segunda-feira, 5 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23847: Casos: a verdade sobre... (32): o pós-25 de Abril no CTIG, as relações das NT com o PAIGC, a retração do dispositivo militar e a descolonização

Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > 3.ª CART/BART 6520/72 (Fulacunda, 1972/74) > Julho de 1974 > Visita de Bunca Dabó e do seu bigrupo, fortemente armado... Ao centro, o nosso amigo e camarada Jorge Pinto, então alf mil, em farda nº 2, desarmado, descontraído, fazendo as "honras da casa". O aquartelamento e a povoação foram ocupados pelo PAIGC apenas em 2 de setembro de 1974. (Natural de Turquel, Alcobaça, o Jorge Pinto é professor do ensino secundário, reformado)

Foto (e legenda): © Jorge Pinto (2016). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné > Região do Oio > Bissorã > CCAÇ 13 (169/74) > Meados / finais de maio de  1974 > Imagens do "glorioso dia do primeiro encontro com as tropas do PAIGC em Bissorã e após 25 de Abril,  creio eu que foi em meados ou finais de maio de 1974" (...). Fotos do álbum do Henrique Cerqueira, que esteve, como fur mil at inf, no TO da Guiné, desde finais de novembro de 1972 até inícios de kulho de 1974, primeiro na 3ª CCAÇ / BCAÇ 4610/72 e depois na CCAÇ 13.

Fotos ( legenda): © Henrique Cerqueira (2012)  Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné > Região de Gabu < Paunca > CCAÇ 11 (1969/74) > 7 de junho de  1974 >  A paz, depois da guerra, ou guerra & paz, como faces da mesma moeda... >  O fur mil op esp J. Casimiro Carvalho, "herói de Gadamael", no meio dos inimigos de ontem...  Fotos do seu álbum fotográfico, sem legendas... 

Este nosso camarada que vemos aqui a abraçar os inimigos de ontem, foi o mesmo que tinha escrito à mãe,na véspera,  em 6 de junho de 1974,  a seguinte missiva:

 "(...) Ficou, nesse encontro, determinado que amanhã o inimigo vinha a um quartel nosso visitar-nos, conhecer-nos, nós que nos matavámos [uns aos outros] sem nos vermos. Enfim, agora como está previsto, conhecer-nos-emos, se não houver imprevistos, e eu, que tanto os odiei, com o ódio que ganhei com a guerra, devido ao sangue que vi derramar, irei... talvez - quem sabe ? - abraçá-los. Sim, porque eles lutaram para defenderem o que por direito lhes pertencia, um chão deles, bravos soldados como nós." (...).

É o mesmo J. Casimiro Carvalho que na batalha de Gadamael pôs a vida em risco para salvar outros camaradas (e nomeadamente o seu capitão) e que chegou a ser ferido.

Fotos: © José Casimiro Carvalho (2007). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Xitole >  2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616/73 (Xitole, 1974) > Foto do álbum do José Zeferino, ex-alf mil at inf. "Primeiro encontro no Xitole: de costas um comandante do PAIGC – não me lembro do nome – , o nosso médico, Dr. Morgado, eu, o capitão Luís Viegas, o comissário politico Antero Alfama e o 1.º sargento páraquedista Vaz".  O comandante da 2ª CCAÇ / BCAC 416/73 era cap mil inf Luís Fernando de Andrade Viegas (com este mesmo nome, há um membro da Ordem dos Engenheiros da Região Sul, portado ca cédula profissional nº 12.037).

Guiné > Zona leste > Região de Bafatá > Xitole >  2.ª CCAÇ/BCAÇ 4616/73, Xitole, 1974 > s/d    [c. jun/set 1974]>  Chegada ao Xitole de forças do PAIGC, em camiões russos.

Algumas apontamentos do diário de alf mil José Zeferino: 

(i) Xitole, 22 de abril de 1974 - Apresenta-se um guerrilheiro do PAIGC. Má altura, para ele, para desertar das suas fileiras; 

(ii) 25 de abril 1974 - madrugada, cerca das 6 horas: "Zefruíno, alferes Zefruíno"!!!... (...) Era o Jamil, comerciante libanês (...),  que estava a ouvir a BBC em árabe: "Zefruíno, o (...)  Spínola está a fazer uma revolta". (...) Foi assim que tive conhecimento do que se passava em Lisboa. Regressámos de imediato ao quartel. Ficámos na expectativa nos dias seguintes. Patrulhamentos, só o mínimo indispensável, até Endorna. Montagem de segurança nocturna: poucas. Estávamos literalmente presos pela avidez dos comunicados. Acreditámos que o fim da guerra era desejado pelas duas partes. Pelo menos para a população era-o. E muito. (...)

(iii) 15 de maio de 1974 – Violento combate – emboscada. Duas baixas do nosso lado: o alferes Aguiar e o soldado de transmissões Domingos. Cerca de uma dezena de feridos. Sinais de baixas IN;

(iv) 30 de maio de 1974 - São detectadas e levantadas várias minas reforçadas com granadas de RPG;

(vi) 6 de junho de 1974 - Pelas 6 horas, nova rajada. Desta vez de uma sentinela junto ao espaldão do morteiro 81, na zona dos quartos dos oficiais e do abrigo da Breda. Novamente nas valas avistámos, a umas dezenas de metros, uma coluna IN que se aproximava, vinda da tabanca, pela orla da pista de aviação. Sob o nosso fogo fugiram para o mato do outro lado da pista, deixando um deles ferido. Veio a falecer pouco depois na nossa enfermaria. Foi este, realmente, o ultimo acto de guerra na zona e ainda hoje não o entendo totalmente.

(vii) 15 de junho de 1974 - Na picada, para lá da Ponte dos Fulas, suspensa de uma árvore, é encontrada uma carta com um maço de tabaco Nô Pintcha, e um isqueiro. Convidava o capitão a fazer a paz. O que foi feito no mesmo dia, perto do pontão do Jagarajá.

(viii)  de 16 de junho a setembro de 1974 - Começaram então as visitas de comandantes e comissários políticos do PAIGC para combinar a cerimónia da entrega do quartel, com o arriar da nossa bandeira e o hastear da deles. Vinham das matas da margem direita do Corubal – Mina, Fiofioli, etc. (...)

Houve um jogo de futebol entre nós e os guerrilheiros. Gostavam imenso de falar com o nosso pessoal chegando a trocar impressões sobre o material que tínhamos usado na guerra. Creio que numa dessas conversas foi dito que quem preparou a tal emboscada de 15 de maio teria sido castigado. Não aprofundámos a questão (...).

Quase todos os dias apareciam guerrilheiros procurando refeições na nossa cantina geral. A única exigência nossa: tinham que deixar a arma à entrada do quartel, no posto de sentinelaFazendo-se transportar por camionetas civis paravam sempre na casa do Jamil para o cumprimentar. (...) Numa das colunas, e em viatura civil, chegaram também duas prostitutas. Alguns aproveitaram. (...)

O Saltinho já tinha sido entregueBastou um dia para ficarem sem gerador. Os novos ocupantes pedem ajuda ao Xitole para reparar o aparelho. Nesse dia à noite ficámos preocupados por a equipa que foi não ter chegado. Foram encontrados perto de Cambéssé com o Unimog espetado dentro do mato com vários guerrilheiros a tentar repô-lo na picada. O comandante deles, de nome Claude, ficou irritadíssimo quando nos viu. Já estava todo alterado. E foi a única expressão de ódio que registei em todos os contactos com elementos do PAIGC. Mas a nossa equipa foi muito bem tratada por eles.

Entretanto chegam-nos notícias de problemas em Bambadinca: Com as nossas milícias: queriam alimentos e com a CCAÇ 12 que não queria entregar as armas. Depois… o tempo passou-se… lentamente. E entregámos o Xitole  [em ].(...)

 (ix) Bissau, 12 de setembro de 1974 - Embarque no Uíge, para Lisboa. (...)

Foto (elegenda): © José Zeferino (2009). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné > Bissau > Brá > BENG 447 > 14 de outubro de 1974 > O último arriar da bandeira no CTIG, mas já sem a presença de representantes do PAIGC. Foto do álbum  do José Lino [Padrão de] Oliveira [ex-fur mil amanuense, CCS/BCAÇ 4612/74, Mansoa, Cumeré e Brá, 12-7-1974 / 15-10-1974]

Guiné > Bissau > Brá > BENG 447 > Cemitério de viaturas e outros equipamentos militares (GMC, Daimlers,  Panhard, jipes, Obuses 14...) abandonados como sucata, no fim da guerra.

Guiné > Região do Oio > Mansoa > CCS/BCAÇ 4612/74 (12jul74-15/10/74) >  9 de setembro de 1974 > Cerimónia da entrega (simbólica) do território aos novos senhores da Guiné, o PAIGC,  e  da retirada, ordeira, digna e segura, das últimas tropas portuguesas. Mansoa, em pleno coração do território, na região do Oio, serviu perfeitamente para esse duplo propósito... É uma fotos histórica, em que se vê o nosso coeditor, camarada e amigo Eduardo Magalhães Ribeiro, fur mil op esp / ranger, a arriar a bandeira verde-rubra. (O MR é membro da nossa Tabanca Grande, desde 1/11/2005...

Guiné > Bissau > Brá > BENG 447 >  14 de outubro de 1974 > O último arriar da bandeira no CTIG, mas já sem a presença de representantes do PAIGC.  O último ato da soberania portuguesa não foi o arruiar da bandeira, em Mansoa, em 9 de setembro de 1974....O BCAÇ 4612/74 seria colocado depois de 9/9/1974, no BENG 447, em Brá, Bissau... a útima bandeira portuguesa a ser arriada, no CTIG, seria no próprio "dia do embarque", ou seja, mais de um mês depois, em 15/10/1974. Essa honra coube, de novo, ao Eduardo Magalhães Ribeiro, fur mil op esp / ranger, da CCS/BCAÇ 4612/73 (12 de julho de 1974 - 15 de outubro de 1974).

Fotos (e legenda): © José Lino Oliveira (2020). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

Guiné >s/l >  s/d > O último Governador Geral e Comandante-Chefe, Carlos Fabião (1974)... Era um dos militares com mais anos de serviço no TO (3 comissões ou mais). Aqui na foto ainda capitão e depois major, comandante do Comando Geral de Milícias (1971/73), ao tempo de Spínola... Foto de autor desconhecido, reproduzida aqui com a devida vénia. In: Afonso, A., e Matos Gomes, C. - Guerra colonial: Angola, Guiné, Moçambique. Lisboa: Diário de Notícias, s/d., pp. 332 e 335. .


Guiné > Bissau > Cais da Marinha > Outubro de 1974 > Quatro Lanchas de Fiscalização Grandes (LFG), uma pequena, e uma LDM na Ponte Cais em Bissau, poucos dias antes da “retirada final” do dia 14 de outubro do mesmo ano. É visível o navio Uíge ao fundo, preparado para transportar os últimos militares portugueses da Guiné. Foto do álbum do ex-Marinheiro Radiotelegrafista, Manuel Beleza Ferraz.

Segundo o nosso amigo Luís Gonçalves Vaz, membro da nossa Tabanca Grande e filho do Cor Cav CEM Henrique Gonçalves Vaz (último Chefe do Estado-Maior do CTIG, 1973/74),e basedado no depoimento do Manuel Beleza Frerraz,  "no dia 14 de outubro, decorreu a última cerimónia de 'Arriar da Bandeira Portuguesa', ao qual se seguiu o 'Hastear de Bandeira da República da Guiné-Bissau' (a última bandeira nacional em Bissau só foi retirada 4 ou 5 semanas depois de 14 de outubro de 1974, sem cerimónia oficial),  como tal, nesse mesmo momento, todo o que restava do contingente militar português (à excepção de dois pequenos destacamentos de tropa portuguesa, da Marinha e da Força Aérea, esta na já ex-BA 12,  em Bissalanca, mas ainda com helicópteros AL-III, e o destacamento da Marinha nas suas antigas instalações, para colaborarem na transição e transmissão de técnicas/procedimentos, conhecimentos e experiências de navegação aérea e marítima, com elementos do PAIGC), encontrava-se agora em território estrangeiro.

(...) "A comitiva constituída pelo Governador (brigadeiro Carlos Fabião), o Comandante Militar (brigadeiro Figueiredo), o Chefe do Estado-Maior do CTIG (coronel Henrique Gonçalves Vaz), bem como alguns outros oficiais do Estado-Maior, sargentos e praças, depois de assistirem ao embarque de todos os militares nos navios, que se encontravam ao largo do estuário do Rio Geba, e assegurando-se que tudo tinha corrido sem problemas e de acordo com o previsto nos 'Planos de Retirada', elaborados pelo CTIG / CCFAG que nesta altura se afirmava como o único Comando das Forças Armadas Portuguesas neste TO da Guiné, seguiram directamente para o Aeroporto de Bissalanca, onde mantínhamos ainda um dispositivo de segurança.

(...) "Mal acabou a cerimónia referida anteriormente, e segundo testemunho do ex-marinheiro radiotelegrafista, Manuel Aurélio A. Beleza Ferraz, que se encontrava nesta altura na LFG Lira, todas as guarnições dos nossos navios que se encontravam na zona, estavam por ordens superiores, em posição de combate (para qualquer eventualidade), estando todos os operacionais equipados com coletes salva-vidas, capacetes metálicos e as Bofors (peças de artilharia antiaéreas de 40 mm) sem capa e municiadas, prontas a realizar fogo de protecção à retirada das nossas tropas, que ainda se encontravam em terra. Segundo o ex-marinheiro radiotelegrafista, Manuel Beleza Ferraz, os navios que se encontravam a realizar a 'segurança de rectaguarda'  mais próxima às tropas que iriam retirar-se para os navios ao largo no Rio Geba, eram a LFG Órion e a LFG Lira.

(...) "Às 2h30m do dia 14 de outubro de 1974, estes militares serão os últimos a retirar da Guiné. Nesse momento estiveram presentes alguns Comandantes do PAIGC, que quiseram despedir-se dos 'seus antigos inimigos', e assim foi o fim da colonização da Guiné com cerca de 500 anos." (...)

Foto (e legenda): ©  Manuel Beleza Ferraz / Luís Gonçalves Vaz (2012). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. No livro de João Céu e Silva,  "Uma longa viagem com Pulido Valente" (Lisboa, Contraponto, 2021, 296 pp.), são atribuídas a Vasco Pulido Valente (VPV)  (1943-2021) as seguintes afirmações, a propósito da descolonização (*):

(...) Quando o Dr. Mário Soares chegou ao Ministério dos Negócios Estrangeiros , já o coronel Fabião estava aos abraços ao PAIGC e o Otelo aos abraços à FRELIMO. Não havia negociação possível.

Quem fez a descolonização não foi o Dr. Mário Soares, mas o MFA. Ele não queria fazer aquela descolonização, e foi assim porque o Exército português se desfez em quarenta e oito horas em Angola, Moçambique e Guiné. Neste último caso, fomos mesmo ao encontro das tropas inimigas e confraternizámos poucos dias após o 25 de Abril. Como aconteceu no Norte de Moçambique e quase imediatamente me Angola (pp. 282/283).

(…) Lembro-me do abraço de Soares a Samora Machel, horrível! E Como aconteceu ? A comitiva entrou na sala de reuniões, Otelo olhou para o Machel e disse: “Ah grande Machel, deixe-me dar-lhe um abraço”, e Soares, que estava a chefiar a delegação, ficou sem saber o que iria fazer. Depois de Machel ter dado um abraço a Otelo, veio ter com Soares de braços abertos, “Meu caro Mário”, e deu-lhe um abraço. Isto só deveria ter acontecido com Moçambique independente” (p. 191).


2. Pergunta-se, aos camaradas da Tabanca Grande que estavam no TO  da Guiné no 25 de Abril de 1974: tem algum fundamento a declaração de VPV, segundo a qual as NT foram logo, "pouco dias após o 25 de Abril" (...)  "ao encontro das tropas inimigas " (leia-se, do PAIGC) e "confraternizaram" ?

Eu não estava lá, mas pelo que sei, e pelos depoimentos já aqui foram publicados ao longo de 18 anos de existência do blogue,  acho estranho que, ao fim destes anos todos (já lá vão 48, quase meio século!), já ninguém se indigne com estas, senão "bojardas", pelo menos "bocas foleiras", vindas para mais de um homem com formação académica, historiador encartado e, de resto,  um dos "cronistas-mor" do regime democrático,  o qual, todavia,  sempre esteve longe (fisicamemte falando) do teatro de operações da Guiné. 

No citado livro (que é um meritório trabalho do João Céu e Silva, como já aqui foi dito), há outras" leviandades" (não quero chamar-lhe outros nomes) que são ditas sobre a guerra da Guiné (como, por exemplo, sobre o acidente de helicóptero, caído no rio Mansoa, em que morreu o seu amigo, o deputado da Ala Liberal José Pedro Pinto Leite, e mais outros 3 deputados da Assembelia Nacional, além da tripulação, e que VPV atribui à pontaria dos artilheiros do  PAIGC) (**)...Para já não falar da infeliz expressão "capitães milicianos mercenários" (também não provocou, ao que parece, a indignação dos nossos leitores, na ausência de comentários ao poste) (***)...

No essencial, as declarações do VPV parecem-me injustas ou menos felizes, em relação aos "últimos soldados do Império" que arriaram a última bandeira verde-rubra na Guiné... No mínimo, não responderão à verdade dos factos... Em zonas como o Xitole, a guerra prolongou-se até quase a meados de junho e ainda houve mortos de parte a parte... Na generalidade dos casos,  a retração do nosso dispositivo militar (aquartelamentos, destacamentos, etc.)  fez-se com ordem e dignidade, de acordo com um plano de retirada superiormente aprovado... E, depois, se uma jogatana de futebol, entre inimigos de ontem, num processo de negocição de paz, ao fim de onde, doze, treze anos de guerra, é uma prova inequícova de "confraternização", então temos que tratar com pinças as palavras que usamos quando falamos da gestão dos conflitos entre os seres humanos...

Na primeira parte deste poste, selecionámos, ao "vol d'oiseau",  algumas fotos e legendas que fomos publicando, a este respeito, ao longo dos anos... Esperemos que estas possam suscitar mais depoimentos e reflexões sobre o tema, sem que a discussão acabe na "fulanização" e na "caça às  bruxas", na patológica tentação, tão portuguesa (e se calhar universal), de querer arranjar logo "bodes expiatórios" quando as coisas não nos correm com ventos de feição como foi o caso, por exemplo, da descolonização... 

Enfim, façamos votos, neste já final do ano de 2022,  para  que os nossos historiadores (militares ou outros, portugueses ou estrangeiros) possam, com mais investigação,  fazer mais luz, em 2023,  sobre este período e estes factos em que as narrativas ainda estão longe de serem consensuais, devido também ao enviesamento político-ideológico (****). LG
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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 3 de dezembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23840: Notas de leitura (1527): "Uma longa viagem com Vasco Pulido Valente", de João Céu e Silva (Lisboa, Contraponto, 2021, 296 pp) - O Estado Novo, a guerra colonial, o Exército e o 25 de Abril (Luís Graça) - Parte VI: 25 de Abril ? 25 de Novembro ? E descolonização ? Acho que consigo compreender tudo no caso português. Isto parece uma gabarolice, mas não é. A mim, não há nenhum acontecimento que me cause perplexidade" (VPV)

(**) Vd. poste de 18 de novembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23793: Notas de leitura (1518): "Uma longa viagem com Vasco Pulido Valente", de João Céu e Silva (Lisboa, Contraponto, 2021, 296 pp) - O Estado Novo, a guerra colonial, o Exército e o 25 de Abril (Luís Graça) - Parte II: A guerra de África não foi nada parecido como o trauma da I Grande Guerra...


(****) Último poste da série > 25 de outubro de 2022 > Guiné 61/74 - P23736: Casos: a verdade sobre... (31): Pansau Na Isna, o "herói do Como" (1938 - 1970), entre o mito e a realidade - Parte II: Visto do lado de lá

Guiné 61/74 - P23846: Parabéns a você (2122): Manuel Carvalho, ex-Fur Mil Armas Pesadas Infantaria da CCAÇ 2366/BCAÇ 2845 (Teixeira Pinto, Jolmete e Quinhamel, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 2 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23836: Parabéns a você (2121): Herlânder Simões, ex-Fur Mil Art da CART 2772 e CCAÇ 3477 (Nova Sintra, Guileje e Nhacra, 1970/72)

domingo, 4 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23845: Tabanca Grande (540): Manuel Calhandra Leitão ("Mafra"), ex-1º cabo at arm pes inf, Pel Mort 1028 (Fá Mandinga, Xime, Ponta do Inglês, Enxalé e Xitole, 1965/67)


Manuel Calhandra Leitão (n. Achada, Mafra, 1943), ex-1º cabo, Pel Mort 1028 (Fá Mandinga, Xime, Ponta do Inglês, Enxalé, Xitole, 1965/67)



Guião do Pel Mort 1028 (CTIG, 1965/67), mobilizado pelo RI 2. 
Divisa: "Res Non Verba" (Obras, não palavras)

Fotos (e legendas): © Manuel Calhandra Leitão (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. Mensagem de Pedro Leitão, filho do novo membro da Tabanca Grande, Manuel Calhandra Leitão ("Mafra") (*):

Data - sábado, 3/12/2022, 13:29  
Assunto - Fotos do "Mafra"

Olá,  boa tarde,

Tal como suspeitava, não conseguimos encontrar o álbum que tem as fotos do meu pai nos tempos da Guiné. A minha irmã guardou-o em algum local do qual agora não se recorda. Havemos de o encontrar,  entretanto. Eu depois vou digitalizá-las para ter um registo digital das mesmas.

Entretanto encontrei uma foto tipo passe do tempo em que ele foi para a Guiné e também o emblema do pelotão de morteiros,  que envio em anexo.

Quero agradecer pelo almoço de ontem. O almoço, o restaurante, o local, a companhia e a conversa, foi muito bom. o meu pai já há algum tempo que tinha vontade de voltar a vos ver e estar com camaradas de armas.

Um forte abraço,
Pedro Leitão (...)

2. Resposta do editor LG, com data de hoje, às 15:50, e com conhecimento a vários camaradas que passaram pelo Enxalé; 

Pedro:

Como prometido, o teu pai (e nosso camarada e amigo Manuel Leitão, mais conhecido como "Mafra") entrou para a Tabanca Grande no dia do seu 79º aniversário (*)... Não sei se viste... É também uma pequena homenagem, bem merecida... Aqui tens o link no Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné:

https://blogueforanadaevaotres.blogspot.com/2022/12/guine-6174-p23841-tabanca-grande-539.html

Seguramente que o João Crisóstomo, que já deve ter chegado, a esta hora, a casa, em Queens, N. Y., onde o esperava a sua querida Vilma, vai ficar satisfeito com a notícia... O João é um homem gregário e agregador, e foi na terra dele, em Paradas, A-dos-Cunhados, Torres Vedras, que eu conheci o teu pai, em 2018 (estive com ele a conversar, juntamente com o nosso saudoso Eduardo Jorge Ferreira).

A CCAÇ 1439 e o Pel Mort 1028 (ou pelo menos a esquadra que era comandada pelo teu pai, o valente 1º cabo "Mafra", no Enxalé, 1965/67) ficam agora ainda mais ligados: os únicos representantes vivos destas duas subunidades que atuaram no leste da Guiné, na zona leste, Sector L1 (a CCAÇ 1439 e do Pel Mort 1028), na nossa tertúlia (a Tabanca Grande, com 867 membros, desde 2004) são o João e o teu pai, respetivamente... Do Pelotão de Morteiros nº 1028 não conhecíamos ninguém...

Podes dizer ao teu pai (que infelizmente não lê, com regularidade, o nosso blogue) que o seu Pel Mort 1028 (que deviam ser 30 homens), em 1 de julho de 1966, estava espalhado por vários aquartelamentos e destacamentos da zona leste, sector L1, da responsabilidade do BCAÇ 1888 (com sede em Bambadinca):
 
Pel Mort 1028(-) : Sede em Fá Mandinga (a 5 km a nordeste de Bambadinca)
- 1 Secção (-): Xime
- 1 Secção (-): Ponta do Inglês (junto à foz do rio Corubal, na margem direita)
- 1 Secção (-): Xitole
- 1 Esquadra: Enxalé


Vou fazer um novo poste com as fotos que mandaste. Quando descobrires, entretanto, o paradeiro do álbum do teu pai, da Guiné, logo me mandarás mais "recuerdos"... É importante que as fotos (e outros documentos, como cartas, aerogramas, diários, etc.) dos antigos combatentes da Guiné (e dos outros teatros de operações, como Angola e Moçambique) não acabem no contentor do lixo, no fogo da lareira ou na feira da ladra, como acontece infelizmente todos os dias, quando morre um antigo combatente...

Prometo telefonar ao teu pai, um dia destes, para ele me contar de viva voz (ou refrescar a minha memória com) algumas das suas histórias do Enxalé... (e de Mafra, onde estive a trabalhar uns meses, em 1973/74). Ele é um excelente contador de histórias, para além de um grande ser humano (e um amigo que muito prezo).

Desejo o melhor do mundo e da vida para o teu pai, para ti e demais família, a começar pela vossa mãe. O melhor Natal possível para vocês. E que o ano de 2023 seja de esperança. Oxalá, Enxalé, Insh' Allah!... Luís (e Alice)

PS - Também fiquei feliz por reencontrar o nosso amigo e camarada Joaquim Peixeira e a sua esposa, que, por coincidência, são pais de uma antiga aluna minha /nossa (ENSP/ NOVA) de administração hospitalar, a dra. Manuela Almeida Peixeira. Espero que o Joaquim, antigo combatente da Guiné, se junte também à nossa Tabanca Grande. Tenho, para já, o lugar nº 868, à sombra do nosso poilão, à sua espera... Só preciso das duas fotos da praxe e de duas linhas de apresentação...
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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 3 de dezembro de 2022 > Guiné 61/74 - P23841: Tabanca Grande (539): Manuel Calhandra Leitão, de alcunha o "Mafra", ex-1º cabo, Pel Mort 1028 (Enxalé, 1965/67), faz hoje anos 79 anos e passa a sentar-se à sombra do nosso poilão, sob o nº 867

Guiné 61/74 - P23844: Blogoterapia (308): As desejadas férias e a angústia do regresso à Guiné (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR)

1. Em mensagem de 1 de Dezembro de 2022, o nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), fala-nos das suas férias na metrópole e na angústia do regresso  Guiné.


As desejadas férias

Gozei os meus trinta e cinco de férias entre Outubro e Novembro de 1972.

As férias eram ansiosamente esperadas e assim eram, não muitas vezes, um pouco decepcionantes em relação às expectativas criadas. É como desejar muito uma coisa, que se transforma num balão e que esvazia lentamente. O facto de ter de regressar tirou muito do prazer de voltar a casa, abraçar os meus pais e irmãos, percorrer os locais beber um café na esplanada do Trindade, estar longe da bianda com estilhaços, das latas com cavala, da ração de combate, o pó da picada. Tudo sabia a ilusão estar ali.

Bem sei que praticamente todos os amigos da minha geração estavam a cumprir as suas comissões. Quando ia ao café,  era quase um estranho só os mais velhos ou mais novos me conheciam.

Por assim dizer a minha vida estava parada, não podia ou não queria ter esperança ou dar esperança, aos que me rodearam com todo o carinho e que tudo fizeram para não me sentir deslocado, mas de alguma forma eu também estava ausente como se não tivesse vindo todo no 727 da TAP . Parte de mim tinha ficado lá, junto dos camaradas nos dias tórridos, nos cheiros bem como nos sons que se expandiam pelo ar logo de madruga.

Hoje encontrei o recibo de uma prestação da minha viagem, 2.235$50 julgo que (pesos) escudos da Guiné. Uma pequena fortuna para aquele tempo, se fizer as contas custou todo o dinheiro que cá ficava depositado até à data.
Uma curiosidade era ter a data do meu desembarque e o fim da comissão para 17 de Setembro de 1973 . Uma espécie de futurologia falhada uma vez que só em finais de Março de 1974 o meu batalhão embarcou no Niassa de regresso a casa.

Vim mais o furriel Fonseca e um camarada do Dulombi a quem chamavam o “Espanhol”. Este camarada era uma pessoa extremamente alérgico a qualquer picada. Assim bastava ser picado por uma formiga daquelas pequeninas pretas para ficar complemente deformado. No avião sentiu-se indisposto e a hospedeira veio com um alka-seltzer. Bom, a reacção alérgica foi de tal ordem, que julgamos que ele não chegava vivo à ilha do Sal. Também viajou no mesmo avião o meu colega de escola primária, Augusto, que estava nos comandos.

Como todos imaginam foi uma festa com uns whiskies, porque o avião era coisa fina e não se bebia lá bejecas nem se comia mancarra.

Fui padrinho de casamento do meu irmão e assim à medida que se aproximava o regresso mais fechado eu me tornei e para os últimos dias eu só desejava desaparecer dali para fora e, já que tinha que ser regressar a Galomaro, que fosse o mais depressa possível.

Parece triste para quem tanto desejou a minha companhia saber que eu não conseguia viver com aquela espada suspensa sobre a cabeça.

Chegado a Bissau, outro problema se pôs que foi o de regressar a Galomaro,  o que não era fácil porque a grande via de acesso era o Geba e não se podia ir a nado. Após alguns dias consegui transporte numa LDG até ao Xime onde fui recolhido por uma coluna do meu batalhão.

Por estranho que pareça senti-me seguro como se o que acontecesse não fosse o esperado.
Foto da festa do meu regresso. Nessa noite atacaram Campata com pelo o menos seis mortos confirmados entre os guerrilheiros, dois milicias e varios feridos entre a população. Na foto estão o Ivo, o Catroga, o Silva, eu, o Passos, o Silva e o Ferreira.

Assim regressei a tempo de infelizmente assistir ao período mais difícil do meu destacamento, com ataques a aldeias em auto-defesa, com minas, com o primeiro morto na picada do Saltinho, com a morte do alferes Mota e por fim com o ataque ao arame no dia 1 de Dezembro.

Quando regressei de vez, voltei aos mesmos sítios e encontrei os que já tinham regressado. O ar era mais leve porque a minha ansiedade tinha desaparecido após deixar o Niassa, agora era para ficar.

Um abraço
Juvenal Amado

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Nota do editor

Último poste da série de 1 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23835: Blogoterapia (307): Nós e eles (Tony Borié, ex-1.º Cabo Op Cripto do CMD AGR 16)

Guiné 61/74 - P23843: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte V - Chegada a Gadamael Porto

1. Parte V da publicação do excerto que diz respeito à sua vida militar do livro "Um Olhar Retrospectivo", da autoria de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 - Gadamael e Quinhamel, 1970/72.


V - Gadamael Porto…

Avisados sobre a data de partida para Gadamael Porto, deram-nos uma ideia sobre o trajecto: descer o rio Geba, seguir pelo mar, passar entre a costa e o arquipélago dos Bijagós, até ao rio Cacine, com percurso até Gadamael Porto.

Dia 27 de Novembro, lá fomos, rio abaixo, com o equipamento de defesa adequado e acompanhados por uma corveta da marinha de guerra, com os transbordos planeados, sempre atentos às margens e a qualquer movimento suspeito, cumprindo as orientações recebidas, até Gadamael Porto, onde chegámos dia 29.

Início da tarde, chegada a Gadamael Porto.
Acostagem a um porto que mais parecia um pequeno cais de brincadeira, enorme decepção, com sensação estranhíssima de desânimo e vazio, imagem parecida com aquelas pequenas cidades perdidas ou abandonadas do tempo do faroeste, ainda sem ter noção de qualquer realidade.
Depois de desembarcarmos, uma olhada pelo cenário, identificação do verdadeiro solo que estávamos a pisar, pela primeira vez, sem sequer pensarmos no tempo que ali teríamos de viver.
Além do rio lamacento, mais lama do que outra coisa, com caudal quando a maré subia, claro, encontrámos terra castanha, circundada por capim e mata cerrada, parte dela, virgem, aguardando ser desbravada.

Pequenas tabancas de lama e colmo, a par das tabancas construídas pelos militares, à medida que iam chegando, dando vida diferente aquele cenário.
Estas tabancas construídas por nós também eram erguidas com tijolos de lama, feitos em formas de madeira dos nossos caixotes, que eram espalhados pelo chão e coziam ao sol.
A argamassa para a união era feita da mesma lama.
A cobertura era com pedaços de palmeira a servir de base e apoio das folhas de zinco que a Engenharia de Bissau enviava por batelões, chegando metade ao destino, pois os nativos iam desviando o que podiam, durante a viagem.

No meio do aquartelamento, um edifício térreo antigo, uma velha casa de comerciantes libaneses (designada Taufik Saad), dos tempos do comércio entre República da Guiné-Conacry, Guiné-Bissau e Senegal, que já tinha sido aproveitado para edifício do comando.
A um canto, uma pequena tabanca que fazia de enfermaria, onde o furriel enfermeiro, o Vítor Coelho, orientava a actividade possível.
Uma caixa de cartão com medicamentos tinha de ser bem gerida, pois era difícil recebermos medicamentos com a frequência adequada.

Por falar nisto, recordo-me de um indígena Fula que tinha o vício da injecção, pois dizia que tinha dores no corpo: ‘a mi miste agula, corpo di mi, manga di mal…’ (eu quero injecção porque tenho dores no corpo).
A primeira vez, perguntam-lhe o nome, para registo, ele diz: ‘afinal di contas’
E lá estava, todos os dias, a pedir injecção.
Claro que levava injecção, mas de água destilada, e dizia: ‘manga di sabe sabe’ (muito bom!).
Depois, perguntavam-lhe: ‘corpinho di bó?’ (está bom?), a que respondia: ‘jametum!’ (está bom!)
Havia um outro que também lá estava caído, a toda a hora, a pedir pastilhas, e chamava-se ‘dinheiro có’.
Mas ele é que escolhia as pastilhas, pela cor da caixa…

Aquilo que mais chamou a nossa atenção foi a expressão de alívio da companhia que íamos render, cansados, saturados e ansiosos por deixar aquele local.
Mas a saudação à companhia que íamos render foi algo atribulada, ao contrário do que era suposto.
Um ajuntamento de militares, em frente ao tal edifício do comando, como que cercando um militar, tronco nu, calções, sujo e suado, de G3 apontada a uma porta do edifício: ‘Saiam daí, seus covardes, que eu limpo-lhes o sebo!’
Ninguém se mexia, ninguém falava.

Perguntei a um deles de que se tratava, respondendo-me que aquele ‘gajo’ queria limpar o capitão e um alferes que estavam escondidos dentro do edifício.
Da minha companhia, ninguém deu um passo, incluindo o capitão Assunção e Silva.
Eu olhei bem para o ‘gajo’ e vi algo de familiar.
Sim, era ele mesmo: um dos filhos de uma família de marchantes, donos dos talhos de Vieira do Minho!
Aproximei-me, ele virou a G3 para mim, de imediato, ameaçando e que não desse nem mais um passo.
Olhei-o bem nos olhos e perguntei-lhe se Vieira do Minho lhe dizia alguma coisa.
Ficou estático, de repente, o que interpretei como que uma certa abertura para uma iniciativa da minha parte.
Avancei, novamente, desviei a G3 e pedi-lhe que fizesse um esforço para me identificar.

Vitória, pois consegui tocar-lhe num braço e levá-lo uns metros para fora daquele círculo de malta, ao mesmo tempo que lhe dizia as palavras que me iam surgindo.
Largou a G3 e deu-me um abraço sentido, deixando-me aliviado, para espanto de todos os outros.
Tudo acalmou e pudemos iniciar as saudações.

No entanto, o meu capitão Assunção e Silva logo se me dirigiu e, de certa forma, depreciou o meu acto, dizendo que, além do risco que corri, era problema da outra companhia que só eles deveriam resolver.
Isto não me caiu bem, mas interpretei como que um gesto de protecção, mais pelo risco que ele dizia eu ter corrido.

A passagem do espólio militar, nomeadamente, das armas, era uma rotina e envolvia alguma tensão, cujo motivo entendi, mais tarde, quando a companhia rendida foi embora e nós constatámos que os acessórios das armas que tínhamos assinado como recebidos não correspondia ao número real.
Esta operação era feita com intervalos, para dar tempo a que um conjunto de acessórios desse para mais do que uma arma.
Enquanto se sugeria um intervalo, depois de se mostrar uma arma, alguém combinado pegaria no conjunto e colocava-a no local a seguir, como se pertencesse à nova arma.
As numerações gravadas passavam despercebidas, com um pouco de conversa.
O mesmo teríamos de fazer, quando fossemos nós a passar à outra companhia que nos viesse render.

Esta operação tinha mais impacto nas metralhadoras pesadas, a Breda m/938 e a Browning m/952, montadas na periferia do aquartelamento, junto ao arame farpado, embora também pudesse abranger os morteiros 60 e 81 e outro material, nomeadamente, acessórios e munições.
E os velhos Racal TR28, equipamento de transmissões, de origem sul-africana, usados pelos operadores, às costas, sempre que solicitados para participarem em operações, lá estavam sob vigilância apertada, dificultando qualquer ‘marosca’ na passagem para a outra companhia.
E as célebres pistolas Walther de 9mm requeriam uma especial atenção…

Isto acontecia com todos e cada companhia tinha de fazer um esforço redobrado na gestão do material de guerra, no sentido de garantir a mesma defesa com menos equipamento.
Desonesto, estúpido, inaceitável, claro, mas as realidades são diferentes da nossa vontade e necessidade.

Sem demora, escolhemos a tabanca que nos pareceu mais simpática, pela localização e possibilidade de melhoramento.
Dava para os três, o Artur Neves, o Carlos Amaral e eu.
Como ficava mesmo em frente ao que era designado como edifício do comando, acabou por gerar polémica e alvo de ataque cerrado por uma personagem que apareceu depois.

E, para animar a malta, cerca das seis da tarde, primeira flagelação, logo no primeiro dia - um aviso do inimigo!
Eu e o Neves, um dos furriéis do 3.º grupo, estávamos a tomar uma espécie de duche, dentro de uma casinha de madeira, junto a zona dos obuses da artilharia, em que a água possível jorrava de um bidão colocado em cima de umas estacas, que era enchido com uma lata de chouriço.
Típico do ‘periquito’, inocente, ingénuo, inconsciente, reage como se se tratasse de brincadeira, mas logo percebe que a coisa é a sério… Gadamael Porto era um aquartelamento que ainda resistia, mas tinha de cobrir uma zona onde tinham existido outros aquartelamentos e destacamentos que, pela força do avanço e pressão do inimigo, acabaram por ser desactivados, pois era difícil a sobrevivência.

O efectivo do aquartelamento completava-se com quatro pelotões distintos:
- um pelotão de cavalaria, comandado pelo alferes Gomes e furriéis Oliveira Soares, Martins Soares, Manso, Barreiros, Rio e Vitoriano, com duas viaturas blindadas Fox, velhinhas;
- um pelotão de artilharia, comandado pelo alferes Vasco Pires e furriéis Krus, Carvalheda e Oliveira, com três obuses;
- dois pelotões de milícia, muito importantes na progressão dentro da mata cerrada e picagem, utilizando a designada pica, uma espécie de pingalim em ferro, cabo de madeira, para ir picando o solo, no sentido da detecção de minas. Ainda me recordo de alguns nomes dos milícias: camisa conté, mamadú biai, abdulai baldé, samba camará, amadú bari, mamadu embaló,…

Falei em Carvalheda que suponho deve conhecer ou, pelo menos, de ouvir falar, ligado à rádio, o Armando Carvalheda.
"O Carvalheda, sim, o Carvalheda da rádio, não me recordo do nome da Rádio."
Da Antena 1, o Armando Carvalheda, que começou na Emissora Nacional, em 1972 ou 1973, já tínhamos regressado da Guiné, hoje, ainda na Antena 1.
Foi mobilizado, mais ou menos na mesma altura que eu, tendo ido parar a Gadamael Porto, para fazer parte do pelotão de artilharia.
Pouco tempo depois, pelo ‘trabalho’ desenvolvido pela mulher, em Lisboa, e por influência do João Paulo Dinis, também da Rádio, foi transferido para Bissau, para a Rádio, passando a fazer parte do PFA, programa das forças armadas, onde cumpriu a comissão, até finais de Outubro de 1972.
É assim, mais um exemplo de sorte, mas com o trabalho e forte empenho de alguém…

Por falar em Rádio, recordo uma curiosidade que ficou célebre, protagonizada por um operador dessa Rádio, um guineense formado pelos profissionais do continente que, quando iniciava o seu turno, nos discos pedidos, dizia:
‘E o PIFAS muda di ritimo! Pr’a Mamadu Jaló, qui firma no Catió, cançon Giani Morandi, non son dinho di bó!’

Os reconhecimentos e operações diárias tinham de manter-se, rigorosamente, e não podíamos deixar-nos cair na tentação de receios ou sentimentalismos, porque sabíamos da existência de comunidades indígenas, com mulheres e crianças, dentro dos espaços militares do PAIGC, aliás, como o nosso caso…
Isso não significava falta de responsabilidade ou de bom senso da nossa parte, mas estávamos ‘metidos’ naquilo, logo, sentido natural de defesa do nosso espaço e da nossa pele, o sentido humano espontâneo, mesmo que… desumano…
Também as armadilhas e minas tinham de ser montadas e instaladas, a par do levantamento das AP, minas antipessoal e AC, minas anticarro do inimigo, para posterior colocação nas supostas zonas de passagem do inimigo, junto à fronteira.
Foi montado um fornilho, pelo nosso pessoal de minas e armadilhas, com a supervisão do Carlos Amaral, um dos furriéis do terceiro grupo, na zona oriental do aquartelamento, no topo do arame farpado.
Era composto por um bidão de duzentos litros - dos que nos enviavam para abastecer as coitadas GMC - cheio de todo o tipo de desperdícios de metal e vidro, tnt e combustível, com uma ligação de fios eléctricos, do interior para o exterior, depois conectada a um detonador.

E os episódios foram surgindo, naturalmente, à medida das circunstâncias de cada momento de guerra, com mais ou menos consequências.
As flagelações, o meio mais utilizado pelo PAIGC, com o uso de diversos tipos de armas pesadas, obus, canhão sem recuo SPG82, os lança granadas RGP2 e RPG7, morteiro 120 perfurante, mísseis, algumas vezes, utilizando very-lights, para iluminação e melhor localização do aquartelamento, um designado ‘ataque aos arames’, chefiado pelo célebre Nino Vieira, mais flagelações, emboscadas, enfim, todo o conjunto de variantes cénicas daquele tipo de guerra, sabida subversiva e de informação.
O tal fornilho, infelizmente, não funcionou, quando foi accionado para fazer face ao designado ‘ataque aos arames’, a tal operação liderada pelo Nino Vieira.
Se tivesse funcionado, o resultado negativo para os guerrilheiros do PAIGC teria sido muitíssimo maior.

A Força Aérea representava uma boa ajuda, com os heli-canhão e os Fiat, em operações RVIS, voos de reconhecimento, mas tinha muita dificuldade de progressão, pois as antiaéreas do PAIGC, sem esquecermos os célebres mísseis terra-ar Strela (SAM7), fabrico soviético, estavam bem posicionadas, ao longo da fronteira, na nossa frente, e já tinham feito estragos, noutras ocasiões.

Para o Daniel ter uma ideia das múltiplas acções que entram nas probabilidades de ocorrência, apanhámos um infiltrado no lado da tabanca, onde tínhamos a pequena comunidade local sob nossa protecção, em cima de uma tabanca, ao anoitecer, a fazer sinais de luz com uma lanterna, bem na direcção da fronteira, uma das formas de facilitar a localização exacta do aquartelamento, no meio da mata.
Interrogado, concluiu-se ser um elemento guerrilheiro do PAIGC que se infiltrou na zona, vindo da fronteira em frente, cuja missão era aquela, apenas: marcar o ponto exacto do nosso aquartelamente, permitindo a regulação das armas já montadas ali perto de nós, para o ‘espectáculo’ que começaria, pouco depois.
Os guerrilheiros do PAIGC, supondo que o seu enviado tinha cumprido a missão e já estava retirado, em segurança, já tinham tudo preparado e estavam mais perto de nós do que poderíamos pensar, a prepararem mais uma operação que, caso conseguissem o resultado previsto, poderia ser o fim de Gadamael Porto, o fim de todos nós.
Ali ficou, deitado no chão, bem no centro do aquartelamento, como primeiro castigo, até tudo terminado…

Sim, porque o arraial começou pouco depois, durando umas horas, com as armas dos guerrilheiros do PAIGC bem reguladas, indicação da lanterna do infiltrado, prisioneiro…
Foi uma das noites horríveis de baixas e destruição, até termos ficado sem munições das armas pesadas, principalmente, ‘supositórios’ (munições dos obuses)!
Contra as expectativas dos guerrilheiros do PAIGC, que nem notaram que estávamos sem munições, a nossa sorte, os resultados não foram o suficiente para acabarem com Gadamael Porto.

No dia seguinte, a nosso pedido, chegaram dois hélis, um destinado ao prisioneiro, outro para os feridos, todos com destino a Bissau.
As ‘salgadeiras’ (urnas funerárias) vinham de batelão, a nosso pedido via rádio, depois de cada baixa declarada.
Depois de tudo tratado, as ‘salgadeiras’ eram enviadas, em batelão, para um outro aquartelamento perto, Cacine, como entreposto, antes de partirem para Bissau.

Depois, dois dias sem dormir e quase sem comer, para levantarmos o que era possível do aquartelamento.
Aqui, a vertente psicológica manda e vence!

Uma outra tarefa, bem desagradável, eram as colunas a Guilege, que fazíamos algumas vezes, para abastecimento de mantimentos, géneros alimentícios e material de guerra.
Os géneros que nos enviavam, acondicionados em redes, deixados cair dos hélis, ou trazidos de batelão, quando possível, eram repartidos com Guilege.
Era a única forma de Guilege os receber, o que justificava o sacrifício e riscos e nos motivava para tal operação.
Porquê? Porque Guilege não podia ser abastecido de outra forma, nomeadamente, de heli, pois estava um pouco mais a leste, ainda mais junto à fronteira, perto de Kandiafara, um posto militar do PAIGC, dentro da Guiné-Conacry, onde as antiaéreas estavam alerta, permanentemente.

Era um percurso de alguns quilómetros, por picada, com alguns homens a montar segurança, ao longo do percurso, mas de difícil progressão, pois os guerrilheiros do PAIGC andavam por ali, como rotina, e algumas vezes nos dificultaram a vida e nos causaram mossa…
Este percurso fazia parte do célebre ‘corredor da morte’, com início em Kandiafara, atravessando a fronteira, passando por Guilege e seguindo para Gadamael Porto.
Deste designado ‘corredor da morte’, também faziam parte Ganturé, Gadembel e Aldeia Formosa, compondo toda a zona de acesso às Matas Morés e Cantanhês, onde o PAIGC tinha estruturas fortes de protecção e tratamento dos feridos, uma espécie de hospital de campanha subterrâneo, e onde o acesso era quase impossível.

O PAIGC andava sempre em cima desta zona, pois tinham o objectivo de ir ganhando terreno, desde a fronteira, o que já tinham conseguido, de certa forma, e a prova estava nos nossos aquartelamentos e destacamentos desactivados ou abandonados, porque as nossas tropas já tinham atingido o limite da resistência, como Sangonhá, Gadamael Fronteira, Cacoca, Tombombofa, Ganturé, Gadembel.

Gadamael Porto tinha a missão de controlar e defender toda a zona, uma ZA (zona de acção) alargada, que requeria um esforço acrescido, originando um grande desgaste…
Um dos problemas da nossa posição e fragilidade, comum às outras zonas da Guiné, residia no facto de que tudo era perto, tudo se concentrava em área reduzida, os passos que se davam não permitiam a mais pequena distracção ou facilidade, uns metros de progressão poderiam terminar em tragédia, pela surpresa, claro.
Ouvi isto, ainda na metrópole, mas só o confirmei ali, quando comecei a viver essa realidade, sem poder voltar para trás.
Mesmo que pensasse na possibilidade desta alternativa, o pensamento nos homens que tínhamos preparado e ‘treinado’ sobrepunha-se a qualquer alternativa.

Não posso esquecer a criatividade e habilidade do Ferreira, o nosso furriel mecânico e sua equipa, na concepção de peças improvisadas para fazer funcionar as velhas GMC.
Uma das GMC tinha o equipamento mais ou menos completo, mais coisa, menos coisa, e servia de carrinho de choque para fazer andar as outras duas, que não tinham qualquer equipamento, acelerador, travão, embraiagem, limitando-se a uma velocidade engrenada.
Estas GMC eram usadas no transporte dos bens para abastecimento a Guilege, sem as quais não seria possível.
Depois de uns sacos de terra colocados em cima de algumas partes das viaturas, a única forma de reduzir o impacto provocado pelas minas anticarro, lá ia a coluna, na expectativa de missão cumprida, sem grandes estragos… A par dos episódios de guerra, as condições atmosféricas, bem agressivas, eram mais uma dificuldade a vencer e deixavam rasto de destruição, como nos aconteceu.
Trovoadas e chuvas monumentais, aumentavam as dificuldades dos terrenos que, já por si, eram bem ingratos.
Quando a coisa dava para o tornado, então, era esperar que alguma coisa ficasse de pé!

As duas pequenas viaturas blindadas do pelotão Fox ficaram reduzidas a uma só, pois a outra foi destruída por um disparo do canhão sem recuo dos guerrilheiros do PAIGC, aquando do ‘ataque aos arames’ de que lhe falei, de que resultaram baixas para as nossas tropas, mas muitas mais para os guerrilheiros do PAIGC.

Como tudo estava organizado/montado pelos guerrilheiros do PAIGC, mesmo ao cimo do aquartelamento, à saída do arame farpado, sem termos noção do que se tratava, muito menos, do efectivo e arsenal lá montado, foi decidido sair uma Fox, comandada pelo Oliveira Soares, e um pequeno efectivo da nossa companhia, escalado no momento, eu de um lado com dois ou três homens, e o Ponte, comandante do primeiro grupo, com mais dois ou três homens do outro lado, mas logo ‘levámos nos queixos’, uma morteirada de canhão sem recuo, sendo obrigados a parar e a optar por morteirada 60, o mais fácil de manusear, naquelas circunstâncias, já com o condutor morto e o Oliveira Soares ferido.

De noite, as coisas tornam-se ainda mais difíceis…
O resto, foi morteirada 60 e 81, acompanhados de batidas de obus, pois sabíamos que os ‘gajos’ tinham de recuar e retirar para a fronteira.
Na madrugada, constatámos o rasto de sangue bem marcado das baixas dos guerrilheiros do PAIGC, estendendo-se até à fronteira, e capturámos o material que deixaram, como vários carregadores de AK47, vários invólucros de canhão sem recuo, uma Tokarev 7,62 mm (origem soviética).
Ainda guardo fotos deste material, além de um invólucro de canhão sem recuo, fabrico chinês, que resolvi trazer, para fabricar um cinzeiro de pé.

Além disso, encontrámos um guerrilheiro morto, na mata, deixado pelos outros, talvez porque já não conseguiam levar mais mortos e feridos.
Era um chefe de grupo, pela forma como estava equipado, que calculámos ter cerca de dois metros, um pé de dimensões ‘anormais’ e uns roncos (anéis simbólicos) nas mãos.
Claro que ninguém deve mexer, pois fica armadilhado, uma prática corrente de qualquer dos lados.

Nós tínhamos conhecimento das baixas e destruições que causávamos ao PAIGC através da Rádio Libertação da República da Guiné-Conacry.
Era comum ouvirmos o Amílcar Cabral dirigir-se a nós, iniciando com as seguintes expressões:
‘Jovens colonialistas e assassinos de Gadamael Porto,…’

Uns dias menos ansiosos do que outros, uns dias menos atribulados do que outros, o que nos esperava durante os muitos meses que se seguiriam.
A população da Tabanca que tínhamos de proteger e que nos dava um certo apoio logístico, como era o caso das lavadeiras, envolvia algumas etnias como Fula, Tanda, Papel.
As nossas roupas eram lavadas um pouco à ‘porrada’ sobre as pedras carcomidas e agressivas da bolanha, naquela água salgada, resultando em botões partidos e alguns rasgões.
Mas isso nada nos importava, pois queríamos os camuflados lavados, sem aquela lama agarrada e a cheirar mal.

Só a população tinha direito a abrigos subterrâneos, que tínhamos de assegurar.

As entidades importantes da Tabanca eram o Padre, normalmente, muçulmano, o Régulo, ou chefe da Tabanca, e o Cipaio, o polícia da Tabanca.

Eu tive a sorte de ser bem recebido e acolhido na Tabanca, onde me refugiava, muitas vezes, ao anoitecer, participando em serões da família das minhas lavadeiras, a Cira e a prima Cadi, todos sentados no chão, à luz ténue e dissimulada de um pequeno bocado de madeira aceso, com grande esforço para entender o que diziam, pois os dialectos eram muitos, normalmente, cada etnia o seu dialecto - mas lá ia conseguindo, mais coisa, menos coisa.
O crioulo usado nesta zona era um idioma pobre, uma mistura de influências latina, francesa e inglesa, de outros tempos, mas os cabo-verdianos falam um crioulo mais rico, mais aperfeiçoado.
Mas, como tínhamos mais do que uma etnia, o próprio dialecto ou idioma não era igual em todas elas.

Na Guiné-Bissau, além do nosso português, fala-se o crioulo cabo-verdiano, o fulbe, o mandê e o mandinga, embora não usado em todas as etnias, dependendo das influências de vários povos, nas suas movimentações nómadas.
Cada homem grande, caso tivesse património, como galinhas, vacas, porcos, cabritos, pequenas parcelas de terra cultivadas, arroz (bianda), amendoim (mancarra), poderia ter mais do que uma mulher, regime poligâmico.
E não havia descriminação pela idade pois, apesar de velhos, tinham várias mulheres, algumas delas bajudas (raparigas).
Em determinadas zonas, embora eu nunca tenha sabido quais, também se praticava o regime poliândrico, pelo qual uma mulher pode ter vários homens, desde que reúna condições para tal.

Em Gadamael Porto, o património limitava-se a umas galinhas e umas pequenas parcelas de cultura de arroz e amendoim, quando as condições de segurança permitiam.
Cheguei a comer galinha cozinhada com frutos vermelhos da palmeira, tudo envolvido em bianda (arroz cozinhado).
E todos metíamos a mão dentro da meia abóbora seca, puxando e enrolando os bocados na mão, tipo almôndegas, que levávamos à boca.

Não esquecerei o rigor e disciplina impostos na Tabanca, controlados pelo Cipaio.
Por exemplo, uma cena que me deixou marcado, aconteceu com uma bajuda acabada de casar com um homem grande, mas os chamados casamentos forçados, negociados.
Na noite de núpcias, a consumação do casamento era feita na presença de uma mulher grande (mulher casada), com o objectivo de mostrar o pano sujo de sangue.
Depois da cerimónia, a bajuda, agora, mulher grande, resolve escapar-se para os lados da bolanha.
Apanhada pela população e pelo Cipaio, o castigo é brutal, começando com as chicotadas da praxe, continuando com outros castigos de que prefiro não falar…

Também não mais esquecerei a cultura da circuncisão, lá conhecida por fanado.
Tantos miúdos massacrados, cuja operação era feita com uma espécie de machadinha ou catana, em ferro, em cima de um improvisado pequeno cepo de madeira!
As infecções proliferavam e, alguns não resistiam!

"Ouvi falar e li alguns artigos sobre costumes e tradições de povos de diversos locais do planeta, alguns dos quais ainda parados no tempo, segundo a nossa cultura, claro.
Aquilo que o Adolfo acaba de me relatar, apesar do contexto, leva-me a pensar nas organizações humanitárias que angariam voluntários, com o objectivo de desenvolverem iniciativas, nomeadamente, na área da sensibilização e apoio alimentar, saúde, educação.
E nunca será demais, pelo contrário, sabemos que muitas e muitas acções continuarão na expectativa de resultados satisfatórios…"


Pois, mas algumas tradições estão presas a crenças religiosas, fora de tudo o que consideramos de bom senso ou racional, mas passaram séculos e sabe-se lá quantos mais passarão…

Não posso deixar de falar nas dúvidas, suspeições e reticências constantes com que tínhamos de conviver, uma vez que se tratava de uma guerra de informação, subversiva, em que tudo e todos os que nos rodeavam eram, supostamente, suspeitos.
Dizia-se, por exemplo, que o Padre era o maior ‘turra’ que tínhamos dentro daquela pequena comunidade, havendo alguns sinais disso, mesmo…
Por exemplo: sempre que tínhamos flagelações mais prolongadas e agressivas, o Padre nunca estava na Tabanca, tinha arranjado maneira de sair para Bissau, na véspera…

(Continua)

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Nota do editor

Último poste da série de 1 DE DEZEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23833: "Um Olhar Retrospectivo", autobiografia de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796. Excerto da pág. 407 à 483 - Parte IV - Guiné

sábado, 3 de dezembro de 2022

Guiné 61/74 - P23842: Os nossos seres, saberes e lazeres (544): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (79): A exposição de homenagem a Francis Graça, pioneiro do bailado em Portugal, Museu Nacional do Teatro (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Outubro de 2022:

Queridos amigos,
Penso que não vi nenhum espetáculo desta companhia de bailado, a música sim, em adolescente, e com fortes restrições para gastos, fazia o possível para não perder os concertos gratuitos da Orquestra Filarmónica de Lisboa, habitualmente no Pavilhão dos Desportos ou na Estufa Fria, o maestro Fernando Cabral incluía sempre obras portuguesas, foi assim que eu vim a conhecer trabalhos de Ruy Coelho ou Frederico de Freitas, pouco tocados nos concertos do Tivoli aos sábados, pela orquestra da Emissora Nacional, preços generosos no 2º balcão. Embora as escolhas da Companhia estivessem pautadas por temas populares (D. Sebastião, a Nazaré, o folclore, D. Pedro e Inês de Castro...) houve um sério esforço para atrair o público às salas de espetáculos. A Companhia vai ter a sua extinção nos anos de 1960, suceder-lhe-á um empreendimento de grande vulto, a Companhia Gulbenkian, chegava o momento de se formar uma escola profissional, com bailarinos convidados de gabarito, alguns deles ainda hoje em funções, e com desempenhos de altíssima qualidade.Impunha-se homenagear quem alcandorou a Companhia ao maior nível daquele tempo, Francis Graça, morreu praticamente esquecido de todos.

Um abraço do
Mário



Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (79):
A exposição de homenagem a Francis Graça, pioneiro do bailado em Portugal, Museu Nacional do Teatro


Mário Beja Santos

Esteve patente até setembro passado uma exposição sobre o trabalho de Francis Graça (1902-1980), bailarino, coreógrafo e ator, pioneiro do bailado em Portugal, em 1940 participou na criação da Companhia de Bailado Verde Gaio, um projeto idealizado por António Ferro (à época responsável pelo Secretariado da Propaganda Nacional), o objetivo era ter um conjunto modernista que pudesse realçar os valores nacionais através da dança e do bailado. Francis Graça (de nome completo Francisco Florêncio Graça) era um autodidata, estudou no Conservatório Nacional música, cedo abandonou os estudos para se dedicar à dança e bailado, estudou em Paris e ganhou notoriedade, sobretudo na década de 1930, nos seus trabalhos ao nível da revista. Irá impor-se como bailarino principal nas décadas de 1940 e 1950, será depois substituído por Margarida de Abreu à frente da Companhia, nunca se recomporá da humilhação, acabará os seus dias num quase total desconhecimento.
A exposição esteve patente no Museu Nacional do Teatro, procura destacar os eventos mais salientes do seu trabalho, relacionou-se com importantes nomes da composição do tempo, como Ruy Coelho, Armando José Fernandes e Frederico de Freitas.
Eu peço licença ao leitor, já estou no museu e vou a caminho da exposição, mas há aqui um conjunto de imagens que me parecem interessantes registar, este museu tem enormes riquezas e um acervo impressionante, aqui fica uma pálida ideai de que o visitante pode encontrar.

Imagem de Eunice, ela representou no filme “A Morgadinha dos Canaviais” em 1949
A iluminação é muito crua, dei voltas que me permitisse mostrar este belo trabalho de Rafael Bordalo Pinheiro alusivo a uma peça que se representou no Teatro de Ginásio, em 1890
O Museu guarda desenhos, aguarelas e óleos de autores e compositores, veja-se à direito um trabalho de Columbano e ao centro Amélia Rey Colaço num belo traço de Maria Adelaide de Lima Cruz
Moniz Pereira, Maria Keil, Bernardo Marques e Lucien Donnat aqui presentes com os seus trabalhos para idealizar guarda-roupas, traços belíssimos e ajustados
Maquete alusiva ao velho cineteatro Monumental, um espaço grandioso, uma impressionante sala de cinema e um teatro onde primaram alguns dos grandes nomes do seu tempo, basta lembrar Laura Alves ou João Villaret
Um belo trabalho em miniatura para se ficar com uma pálida ideia do que era o Teatro D. Leonor
Francis Graça e Ruth Walden, na verdade os nomes principais do Verde Gaio, em Passatempo, 1941
Capa de um programa de um espetáculo realizado no Teatro Nacional de S. Carlos, em 1944
Figurino de Maria Keil para os Bailados Verde Gaio, 1940
Imagem de Francis Graça a mostrar os seus dotes
Francis Graça pintado por Mário Eloy
Figurino de Francis Graça por Maria Adelaide de Lima Cruz, 1930
Elemento curioso da exposição, Francis Graça aparece ao lado de uma histórica representação de Romeu e Julieta, no Coliseu dos Recreios em junho de 1968, a companhia era o Ballet do século XX, dirigida por Maurice Béjart, Béjart acabaria expulso, bem como toda a companhia por ter pedido um minuto de silêncio pelo assassinato de Robert Kennedy, “vítima do fascismo e do imperialismo”
A derradeira imagem, a Companhia Verde Gaio mereceu honras de ficar registada em filme
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Nota do editor

Último poste da série de 26 DE NOVEMBRO DE 2022 > Guiné 61/74 - P23819: Os nossos seres, saberes e lazeres (543): Itinerâncias avulsas… Mas saudades sem conto (78): Do Badoca Safari Park para o Circo Arena (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P23841: Tabanca Grande (539): Manuel Calhandra Leitão, de alcunha o "Mafra", ex-1º cabo, Pel Mort 1028 (Enxalé, 1965/67), faz hoje anos 79 anos e passa a sentar-se à sombra do nosso poilão, sob o nº 867


Torres Vedras > A-dos-Cunhados > Paradas > 16 de setembro de 2018 >   "Paradas Party, do João Crisóstomo" ou  Festa das Famílias Crisóstomo & Crispim.

O camarada  Manuel Calhandra Leitão, o "Mafra" ou o "Ruço", como era conhecido no CTIG: foi 1º cabo, Pel Mort 1028 (Enxalé, 1965/67).

Foto (e legenda): © Luís Graça (2018). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Almeirim > 10 de maio de 2014 > 23º Encontro do pessoal da CCAÇ 1439, Pel Caç Nat 52, Pel Caç Nat 54, e Pel Mort 1028, subunidades que passaram pelo Enxalé (1965/67). 

Mesta foto, além do "Mafra" (Manuel Calhandra Leitão), podemos reconhecer  outros membros da Tabanca Grande: o Abel Rei (o primero da primeira fila, do lado direito), o Henrique Matos (Pel Caç Nat 52), o José António Viegas (Pel Caç Nat 54) e o Júlio Martins Pereira (CÇAÇ 1439) (1944-2022).

Foto (e legenda): © Henrique Matos  (2014). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Coruche > 19º Encontro Nacional da CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67), mais os Pel Caç Nat 52 e 54, Pel Mort 1028 e outras subunidades > 6 de Março de 2010 > Fotografia de grupo. O Manuel Calhandra Leitão está assinalado a amarelo.

Associaram-se ainda à festa os antigos alf mil  João Crisóstomo (que vive nos EUA), o António Freitas (que vive no Funchal), o Mário Beja Santos e o Jorge Rosales (1939-2019). A foto veio sem legenda: reconheço o Jorge Rosales (o primeiro da 1ª fila, do lado esquerdo), o Beja Santos (o segundo da 2ª fila, a contar do lado direito); e o Henrique Matos (o segundo da 3ª  fila, a contar do lado direito).

Fonte: © Henrique Matos (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Mafra > Ericeira > Restaurante Onda Mar by Furnas > 18 de maio de 2019 > Encontro do pessoal da CCAÇ 1439, Pel Mort 1028, Pel Caç Nat 52 e Pel Caç Nat 54, subunidades que passaram pelo Enxalé, Porto Gole e/ou Missirá, 1965/67 >   Da esquerda para a direita, dois homens da CCAÇ 1439: o ex-alf mil Sousa (V. N. Famalicão) e  o ex-fur mil Teixeira (Faro), mais o "Mafra" (Manuel Calhandra Leitão, também conhecido por "Ruço"), ex-1º cabo apontador do morteiro 81, Pel Mort 1028, o organizador do convívio.


Mafra > Ericeira > Restaurante Marisqueira Onda Mar by Furnas > 18 de maio de 2019 > Encontro do pessoal da CCAÇ 1439, Pel Mort 1028, Pel Caç Nat 52 e Pel Caç Nat 54, que passou pelo Enxalé, 1965/67 > À direita, a Felismina, a "patroa" do "Mafra", que o ajudou a organizar o encontro, juntamente com os filhos. À esquerda, a Alice Carneiro.


Mafra > Ericeira > Restaurante Marisqueira Onda Mar by Furnas > 18 de maio de 2019 > Encontro do pessoal da CCAÇ 1439, Pel Mort 1028, Pel Caç Nat 52 e Pel Caç Nat 54, que passou pelo Enxalé, 1965/67 >  O João Crisóstomo e o filho do "Mafra", o Pedro Leitão, que empresta "a caixa de correio eletrónico" ao pai... Também gostei muito de falar com ele e incentivei-o a gravar, em áudio e vídeo, as histórias de vida do pai, o nosso camarada "Mafra"...  

Foto (e legenda): © Luís Graça (2019). Todos os direitos reservados. [Edição: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


Torres Vedras > A-dos-Cunhados > Paradas > 16 de setembro de 2018 > Festa das Famílias Crisóstomo & Crispim > Dois camaradas da Guiné: no lado esquerdo, o nosso  saudoso Eduardo Jorge Ferreira (1952-2019); no lado direito, o "Mafra", um camarada natural de Achada, Mafra que esteve com o João Crisóstomo no Enxalé em 1965/67...


Caldas da Rainha > 28 de maio de 2022 >   Os participantes da CCAÇ 1439 presentes: "Mafra", Teixeira e eu. O "Mafra", de seu nome, Manuel Calhandra Leitão,  foi o organizador do último encontro, de resto excelente (do ponto de vista da escolha do restaurante e do agradável convívio), do pessoal da CCAÇ 1439, na Ericeira, em 18/5/2019.


Mafra > Sobreiro > 1 de junho de 2022 > Visita ao "Mafra", na sua casa: a Vilma tirou a foto e ficou de fora… Em primeiro plano,  sentados, o "Mafra" e a esposa; na fila de trás de pé,   os filhos do "Mafra"  a meu lado.
 
Foto (e legenda): © João Crisóstomo (2022). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné].


1. O "Mafra", alcunha do Manuel Calhandra Leitão, conhecia-o na terra do João Crisóstomo, Paradas,  A-dos-Cunhados. concelho de Torres Vedras, por ocasião da festa das famílias Crisóstomo & Crispim, em 16 de setembro de 2018. Na altura ainda era vivo o nosso querido Eduardo Jorge (1952-2019). 

Estivemos um bocado à conversa, de copo na ,ão,e conclui que  o "Mafra" era um grande contador de histórias... Logo na altura convidei-o para integrar a Tabanca Grande; de seu nome completo, Manuel Calhandra Leitão; não se lembrava, na altura,  do nº do Pel Mort, que estava sediado em Bambadinca, dizia ele  (descobri depois que era o Pel Mort 1028)... 

O "Mafra" era de rendição individual. Não tem notícias dos seus camaradas desse tempo, que fizeram parte do pelotão de morteiros. Foi destacaddo para o Enxalé com uma esquadra (ele mais sete, sedno ele o 1º cabi)... E lá fez a sua comissão que só acabou, uns meses depois da CCAÇ 1439 ter regressado a Bissau... 

Já agora ficamos com uma ideia das forças que estavam às ordens do BCAÇ 1888 (Fá Mandinga), subordinado do Agrupamento 24 (Bafatá), à data de 1 de julho de 1966:

BCAÇ 1888;
- Comando - Sector LI Fá Mandinga
- CCaç 818 (-) Xitole
_ 2° Pel (-) Saltinho
- 1 Sec Ponte Rio Pu 10m
- 1 Sec Cansamange
- CCaç 1439(-) Enxalé
_ 3° Pel(+) Missirá
- 2 Sec Porto Gole
- CCaç 1551(-) Bambadinca
_ 1° Pel(-) Taibatá (T)
_ 2° Pel(-) Xime
- 1 Sec Amedalai (T)
- 1 Sec Galomaro
- CCav 1482(-) Xime
_ 2° Pel(-) Quirafo (T)
_ 3° Pel Ponta do Inglês
- 1 Sec(+) Galomaro
_ 1 Pel(-)/1ª CCaç Porto Gole
- 1 Sec Enxalé
- Pel AMetr "Daimler" 809 Galomaro
- Pel Mort 1028(-) : Fá Mandinga
- 1 Sec(-) Xime
_ 1 Sec(-) Ponta do Inglês
- 1 Sec(-) Xitole
- 1 Esq Enxalé
_ Comp Milícia 1(-) Dulombi
- 1 Pel Finete
- 1 Pel(-) Moricanhe
- 1 Sec Samba Silate
- Comp Milícia 14(-) Quirafo
_ 1 Pel Ponta do Inglês
- 1 Pel(-) Galomaro
_ 1 Sec(-) Sinchã Tumani
- 1 Sec Mondajane
- 1 Sec(-) Cansamange
- 1 Sec Duá

O "Mafra" falou-me de homens "lendários" como o Luís Zagallo e Abna Na Onça e de alguns episódios de guerra. Era um exímio apontador de morteiro.

Entretanto, fui depois conhecer a sua quinta, na Sobreira, Mafra, onde ele  era um  produtor de limões, de créditos firmados  (tinha mais de setecentos limoeiros). Esta zona do concelho de Mafra, próxima do mar, Ericeira, é historicamente uma grande produtora de limões. 

Tive ocasião de conhecer o seu grande amor à terra, bem como à sua família, esposa, filha e filho.

Meteu-se, entretanto, a pandemia, e surgiram problemas de saúde, que tiraram um bocado de alegria à vida: o "Mafra" já recuperou, a esposa Felismina ainda anda em tratamento.

Ontem, encontrámo-nos, na Praia da Areia Branca, Lourinhã, no restaurante Foz, por iniciativa do João  Crisóstomo (que esteve cá menos de um mês, desta vez sem a sua Vilma, e gressa a Nova Iorque no próximo domingo, dia 4). Infelizmemnte, não tenho uma única foto...

Cabíamos numa mesa, éramos sete:  eu, a Alice, o João Crisóstomo, o Joaquim Peixeira e a esposa, o Leitão e o filho, Pedro... O Joaquim Peixeira, que vive em Loures, é alentejano de Campo Maior, ex-bancário, e ex-furriel mil, que passou por Tite, também no período de 1965/67; não tomei boa nota do batalhão e companhia a que pertencia, mas suponho que era o BCAÇ 1860 (Tite, 1965/67): não dispunha de subunidades orgânicas, e foi rendido pelo BCAÇ 1914).

Foi um agradável almoço no resturante Foz, que tem uma localização privilegiada, memso em cima da praia. Pedimos três pratos duplos: mariscada de povo, arroz de lampreia, e povo panado com feijão...  

Ainda antes de começarmos o repasto, voltei a lembrar, ao "Mafra", o meu convite de 2018. O filho, Pedro Leitão, que tem uyma empresa na área do "web design", prometei-me enviar algumas fotos digitalizadas do seu álbum da Guiné. 

E logo ali fizemos um brinde aos nossos reencontros (ele anda sempre atrelado ao CCAÇ 1439)  e demos-lhe os parabéns antecipados pelo dia de hoje, em que completa 79 anos.

É uma pequena prenda de anos, esta, coincidindo a sua entrada na Tabanca Grande. Uma prenda mais do que merecida: a sua história de vida é um exenplo para todos nós, o "Mafra" ou "Ruço" (era "lourinho" quando jovem) é sobretudo um exemplo de tenacidade, capacidade de luta, organização e resistência... É uma cidadão com valores e princípios, um lutador pela justiça e a liberdade, antigo operário da FOC... 

Sê, pois,  bem vindo, "Mafra", ficas aqui connosco de pleno direito,,, E sentimo-nos felizes pela tua presença ao nosso lado. Ficamos `espera das fotos prometidas pelo teu filho. E agora, não te esqueças: até aos cem, é sempre em frente, só é preciso é ter cuidado com as "minas & armaldilhas", e nunca perder a bússola, o mesmo é dizer, o norte (e os restantes pontos cardeais). Parabéns, bebo mais um copo à tua saúde, com votos de melhoras para a tua Felismina. Oxalá, Enxalé, Insha'Allah! (LG)