-Bissau, as well as evidence pertaining to the success or failure of air operations. Perhaps most importantly, the Portuguese ground forces’ perception of airpower must be considered, specifically the degree to which they relied on FAP support, and the subsequent impact when that support was withdrawn or curtailed. Correspondingly, the importance of air defense to the insurgents must also be considered. The PAIGC’s perception of Portuguese airpower—and their reaction to it—provide perhaps the most persuasive metric by which to measure the effectiveness of FAP operations.
Clearly, the PAIGC attached considerable importance to the requirements of air defense, which I will endeavor to demonstrate in the dissertation. By way of example, the PAIGC and its leader, Amílcar Cabral, invested considerable diplomatic capital in the acquisition of air defense weaponry. Consequently, I also intend to explore the impact of external support to insurgent movements, as well as the factors that motivated nations such as the Soviet Union to provide increasingly-sophisticated arms to guerrilla bands in a NATO member’s territory.
Most critically, I intend to try to assess how the loss of a handful of FAP aircraft exerted such a profound impact on Portuguese air operations, the war in Guinea-Bissau, and the entire imperial enterprise. This question becomes more perplexing in light of the fact that US air arms suffered far more losses to the SA-7 system in Vietnam during 1972, but without any appreciable effect on its overall conduct of the war there. Something accounts for this difference in impact, and I suspect it involves a complex interplay between national policy, military will, tactical considerations, weapons technology, superpower rivalry, and insurgent motivation. The war in Guinea-Bissau, like any other insurgency, was richly complex; however, like Tolstoy’s unhappy families, each insurgency is complex in its own way. By unraveling some of that complexity, I intend to demonstrate the link between the employment of a shoulder-fired air defense missile and the collapse of an empire.
5. Chapter Outline.
The first two substantive chapters will explore the motives and objectives of the antagonists from a macro, institutional level. Regarding the Portuguese side, I will draw heavily from the paper I wrote for Prof. Beyerchen’s latest History 801.2 seminar, entitled “The Empire Metaphor: Making Identity, War, and Rebellion during Portugal’s Estado Novo Era.” This chapter will examine Portugal’s rationale for fighting to maintain its African Empire, including the Estado Novo’s apparent conviction that the future survival of an independent Portuguese polity necessitated the maintenance of imperial stature.
A similar chapter exploring the PAIGC’s motives will examine the development of its political and military programs, its campaign to mobilize peasant support, and its deliberate development of an inter-ethnic nationalism to unite antagonistic Guinean ethnicities against a common colonialist foe.
Using the PAIGC program as a springboard, the third substantive chapter will examine the initiation and conduct of the war from a macro perspective. In particular, this chapter will consider the evolving military and political strategies of the Portuguese forces and the PAIGC, detailing how the contending strategies influenced each other over the course of the conflict.
The following chapter will do much the same from an air-centric perspective. Drawing on work currently in progress for Prof. Mansoor’s History 767 seminar, this chapter will examine the evolution of FAP air operations and PAIGC air defense activities. Available equipment, fluid operational and strategic requirements, and enemy response all conditioned these aerial activities as each side attempted to gain or maintain sufficient control of the air to enable the attainment of their larger strategic aims.
The fifth substantive chapter will diverge slightly from the overall narrative and examine the war from the perspective of outside powers, particularly where airpower was concerned. For the Portuguese, this was largely a study in constraints, given US and NATO restrictions on what the FAP was able to bring to the Guinean fight. For the PAIGC, on the other hand, it is primarily a tale of expanding opportunities as Amílcar Cabral and his successors waged an increasingly successful campaign for military aid from the Communist bloc. This chapter will also examine the development of specific air defense systems that were later used in Guinea-Bissau, focusing on their suitability to guerrilla warfare and their use in earlier conflicts in order to provide context to their later employment by the PAIGC.
That later employment provides the sixth substantive chapter, which will examine the air war in Guinea Bissau from 1973 to 1974. This was the period when the PAIGC first used the Soviet ZPRK Strela-2M (NATO SA-7 GRAIL) shoulder-fired missile, which initially hindered the FAP’s effectiveness; although subsequent Portuguese counter-tactics later curtailed the missile’s efficiency, the initial spate of losses and their impact on FAP effectiveness continued to limit Portuguese air operations for the remainder of the war.
Also during this period, Portugal received reports that the Soviet Union was training PAIGC MiG pilots to be based in neighboring Guinea-Conakry, a program which would have definitively neutralized Portuguese air superiority if implemented (the FAP had no dedicated air-to-air fighters in Guinea-Bissau). The following chapter, the final substantive one, will explore the impact of these events on Portuguese military morale, political stability, and the April 1974 coup d’etat that for all intents and purposes brought the war to an end. A concluding chapter will attempt to distill lessons relevant to the current insurgent challenges facing the United States and its allies today.
6. Current Bibliography.
Please see the attached appendix, “Provisional Bibliography.”
APPROVED:
Professor John F. Guilmartin, Jr. Professor Alan Beyerchen
ADVISOR COMMITTEE MEMBER
[To be continued - Part III]
__________
Notas de L.G.:
(*) Vd. poste 26 de Maio de 2009 >Guiné 63/74 - P4418: O poder aéreo no CTIG: uma pesquisa de Matthew M. Hurley, Ten Cor, USAF: Trad. de Miguel Pessoa (1): Parte I
Vd. também poste de 16 de Abril de 2009 >Guiné 63/74 - P4197: FAP (23): O poder aéreo no CTIG, 'case study' numa tese de doutoramento nos EUA (Matt Hurley / Luís Graça)
(**) Em inglês, "unholy Grail" também poderia ser traduzido por "ímpio Graal", por oposição a Santo Graal... O autor faz aqui uso de um trocadilho: Grail, nome de código do Strela soviético no campo da Nato, é também Graal... Nas lendas e na literatura da Idade Média, o Santo Graal pode designar várias coisas, mas normalmente refere-se ao cálice usado na Última Ceia por Jesus Cristo. Nas lendas do Rei Artur, cabe aos Cavaleiros da Távola Redonda encontrar o Santo Graal, talismã que vai permitir devolver a paz às terras do Rei... No caso da Guiné, para os portugueses o Graal (o Strela) não é santo mas ímpio, porque traz com ele não a paz, mas a escalada da guerra...
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Guiné 63/74 - P4422: Bibliografia de uma guerra (47): Coutinho e Lima fala do seu livro "A Retirada de Guileje" (José Martins)
1. A propósito da apresentação do livro "A Retirada de Guileje" feita pelo seu autor, Coronel Reformado Alexandre da Costa Coutinho e Lima, integrado no 2.º Ciclo de Conferências "Memórias Literárias da Guerra Colonial", no dia 14 de Maio na Biblioteca-Museu República e Resistência/Grandela, o nosso camarada José Martins (*) envou-nos este trabalho para publicação.
Conferência sobre a Retirada de Guilege
Apresentação do conferencista pelo anfitrião José Paulo Sousa, da Biblioteca-Museu República e Resistência, Espaço Grandela.
© Foto José Martins
Durante esta segunda fase de conferências sobre literatura da guerra colonial, coube a apresentação do livro "A RETIRADA DE GUILEJE", da autoria do Coronel de Artilharia, na reforma, Alexandre da Costa Coutinho e Lima.
Como referiu o anfitrião José Paulo, não se trata de um livro de ficção, mas de um documento histórico, não só vivido pelo autor, mas pelas duas centenas de homens que, na altura, constituíam a guarnição de Guileje.
Como é meu hábito, não faço comentários a escritos dos camaradas de armas. Cada vivência é uma vivência e, cada soldado é um soldado, por detrás do qual se esconde um Homem, que tem reacções e sentimentos diferentes, o que proporciona o grande conjunto que todos somos. Prefiro referir factos, que por si mesmos, revelam ou, ajudam a revelar, o que cada um sentiu ao envergar uma farda, tenha sido do quadro ou conscrito, tenha sido profissional ou alistado.
Coutinho e Lima foi um dos poucos militares profissionais que, durante o período em que decorreu a guerra, cumpriu todas as suas comissões de serviço na Guiné.
No seu livro, 1.ª edição a páginas 15, escreve:
- Na 1.ª comissão, no período de 63/65, como Capitão, fui Comandante da Companhia de Artilharia n.º 494 (CART 494), que passou a maior parte do tempo em GADAMAEL (DEZ63 a MAI65), foi a primeira Companhia que esteve aquartelada nesta localidade.
Sobre a CART 494, passamos a referir alguns factos, conjugando a Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África – 1961/1974:
A Companhia de Artilharia n.º 494, foi mobilizada no Regimento de Artilharia Pesada n.º 2, na Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia.
Quase até ao momento do embarque, a subunidade estava destinada à região de Montepuez, na província de Moçambique. Foi porém desviada e, em 17 de Julho de 1963 embarca em Lisboa, rumo à Guiné, chegando a Bissau em 22 desse mesmo mês.
Fica estacionada em Bissau, após o que se dirige para Ganjola em 15 de Setembro de 1963, para ocupação da localidade e efectuar operações nas regiões de Tombali e Cubucaré.
No período de 17 de Setembro a 15 de Dezembro de 1963, fica integrada no dispositivo do Batalhão de Caçadores 356.
Com a criação do subsector de Gadamael, criado em 19 de Dezembro de 1963, assume a responsabilidade deste subsector, na dependência e dispositivo do Batalhão de Caçadores n.º 513, tendo sido substituído, em Ganjola, por um pelotão da Companhia de Caçadores n.º 414.
Realiza várias operações na área Bomane e Sangonhá, destacando-se as operações “Toca” e “Jacaré”, onde captura material e provoca baixas ao inimigo, sendo de referir, também, uma reacção a um ataque a Gadamael.
É neste período que regista as seguintes baixas:
- Manuel Tavares da Costa, Alferes Miliciano de Artilharia, falecido em 26 de Janeiro de 1964, por ferimentos em combate em Gadamael-Porto, tendo sido inumado no Cemitério de Alvarenga;
- Albino Mendes Carvalho, Soldado Atirador, falecido em 23 de Outubro de 1964, vítima de afogamento, tendo sido inumado no Cemitério de Bissau, campa nº 1280;
- Armando Barreiro de Amorim, Soldado Atirador, falecido no Hospital Militar Principal, em Lisboa, em 23 de Outubro de 1964, depois de ter sido ferido em combate na região de Gadamael, tendo sido inumado no Cemitério de Arcos de Valdevez.
Inicia o deslocamento para Bissau em 16 de Maio, por troca com a Companhia de Caçadores n.º 798, tendo terminado o deslocamento em 28 de Maio de 1965.
Em 29 de Maio de 1965 passa a integrar o dispositivo de manobra do Batalhão de Caçadores n.º 513 e depois o do Batalhão de Caçadores n.º 1857, tendo ficado com a missão de segurança e defesa das instalações e população da área de Bissau.
Entre 27 de Julho e meados de Agosto de 1965, desloca, temporariamente, dois pelotões para Gadamael e Ganturé, em reforço das guarnições locais.
É rendida pela Companhia de Caçadores n.º 1426 em 24 de Agosto de 1965, para efectuar o embarque de regresso.
Aspecto da sala no inicio da sessão.
© Foto José Martins
Na segunda comissão, também cumprida na Guiné, exerceu a sua especialidade de Observador Aéreo de Artilharia, especialidade que tem desde 1957, ano em que terminou a sua passagem pela Escola do Exército, hoje, Academia Militar de Artilharia, tendo sido colocado no Quartel-General, em Bissau.
Na página, acima referida do seu livro, escreve sobre esta comissão:
- Na 2.ª Comissão, no período de 68/70, ainda Capitão, desempenhei as funções de Adjunto da Repartição de Operações do Quartel-General do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné (QG/CCFAG). A minha colocação deveu-se ao facto de ser Observador Aéreo de Artilharia, que era Especialidade de Mobilização.
O conferencista ouvindo a apresentação do anfitrião.
© Foto José Martins
Recorrendo, de novo, a introdução do livro "A RETIRADA DE GUILEJE", na página 15, transcrevemos a referência sobre a última comissão:
- Na 3.ª Comissão, no período de 72/74, com o posto de Major, fui mobilizado em rendição individual e colocado, inicialmente, no Centro de Instrução Militar (CIM) em Bolama; nomeado Comandante do COP 5, desempenhei as funções desde 22JAB73 até 22MAI73. Na sequência da decisão que tomei de RETIRAR DE GUILEJE, passei à situação de prisão preventiva, desde 22MAI73 até 12MAI74, enquanto me foi instaurado um Auto de Corpo de Delito.
A “ala” feminina – Uma professora do ISCTE e duas enfermeiras paraquedistas.
© Foto José Martins
Na sala, sobre cada uma das cadeiras, podia ver-se um folheto, que abaixo reproduzimos, fazendo uma súmula do livro que ia ser apresentado, para os visitantes do blogue, que ainda não tenham tido a oportunidade de ler o livro, tenham uma pequena visão deste acontecimento histórico, em que um Comandante/Homem, praticamente sozinho, tem que tomar uma decisão, sobre a sorte de centenas de pessoas que lhe estavam confiadas.
Apresentação do livro “A RETIRADA DE GUILEJE” – 14MAI2009
Biblioteca-Museu República e Resistência – Espaço Grandela
Em 04SET72, com o posto de Major, iniciei a terceira comissão por imposição, na Guiné.
Em 08JAN73 fui nomeado, pelo Sr. Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, Sr. General ANTÓNIO DE SPÍNOLA, Comandante do Comando Operacional n.º 5 (COP 5), com sede em Guileje. Na zona de Acção do COP 5 passava o Corredor de GUILEJE, através do qual o PAIGC introduzia 70 a 80% dos abastecimentos (armas, munições e outros), para todo o território da GUINÉ.
Em 25MAR73, foi abatido na região de GUILEJE o primeiro avião a jacto FIAT G-91, atingido por um missel terra-ar STRELA; o piloto foi recuperado com um pé partido. O aparecimento destes mísseis provocou grandes alterações e limitações no emprego da nossa Força Aérea.
Em 18MAI73 pelas 7:00 horas, 2 Grupos de Combate e 1 Pelotão de Milícias, saídos de GUILEJE, foram emboscados por um grupo Inimigo (IN) estimado em 100 elementos; as Nossas Tropas (NT) sofreram 1 Morto, 7 feridos graves (um dos quais veio a falecer 4 horas mais tarde por falta de evacuação) e 4 feridos ligeiros. Em 11MAI73, o Sr. General SPÍNOLA, na sua última visita a GUILEJE, afirmara, perante a formatura geral de todos os militares que, não obstante os condicionamentos da actuação da Força Aérea, esta faria a evacuação dos feridos graves; esta promessa não foi cumprida.
Face à situação, solicitei a ida a GUILEJE da Delegados da Repartição de Operações e da Força Aérea; porque estes não apareceram, desloquei-me no dia seguinte (19MAI73) a CACINE, comandando a evacuação das baixas da emboscada, através do rio; esperava lá encontrar os Delegados referidos. No dia 20MAI, ao fim da tarde, fui transportado de helicóptero a BISSAU, onde apresentei ao Sr. General SPÍNOLA, a necessidade de reforços, já solicitada antes por mensagem; respondeu-me que não me dava qualquer reforço, que devia regressar na manhã seguinte a GUILEJE e que ia mandar para lá o Sr. Coronel Pára-quedista RAFAEL DURÃO, passando eu a 2.º Comandante.
Cheguei a GUILEJE ao fim do dia 21MAI, depois de me ter deslocado de sintex (barco com motor fora de borda) de CACINE (onde a Força Aérea me deixou) para GADAMAEL; o percurso de Gadamael para GUILEJE foi feito em coluna apeada, utilizando um trilho da população, durante o trajecto, ouvimos a flagelação que GUILEJE estava a sofrer, a mais violenta de todas, que provocou a morte de um Furriel Miliciano e vários estragos materiais, entre os quais a destruição total do Centro de Comunicações, incluindo as antenas, o que impedia a ligação rádio com qualquer entidade.
Face à forte pressão do IN, à não atribuição de reforços e a outros factores (falta de água no quartel, escassez de munições de artilharia, não evacuação de feridos, etc) decidi retirar para GADAMAEL, no dia seguinte ao romper do dia, todos os militares (cerca de 200) e toda a população (cerca de 500 elementos), por considerar a posição insustentável. A alternativa era aguardar a chegada do Sr. Coronel Durão, que eu não sabia quando se iria verificar e que, em minha opinião, não resolveria a situação, porque, seguramente, não viria acompanhado de reforços, nem tão pouco tinha condições para solucionar os factores atrás referidos e, principalmente, a forte pressão do IN, que cada vez era mais acentuada.
Desde as 20:00 horas do dia 18MAI até às 4:00 horas do dia 22MAI (80 horas), GUILEJE sofreu 37 flagelações. A retirada efectuou-se, em coluna apeada, com pleno êxito, tendo surpreendido totalmente o IN, que continuou a bombardear GUILEJE, onde só entrou em 25MAI73
O Sr. General SPÍNOLA não sancionou a decisão, ordenando a minha prisão preventiva e a instauração de um Auto de Corpo de Delito; estive preso em BISSAU, desde 27MAI73 a 12MAI74. Como consequência do 25ABR74, os crimes que supostamente me eram imputados, foram amnistiados por Decreto-Lei da Junta de Salvação Nacional e o processo foi arquivado.
Os factos descritos são relatados, no livro que agora foi publicado; o processo é, também analisado e criticado, com pormenor; a última parte do livro trata do Simpósio Internacional de GUILEJE, realizado em BISSAU, de 1 a 6 de Março de 2008, em que participei.
O livro “A RETIRADA DE GUILEJE” não está à venda nas livrarias; estou disponível para o enviar, pelo correio, para qualquer parte do MUNDO. Os meus contactos são:
Rua Tomás Figueiredo, n.º 2 – 2.º Esq.
1500-599 Lisboa
Telefone: 217 608 243
Telemóvel: 917 931 226
Email: icoutinholima@gmail.com
Aspecto da sala © Foto José Martins
Com a afabilidade a que me habituou, nos encontros que com o Coronel Coutinho e Lima tive, de pronto me forneceu cópia da cábula que elaborou para desenvolver a sua apresentação. Dela damos nota a seguir:
01. Introdução
02. Nomeação para o COP 5; nenhum reforço
03. Primeiras medidas tomadas em Guileje
. Obras
. Substituição material Artilharia
. Reforços (GC Cacine, Pel Rec Fox e Pel Mil)
04. Abate do 1.º FIAT – 25MAR73
. Restrições de Apoio Aéreo
05. Deserção do Milícia ALIU BARI
06. Última visita do General Comandante-Chefe - 11MAR73
07. Inicio da acção em força sobre Guileje – 18MAI73
08. Período 18/22MAI73 (57 mensagens – pag 45 a 70 do livro)
09. Ida a Bissau – 20MAI73
10. Regresso a Guileje (21MAI73); situação encontrada
11. Factores considerados na decisão da Retirada
12. Preparação da Retirada
13. Chegada a Gadamael; mensagens do Coronel Durão
14. Ida para Bissau; prisão; processo.
O Alferes Miliciano Seabra, comentando os acontecimentos que também viveu na Guiné, nos longínquos anos de 1973. Na foto vê-se o Alberto Branquinho, um dos próximos conferencista destes colóquios
© Foto José Martins
(*) José Martins, ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 21 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4394: Bibliografia de uma guerra (46): "Diário da Guiné, Lama, Sangue e Água Pura" - Comentário de Fátima Teixeira
Conferência sobre a Retirada de Guilege
Apresentação do conferencista pelo anfitrião José Paulo Sousa, da Biblioteca-Museu República e Resistência, Espaço Grandela.
© Foto José Martins
Durante esta segunda fase de conferências sobre literatura da guerra colonial, coube a apresentação do livro "A RETIRADA DE GUILEJE", da autoria do Coronel de Artilharia, na reforma, Alexandre da Costa Coutinho e Lima.
Como referiu o anfitrião José Paulo, não se trata de um livro de ficção, mas de um documento histórico, não só vivido pelo autor, mas pelas duas centenas de homens que, na altura, constituíam a guarnição de Guileje.
Como é meu hábito, não faço comentários a escritos dos camaradas de armas. Cada vivência é uma vivência e, cada soldado é um soldado, por detrás do qual se esconde um Homem, que tem reacções e sentimentos diferentes, o que proporciona o grande conjunto que todos somos. Prefiro referir factos, que por si mesmos, revelam ou, ajudam a revelar, o que cada um sentiu ao envergar uma farda, tenha sido do quadro ou conscrito, tenha sido profissional ou alistado.
Coutinho e Lima foi um dos poucos militares profissionais que, durante o período em que decorreu a guerra, cumpriu todas as suas comissões de serviço na Guiné.
No seu livro, 1.ª edição a páginas 15, escreve:
- Na 1.ª comissão, no período de 63/65, como Capitão, fui Comandante da Companhia de Artilharia n.º 494 (CART 494), que passou a maior parte do tempo em GADAMAEL (DEZ63 a MAI65), foi a primeira Companhia que esteve aquartelada nesta localidade.
Sobre a CART 494, passamos a referir alguns factos, conjugando a Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África – 1961/1974:
A Companhia de Artilharia n.º 494, foi mobilizada no Regimento de Artilharia Pesada n.º 2, na Serra do Pilar, em Vila Nova de Gaia.
Quase até ao momento do embarque, a subunidade estava destinada à região de Montepuez, na província de Moçambique. Foi porém desviada e, em 17 de Julho de 1963 embarca em Lisboa, rumo à Guiné, chegando a Bissau em 22 desse mesmo mês.
Fica estacionada em Bissau, após o que se dirige para Ganjola em 15 de Setembro de 1963, para ocupação da localidade e efectuar operações nas regiões de Tombali e Cubucaré.
No período de 17 de Setembro a 15 de Dezembro de 1963, fica integrada no dispositivo do Batalhão de Caçadores 356.
Com a criação do subsector de Gadamael, criado em 19 de Dezembro de 1963, assume a responsabilidade deste subsector, na dependência e dispositivo do Batalhão de Caçadores n.º 513, tendo sido substituído, em Ganjola, por um pelotão da Companhia de Caçadores n.º 414.
Realiza várias operações na área Bomane e Sangonhá, destacando-se as operações “Toca” e “Jacaré”, onde captura material e provoca baixas ao inimigo, sendo de referir, também, uma reacção a um ataque a Gadamael.
É neste período que regista as seguintes baixas:
- Manuel Tavares da Costa, Alferes Miliciano de Artilharia, falecido em 26 de Janeiro de 1964, por ferimentos em combate em Gadamael-Porto, tendo sido inumado no Cemitério de Alvarenga;
- Albino Mendes Carvalho, Soldado Atirador, falecido em 23 de Outubro de 1964, vítima de afogamento, tendo sido inumado no Cemitério de Bissau, campa nº 1280;
- Armando Barreiro de Amorim, Soldado Atirador, falecido no Hospital Militar Principal, em Lisboa, em 23 de Outubro de 1964, depois de ter sido ferido em combate na região de Gadamael, tendo sido inumado no Cemitério de Arcos de Valdevez.
Inicia o deslocamento para Bissau em 16 de Maio, por troca com a Companhia de Caçadores n.º 798, tendo terminado o deslocamento em 28 de Maio de 1965.
Em 29 de Maio de 1965 passa a integrar o dispositivo de manobra do Batalhão de Caçadores n.º 513 e depois o do Batalhão de Caçadores n.º 1857, tendo ficado com a missão de segurança e defesa das instalações e população da área de Bissau.
Entre 27 de Julho e meados de Agosto de 1965, desloca, temporariamente, dois pelotões para Gadamael e Ganturé, em reforço das guarnições locais.
É rendida pela Companhia de Caçadores n.º 1426 em 24 de Agosto de 1965, para efectuar o embarque de regresso.
Aspecto da sala no inicio da sessão.
© Foto José Martins
Na segunda comissão, também cumprida na Guiné, exerceu a sua especialidade de Observador Aéreo de Artilharia, especialidade que tem desde 1957, ano em que terminou a sua passagem pela Escola do Exército, hoje, Academia Militar de Artilharia, tendo sido colocado no Quartel-General, em Bissau.
Na página, acima referida do seu livro, escreve sobre esta comissão:
- Na 2.ª Comissão, no período de 68/70, ainda Capitão, desempenhei as funções de Adjunto da Repartição de Operações do Quartel-General do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné (QG/CCFAG). A minha colocação deveu-se ao facto de ser Observador Aéreo de Artilharia, que era Especialidade de Mobilização.
O conferencista ouvindo a apresentação do anfitrião.
© Foto José Martins
Recorrendo, de novo, a introdução do livro "A RETIRADA DE GUILEJE", na página 15, transcrevemos a referência sobre a última comissão:
- Na 3.ª Comissão, no período de 72/74, com o posto de Major, fui mobilizado em rendição individual e colocado, inicialmente, no Centro de Instrução Militar (CIM) em Bolama; nomeado Comandante do COP 5, desempenhei as funções desde 22JAB73 até 22MAI73. Na sequência da decisão que tomei de RETIRAR DE GUILEJE, passei à situação de prisão preventiva, desde 22MAI73 até 12MAI74, enquanto me foi instaurado um Auto de Corpo de Delito.
A “ala” feminina – Uma professora do ISCTE e duas enfermeiras paraquedistas.
© Foto José Martins
Na sala, sobre cada uma das cadeiras, podia ver-se um folheto, que abaixo reproduzimos, fazendo uma súmula do livro que ia ser apresentado, para os visitantes do blogue, que ainda não tenham tido a oportunidade de ler o livro, tenham uma pequena visão deste acontecimento histórico, em que um Comandante/Homem, praticamente sozinho, tem que tomar uma decisão, sobre a sorte de centenas de pessoas que lhe estavam confiadas.
Apresentação do livro “A RETIRADA DE GUILEJE” – 14MAI2009
Biblioteca-Museu República e Resistência – Espaço Grandela
Em 04SET72, com o posto de Major, iniciei a terceira comissão por imposição, na Guiné.
Em 08JAN73 fui nomeado, pelo Sr. Comandante-Chefe das Forças Armadas da Guiné, Sr. General ANTÓNIO DE SPÍNOLA, Comandante do Comando Operacional n.º 5 (COP 5), com sede em Guileje. Na zona de Acção do COP 5 passava o Corredor de GUILEJE, através do qual o PAIGC introduzia 70 a 80% dos abastecimentos (armas, munições e outros), para todo o território da GUINÉ.
Em 25MAR73, foi abatido na região de GUILEJE o primeiro avião a jacto FIAT G-91, atingido por um missel terra-ar STRELA; o piloto foi recuperado com um pé partido. O aparecimento destes mísseis provocou grandes alterações e limitações no emprego da nossa Força Aérea.
Em 18MAI73 pelas 7:00 horas, 2 Grupos de Combate e 1 Pelotão de Milícias, saídos de GUILEJE, foram emboscados por um grupo Inimigo (IN) estimado em 100 elementos; as Nossas Tropas (NT) sofreram 1 Morto, 7 feridos graves (um dos quais veio a falecer 4 horas mais tarde por falta de evacuação) e 4 feridos ligeiros. Em 11MAI73, o Sr. General SPÍNOLA, na sua última visita a GUILEJE, afirmara, perante a formatura geral de todos os militares que, não obstante os condicionamentos da actuação da Força Aérea, esta faria a evacuação dos feridos graves; esta promessa não foi cumprida.
Face à situação, solicitei a ida a GUILEJE da Delegados da Repartição de Operações e da Força Aérea; porque estes não apareceram, desloquei-me no dia seguinte (19MAI73) a CACINE, comandando a evacuação das baixas da emboscada, através do rio; esperava lá encontrar os Delegados referidos. No dia 20MAI, ao fim da tarde, fui transportado de helicóptero a BISSAU, onde apresentei ao Sr. General SPÍNOLA, a necessidade de reforços, já solicitada antes por mensagem; respondeu-me que não me dava qualquer reforço, que devia regressar na manhã seguinte a GUILEJE e que ia mandar para lá o Sr. Coronel Pára-quedista RAFAEL DURÃO, passando eu a 2.º Comandante.
Cheguei a GUILEJE ao fim do dia 21MAI, depois de me ter deslocado de sintex (barco com motor fora de borda) de CACINE (onde a Força Aérea me deixou) para GADAMAEL; o percurso de Gadamael para GUILEJE foi feito em coluna apeada, utilizando um trilho da população, durante o trajecto, ouvimos a flagelação que GUILEJE estava a sofrer, a mais violenta de todas, que provocou a morte de um Furriel Miliciano e vários estragos materiais, entre os quais a destruição total do Centro de Comunicações, incluindo as antenas, o que impedia a ligação rádio com qualquer entidade.
Face à forte pressão do IN, à não atribuição de reforços e a outros factores (falta de água no quartel, escassez de munições de artilharia, não evacuação de feridos, etc) decidi retirar para GADAMAEL, no dia seguinte ao romper do dia, todos os militares (cerca de 200) e toda a população (cerca de 500 elementos), por considerar a posição insustentável. A alternativa era aguardar a chegada do Sr. Coronel Durão, que eu não sabia quando se iria verificar e que, em minha opinião, não resolveria a situação, porque, seguramente, não viria acompanhado de reforços, nem tão pouco tinha condições para solucionar os factores atrás referidos e, principalmente, a forte pressão do IN, que cada vez era mais acentuada.
Desde as 20:00 horas do dia 18MAI até às 4:00 horas do dia 22MAI (80 horas), GUILEJE sofreu 37 flagelações. A retirada efectuou-se, em coluna apeada, com pleno êxito, tendo surpreendido totalmente o IN, que continuou a bombardear GUILEJE, onde só entrou em 25MAI73
O Sr. General SPÍNOLA não sancionou a decisão, ordenando a minha prisão preventiva e a instauração de um Auto de Corpo de Delito; estive preso em BISSAU, desde 27MAI73 a 12MAI74. Como consequência do 25ABR74, os crimes que supostamente me eram imputados, foram amnistiados por Decreto-Lei da Junta de Salvação Nacional e o processo foi arquivado.
Os factos descritos são relatados, no livro que agora foi publicado; o processo é, também analisado e criticado, com pormenor; a última parte do livro trata do Simpósio Internacional de GUILEJE, realizado em BISSAU, de 1 a 6 de Março de 2008, em que participei.
O livro “A RETIRADA DE GUILEJE” não está à venda nas livrarias; estou disponível para o enviar, pelo correio, para qualquer parte do MUNDO. Os meus contactos são:
Rua Tomás Figueiredo, n.º 2 – 2.º Esq.
1500-599 Lisboa
Telefone: 217 608 243
Telemóvel: 917 931 226
Email: icoutinholima@gmail.com
Aspecto da sala © Foto José Martins
Com a afabilidade a que me habituou, nos encontros que com o Coronel Coutinho e Lima tive, de pronto me forneceu cópia da cábula que elaborou para desenvolver a sua apresentação. Dela damos nota a seguir:
01. Introdução
02. Nomeação para o COP 5; nenhum reforço
03. Primeiras medidas tomadas em Guileje
. Obras
. Substituição material Artilharia
. Reforços (GC Cacine, Pel Rec Fox e Pel Mil)
04. Abate do 1.º FIAT – 25MAR73
. Restrições de Apoio Aéreo
05. Deserção do Milícia ALIU BARI
06. Última visita do General Comandante-Chefe - 11MAR73
07. Inicio da acção em força sobre Guileje – 18MAI73
08. Período 18/22MAI73 (57 mensagens – pag 45 a 70 do livro)
09. Ida a Bissau – 20MAI73
10. Regresso a Guileje (21MAI73); situação encontrada
11. Factores considerados na decisão da Retirada
12. Preparação da Retirada
13. Chegada a Gadamael; mensagens do Coronel Durão
14. Ida para Bissau; prisão; processo.
O Alferes Miliciano Seabra, comentando os acontecimentos que também viveu na Guiné, nos longínquos anos de 1973. Na foto vê-se o Alberto Branquinho, um dos próximos conferencista destes colóquios
© Foto José Martins
(*) José Martins, ex-Fur Mil Trms da CCAÇ 5, Gatos Pretos, Canjadude, 1968/70
__________
Nota de CV:
Vd. último poste da série de 21 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4394: Bibliografia de uma guerra (46): "Diário da Guiné, Lama, Sangue e Água Pura" - Comentário de Fátima Teixeira
Guiné 63/74 - P4421: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (2): O IAO em Santa Margarida
1. Mensagem de José da Câmara, ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 e Pel Caç Nat 56, Guiné, 1971/73, com data de 25 de Maio de 2009:
Olá Carlos,
Em anexo encontrarás a continuação da minha experiência militar.
Como sempre deixo-te à vontade para fazeres com ela o que muito bem de aprouver.
Um abraço do
José Câmara
Memórias e histórias minhas
2 - O IAO em Santa Margarida
Três apitos! Saudação tradicional de despedida dos barcos que aproavam à Ilha das Flores. A âncora começou a subir na proa do n/m Ponta Delgada. Extremeci. O coração apertou… de ternura! Por uma lágrima que quisera saborear. Comigo, bem escondido no meu coração, levava uma linda recordação.
Olhei a minha ilha uma vez mais. Relutantemente, as costas lhe fui virando…
Um aspecto da linda ilha das Flores, Açores
Juntei-me aos outros camaradas oriundos das ilhas das Flores e Corvo que, tal como eu, estavam mobilizados, e íam juntar-se às suas Companhias, incluindo a CCaç 3327. Na chegada à Terceira, um piquete militar esperava por nós. Guias de marcha em ordem, passagens confirmadas. De repente, sem esperar, o som inconfundível de calcanhares à posição de sentido. O Aspirante de serviço, com a dignidade própria de um camarada de armas, estendeu a mão num cumprimento, desejou-nos boa sorte. Jamais esqueci esse gesto simples, mas cheio de um sigificado muito especial. Afinal eramos todos irmãos.
Ao largo, majestosamente boiando na baía de Angra, o luxuoso paquete Funchal esperava por nós. Esse navio, no seu giro tradicional, passaria pela Horta, Ponta Delgada, Funchal e Lisboa. Aqui, em perfeito contraste com o que se tinha passado na Terceira, não havia piquete, estafeta ou qualquer outro tipo de apoio militar. De malas às costas lá segui com os outros militares que me acompanhavam para o Depósito Geral de Adidos. Ali deparei com outro desastre, ou melhor, com uma afronta: não sabiam da chegada dos militares, mas sabiam que íamos para Santa Margarida no dia seguinte. Desenrasquem-se, foi a palavra de ordem. Foi isso que se fez, até à hora de tomar o combóio, no dia seguinte para Santa Margarida.
12/1970 – José Câmara a bordo do n/m Funchal, em frente à cidade com o mesmo nome, a caminho do IAO
A chegada àquele campo militar trouxe um pouco de comoção. Os meus camaradas desdobravam-se a contarem as suas experiências do IAO. Porém, não foi o retrato da instrução o que mais mexeu comigo. A grande notícia no campo militar era a deserção de três oficiais mobilizados para a Guiné. O madeirense Gonçalves, Aspirante a Oficial Miliciano, Comandante do 3.º GComb da CCaç 3327, era um dos oficiais desertores. Servi, ainda na Terceira, durante algum tempo debaixo do seu comando. Considerava-o um bom oficial, e nunca pensei ser capaz (e desejoso) de dar o salto. Enganei-me! A atitude daquele oficial trouxe-me a certeza de uma outra realidade: eu nunca seria capaz de abandonar os meus soldados, que treinei e que confiavam em mim para os guiar em terras da Guiné.
O IAO não teve, em mim, quaisquer proveitos práticos. Porque cheguei mais tarde, e porque no pouco tempo que estive em Santa Margarida, não me apercebi de nada ser diferente daquilo que já se fazia no Monte Brasil, Ilha Terceira. Os exercícios com o apoio de helicópteros foi a novidade programada mas, até isso, foi cancelado. Passavamos o tempo em exercícios de ginástica e ordem unida, treinos de penetração, progressão, patrulhamentos, emboscadas, e pouco mais. O mais importante, para mim, foi a manutenção do poder físico e da disciplina militar. Foi num desses exercícios que conheci o distinto e prestigiado coronel Maçanita, Comandante do campo militar. Observou o meu Grupo durante algum alguns exercícios, fez alguns comentários, desejou-nos sorte e prosseguiu a sua vistoria.
12/1970 – José Câmara no IAO, Santa Margarida
Mas nem tudo foi monótono no IAO. Três eventos muito importantes marcaram a minha estadia em Santa Margarida: a visita ao Santuário de Fátima, as festas de Natal e Ano Novo, e o festival da Batatada entre açorianos e madeirenses.
A visita que a Companhia fez ao Santuário de Fátima, foi o evento mais importante do IAO. Para os açorianos, profundamente religiosos, essa visita acabou por ser uma autêntica peregrinação de fé cristã. A magnitude do lugar, o silêncio, o simbolismo e as manifestações de fé que constantemente se podem observar são deveras impressionantes. Nesta visita ao Santuário, com cerca de quatro contos que conseguimos juntar entre os militares da Companhia, foi adequirida e abençoada uma linda imagem do Sagrado Coração de Maria, que nos acompanhou e protegeu durante toda a comissão. Hoje, a imagem, como muitas outras imagens que fizeram comissão no ultramar, faz parte do espólio religioso da igreja de São João Batptista, que se encontra edificada no Castelo, em Angra do Heroísmo.
Outro evento importante, para nós açorianos, foi a celebração do Natal de 1970 e a passagem de ano em terras de Santa Margarida. Para muitos soldados açorianos foi a primeira vez que o fizeram longe do aconchego familiar. Foi um Natal passado com saudades, tristeza e resignação. Para mim era a segunda vez que me acontecia. Mas tive uma consolação: voluntáriamente, estive de serviço contítuo à Companhia, permitindo, assim, que os meus camaradas continentais pudessem disfrutar, mais uma vez, do calor familiar, e das alegrias próprias que embelezam a época de Natal. Nunca me arrependi de o ter feito. A minha família, naquele momento, eram os militares da CCaç 3327.
Natal 1970 – Caserna da CCaç 3327 - Armas ensarilhadas e imaginação. José Câmara junto da árvore de Natal
Natal 1970 – José Câmara (Em pé – Primeiro da direita) – CCaç 3327 - A minha família
As Companhias em exercícios de IAO eram as CCaç 3325, do BII19, Funchal e as açorianas 3326, que foi para Mampatá, a 3327 (a minha) que ficou, no príncipio, em Bissau e a 3328 que foi para Bula. Com as férias de mobilização dos graduados continentais, essas Companhias ficaram decapitadas pela ausência de commandos a todos os níveis. Apenas sargentos de dia se encontravam presentes. As relações entre açorianos e madeirenses, que usufruiam do mesmo refeitório, começaram a azedar com a recusa dos madeirenses em descascar as suas batatas.
Pelo facto de ser açoriano, julgo eu, a minha ajuda foi solicitada, para ajudar a resolver o problema das batatas, ou melhor, da recusa pelos militares madeirenses em descascar as suas batatas. Em voz bem alta, e para que não houvesse dúvidas, dei ordem para que as batatas descascadas e por descascar fossem depositadas no mesmo caldeiro, cozidas e servidas ao jantar. Seguidamente, e com os sargentos de dia das outras Companhias, saí do refeitório, e fechei a porta. Nunca soube o que se passou a seguir. Ao jantar as batatas foram servidas descascadas, havia sorrisos, e, por incrível que pareça, vi açorianos e madeirenses sentados na mesma mesa. Tenho que confessar: o Sagrado Coração de Maria tinha feito o seu primeiro milagre: tinha tornado uma ordem muito perigosa em remédio santo. Julgo que Lhe agradeci
No príncipio do mês de Janeiro o frio começou a apertar, e apareceram os primeiros flocos de neve. Os exercícios de IAO cessaram e, começamos a contagem dos dias para a partida para a Guiné. Soubemos que o embarque estava marcado para o dia 5 de Janeiro de 1971. Por razões que desconheço só veio a acontecer no dia 21 de Janeiro de 1971.
Entretanto, mais uma surpresa me estava reservada. Fui nomeado, conjuntamente com o Aspirante Francisco João Magalhães, para fazer a vistoria do barco que nos levaria à Guiné. No dia da minha partida para Lisboa o Comandante da Companhia, Cap. Mil. Rogério Rebocho Alves, chamou-me ao seu gabinete, e mandou-me por as divisas de Furriel. Excusado será dizer que, ainda hoje, o braço direito me doi de responder a tanta pala feita com a mão esquerda: o gozo normal, nestas circunstâncias, dos meus camaradas. Porém, quando em frente do espelho as vi nos meus ombros, aquilo que podia ter sido um sentimento de honra e orgulho, foi substituído pelo peso acrescido das responsabilidades que se advinhavam: comandar tropas no teatro de guerra: a Guiné!
A 19 de Janeiro eu deixava Santa Margarida com destino a Lisboa no cumprimento da minha missão: vistoriar as acomodações do n/m Angra do Heroísmo, da Empresa Insulana de Navegação, que iria fazer, segundo se dizia, a sua viagem inaugural como navio transporte de tropas. O resto da Companhia chegaria a Lisboa dois dias depois.
NAVIO ANGRA DO HEROISMO
Tipo... Navio de passageiros de 1 hélice
Construtor... Deutsche Werft A.G. (construção número 690)
Local construção... Hamburgo
Ano de construção... 1954-55
Ano de abate... 1974
Porto de registo... Lisboa
Número de registo... I 358
Indicativo de chamada... C S B P
Comprimento ff... 152,71 m
Comprimento pp... 138,34 m
Boca... 19,87 m
Pontal... 11,00 m
Calado máximo... 8,71 m
Capacidade de carga... 4 porões com capacidade para 9.019 m3 de carga, incluíndo 536 m3 de carga frigorífica
Tonelagem... 10.187 TAB, 6.230 TAL, 6.870 TPB, 13.900 T deslocamento
Aparelho propulsor... Um grupo de turbinas a vapor AEG, construídas em Berlim Ocidental, por Allgemeine Electric Gesellschft, 2 caldeiras.
Potência... 11.500 shp a 119 r.p.m.
Velocidade máxima... 19 nós
Velocidade normal... 18 nós
Classificação... +100A1 LRS
Passageiros... Alojamentos para 80 em primeira classe, 43 em turistica A, 80 turistica B e 120 em turistica C, no total de 323 passageiros.
Tripulantes... 139
Photo and Copyright Carlos Russo Belohttp://navios.no.sapo.pt/angrah.html
O resto da Companhia chegaria a Lisboa dois dias depois.
José Câmara
__________
Nota de CV:
Vd. primeiro poste da série de 16 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4353: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (1): O início do Serviço Militar
Em tempo:
Poste rectificado em 29 de Maio por ter sido publicado originalmente com parte do texto suprimido.
As minhas desculpas ao José da Câmara
CV
Olá Carlos,
Em anexo encontrarás a continuação da minha experiência militar.
Como sempre deixo-te à vontade para fazeres com ela o que muito bem de aprouver.
Um abraço do
José Câmara
Memórias e histórias minhas
2 - O IAO em Santa Margarida
Três apitos! Saudação tradicional de despedida dos barcos que aproavam à Ilha das Flores. A âncora começou a subir na proa do n/m Ponta Delgada. Extremeci. O coração apertou… de ternura! Por uma lágrima que quisera saborear. Comigo, bem escondido no meu coração, levava uma linda recordação.
Olhei a minha ilha uma vez mais. Relutantemente, as costas lhe fui virando…
Um aspecto da linda ilha das Flores, Açores
Juntei-me aos outros camaradas oriundos das ilhas das Flores e Corvo que, tal como eu, estavam mobilizados, e íam juntar-se às suas Companhias, incluindo a CCaç 3327. Na chegada à Terceira, um piquete militar esperava por nós. Guias de marcha em ordem, passagens confirmadas. De repente, sem esperar, o som inconfundível de calcanhares à posição de sentido. O Aspirante de serviço, com a dignidade própria de um camarada de armas, estendeu a mão num cumprimento, desejou-nos boa sorte. Jamais esqueci esse gesto simples, mas cheio de um sigificado muito especial. Afinal eramos todos irmãos.
Ao largo, majestosamente boiando na baía de Angra, o luxuoso paquete Funchal esperava por nós. Esse navio, no seu giro tradicional, passaria pela Horta, Ponta Delgada, Funchal e Lisboa. Aqui, em perfeito contraste com o que se tinha passado na Terceira, não havia piquete, estafeta ou qualquer outro tipo de apoio militar. De malas às costas lá segui com os outros militares que me acompanhavam para o Depósito Geral de Adidos. Ali deparei com outro desastre, ou melhor, com uma afronta: não sabiam da chegada dos militares, mas sabiam que íamos para Santa Margarida no dia seguinte. Desenrasquem-se, foi a palavra de ordem. Foi isso que se fez, até à hora de tomar o combóio, no dia seguinte para Santa Margarida.
12/1970 – José Câmara a bordo do n/m Funchal, em frente à cidade com o mesmo nome, a caminho do IAO
A chegada àquele campo militar trouxe um pouco de comoção. Os meus camaradas desdobravam-se a contarem as suas experiências do IAO. Porém, não foi o retrato da instrução o que mais mexeu comigo. A grande notícia no campo militar era a deserção de três oficiais mobilizados para a Guiné. O madeirense Gonçalves, Aspirante a Oficial Miliciano, Comandante do 3.º GComb da CCaç 3327, era um dos oficiais desertores. Servi, ainda na Terceira, durante algum tempo debaixo do seu comando. Considerava-o um bom oficial, e nunca pensei ser capaz (e desejoso) de dar o salto. Enganei-me! A atitude daquele oficial trouxe-me a certeza de uma outra realidade: eu nunca seria capaz de abandonar os meus soldados, que treinei e que confiavam em mim para os guiar em terras da Guiné.
O IAO não teve, em mim, quaisquer proveitos práticos. Porque cheguei mais tarde, e porque no pouco tempo que estive em Santa Margarida, não me apercebi de nada ser diferente daquilo que já se fazia no Monte Brasil, Ilha Terceira. Os exercícios com o apoio de helicópteros foi a novidade programada mas, até isso, foi cancelado. Passavamos o tempo em exercícios de ginástica e ordem unida, treinos de penetração, progressão, patrulhamentos, emboscadas, e pouco mais. O mais importante, para mim, foi a manutenção do poder físico e da disciplina militar. Foi num desses exercícios que conheci o distinto e prestigiado coronel Maçanita, Comandante do campo militar. Observou o meu Grupo durante algum alguns exercícios, fez alguns comentários, desejou-nos sorte e prosseguiu a sua vistoria.
12/1970 – José Câmara no IAO, Santa Margarida
Mas nem tudo foi monótono no IAO. Três eventos muito importantes marcaram a minha estadia em Santa Margarida: a visita ao Santuário de Fátima, as festas de Natal e Ano Novo, e o festival da Batatada entre açorianos e madeirenses.
A visita que a Companhia fez ao Santuário de Fátima, foi o evento mais importante do IAO. Para os açorianos, profundamente religiosos, essa visita acabou por ser uma autêntica peregrinação de fé cristã. A magnitude do lugar, o silêncio, o simbolismo e as manifestações de fé que constantemente se podem observar são deveras impressionantes. Nesta visita ao Santuário, com cerca de quatro contos que conseguimos juntar entre os militares da Companhia, foi adequirida e abençoada uma linda imagem do Sagrado Coração de Maria, que nos acompanhou e protegeu durante toda a comissão. Hoje, a imagem, como muitas outras imagens que fizeram comissão no ultramar, faz parte do espólio religioso da igreja de São João Batptista, que se encontra edificada no Castelo, em Angra do Heroísmo.
Outro evento importante, para nós açorianos, foi a celebração do Natal de 1970 e a passagem de ano em terras de Santa Margarida. Para muitos soldados açorianos foi a primeira vez que o fizeram longe do aconchego familiar. Foi um Natal passado com saudades, tristeza e resignação. Para mim era a segunda vez que me acontecia. Mas tive uma consolação: voluntáriamente, estive de serviço contítuo à Companhia, permitindo, assim, que os meus camaradas continentais pudessem disfrutar, mais uma vez, do calor familiar, e das alegrias próprias que embelezam a época de Natal. Nunca me arrependi de o ter feito. A minha família, naquele momento, eram os militares da CCaç 3327.
Natal 1970 – Caserna da CCaç 3327 - Armas ensarilhadas e imaginação. José Câmara junto da árvore de Natal
Natal 1970 – José Câmara (Em pé – Primeiro da direita) – CCaç 3327 - A minha família
As Companhias em exercícios de IAO eram as CCaç 3325, do BII19, Funchal e as açorianas 3326, que foi para Mampatá, a 3327 (a minha) que ficou, no príncipio, em Bissau e a 3328 que foi para Bula. Com as férias de mobilização dos graduados continentais, essas Companhias ficaram decapitadas pela ausência de commandos a todos os níveis. Apenas sargentos de dia se encontravam presentes. As relações entre açorianos e madeirenses, que usufruiam do mesmo refeitório, começaram a azedar com a recusa dos madeirenses em descascar as suas batatas.
Pelo facto de ser açoriano, julgo eu, a minha ajuda foi solicitada, para ajudar a resolver o problema das batatas, ou melhor, da recusa pelos militares madeirenses em descascar as suas batatas. Em voz bem alta, e para que não houvesse dúvidas, dei ordem para que as batatas descascadas e por descascar fossem depositadas no mesmo caldeiro, cozidas e servidas ao jantar. Seguidamente, e com os sargentos de dia das outras Companhias, saí do refeitório, e fechei a porta. Nunca soube o que se passou a seguir. Ao jantar as batatas foram servidas descascadas, havia sorrisos, e, por incrível que pareça, vi açorianos e madeirenses sentados na mesma mesa. Tenho que confessar: o Sagrado Coração de Maria tinha feito o seu primeiro milagre: tinha tornado uma ordem muito perigosa em remédio santo. Julgo que Lhe agradeci
No príncipio do mês de Janeiro o frio começou a apertar, e apareceram os primeiros flocos de neve. Os exercícios de IAO cessaram e, começamos a contagem dos dias para a partida para a Guiné. Soubemos que o embarque estava marcado para o dia 5 de Janeiro de 1971. Por razões que desconheço só veio a acontecer no dia 21 de Janeiro de 1971.
Entretanto, mais uma surpresa me estava reservada. Fui nomeado, conjuntamente com o Aspirante Francisco João Magalhães, para fazer a vistoria do barco que nos levaria à Guiné. No dia da minha partida para Lisboa o Comandante da Companhia, Cap. Mil. Rogério Rebocho Alves, chamou-me ao seu gabinete, e mandou-me por as divisas de Furriel. Excusado será dizer que, ainda hoje, o braço direito me doi de responder a tanta pala feita com a mão esquerda: o gozo normal, nestas circunstâncias, dos meus camaradas. Porém, quando em frente do espelho as vi nos meus ombros, aquilo que podia ter sido um sentimento de honra e orgulho, foi substituído pelo peso acrescido das responsabilidades que se advinhavam: comandar tropas no teatro de guerra: a Guiné!
A 19 de Janeiro eu deixava Santa Margarida com destino a Lisboa no cumprimento da minha missão: vistoriar as acomodações do n/m Angra do Heroísmo, da Empresa Insulana de Navegação, que iria fazer, segundo se dizia, a sua viagem inaugural como navio transporte de tropas. O resto da Companhia chegaria a Lisboa dois dias depois.
NAVIO ANGRA DO HEROISMO
Tipo... Navio de passageiros de 1 hélice
Construtor... Deutsche Werft A.G. (construção número 690)
Local construção... Hamburgo
Ano de construção... 1954-55
Ano de abate... 1974
Porto de registo... Lisboa
Número de registo... I 358
Indicativo de chamada... C S B P
Comprimento ff... 152,71 m
Comprimento pp... 138,34 m
Boca... 19,87 m
Pontal... 11,00 m
Calado máximo... 8,71 m
Capacidade de carga... 4 porões com capacidade para 9.019 m3 de carga, incluíndo 536 m3 de carga frigorífica
Tonelagem... 10.187 TAB, 6.230 TAL, 6.870 TPB, 13.900 T deslocamento
Aparelho propulsor... Um grupo de turbinas a vapor AEG, construídas em Berlim Ocidental, por Allgemeine Electric Gesellschft, 2 caldeiras.
Potência... 11.500 shp a 119 r.p.m.
Velocidade máxima... 19 nós
Velocidade normal... 18 nós
Classificação... +100A1 LRS
Passageiros... Alojamentos para 80 em primeira classe, 43 em turistica A, 80 turistica B e 120 em turistica C, no total de 323 passageiros.
Tripulantes... 139
Photo and Copyright Carlos Russo Belohttp://navios.no.sapo.pt/angrah.html
O resto da Companhia chegaria a Lisboa dois dias depois.
José Câmara
__________
Nota de CV:
Vd. primeiro poste da série de 16 de Maio de 2009 > Guiné 63/74 - P4353: Memórias e histórias minhas (José da Câmara) (1): O início do Serviço Militar
Em tempo:
Poste rectificado em 29 de Maio por ter sido publicado originalmente com parte do texto suprimido.
As minhas desculpas ao José da Câmara
CV
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