por Domingos Robalo (*)
[, Foto à esquerda: Domingos Robalo:
(i) tem página no Facebook desde março de 2009 e administra também o grupo Artilharia de Campanha na Guiné-BAC1/-GAC7;
(ii) filho de militar, foi fur mil art, BAC 1 / GAC 7, Bissau, 1969/71;
(iii) vive em Almada, está ligado à Universidade Sénior Dom Sancho I, de Almada, onde faz voluntariado, desde julho de 2013, como professor da disciplina de "Cultura e Arte Naval";
(iv) trabalhou na Lisnave: é praticante de golfe;
(v) e passou a integrar a Tabanca Grande, com o nº 795, desde 21 de setembro último]
(Continuação)
Durante três meses e uns dias [, desde o início de janeiro de 1968] vamos aprender . [, no RI 5, Caldas da Rainha,] a “ordem unida”, o manejo da G3, fazer fogo em carreira de tiro e toda a teoria necessária e aplicável á época para se preparar um sargento para a “guerra colonial”. Mergulhar no tanque da merda, ou mesmo atravessar o cano dos esgotos sanitário era prática de alguns pelotões na recruta das Caldas, porém tenho de referir que a minha Companhia de instrução, a 5ª, não nos fez passar por estas situações.
Conhecer a hierarquia militar, a forma como no devíamos dirigir a um sargento ou a um oficial, fosse ele subalterno ou superior, fazia parte do conhecimento básico da instrução militar. Marchar bem e com garbo, manejar a arma; tudo fazia parte do nosso quotidiano.
Estou colocado na 5ª Companhia, tendo como comandante o tenente Vasco Lourenço, que em 25 de abril de 1974 viria a fazer parte do Movimento dos Capitães.
Não era um Comandante acessível. Militar oriundo da Academia Militar, chegou a castigar-me com cinco dias de detenção, embora a infração, disciplinarmente, e de acordo com o RDM, daria 3 dias de prisão. “Apenas porque me desenfiei de domingo para segunda, para poder participar no casamento de uma amiga da minha namorada que sendo Luso-Americano, obteve autorização dos seus superiores para vir dos USA casar a Portugal, mas já com guia de marcha para o Vietname." (Recordam-se do que era a guerra naquele território?). Mas isto dava outra história que agora não vem a propósito.
[Um ano depois,] em março/abril de 1969, sou mobilizado para a Província da Guiné. Dois cursos de CSM a seguir ao meu já tinham sido mobilizados e um terceiro a terminar a especialidade na EPA [Escola Prática de Artilharia], Vendas Novas. Estava com planos de casório, pois já estava na expectativa de não vir a ser mobilizado, resultado também da minha boa classificação de curso na Arma de Artilharia na especialidade de Campanha.
Lembro-me que o mundo desabou sobre os “noivos”. A guerra do Ultramar tinha este efeito devastador sobre a vida dos jovens do meu tempo. Interrompiam-se casamentos, carreiras profissionais e estudos académicos. Mas, apesar de todos estes contratempos, a juventude dizia sim a Portugal, embora poucos ainda se questionassem sobre as motivações da guerra.
Estou colocado na 5ª Companhia, tendo como comandante o tenente Vasco Lourenço, que em 25 de abril de 1974 viria a fazer parte do Movimento dos Capitães.
Não era um Comandante acessível. Militar oriundo da Academia Militar, chegou a castigar-me com cinco dias de detenção, embora a infração, disciplinarmente, e de acordo com o RDM, daria 3 dias de prisão. “Apenas porque me desenfiei de domingo para segunda, para poder participar no casamento de uma amiga da minha namorada que sendo Luso-Americano, obteve autorização dos seus superiores para vir dos USA casar a Portugal, mas já com guia de marcha para o Vietname." (Recordam-se do que era a guerra naquele território?). Mas isto dava outra história que agora não vem a propósito.
[Um ano depois,] em março/abril de 1969, sou mobilizado para a Província da Guiné. Dois cursos de CSM a seguir ao meu já tinham sido mobilizados e um terceiro a terminar a especialidade na EPA [Escola Prática de Artilharia], Vendas Novas. Estava com planos de casório, pois já estava na expectativa de não vir a ser mobilizado, resultado também da minha boa classificação de curso na Arma de Artilharia na especialidade de Campanha.
Lembro-me que o mundo desabou sobre os “noivos”. A guerra do Ultramar tinha este efeito devastador sobre a vida dos jovens do meu tempo. Interrompiam-se casamentos, carreiras profissionais e estudos académicos. Mas, apesar de todos estes contratempos, a juventude dizia sim a Portugal, embora poucos ainda se questionassem sobre as motivações da guerra.
Grande parte da juventude do meu país vivia longe das cidades, eram iletrados e muitas vezes ávidos de sair da casa dos pais onde trabalhavam de sol a sol e sem independência. Ou fugiam a salto para a Europa do pós-guerra, ou vinham à aventura da vida militar, muitos deles como voluntários, quer para a força aérea, quer para a marinha.
A minha mobilização para a Guiné ocorrera para cumprir uma rendição individual de um militar que não teve oportunidade de chegar ao fim. Ia substituir o furriel miliciano Batista [, António da Conceição Dias Baptista, natural de Murtal, São Domingos de Rana, Cascais ], que infelizmente não terminara a sua comissão no tempo normal. No dia 14 de fevereiro de 1969, morre heroicamente ao lado do seu Comandante de pelotão, o alferes Gonçalves [, José Manuel de Araújo Gonçalves, natural de Lisboa], São vítimas de um ataque IN no aquartelamento de Guileje.
Merecem, entre muitos outros, serem aqui referidos porque o seu sacrifício resultou de um ato heroico, não por falta de discernimento ou inconsequente, mas, na sequência da intensidade do fogo IN terem querido proteger os seus soldados, todos negros e do recrutamento da Província. Ordenou o Alferes que todos se recolhessem no abrigo. O Furriel Batista manteve-se a seu lado respondendo ao fogo IN, como se de um duelo de artilharia se tratasse. Mas a má hora chegou. Uma morteirada cai sobre o ferrão do lado esquerdo do obús 10,5cm e ali morrem os dois.
Cascais > Monumento aos Mortos do Ultramar > Guiné. Foto: Cortesia do Blogue Povo de Portugal, 31/3/2016 |
A minha mobilização para a Guiné ocorrera para cumprir uma rendição individual de um militar que não teve oportunidade de chegar ao fim. Ia substituir o furriel miliciano Batista [, António da Conceição Dias Baptista, natural de Murtal, São Domingos de Rana, Cascais ], que infelizmente não terminara a sua comissão no tempo normal. No dia 14 de fevereiro de 1969, morre heroicamente ao lado do seu Comandante de pelotão, o alferes Gonçalves [, José Manuel de Araújo Gonçalves, natural de Lisboa], São vítimas de um ataque IN no aquartelamento de Guileje.
Merecem, entre muitos outros, serem aqui referidos porque o seu sacrifício resultou de um ato heroico, não por falta de discernimento ou inconsequente, mas, na sequência da intensidade do fogo IN terem querido proteger os seus soldados, todos negros e do recrutamento da Província. Ordenou o Alferes que todos se recolhessem no abrigo. O Furriel Batista manteve-se a seu lado respondendo ao fogo IN, como se de um duelo de artilharia se tratasse. Mas a má hora chegou. Uma morteirada cai sobre o ferrão do lado esquerdo do obús 10,5cm e ali morrem os dois.
Guileje era uma povoação a sul da Província da Guiné e sobejamente conhecida de todos os militares mobilizados para esta Província Ultramarina.
A sete de maio de 1969, embarco no “Niassa” com destino a Bissau.
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Nota do editor:
A sete de maio de 1969, embarco no “Niassa” com destino a Bissau.
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Nota do editor:
(*) Último poste da série > 26 de setembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20178: Recordações e desabafos de um artilheiro (Domingos Robalo, fur mil art, BAC 1 /GAC 7, Bissau, 1969/71) - Parte I: Apurado para todo o serviço militar