1. O "alfero Cabral" foi um dos grandes artistas que animou a nossa "tertúlia" nos idos tempos da I Série do blogue (que vai de 23/4/2004 a 1/6/2006)... Simplesmente genial este camarada da tropa que, se não existisse, teria que ser inventado... Ele trouxe, na época, à nossa caserna virtual o outro lado do espírito do blogue, que podemos descrever como sendo o lado mais solar, alegre, romântico, maroto, brejeiro, provocador, irreverente, desconcertante, descomplexado, histriónico, humorístico, burlesco, saudavelmente louco... dos camaradas da Guiné.
O "alfero Cabral" foi uma criação do Jorge Cabral, uma espécie de "alter ego" do Jorge Cabral, ex-alf mil art, comandante do Pel Caç Nat 63, que esteve destacado, há muitas luas, nos idos tempos de 1969/71, em Fá Mandinga e depois em Missirá, na zona leste, no setor L1 (Bambadinca)... Na portuguesíssima província da Guiné, longe do Vietname... Hoje, República da Guiné-Bissau, pátria de outro Cabral, que não tinha, nem de longe, o sentido de humor, a ironia fina, e o talento para contar histórias, do seu homónimo lisboeta... Aliás, discutia-se, no meu tempo, quem era "o Cabral mais Cabral da Guiné"... Seu contemporâneo e vizinho na região, eu nunca tive dúvidas de que "Cabral só há [, havia,] um, o de Missirá e mais nenhum"... Mesmo que dele se dissesse coisas manifestamente exageradas como "consertador de catotas, engatatão de bajudas, anfitrião da putaria, oferente de soutiãs, e pai de todos os mininos da tabanca"...
O melhor elogio que se pode fazer deste brioso "alfero Cabral", é dizer que ele, no TO da Guiné, foi "pau para toda a obra": para além de oficial miliciano e comandante de um pelotão de caçadores nativos, era homem grande, pai, patrão, chefe de tabanca, conselheiro, poeta, contador de histórias, antropólogo, cherno, mauro, enfermeiro, médico, sexólogo, confidente de bajudas, advogado e não sei que mais, um verdadeiro Lawrence das Arábias da Guiné... Mais: não tinha inimigos, nem nas fileiras do PAIGC!... E a prova disso é que, no seu tempo, nem Fá nem Missirá foram atacadas ou flageladas.
Pois bem, foi este homem quem começou a escrever, na I Série do blogue, as famosas "estórias cabralianas" que já vão no nº 76... Pensando nos seus fãs, mais antigos ou mais recentes, e em tempo de comemorações do nosso 9º aniversário (*), reproduzimos aqui a nº 7 dessas "estórias cabralianas", que tem a ver com um delicioso anúncio que apareceu um dia, cravado no poilão da Tabanca de Fá Mandinga: " Alfero poi catota noba, dam trez bintim"...
Se não foi o melhor negócio da vida dele, "alfero Cabral", foi seguramente a melhor "boa ação" psicossocial levada a cabo no tempo do Spínola, e que muito terá contribuído para uma Guiné Melhor... Pelo menos, em Fá (Mandinga), sempre que lá fui, nunca vi bajudas com ar infeliz... (LG).
2. Estórias cabralianas > Alfero Cabral põe "catota nova" (**)...
por Jorge Cabral
Finda a comissão, calculem (!), fui louvado. O despacho do Exmo. Comandante do CAOP Dois [, com sede em Bafatá,] referia, entre outros elogios, a minha “habilidade para lidar com a tropa africana e populações”, a qual me havia “granjeado grande prestígio”.
Esquecido, porém, foi o essencial – evitei a dezenas de bajudas o repúdio matrimonial e a consequente devolução do preço. Essa tão meritória actividade, sim, teria merecido, não um simples louvor, mas uma medalha…
Entre Fulas, Mandingas e Beafadas, as mulheres eram compradas, alcançando-se verbas elevadas. Cheguei a arbitrar casamentos, cujo dote atingiu os trinta contos! Claro que era exigida a virgindade, que às vezes havia desaparecido… Era então que o Alfero odjo grosso era procurado para remediar o que parecia irremediável.
Quanto ao teste pré-matrimonial, a cargo das mulheres grandes, que utilizavam um ovo (!), a questão resolvia-se, com alguns pesos.
O mais difícil era a prova do sangue no lençol, que devia ser exibido no dia seguinte à cerimónia. Equacionado o problema, adoptei uma solução que sabia já ter sido usada entre outras gentes com sucesso. Comprei em Bafatá pequenas esponjas, as quais embebidas em sangue de galinha, e metidas no local apropriado deram um resultadão.
Não houve mais Bajuda que não casasse em total e absoluta virgindade e confesso que me dava um certo gozo assistir às manifestações de júbilo dos viris maridos, no dia seguinte aos casamentos, no meio da algazarra da Tabanca.
Espalhada a minha fama, acorreram noivas de todo o lado. Ponderei mesmo montar um gabinete especializado, tendo chegado a escrever um folheto publicitário a informar que Alfero poi catota noba, dam trezbintim.
Texto: © Jorge Cabral (2006). Todos os direitos reservados
Notas do editor
(*) Último poste da série > 7 de maio de 2013 > Guiné 63/74 - P11539: 9º aniversário do nosso blogue: Os melhores postes da I Série (2004/06) (12): Fima Siga, a enfermeira do Morés (Virgínio Briote, ex-alf mil comando, Brá, 1965/67)
(**) Vd. I Série, poste de 17 de março de 2006 > Guiné 63/74 - DCXXXIX [639]: Estórias cabralianas (7): Alfero poi catota noba (Jorge Cabra)