sábado, 6 de agosto de 2022

Guiné 61/74 - P23502: In Memoriam (444): Poetisa Ana Luísa Amaral (Lisboa, 5 de Abril de 1956 - Porto, 5 de Agosto de 2022) (Adão Cruz, ex-Alf Mil Médico da CCAÇ 1547/BCAÇ 1887)

IN MEMORIAM

Ana Luísa Amaral (Lisboa, 1956 - Porto, 2022)

© Adão Cruz


PARA ANA LUISA AMARAL

Como a vida te apagou, também apaguei o teu e-mail.

Lá para os confins do mundo molecular do Universo, não tenho possibilidade de comunicar contigo, mas irei falando para mim mesmo sobre tanta coisa que deixaste.

Aprendi com outros e também contigo que a cultura tem de fazer parte integrante da estrutura do ser humano, da sua solidez e profundidade, da sua autenticidade, da sua verdade e da sua intrínseca sabedoria.

Aprendemos que a cultura com que te irmanaste e que cedo a morte ceifou é construída através da vida como qualquer mecanismo de adaptação, mas apenas quando assenta nos fortes alicerces do conhecimento científico e na aprendizagem dos emaranhados mecanismos neurobiológicos da mente criativa.

Também aprendemos que a verdadeira cultura, a cultura do saber autêntico, a cultura do ser são indissociáveis da nossa língua e de toda a linguística onde sempre foste mestra.

Como todos sabemos, a língua não é apenas um mero instrumento de comunicação, mas uma parte inseparável do todo que somos e da riqueza anímica que construímos.

Um bom perfume deve ser sentido como parte integrante da personalidade de uma mulher e não como um cheiro. Uma boa decoração deve ser sentida pelo bom ambiente, pelo conforto e bem-estar que cria e não por dar nas vistas apenas pelo estilo e pela configuração dos objectos.

A cultura não é um enfeite, uma cosmética, uma roupagem mais ou menos vistosa, nem pode ser confundida com a cultura-folclore, com a prolixa cultura política ou com a cultura do enciclopedismo balofo dos nossos dias.

Adeus Ana Luisa. Guardarei como recordação o difícil livro que me aconselhaste: PAISAJES COGNITIVOS DE LA POESIA, de Amelia Gamoneda e Candela Salgado Ivanich

adão cruz

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Nota do editor

Último poste da série de 6 DE AGOSTO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23501: In Memoriam (443): Maria Aldina G. O. Marques da Silva (Fafe, 1946 - Lourinhã, 2022), esposa do Jaime Silva (ex-alf mil paraquedista, BCP 21, Angola, 1970/72): o funeral é em Fafe, amanhã, domingo, às 12h00

Guiné 61/74 - P23501: In Memoriam (443): Maria Aldina G. O. Marques da Silva (Fafe, 1946 - Lourinhã, 2022), esposa do Jaime Silva (ex-alf mil paraquedista, BCP 21, Angola, 1970/72): o funeral é em Fafe, amanhã, domingo, às 12h00


Lourinhã > Ribamar > Porto Dinheiro > Tabanca de Porto Dinheiro > 12 de julho de 2015 > O Jaime e a Dina, ambos professores, já então reformados, e dividindo o seu tempo entre a Lourinhã e Fafe. Ela era de Fafe, ele, do Seixal, Lourinhã. Em Fafe o Jaime Silva foi autarca, tendo tido o pelouro da cultura e desporto no respetivo município. O casal vivia nos últimos anos no Seixal, Lourinhã.  E, apesar da doença que a afetava, a Dina ainda acompanhava o marido e convivia com os amigos, até 2019. Sempre impecavelmente cuidada, resguardada  e protegida  pelo seu "anjo da guarda". 

Foto (e legenda): © Luís Graça (2017). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Lourinhã > Praia da Areia Branca > 7 de julho de 2018 > Dina e Jaime

Foto (e legenda): © Luís Graça (2018). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]




Lourinhã > Seixal > 17 de julho de 2019 >   A Dina, na festa do 73º aniversário do Jaime


Foto (e legenda): © Luís Graça (2019). Todos os direitos reservados [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

1. A Dina acaba de morrer esta noite. De seu nome completo, Maria Aldina Gonçalves de Oliveira Marques da Silva, nascida em 24 de fevereiro de 1946, em Fafe. Há dois anos e tal, desde o início da pandemia de Covid-19, que estava internada, no Lar Vida Maior, na Maceira, união das freguesias de A-dos-Cunhados e Maceira, Torres Vedras,  Sofria, há mais de dez anos, de uma doença crónica degenerativa, a doença de Alzheimer (perda progressiva da função mental, caracterizada pela degeneração do tecido do cérebro). 

O corpo seguiu hoje para a sua terra natal, Fafe, Depois do velório, será celebrada amanhã, dia 7, missa de corpo presente às 12 horas, na Igreja Matriz  de Fafe. Os seus restos mortais ficarão sepultados no cemitério local. 

 Deixa viúvo o nosso amigo, conterrâneo e camarada Jaime Silva, ex-alf mil paraquedista, BCP 21 (Angola, 1970/72), membro da nossa Tabanca Grande e da Tabanca do Atira-te ao Mar (... e Não Tenhas Medo) (com sede em Porto das Barcas, Atalaia, Lourinhã).

Tinha 76 anos. O Jaime foi um herói e um santo, e um exemplo para todos nós, cuidando dela de modo inexcedível, ao longo de mais de uma dezena de anos. Ela era de Fafe, professora do ensino secundário, depois de ter leccionado antes na Lourinhã, como professora do ensino primário nos primeiros anos da década de 1970. O Jaime viveu em Fafe  durante cerca de 4 décadas, fez lá sua vida, como professor de educação física, e foi autarca com o pelouro do desporto e cultura. O casal tem dois filhos, ambos doutorados, e um neto.

Vou dar ao Jaime, que eu tratao como mano, um abraço solidário na dor, que espero seja partilhado pelos membros do blogue onde ele tem bons camaradas e amigos. Chegou ao fim o sofrimento da família. É altura agora de fazer o luto e guardar, para a posteridade, as melhores memórias de uma vida, cheia de alegrias mas também de tristezas. E deixo aqui, no blogue dos amigos e camaradas da Guiné, dois textos dedicados a ambos, um escrito há quatro  anos por  oacasião do 72º aniversário da Dina, e outro mais recente (e inédito),  um poema escrito para ser cantado, com a música da chilena Violeta Parra, por ocasião 
do 76º aniversário do Jaime, em 17/7/2022.


2. “A balada do amor” foi uma gracinha do Luís Graça, uma pequena homenagem à Dina e ao Jaime, em dia de festa de 72º aniversário da Dina, em 24 de fevereiro de 2018, celebrada no Restaurante Braga, Vimeiro, Lourinhã,,,

"Porque recordar é preciso, é viver duas vezes!",  disse eu nesse dia. E lembrei, perante os presentes (dezenas de familiares e amigos), o seguinte:

(...) "Conheço o Jaime há mais tempo do que a Dina, mas conheci a Dina primeiro que o Jaime, pelo mero acaso das circunstâncias: eu tinha vindo da guerra da Guiné, um ano antes, em março de 1971; o Jaime acabou a sua comissão de serviço militar em 1972 mas ficou em Angola até 1974; a Dina viera trabalhar para a Lourinhã e cá acabou por deixar o seu coração . (...)

(...) A verdade é que, um belo dia, roubou-nos o Jaime e levou-o para Fafe… Felizmente, para nós, seus familiares e seus amigos quase quatro décadas depois, ela devolveu a "encomenda" (o Jaime, claro, inteiros e  mais ou menos bem conservado) à sua origem, à sua terra natal. Mas para que não se perdesse, pelo caminho, acompanhou-o e por cá, pelo Seixal da Lourinhã,  tem ficado…

(...) São dois grandes amigos, nossos, meus e da Alice, as duas são nortenhas, e nós dois sulistas… (com u). E tem sido um privilégio conviver agora mais, com eles, nestes últimos anos.

Permitam-me, pois, estas liberdades poéticas que resultam da cumplicidade da amizade, e têm o propósito de homenagear, de maneira singela, neste dia, dois grandes seres humanos, numa fase da vida deles, em que mais do que nunca precisam dos nossos miminhos e carinhos.

Pessoalmente fico muito feliz por ver aqui a sua grande família, toda junta, a nortenha e a sulista, a de Fafe e da Lourinhã, Irmãos, cunhados, filhos, genro e nora, sobrinhos, sem esquecer o ai-Jesus que  agora é neto, o rei David, e todos os demais amigos do peito.

Aqui vai a melhor prenda que eu lhes posso dar, a eles e a todos vós, e que são os meus versinhos (...) Neles vão todo o meu afeto, a minha amizade e  o meu apreço por este casal de professores, cuja vida foi (e é) uma grande lição de grandeza humana, generosidade e amor. (...)

Não se assustem, são apenas 12 quadras, de sete sílabas métricas, 48 versos, que o tempo e a inspiração não deram para mais…


Balada do amor: para a Dina & o Jaime

1. 
Hoje há festa no Vimeiro,
Faz anos a nossa Dina,
E o Jaime é o primeiro
A saudar sua … menina.

2. 
A saudar sua menina,
Que de Fafe é cidadã,
E que, lesta e ladina,
Veio cedo p’ra… Lourinhã.

3. 
Veio cedo p’ra Lourinhã,
Terra de mouro encantado,
E sem ter um grande afã,
Encontrou um bravo… soldado.

4. 
Encontrou um bravo soldado
Que lá da guerra voltava
E que logo foi emboscado,
Quando as feridas… sarava.

5. 
Quando as feridas sarava,
Mais da alma que do corpo,
Logo a Dina lhe ensinava
Que o amor é um… heliporto.

6. 
Que o amor é um heliporto,
Em Fafe, terra afamada,
Onde há cultura e desporto,
… “Mas só volto mulher… casada!”

7. 
“Mas só volto mulher casada,
Com a bênção dos meus pais,
Trata lá da papelada,
Que eu tenho pressa… demais”!

8. 
Que eu tenho pressa demais,
Ó meu querido paraquedista,
E até escrevo p’rós jornais,
Que és bom rapaz e… sulista.

9. 
Que és bom rapaz e sulista,
E melhor apessoado,
Cuidado, cortam-te a crista,
Se fores mal… comportado.

10. 
Se fores mal comportado,
Lá na festa de Antime,
Nunca s’rás avô babado,
De um neto como o … David.

11. 
De um neto como o David,
Que há de ser um campeão,
Já veste calções e bibe,
É do amor uma lição.

12. 
É do amor uma lição,
Este par Dina & Jaime,
Parabéns, chicoração,
E eu acabo… “just in time”!

Luís Graça

Lourinhã, Vimeiro, restaurante Braga, 24 de fevereiro de 2018.

3. Homenagem ao Jaime, por ocasião do seu 76º aniversário natalício (17 de julho de 2022)

Gracias a la vida, Jaime…

Gracias a la vida que te ha dado tanto…
Deu-te uma família, tão linda e querida,
E de quem bem cuidas, com enlevo e encanto,
Mesmo que, por vezes, de alma sofrida.
... Gracias a la vida que te ha dado tanto!

Gracias a la vida que te ha dado tanto…
Das boas e más memórias da infância,
Mais do seminário, da guerra... e nem santo,
Nem herói te fez a tua circunstância.
...Gracias a la vida que te ha dado tanto!

Como é bom chegares à idade serena
Em que todo o sonho não é pesadelo,
Tudo afinal ainda vale a pena.
E como é bom, Jaime, ouvires este canto,
Sentindo este verso como vero e belo:
Gracias a la vida que te ha dado tanto!

Tabanca do Atira-te ao Mar, Porto das Barcas, Lourinhã, 
em data a anunciar (a surpresa, por parte dos amigos, sendo a ideia inicial da sua filha Sofia,  estava prevista  para o dia 24 de julho de 2022, um semana depois da festinha em família, mas o aniversariante ficou de cama com a Covid-19, e a filha partiu para o Norte com o rei David...)

Letra: Luís Graça / Joaquim Pinto Carvalho / Rogério Ferreira

Música: Adaptada,  com a devida vénia, da canção Gracias a la vida (1966), da chilena Violeta Parra (1917-1967)

Voz:  Rogério Ferreira / Acompanhamento à viola: Joaquim Pinto Carvalho e Rogério Ferreira

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Nota do editor:

Último poste da série > 5 de agosto de 2022 > Guiné 61/74 - P22496: In Memoriam (442): ex-alf mil médico Francisco Pinho da Costa (1937-2022), CCS/BCAÇ 1888 (Fá Mandinga e Bambadinca, 1966/68); oftalmologista, tinha 85 anos, vivia em São João da Madeira

Guiné 61/74 - P23500: Consultório Militar do José Martins (75): O Cartão do Antigo Combatente não dá direito a entrada gratuita em Museus na dependência de entidades particulares (José Martins)

1. Mensagem enviada ao Blogue no dia 3 de Agosto de 2022 pelo nosso camarada Fernando Barata, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 2700/BCAÇ 2912 (Dulombi, 1970/72):

Caro Carlos
Não sei se este meu lamento tem cabimento no nosso espaço tertuliano, mas aqui vai.
Há dias ao visitar o Museu do Tesouro Real e "garbosamente" ao apresentar o Cartão de Antigo Combatente na expectativa de obter a entrada gratuita fui informado, pela senhora que se encontrava ao balcão que o Museu era explorado por entidade privada não havendo, portanto, lugar a semelhante benesse.
Espanta-me e choca-me que um Museu que se encontra situado no Palácio da Ajuda, portanto pertencente ao Estado português, sendo o seu acervo fundamentalmente constituído por peças que pertenceram aos mais variados reis deste rincão seja privado e não Nacional.
Fica o lamento e tristeza por ver o património e a maior parte da estrutura produtiva deste país alienada desta forma.

Aceita um abraço do
Fernando Barata


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2. Instado a pronunciar-se sobre o caso vertente, o nosso colaborador permanente em assuntos militares, José Martins, mandou-nos esta mensagem:

Boa tarde Carlos e Fernando
Sobre o que deriva do Estatuto do Combatente, continuo a pensar que foi mal pensado e pior executado.
Culpados? Claro, inclusivamente os prováveis beneficiários.
Adiante.
O estado só pode dispor daquilo que dirige. Se os museus estão na dependência do Ministério da Cultura, pode dar borlas, porque é mais um ou menos um visitante. Provavelmente, se não for de borla, não vai. É o espirito português.
Portanto, quando pensaram, não pensaram por inteiro. Resumindo: NÃO PENSARAM!
Portanto, aí nada feito. Há o recurso ao bilhete da 3.ª idade ou às borlas, nalguns, ao domingo de manhã.
E não vale a pena pensar em propor alterações.
Primeiro porque quem pode mudar, não está interessado; os outros se propuserem, só estão a pensar em S. Bento.
Repito o que escrevi no início. Ninguém está interessado em fazer, seja o que for, para valorizar os combatentes; estes por sua vez, estão mais interessados em criar dissensões entre os mesmos, até porque nunca foi possível haver um entendimento mínimo entre os grupos que, por todo o país, foram sendo criados para "proveito e valorização própria"!


3. Podes acrescentar o mail que recebi do Ministério da Cultura:

"Exmo. Senhor José Marcelino Martins,
No seguimento da questão que coloca sobre os museus e monumentos relativamente aos quais existe protocolo para entrada gratuita, cumpre informar o seguinte:

1. Nos termos do art.º 18 Lei n.º 46/2020, de 20 de agosto a entrada é gratuita para os antigos combatentes e sua viúva ou viúvo;
2. A Direção-Geral do Património Cultural, naturalmente, deu cumprimento a esta norma e disponibiliza o bilhete designado “ ANTIGO COMBATENTE” Antigo combatente do ultramar e respetiva(o) viúva(o)” que pode ser adquirido em qualquer dos equipamentos culturais tutelados por esta direção. Segue lista infra.
3. Importa, no entanto, ter presente que a entrada é gratuita em qualquer dos equipamentos constantes na lista, contudo no caso de existirem exposições temporárias pagas, estas estão excecionadas da referida gratuitidade, apenas a entrada e as exposições permanentes estão abrangidas pela gratuitidade nos museus, monumentos e palácios.
De um modo geral o bilhete das exposições temporárias é de € 5 e encontra-se circunscrita a um espeço reservado dentro do referido equipamento, não impedindo a visita no equipamento cultural em causa.
Segue a lista de equipamentos culturais tutelados por esta Direção-Geral:


1. Alcobaça: Mosteiro de Alcobaça
2. Batalha: Mosteiro da Batalha (Mosteiro de Santa Maria da Vitória)
3. Coimbra, Condeixa-a-Velha: Museu Monográfico de Conímbriga - Museu Nacional
4. Coimbra: Museu Nacional de Machado de Castro
5. Évora: Museu Nacional Frei Manuel do Cenáculo
6. Lisboa: Casa-Museu Dr. Anastácio Gonçalves
7. Lisboa: Mosteiro dos Jerónimos
8. Lisboa: Museu de Arte Popular
9. Lisboa: Museu Nacional da Música
10. Lisboa: Museu Nacional de Arqueologia
11. Lisboa: Museu de Arte Antiga
12. Lisboa: Museu Nacional de Arte Contemporânea
13. Lisboa: Museu Nacional de Etnologia
14. Lisboa: Museu Nacional do Azulejo
15. Lisboa: Museu Nacional do Teatro e da Dança
16. Lisboa: Museu Nacional do Traje
17. Lisboa: Museu Nacional dos Coches
18. Lisboa: Palácio Nacional da Ajuda
19. Lisboa: Panteão Nacional
20. Lisboa: Torre de Belém
21. Mafra: Palácio Nacional de Mafra
22. Peniche: Museu Nacional da Resistência e da Liberdade
23. Porto: Museu Nacional de Soares dos Reis e Casa Museu Fernando de Castro
24. Tomar: Convento de Cristo
25. Viseu: Museu Nacional Grão Vasco


Com os melhores cumprimentos
Sónia Paulo Soares
Directora de Departamento
(em regime de substituição)
Departamento de Apoio à Gestão de Museus, Monumentos e Palácios |DAGMMP
Direção-Geral do Património Cultural
Palácio Nacional da Ajuda, 1349-021 Lisboa
Tel. Direto (00 351) 21 3614373 - Geral (00351) 213 650 800
E-mail: soniasoares@dgpc.pt
Site: http://www.patrimoniocultural.gov.pt"


4. Acrescenta mais este mail:

"Caro Senhor José Martins,
Saudações do Castelo!
Agradecemos o seu contato e informamos que para usufruir da gratuitidade deverá fazer-se apresentar na bilheteira do Castelo com o seu cartão de Antigo Combatente.
As entradas deverão ocorrer entre as 9h30 e as 17h30, no horário de funcionamento do Castelo.

Informamos ainda:

Existem atualmente condicionamentos devido a obras a decorrer no Largo de São Pedro, pelo que é recomendável o estacionamento de veículos no Parque de Estacionamento do Estádio Municipal e a subida ao Castelo através do elevador Norte (gratuito), acesso a meio da Avenida 25 de Abril.

Com os melhores cumprimentos,
Ana Santos
Município de Leiria I Divisão de Museus e Património Cultural
Castelo de Leiria I Igreja de São Pedro
Telefone: 244 839 670
Correio eletrónico: castelo@cm-leiria.pt"

E mais estes:
Todos os museus dependentes do Ministério da Defesa (Museus Militar, Marinha, Ar), incluindo os Museus do Combatente na Batalha e em Lisboa

Convém que quem queira visitar um museu ou monumento se informe se está ou não incluído no "espirito do decreto", uma vez que muitas autarquias aderiram, sem publicidade.
Além disso há museus/monumentos que a visita efetuada aos Domingos de manhã, são gratuitas. Os visitantes com mais de 65 anos estão sujeitos a um desconto que ronda os 50%.

Abraço para ambos e, se for caso disso, boa estadia fora do local habitual (atenção: nós não temos férias)
Zé Martins

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Nota do editor

Último poste da série de 5 de Agosto de 2022 > Guiné 61/74 - P23494: Consultório Militar do José Martins (74): Nas Forças Armadas Portuguesas nunca existiram capelães milicianos, desde o início da República que os capelães são graduados em alferes

Guiné 61/74 - P23499: Os nossos seres, saberes e lazeres (517): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (62): De novo em São Miguel, é infindável a romagem de saudade - 7 (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 16 de Junho de 2022:

Queridos amigos,
Nisto das viagens não há chegada que não tenha partida, neste caso parte-se inconsolável, ainda por cima era a 1ª viagem depois da pandemia, houvera passamentos na ilha, gente muito estimada, caso de uma comadre, uma grande afeição, caso de um médico oftalmologista, alguém que cuidara dos meus olhos em Bissau, depois da explosão de uma mina anticarro, amizade para sempre. E logo no dia da partida, não ter conseguido despedir-me do professor António Machado Pires, meu professor de Cultura Portuguesa, que me recebia sempre com atenção e desvelo e um livro de oferta, uma grande perda, exímio mestre, a cultura seguramente que dará pela sua falta. Escusado de referir que estou pronto a regressar, haja circunstância, é tudo uma questão agora de bombear essa circunstância, dou-me bem nesta atmosfera de paz, de pontas, picos, águas em cascata, a bagacina a estalar sobre os pés. Adeus, até à próxima viagem!

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (62):
De novo em São Miguel, é infindável a romagem de saudade - 7


Mário Beja Santos

É o meu último dia em São Miguel e pesa-me a consciência, nada de remorsos, viajante que se preza sabe que há limites entre o chegar e partir, mas este mais de meio século a calcorrear esta terra de feteiras, lagoas, faróis a apontar para o vasto oceano, pontas de sossego e desassossego, variações cromáticas a perder de vista, o exotismo dos parques, a constante afabilidade dos encontros, quer com amigos quer aqueles a quem se pede uma informação, toda esta escorrência de sons da água e do vento, aqui chegam comigo, e onde quer que esteja, depois de um avião aterrar em Lisboa, é a sempre e obsidiante vontade de aqui tornar, cada um de nós determina o Paraíso na terra, faz parte da sacrossanta autonomia da vontade, gostos não se discutem.
Pedira no Hotel Terra Nostra para voltar a visitar o espaço do antigo casino, dou-me bem com o regionalismo pictórico de Domingos Rebelo, não era possível, só que gente muito amável da receção cumpriu o prometido, recebi imagens que vou religiosamente guardar, de festas e panorâmicas com que o artista embelezou este belo espaço Arte Deco, tão bem conservado. Conforme as gravuras juntas.

É o último passeio pelo Parque Terra Nostra, mas é sempre o primeiro, deambulo com a saudade afogueada, imagino que já percorri todo o Nordeste, que estive sentado no jardim da Povoação, que conversei com um amigo do Faial da Terra, que aqui mesmo nas Furnas assisti a uma procissão com visita aos enfermos, posso fechar os olhos e antever o que o autocarro me irá oferecer de panorâmicas até Ponta Delgada, tenho uma visita surpresa ainda a fazer. Aqui ficam algumas imagens soltas da vegetação do parque, da casa sobranceira à piscina vigiada pelo busto de Thomas Hickling, a quem indubitavelmente devemos origem deste espaço edénico, só falta ouvir-se o murmúrio das águas, e depois o caminho da lagoa das Furnas e a vegetação que se avista do Parque José do Canto, chega de lágrima no olho, caminha-se para a paragem de autocarro, irresistível não registar a bruma que se levanta, pois adeus e até à próxima, e lembranças aos amigos que nos guardam estima e uma pequena oração para todos os que já partiram.
Não há visita a São Miguel que não inclua o bater à porta do meu querido professor de Cultura Portuguesa, António Machado Pires. Vimo-nos 1 ano antes da pandemia, era sempre uma questão de ritual, uma visita à Igreja do Colégio, uma entrada apressada na Biblioteca Municipal, por cima do Jardim Antero de Quental, para cheirar novidades editoriais, atravessado o jardim batia-lhe à porta. Tinha seguramente problemas sérios de visão, os olhos já entaipados com lentes escuras, conversámos de tudo e de nada, recebi prenda, Páginas Sobre Açorianidade, voltámos ao passado, quando me apresentei como estudante-militar para fazer a cadeira, sempre com aquele timbre de voz modulada, sem excitações, que lhe conheci ao longo destas décadas, deu-me o fardos das matérias, tudo bem organizado, foi um gosto preparar-me para tal exame, e ficou o encanto de nos revermos, sentia que gostava da minha companhia, a visita de um antigo aluno, de outras eras.
Bati à porta, com alguma insistência. Passou alguém e disse-me que o Sr. Professor já não vivia ali, na rua mais acima, e deu-me o número e a indicação de uma campainha. Ninguém atendeu, por absurdo não levava agenda. Mais tarde, o meu amigo Mário Reis disse-me que nesse preciso dia falecera a mulher, e que o professor tinha a saúde abalada, era o que sabia.
E agora, no preciso instante em que me despeço desta viagem, a sentida dor de uma perda, era um professor de comunicação rara, ouvi-lo falar sobre a cultura novecentista e ir mais atrás ao sebastianismo, era puro deleite, sempre a voz compassada, a gesticulação medida. Tudo isso perdemos, dou sempre comigo a pensar nos gigantes da cultura que aqui se ergueram, e permanecem, é uma dádiva do Espírito Santo, com certeza. E até à próxima viagem!

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Notas do editor

Poste anterior de 30 DE JULHO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23473: Os nossos seres, saberes e lazeres (514): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (61): De novo em São Miguel, é infindável a romagem de saudade - 6 (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 4 DE AGOSTO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23493: Os nossos seres, saberes e lazeres (515): Visita de um grupo de sócios do Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes à exposição "O Cristo das Trincheiras", em Fátima, em Abril de 2015 (Abel Santos)

Guiné 61/74 - P23498: Parabéns a você (2088): Coronel Inf Ref Fernando José Estrela Soares, ex-Cap Inf, CMDT da CCAÇ 2445 (Cacine, Cameconde e Có, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 4 de Agosto de 2022 > Guiné 61/74 - P23489: Parabéns a você (2087): TCor Inf Ref Rui Alexandrino Ferreira, ex-Alf Mil Inf da CCAÇ 1420 e ex-Cap Inf, CMDT da CCAÇ 18 (Fulacunda, Bissorã e Mansoa, 1965/67; Aldeia Formosa, 1970/72)

sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Guiné 61/74 – P23497: (Ex)citações (412): Da utópica peleja de Tróia ao conflito da Guiné. Princípios distintos. (José Saúde)


1. O nosso Camarada José Saúde, ex-Fur Mil Op Esp/RANGER da CCS do BART 6523 (Nova Lamego, Gabu) - 1973/74, enviou-nos a seguinte mensagem: 

Da utópica peleja de Troia ao conflito da Guiné 

Princípios distintos 

Camaradas,  

A longevidade do tempo, embora a entendamos substancialmente distante nas eras, é algo que nos remete para o redescobrir momentos passados que jamais se apagarão das nossas louváveis memórias. Nesses tempos, sim, os tempos em que fomos atores forçados na guerrilha na Guiné, proliferava entre nós uma irreverente juventude que ultrapassava “montanhas” (que por sinal pariam ratos), não esquecendo, porém, que fomos então sublimes alvos de miras de espingardas cujas balas atravessavam corpos de “putos” que, na mocidade civil, viviam uma vida feliz. 

Numa viagem ao “status quo” da nossa existência humana, sendo que a expressão, “status quo” é latina e cujo significado exprime “estado atual”, vagueio pelo conteúdo das palavras presentes, medito sobre o seu potencial valor e deparo-me a idealizar no antigamente a peleja de Troia, revendo, com ênfase, o conflito da Guiné.  

Recorro a dizeres da lenda que diz que essa luta teria sido originada por uma disputa de puderes entre as deusas Hera, Atena e Afrodite. Tudo terá ocorrido depois da deusa Éris, a deusa da discórdia, lhes ter dado um pomo de ouro que, traduzido à letra, ficou conhecido como o “Pomo da Discórdia”. 

É evidente que a lenda nos leva ao irreversível dado que identificamos, por razões consideradas substancialmente óbvias, à peleja de Troia. Claro que os princípios da nossa luta por terras guineenses, são literalmente distintos em toda a dimensão no evoluir das eras, assim como à forma no desenrolar de um conflito que muitas contrariedades nos trouxeram numa Guiné onde fomos membros de um exército etiquetado de valores que nos fizeram crescer como homens numa sociedade subordinada a um poder absoluto, restando as dificuldades amiúde observadas por todos aqueles que pisaram o palco da guerra.  

Viajo, não pela idade do bronze, ou pelas historietas do tal célebre “Cavalo de Troia”, e revejo os momentos de uma Guiné em que os momentos de ócio se apresentavam como verdadeiros tempos livres, onde o batucar dos tambores nos acalentava as almas, esquecendo, por ora, males maiores.  

Camaradas, com a devida vénia, aqui vos deixo um pequeno texto, com imagem, que deixei escrito no meu livro “Um Ranger na Guerra Colonial – Guiné-Bissau 1973/1974”, para todos recordámos, sem mácula, aqueles momentos de descanso.  


Noite de descontração 

Tocadores improvisados acertavam as mãos nos instrumentos e os camaradas… gostavam.

O som do batuque deliciava-me! Encantava-me a alma. Noite de batuque era noite de ronco na tabanca. A população, numa correria louca, desfazia-se em contactos e os nativos, sempre faustosos, marcavam presença no local do aconselhado e atrativo ronco. O tocador, ou tocadores, bem cedo diziam presente. As bajudas, sempre destemidas, envergavam indumentárias garridas e davam cor ao espetáculo. Os rapazes, com vestes compridas, impunham a sua condição de machos negros e as pomposas donzelas esculpiam os seus salientes rabos ao toque do tambor.  

Ao lado, homens e mulheres já entrosados na idade, agitavam-se com os estrondos vindos dos instrumentos das mãos dos tocadores. Os corpos do pessoal do batuque desenhavam figurinos encantadores. Descalças e descalços o pessoal da tabanca obsequiava com humildade os convivas.  

Paulatinamente os corpos joviais, alguns divinais, iniciavam o processo da transpiração. Um processo que não colocava senãos a gentes que por teimosia ousavam desafiar o calor da noite. Os cheiros não importavam! Conhecíamos já esses velhos odores. Faziam parte do nosso quotidiano. O perfume Hugo Boss, deixado, entretanto, no baú das recordações, era um esmero anfitrião, mas para outros momentos de afirmação social. Naqueles instantes a festa era outra. De arromba. Os cheiros natos da jovialidade apresentavam-se para nós como mais uma página a acrescentar ao calendário de uma comissão que pausadamente evoluía no tempo, mas devagarinho.      

Recordo as minhas saídas noturnas com outros camaradas a caminho de tabanca para ouvirmos e vermos ao vivo as maravilhas de um batuque das gentes guineenses. Em noite de luar era mais fácil a aproximação à manga de ronco. A pequena multidão, em círculo, faturava momentos ímpares de incontidos prazeres. 

O toque do batuque ter-se-á generalizado ao interior dos quartéis. Era comum os militares terem nas suas instalações os respetivos tambores. Numa noite de plena descontração a rapaziada juntou-se e toca a batucar. Nesta perspetiva, um grupo de tocadores improvisados brindou a malta da messe de sargentos com os melodiosos sons oriundos de caixas feitas pelos ilustres mestres negros.  

A recetividade da iniciativa mereceu honras dos camaradas que a seguir, e à nossa volta, se predispuseram para ofertar refrescantes bebidas aos tocadores. Numa noite de batuque, e sem danças feitas por corpos ondulantes, uma cuba livre foi divinal!  

Um abraço, camaradas,

José Saúde

Fur Mil OpEsp/RANGER da CCS do BART 6523

Mini-guião de colecção particular: © Carlos Coutinho (2011). Direitos reservados.
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Nota de M.R.: 

Vd. último poste desta série em: 

23 DE JULHO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23455: (Ex)citações (411): Cuidado com o "fogo amigo", cuidado com o dilagrama, cuidado com a granada defensiva... (António J. Pereira da Costa / Luís Graça) 

Guiné 61/74 - P22496: In Memoriam (442): ex-alf mil médico Francisco Pinho da Costa (1937-2022), CCS/BCAÇ 1888 (Fá Mandinga e Bambadinca, 1966/68); oftalmologista, tinha 85 anos, vivia em São João da Madeira


São João da Madeira > 23 de outubro de 2021 > Dois velhos camaradas do tempo de Porto Gole: o alf mil at inf João Crisóstomo, da CCAÇ 1439 (1965/67) e o alf mil médico Francisco Pinho da Costa, do BCAÇ 1888 (Fá Mandinga e Bambadinca, 1966/68). Foto tirada pela Vilma. (*)

Foto (e legenda): © João Crisóstomo (2021). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Mensagem do médico e meu amigo dr. Joaquim Pinho, especialista em medicina do trabalho, a viver em São da Madeira, e leitor atento do nosso blogue:




Data - segunda, 1/08/2022, 15:07
Assunto - Óbito.

Hoje, em S. João da Madeira, às 16 horas, realiza-se o funeral do médico oftalmologista dr. Francisco Costa

Francisco Costa, de 85 anos, foi alferes miliciano médico na Guiné.

Ab, Joaquim Pinho


2. Hoje, sexta-feira, dei conhecimento a alguns camaradas que conviveram com o dr. Francisco Costa, nomeadamente o dr. Adão Cruz e o João Crisóstomo, sendo do seu tempo no TO da Guiné_

João: uma triste notícia... Vou publicar (**)... Queres acrescentar algo mais ?... 

Estiveste em outubro passado, em São da Madeira, com o dr. Francisco Costa (**)... 

Foi um antigo aluno, e meu amigo, médico do trabalho, o dr. Joaquim Pinho, quem nos deu a notícia, na passada segunda feira. (Obrigado, Joaquim.)

Um abraço, João. Bj para a Vilma. Luis

3. T
exto  de homenagem ao dr. Francisco Costa  (1933-2022), pelo seu colega, camarada e amigo dr. Adão Pinho da Cruz, membro  da nossa Tabanca Grande, poeta e artista plástico, natural de Vale de Cambra.  Foi-nos remetido hoje, 5 ago2022, 11:06, mas já havia sido publicado na página do Facebook do Adão Cruz no passado dia 1:

1 de agosto às 19:39  > Dr. Francisco Costa, Oftalmologista.

Mais um que entrou, como todos iremos entrar, no equilíbrio molecular do Universo. Desta vez, o meu colega e grande amigo Chico Costa, o Chicoso, como eu lhe chamava. 

Fomos colegas e amigos no Colégio de Oliveira de Azeméis, fomos amigos e colegas de curso na Faculdade, fomos colegas de quarto durante três anos, na Praça Guilherme Gomes Fernandes, na Rua Aníbal Cunha, na Travessa Sá Noronha, na Rua Particular de Monsanto, em Paranhos, fomos contemporâneos na guerra da Guiné e sempre nos abraçamos ao longo da vida.

Foi, ao fim e ao cabo, uma profunda mistura de vidas, suficientemente grande para que os meus olhos, hoje, neste triste e último encontro, se humedecessem ao ver-te assim, incapaz, pela primeira vez, de corresponder ao nosso longo e apertado abraço de sempre.

Teu velho amigo Adão.
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 24 de outubro de 2021 > Guiné 61/74 - P22657: (De) Caras (180): 55 anos depois, o reencontro ao vivo, em São da João da Madeira, com o ex-alf mil médico Francisco Pinho da Costa (BCAÇ 1888, Fá Mandinga e Bambadinca, 1966/68) (João Crisóstomo, Nova Iorque, de visita a Portugal)

(...) O alferes médico Francisco Pinho da Costa, do BCaç 1888, sediado em Bambadinc em 1965 /66, tem agora 84 anos, com uma memória ainda muito boa, lembrando coisas nos seus pormenores, capacidade que eu há muito perdi substancialmente.

Perante a minha surpresa, uma vez que estivemos na Guiné na mesma altura e ele ter mais sete anos que eu, explicou que isso se deve ao facto de ter adiado o serviço militar várias vezes para que ele
pudesse acabar o seu curso de medicina. Pensei que ele tinha feito o curso de oficial miliciano em Mafra, mas esclareceu-me me "ter sido preparado" em Santarém, uma preparação rápida "ad hoc" (disse ter sido apenas cerca de um mês, se me não engano) ao fim da qual, mesmo sem saber ainda bem o que era e como funcionava uma G3, foi enviado em rendição individual para a Guiné. (...)

Apesar das poucas vezes que estive com ele ( ele apenas esteve na Guiné quatro meses e apenas apareceu algumas vezes na CCaç 1439), lembro-me bem dele, como um indivíduo afável, bem disposto e sempre a querer ajudar no que quer que fosse: mostrei-lhe no computador que propositadamente tinha trazido vários posts do nosso blogue, nomeadamente os post P22258 e P22478. Ele aparece numa foto (...), a do primeiro poste, o P22258, ( da esquerda é o segundo, de óculos, ) por ocasião da visita da Supico Pinto a Porto Gole e reconheceu , parece mais e melhor que eu, a maioria dos que aparecem nessa foto. Outras fotos que lhe mostrei foram para ele momentos de emotiva saudade.

Mas foi a leitura do relatório sobre a operação Gorro que lhe ocasionou ume enxurrada de comentários e detalhes, alguns deles a meu respeito que eu tinha já completamente esquecido mas que me vieram à memória então.

Lembrou que o Capitão Pires o havia mandado para ir nessa "saída ao mato”. Mas, quando ele se preparava para o fazer, alguns elementos da tabanca vieram ter com ele, avisando-o que não fosse. Mas ele não lhes deu ouvidos: o capitão tinha-o mandado ir e portanto ia. Mas que mais tarde os mesmos membros da tabanca que o haviam aconselhado a não sair, voltaram e desta vez com mais insistência o avisavam de que não devia ir pois que iam ser atacados. Que não lhes deu atencão, mas que, perante a insistência deles de que iam ser atacados, resolveu então levar uma G3, como todos os outros.

Lembra-se de ir em pé em cima do “granadeiro” agarrado à “parede da frente "por trás do condutor António Figueiredo, quando a mina explodiu e foi pelos ares. "Foram os maiores minutos da minha vida”…sentiu e ficou consciente do sopro da explosão que o fez ir pelos ares mas que depois parecia nunca mais chegar ao chão”…

E quando de pernas direitas atingiu o chão, percebeu logo que tinha partido uma das pernas, para logo verificar que tinha o calcanhar e tornozelo da outra também estavam partidos. Mas que haviam vários feridos (, pensa ele que eram cerca de oito,) , os que foram com ele pelos ares e as dores eram sofríveis

Com um bocado duma tábua e alguma ajuda que lhe deram ele próprio endireitou e imobilizou a perna partida e começou a ajudar aqueles que precisavam da sua ajuda; lembra-se de ter instruido um indivíduo— pensa ele que era um cabo enfermeiro que estava ferido — a tapar e fechar com os próprios dedos a veia junto ao ouvido, pois este estava a sangrar pelos ouvidos e tinha de ser evacuado imediatamente. Depois de evacuado nunca soube mais dele.

E lembra-se bem de mim: que eu ia ao lado do condutor e que eu ia a dormitar quando a mina rebentou. A mim e ao condutor não nos sucedeu nada, apesar de termos sido lançados pelos ares. Lembra-se que eu o abracei quando vi que ele estava vivo; e lembrou-me dum facto que de todo tinha esquecido até hoje: que lhe disse que eu estava ferido, mas que não sentia dores, mas que — dizia eu, -- o sangue me corria pelas pernas. E logo verificou que o que eu pensava ser sangue a escorrer na perna era apenas o azeite de uma lata de sardinhas… Sucede que eu tinha comigo a ração de combate e um estilhaço qualquer atingiu o meu saco da ração de combate mas a lata de sardinhas salvou-me do pior. E a verdade é que quando ele mencionou isto eu lembrei-me imediata e vivamente de tudo isso. (...)

(**) Último poste da série > 22 de julho de 2022 > Guiné 61/74 - P23452: In Memoriam (441): João Moura, ex-Fur Mil Mec Auto da CCS/BCAV 2922 (Piche, 1970/72) (Hélder Sousa)

Guiné 61/74 - P23495: Notas de leitura (1471): "Memórias de um Tigre Azul - O Furriel Pequenina", por Joaquim Costa; Lugar da Palavra Editora, 2022 (Mário Beja Santos)


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Agosto de 2022:

Queridos amigos,
Joaquim Costa teve a amabilidade de me oferecer as suas memórias de Cumbijã, edição Lugar da Palavra Editora (telef 220994591/ telem 915416141), tocaram-me pela singularidade com que homenageia pais e irmãos, como faz a apologia da camaradagem sem precisar de bater as palmas e a discrição com que narra a criação de um quartel em terra de ninguém, tudo com o objetivo de procurar asfixiar a prazo a presença do PAIGC na região sul, designadamente naquelas reentrâncias da mata do Cantanhez. A epopeia dos homens ficou lavrada, mas em 1973, ali bem perto, no mês de maio, Guileje cedeu, nada ficaria como dantes, e a Operação Grande Empresa esmoreceu, o 25 de Abril foi a última gota. Foi bom que Joaquim Costa deixasse o seu testemunho, todo ele de emoção contida.

Um abraço do
Mário



Recordar Cumbijã, um dos pilares da Operação Grande Empresa

Mário Beja Santos

O livro de Joaquim Costa, largamente referenciado em textos do blogue, é credor da nossa elevada consideração, a diferentes níveis: a tocante homenagem que presta a pais e irmãos, se é certo que há testemunhos de arromba sobre estas memórias afetivas, inescapáveis, o que Joaquim Costa nos oferece é tocante como homenagem do seu coração. 

Não me recordo de tal texto ter aparecido no blogue, se não estou enganado, incito-o a dá-lo à estampa, a nossa assembleia merece; se é certo que ele nos vai dar um itinerário muito comum de recruta e especialidade, subidas e descidas por quartéis até à formação da unidade que irá partir para a Guiné, também aqui ficam uns pingos de camaradagem da melhor água, uma camaradagem que percorre transversalmente a sua narrativa; e para quem ainda não atendeu às diferentes facetas da Operação Grande Empresa, destinada a reocupar o Cantanhez, o testemunho de Joaquim Costa é vibrante quanto ao confronto com os grupos do PAIGC instalados na região, quase desde a primeira hora, Spínola intentava provocar um cerco a “lugares santos”, impedindo abastecimentos, circulação de pessoas, fuga de populações, foi uma operação de sangue, suor e lágrimas que não pôde completar-se devido aos acontecimentos que envolveram Guileje, Gadamael e Guidaje. O que se passou no Cumbijã foi uma pequena epopeia de que Joaquim Costa deixa um relato singelo.

Primeiro, a homenagem à família, ele é o sétimo filho de José e de Gracinda, um casal que viveu a miséria em tempos conturbados, o pai Zé trabalhou numa pedreira, abriu uma pequena mercearia/taberna, ele não esqueceu uma viagem que fez na sua companhia até Ermidas do Sado para ir visitar o irmão Manuel, que estivera na Guiné e regressara com uma grande pneumonia; a mãe Gracinda é a imagem da devoção maternal, levanta-se pela alva para preparar os comes, tudo sem um queixume. E fala-nos do mano mais velho, o Eduardo, da sua paixão pelos pombos, da Maria, a irmã mais velha, uma cúmplice deste furriel do Cumbijã. E deixo ao leitor a faculdade de saber mais sobre o Avelino, o Manuel, o João, a Noémia, o Joaquim, os sete manos vão aparecer em bela fotografia, há mesmo casacos e gravatas para se entender que o clã lutou pela vida para conhecer dias mais risonhos.

Segundo, a ficha curricular, com todas aquelas peripécias nos coube experimentar, no caso dele Caldas da Rainha, Tavira, é um sargento de armas pesadas que vai dar instrução a Chaves, segue-se Estremoz (que lhe deixou imensas saudades), já está delineada a CCAV 8351, os Tigres de Cumbijã, tendo como maestro Vasco Augusto Rodrigues da Gama, a quem tive a honra de dar instrução em Mafra e de descrever em sede própria que daria um competentíssimo comandante de companhia. 

Ainda há Portalegre pelo caminho, toma-se um avião, há uma curta passagem pelo Cumeré, segue-se a Aldeia Formosa depois de uma viagem até Buba. Festa de Natal com repasto de macaco-cão assado. Não são esquecidas as peripécias com lavadeiras e roupas dispersas.

Terceiro, cumprida a missão de proteger colunas para Buba e dar proteção ao grupo de Engenharia na construção da estrada Mampatá-Nhacobá, vamos ao âmago da história, toca a marchar para Cumbijã, o PAIGC não queria abrir mão de Nhacobá, não bastava a estrada a partir de Mampatá, havia que estender o cerco. Chega-se a Cumbijã e levantam-se cerca de 30 minas, assim vai começar o calvário dos estropiados e mortos, as imagens são eloquentes, faz-se um quartel de raiz, ele diz com simplicidade: 

“Ao mesmo tempo que avançava a construção para Nhacobá e os trabalhos da adaptação do Cumbijã para receber e unir definitivamente toda a família da CCAV 8351, ia-se criando, em cada um de nós, a sensação, agridoce, de que estávamos a construir a nossa modesta casinha, porventura no sítio menos aconselhável.” 

Alimentação a rações de combate, flagelações constantes, fazer tijolos e erguer casas. Visita de Spínola, apresenta-se a lista de reclamações, o Comandante-Chefe responde positivamente. Passa a haver segurança e mesmo casernas com conforto básico. Chega a hora da operação “Balanço Final”, o assalto a Nhacobá, encontrou-se gente, documentação, muito arroz, há tiroteios, Spínola chega a fazer uma visita relâmpago a Nhacobá, visita rápida, já que o rebentamento de uma mina provocada por uma máquina de Engenharia projetou uma enorme quantidade de terra que atingiu ao de leve o general. 

Se Cumbijã já era um descampado, preparar o terreno em Nhacobá para novo quartel não foi pequena a odisseia. Estamos nisto quando se dão os acontecimentos do ataque a Guileje, que Joaquim Costa esmiúça. Vem de férias e no regresso a Bissau tem más notícias do que se passa em Cumbijã e arredores. O autor aproveita um texto do nosso confrade António Murta, repescado do nosso blogue para se voltar à operação “Balanço Final”.

Assim se chegou ao 25 de Abril, é o regresso a casa, as durezas da adaptação. E há os acasos da sorte, Joaquim tem o filho a trabalhar na Guiné na construção da Ponte S. Vicente, é o regresso, a vida continua, o Cumbijã não lhe sai da memória, vai trabalhar como professor, orientador pedagógico e dirigente escolar. 

E assim aconteceu, talvez fruto da pandemia, o Furriel Pequenina deu à costa com as suas memórias de guerra, teve a gentileza de me contactar para me oferecer o seu livro, li-o de um só fôlego, confessei-lhe a admiração pelo modo como trata pais e irmãos, como hasteia a bandeira da camaradagem e é sóbrio descrever os episódios do Cumbijã. E muito contente fiquei quando descobri que ele e eu éramos devotos admiradores daquele Vasco da Gama que em vez de ir à Índia esteve brioso a comandar o que a ele dizia respeito ali perto do rio Cumbijã naquela operação tão promissora mas que já não tinha força para reverter os ventos da História.

O destacamento de Cumbijã, região de Tombali, em 1973. Foto gentilmente cedida por Joaquim Costa.
Tabanca de Nhacobá, região de Tombali, ocupada num “golpe de mão” pela CCAV 8351 no dia 17 de maio 1973 na operação Balanço Final (17 a 23 maio 1973). Foto gentilmente cedida por Joaquim Costa.
Região de Tombali > Construção da estrada Mampatá / Cumbijã, no fim de mais um dia de trabalho. Foto gentilmente cedida por Joaquim Costa.
Região de Tombali, Cumbijã > O capitão da CCAV 8351 (Os Tígres de Cumbijã) e o Sargento Redondeiro. Foto gentilmente cedida por Joaquim Costa.
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Nota do editor

Último poste da série de 1 DE AGOSTO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23480: Notas de leitura (1470): Como nasceram as fronteiras da Guiné-Bissau (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P23494: Consultório Militar do José Martins (74): Nas Forças Armadas Portuguesas nunca existiram capelães milicianos, desde o início da República que os capelães são graduados em alferes

1. Oportuno comentário do nosso amigo e camarada José Marcelino Martins  (ex-fur mil trms,  CCAÇ 5, "Gatos Pretos",  Canjadude, 1968/70), ao poste P23488 (*), e que vamos inserir na sua série "Consultório Militar do José Martins" (**):

Que o administrador e editores, me permitam uma pequena corrigenda.

Nas Forças Armadas Portuguesas, nunca existiram Capelães Milicianos.

Os padres que assumem as funções de capelães das FFAA, são graduados nos postos que lhes são conferidos. Desde o inicio da República que os capelães são graduados em Alferes, pelo que a designação correta é: Alferes Graduado.

Caso contrário, teríamos, pelo menos, um Major-General Miliciano. É o caso do Bispo da Diocese das Forças Armadas e de Segurança que, ao assumir as funções, é graduado no posto mínimo que lhe está reservado - Major-General, uma vez que o posto de Brigadeiro-General é mais recente.

4 de agosto de 2022 às 09:27


2. Comentário do editor LG:

Meu caro Zé: Qem sabe, sabe... Obrigado pela tua sempre oportuna, generosa e ponderada intervenção no nosso blogue. O Padre José Torres Neves não foi alferes miliciano capelão mas sim alferes graduado capelão (tal como os demais capelães que serviram na Guiné, alguns dos quais membros da nossa Tabanca Grande). 

Felizmente, o Padre José Torres Neves ainda está vivo, a caminhos dos 86 anos, e a missionar num dos nossos PALOP,  podendo confirmar,  por intermédio do seu amigo, o dr. Ernestino Caniço, com quem está em contacto, a tua abalizada e douta opinião... 

Esta passará a ser "doutrina" no nosso blogue. Vamos corrigir, pois,  a designação desta série que passa a ser Álbum fotográfico do Padre José Torres Neves, ex-alferes graduado capelão, CCS/BCAÇ 2885 (Mansoa, 1969/71). E de futuro vamos... devidamente "graduar" todos os demais capelães que aqui forem referidos... Não é uma questão de somenos importância, é uma questão terminológica, uma questão de rigor.

Temos o descritor "capelães" (com 89 referências) e o descritor "os nossos capelães" (com 62 referências). E até temos (neste blogue não falta nada, pode às vezes é sobrar...)  uma foto, rara, de um alferes graduado capelão, açoriano, a dizer missa, em pleno mato, tendo como ajudante um furriel miliciano de transmissões (***)...


Guiné > Região de Gabu > Sector de Nova Lamego) > Canjadude > CCAÇ 5, "Gatos Pretos" > 1969 > O alferes graduado  capelão Libório Tavares (1933-2020),  dizendo missa, num altar improvisado. Ajudante, o José Martins, fur mil trnms, CCAÇ 5 (Canjadude, 1968/70).

(***) Vd. poste de 25 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16638: Os nossos capelães (6): Libório [Jacinto Cunha] Tavares, o meu Capelini, capelão dos "Gatos Negros", açoriano de São Miguel, vive hoje, reformado, em Brampton, AM Toronto, província de Ontario, Canadá (José Martins, ex-fur mil trms, CCAÇ 5, Canjadude, 1968/70)

quinta-feira, 4 de agosto de 2022

Guiné 61/74 - P23493: Os nossos seres, saberes e lazeres (516): Visita de um grupo de sócios do Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes à exposição "O Cristo das Trincheiras", em Fátima, em Abril de 2015 (Abel Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Abel Santos, (ex-Soldado Atirador Art da CART 1742 - "Os Panteras" - Nova Lamego e Buruntuma, 1967/69), com data de 1 de Agosto de 2022:


O Cristo das Trincheiras

Fazendo limpeza ao baú das minhas recordações encontrei esta sequência de fotos que deixo à apreciação dos camaradas, e que merecem estar expostas, digo eu, na galeria do nosso blogue.

As fotos dizem respeito à visita efectuada no dia 09 de Abril de 2015, por um grupo de sócios do Núcleo de Matosinhos da Liga dos Combatentes, à exposição "O Cristo das Trincheiras", em Fátima.

Um grande abraço a todos
Abel Santos



© As fotos são reserva do autor Abel Santos
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Nota do editor

Último poste da série de 30 DE JULHO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23473: Os nossos seres, saberes e lazeres (514): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (61): De novo em São Miguel, é infindável a romagem de saudade - 6 (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P23492: Convívios (938): Almoço de confraternização do pessoal da 2.ª CART/BART 6521 (Có, 1972/74), dia 24 de Setembro de 2022 em Cacia - Aveiro (José Morgado)

1. Mensagem do nosso camarada José Morgado, com data de 3 de Agosto de 2022, dando notícia do almoço/convívio da 2.ª CART/BART 6521, (Có, 1972/74), em Cacia - Aveiro, no dia 24 de Setembro próximo:

2ª CART do BART 6521

Na procura de alguns tresmalhados da minha Companhia - "Os Có Boys", (Có, 72/74) - 2ª CART do BART 6521, e porque fazemos 50 anos que chegamos à Guiné, zona de Có, vamos reunir as tropas num almoço de confraternização em Cacia, Aveiro, no Restaurante Solar das Estátuas, no dia 24 de setembro.

Para membros que não tenham conhecimento,
Contacto: 934 755 427

Saudações a todos Ex-Combatentes.

Cumprimentos,
José Morgado

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Nota do editor

Último poste da série de 3 DE JULHO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23407: Convívios (937): 37º encontro nacional do BENG 447, Caldas da Rainha, 25/6/2022, com 181 participantes (João Rodrigues Lobo, ex-alf mil, cmdt, PTE, Brá, 1967/71)