Foto 2 > Guiné > Região de Cacheu > Varela > Praia de Varela, Acesso à praia de Varela, em Maio de 1968 [P18183 > Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-Alf Mil, CCS/BVAÇ 1933 (1967/69)], com a devida vénia.
Foto 3 > Guiné > Região de Cacheu > Varela > Praia de Varela > Junho de 2011 > Vestígios do quartel de Varela (imagem retirada do Youtube [https://www.youtube.com/watch?v=ODFTcpeGwHQ] com o título: "Varela, Dégradation d'un site paradisiaque - Juin 2011 (Après la fête du 1º mai)" ["Varela, Degradação de um local paradisíaco - Junho de 2011 (após a festa do 1º de maio"), tradução do francês], com a devida vénia.
O nosso coeditor Jorge Alves Araújo, ex-Fur Mil Op Esp/Ranger,CART 3494 (Xime e Mansambo, 1972/1974), professor do ensino superior; vive em, Almada, está atualmente nos Emiratos Árabes Unidos; tem mais de 260 registos no nosso blogue.
MEMÓRIAS CRUZADAS
DA REGIÃO DO CACHEU ANTES DO INÍCIO DA GUERRA
O (CRUEL) PLANO DE ASSALTO AO QUARTEL DE VARELA, PROPOSTO POR DOIS DESERTORES DO EXÉRCITO PORTUGUÊS
A AMÍLCAR CABRAL, EM JANEIRO DE 1963,
E QUE FELIZMENTE NÃO PASSOU DE UMA INTENÇÃO
1. - INTRODUÇÃO
Sabemos todos que não existem sociedades sem história, o mesmo acontecendo com todas as «Guerras», onde a ciência militar produz as suas… "Histórias". Porém, convém referir que nos casos da nossa (continuada) investigação historiográfica, nem sempre é possível misturar "relato" e "explicação", mas tão só investir no aprofundamento do primeiro conceito, como condição de saber histórico do passado, tornando-o, assim, objecto da história através da sua reconstrução, na agregação «História e Memória».
Quanto ao "puzzle da memória da guerra colonial da Guiné", acredito que a sua História global continuará a escrever-se no plural, pela importância do papel que a memória colectiva desempenha. NÓS ("EU" e "TU"), todos observadores e actores nos diferentes "palcos da missão", constituímo-nos como um valioso espólio da história de década e meia, no mínimo, unindo e reforçando as fontes de informação privilegiada, num processo dinâmico "entre contrários", porque, como diz o povo, "na guerra não se combate sozinho".
Por outro lado, o que não sei (nem ninguém poderá saber!) é "SE" os propósitos da "História" que está na origem desta narrativa, que hoje partilho no Fórum, tivessem sido concretizados com sucesso, "SE" o início da guerra colonial no CTIG, simbolicamente aceite com o ataque ao Aquartelamento de Tite, em 23 de Janeiro de 1963, 4.ª feira, onde efectivos do Batalhão de Caçadores 237 [BCAÇ 237] – [25Jul61-19Out63, do TCor Inf Carlos Barroso Hipólito] – se encontravam estacionados, teria sido o/a mesmo/a? Provavelmente não teria sido!
O que também sei (sabemos) é que na ciência historiográfica ou histórica o "SE" não existe.
No presente caso, o que faz parte da História são os registos documentais encontrados, uma vez mais nos arquivos de Amílcar Cabral existentes na CasaComum, Fundação Mário Soares, onde estão plasmadas crenças, atitudes, comportamentos, valores, mudanças e modos de vida…, como se prova no documento abaixo reproduzido.
Sabemos que antes do ataque ao Aquartelamento de Tite [23Jan63] haviam já ocorrido diversas actividades subversivas, as primeiras dois anos antes, por iniciativa de grupos armados sediados no Senegal, de que são exemplos as acções em S. Domingos, Susana e Varela.
Foto 4 > Guiné > Região de Cacheu > Varela > Um dos edifícios existentes em Varela, propriedade do Banco Nacional Ultramarino, complexo vandalizado em 1961, por grupos de indivíduos oriundos do Senegal, e onde ficaram alojadas as primeiras forças militares portuguesas (um Gr Comb da CART 240). Foto do acervo documental do BNU (P18534), com a devida vénia.
Sobre estas actividades subversivas de Julho de 1961, sugiro a leitura do P18534 «Historiografia da presença portuguesa em África: imagens e relatórios dos actos de vandalismo praticados pelo MLG, na Praia de Varela, encontrados no acervo documental do Banco Nacional Ultramarino», trabalho elaborado pelo camarada Mário Beja Santos.
Na mesma perspectiva histórica segue o artigo de José Matos - O início da Guerra na Guiné (1961-1964) - publicado na «Revista Militar» n.º 2566, de Novembro de 2015.
Capa da Revista Militar – 2566 – Novembro de 2015
Mapa da região norte da Guiné (fronteira com o Senegal), assinalando-se as linhas de infiltração da guerrilha nos anos de 1961/1963 (fonte: op. cit), com a devida vénia.
Como fonte oficial, que naquele período era considerada confidencial, recupera-se parte do documento publicado no P15962 - "O que dizem os Perintreps: Violações da fronteira e assaltos no chão felupe, em Julho de 1961: S. Domingos (a 18, 21 e 24), Ingoré (a 21), Susana (a 24) e Varela (a 25)", da autoria de Nuno Rubim (Cmdt da CCAÇ 726 (Out64-Jul66) e CCAÇ 1424 (Jan66-Dez66) e, em segunda comissão, no Quartel-General (QG).
2. - PLANO DE ASSALTO AO QUARTEL DE VARELA, ELABORADO EM DAKAR POR DOIS DESERTORES DO EXÉRCITO PORTUGUÊS, E DIRIGIDO A AMÍLCAR CABRAL, EM 04 DE JANEIRO DE 1963
Os autores do "plano de assalto ao Quartel de Varela", elaborado em Dakar, em 04 de Janeiro de 1963, 6.ª feira, e dirigido a Amílcar Cabral (1924-1973) por intermédio de José Araújo (1933-1992), responsável do PAIGC do Bureau de Dakar, que felizmente não se concretizou, pertenciam às CART 240 e CART 250, respectivamente, António de Jesus Marques (1.º cabo enfermeiro) e António Augusto de Brito Lança (furriel mil de artilharia).
Uma vez que nos Arquivos do Exército nada consta, no que à "História" das duas Unidades diz respeito, pois essa prática não abrangeu o período inicial das "Campanhas", procedemos à elaboração de uma resenha histórica "a nível operacional" durante a sua presença no CTIG.
2.1 - A MOBILIZAÇÃO PARA O CTIG DA CART 240
Mobilizada pelo Grupo de Artilharia Contra Aeronaves 2 (GACA 2), de Torres Novas, para servir na província ultramarina da Guiné, embarcou em Lisboa, provavelmente por via aérea, em 30 de Julho de 1961, domingo, sob o comando do Capitão Art Manuel Fernando Ribeiro da Silva, tendo chegado a Bissau na mesma data.
2.1.1 - SÍNTESE DA MOBILIDADE OPERACIONAL DA CART 240
A CART 240 foi colocada em Bissau, onde manteve a sua sede durante toda a comissão (30Jul61-19Out63), sendo integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 236 [21Jul61-19Out63, do TCor Inf José Alves Moreira], a fim de colaborar na segurança e defesa das instalações e das populações da área.
Em princípios de Fev72, destacou um Gr Comb para guarnecer a povoação de Varela, em substituição da CCAÇ 74 [18Mar61-12Fev63, do Cap Inf Alcides José Sacramento Marques], o qual ficou integrado no dispositivo do BCAÇ 239 [06Jul61-24Jul63, do Maj Inf António Maria Filipe (1.º) e TCor Inf Hélio Augusto Esteves Felgas (2.º)]. Ao fim de um ano de permanência em Varela (finais de Fev63), este Gr Comb foi transferido para Susana, recolhendo a Bissau no mês seguinte.
A CART 240 destacou ainda Grs Comb para Quinhamel, de princípios de Ago62 a meados de Set62 e novamente a partir de Abr63, e para Nhacra, a partir de meados de Jul63. De 01 a 27Jun63, foi atribuída em reforço do BCAÇ 356 [23Jan62-17Jan64; do TCor Inf João Maria da Silva Delgado], com vista à realização da «Operação Seta», na região do Quinara-Fulacunda, nas áreas de Iusse, Bissássema, Nova Sintra e Jabadá.
Em 18Out63, foi rendida pela CART 564 [14Out63-27Out65; do Cap Mil Art Rodrigo Claro de Albuquerque Menezes de Vasconcelos (1.º) e Cap Art António Manuel Fevereiro Chambel (2.º)], a fim de efectuar o embarque de regresso (Ceca; p 433).
2.2 - A MOBILIZAÇÃO PARA O CTIG DA CART 250
Mobilizada pelo Regimento de Artilharia Pesada 2 (RAP 2), em Vila Nova de Gaia, para servir na província ultramarina da Guiné, embarcou em Lisboa, no Cais da Rocha, em 10 de Agosto de 1961, 5.ª feira, sob o comando do Capitão Art José Maria Eusébio Alves, tendo desembarcado em Bissau na 4.ª feira seguinte, dia 16 de Agosto.
2.2.1 - SÍNTESE DA MOBILIDADE OPERACIONAL DA CART 250
A CART 250 foi colocada em Bissau, onde manteve a sua sede durante toda a comissão (16Ago61-06Nov63), sendo integrada no dispositivo e manobra do BCAÇ 236 [o mesmo da CART 240], em substituição da CCAÇ 52 [18Ago59-17Ago61; do Cap Inf Frederico Alfredo de Carvalho Ressano Garcia], a fim de assegurar a segurança e defesa das instalações e das populações da área.
Por períodos variáveis, a CART 250 cedeu pelotões para reforço de outros batalhões e intervenção em acções de nomadização e batida nas regiões de Mansodé/Mansabá, em Jul63, sob dependência do BCAÇ 507 [20Jul63-29Abr65; do TCor Inf Hélio Augusto Esteves Felgas] e Xime, em Ago63, sob a dependência do BCAÇ 506 [20Jul63-29Abr65; do TCor Inf Luís do Nascimento Matos].
Em 04Nov63, já na dependência do BCAÇ 600 [18Out63-20Ago65; do TCor Inf Manuel Maria Castel Branco Vieira], foi substituída no sector de Bissau pela CCAÇ 555 [03Nov63-28Out65; do Cap Inf António José Brites Leitão Rito], a fim de efectuar o embarque de regresso (Ceca; p 434).
2.3 - O PLANO DE ATAQUE AO QUARTEL DE VARELA – JAN1963
A ideia perversa e macabra que levou à elaboração do projecto (plano) de "ataque ao quartel de Varela" é atribuída a dois desertores do Exército Português, conforme referido anteriormente: o António de Jesus Marques, da CART 240, e o António de Brito Lança, da CART 250.
Essa prova pode ser conferida no documento que abaixo se reproduz.
Chegados ao CTIG no início do 2.º semestre de 1961, um Gr Comb da CART 240, onde estaria incluído o António de Jesus Marques [?], seguiu para Varela, com o objectivo de guarnecer essa povoação situada na região do Cacheu (Norte), enquanto o António de Brito Lança, da CART 250, permaneceu em Bissau, provavelmente em instalações situadas nos arredores do Aeroporto, em Bissalanca.
Em função de outras informações de que dispomos, mas que não se enquadram na presente narrativa, é de acreditar que destes dois militares, o primeiro a desertar para o Senegal tenha sido o António Lança, durante o Outono de 1962, e o António Marques, algumas semanas depois, mas ainda no decurso do mesmo ano. Portanto, antes do início do conflito armado.
Considerando que o António Marques estivera destacado em Varela, é de admitir (!?) que tenha sido ele o autor do croqui do "quartel a atacar" (o seu, em Varela).
Esboço da planta do quartel de Varela em 1962/1963, atribuível ao desertor António de Jesus Marques, da CART 240
Fotos 5 e 6 (Varela, Junho de 2011) – Vestígios do quartel de Varela (imagem retirada do Youtube [https://www.youtube.com/watch?v=ODFTcpeGwHQ] com o título: "Varela, Dégradation d'un site paradisiaque - Juin 2011 (Après la fête du 1º mai)" [Varela, Degradação de um local paradisíaco - Junho de 2011 (após a festa do 1.º de maio), tradução do francês], com a devida vénia.
Quanto à descrição apresentada na proposta, não nos é possível identificar o seu autor (moral), na medida em que a carta foi dactilografada (em máquina portátil), acto realizado em Dakar, com data de 4/1/963, 6.ª feira, mas assinada por ambos.
Citação: (1963), "Plano de assalto ao quartel de Varela", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível http: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_40296 (com a devida vénia)