domingo, 1 de dezembro de 2019

Guiné 61/74 - P20402: In Memoriam: Os 47 oficiais oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar mortos na guerra do ultramar (1961-75) (cor art ref António Carlos Morais da Silva) - Parte XXXI: Luís Filipe Rei Vilar (Cascais, 1941 - Susana, região de Cacheu, Guiné, 1970)








1. Continuação da publicação da série respeitante à biografia (breve) de cada um dos 47 Oficiais, oriundos da Escola do Exército e da Academia Militar que morreram em combate no período 1961-1975, na guerra do ultramar ou guerra colonial (em África e na Ásia).


Trabalho de pesquisa do cor art ref António Carlos Morais da Silva [, foto atual à direita], instrutor da 1ª CCmds Africanos, em Fá Mandinga, adjunto do COP 6, em Mansabá, e comandante da CCAÇ 2796, em Gadamael, entre 1970 e 1972.

Morais da Silva foi cadete-aluno nº 45/63, do corpo de alunos da Academia Militar. É membro da nossa Tabanca Grande, com o nº 784, desde 7 do corrente.

Sobre o infortunado Cap Cav Luís Rei Villar e as circunstâncias (nunca totalmente esclarecidas) da sua morte, temos 9 referências no nosso blogue. Há uma rua com o seu nome na sua terra natal.



Guiné > Região do Cacheu > Susana > CCAV 2358 (1969/71) > Natal de 1969 > Último Natal e provavelmente a última ou uma das últimas fotos do Cap Cav Luís Filipe Rei Vilar (1941-1970) (, o segundo a contar da esquerda), comandante da CCAV 2538 / BCAV 2876, unidade de quadrícula de Susana (1969/71), que morreu, em combate, em circunstâncias que nunca foram cabalmente esclarecidas pelo Exército, na sequência de uma operação contra o PAIGC, a Op Cassum [ou Op Selva Viva ?), na fronteira com o Senegal, no dia 18 de Fevereiro de 1970. [O Perintrep nº 08/70 refere a Op Cassum, e diz que a morte ocorreu às 14h30.]

Nesse dia ainda foi evacuado, de Susana para Bissau, para o HM 241, de heli (pilotado pelo nosso camarada Jorge Félix). O malogrado oficial foi substituído pelo Cap Cav Rogério da Silva Guilherme. [Outras subunidades do BCAV 2876: CCAV 2539 (S. Domingos) e CCAV 2540 (Ingoré).]

Foto cedido por Rogério Pedro Martins, que estava em Susana nesta altura. O Miguel Vilar, um dos irmãos Vilar (, um dos quais, o Duarte foi meu colega de curso de sociologia no ISCTE, concluído em 1979/80), falou também com o ex-fur mil Enf Jesus, que vive em Mértola, e que estava a dois metros do seu capitão, quando este foi atingido. 

Foto (e legenda) : © Rosário Pedro Martins / Miguel Vilar / Duarte Vilar (2010). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar:  Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]

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Guiné 61/74 - P20401: Parabéns a você (1716): Ernestino Caniço, ex-Alf Mil Cav, CMDT do Pel Rec Daimler 2208 (Guiné, 1969/71)

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Nota do editor

Último poste da série de 26 de Novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20383: Parabéns a você (1715): Jorge Teixeira, ex-Fur Mil Art da CART 2412 (Guiné, 1968/70) e Manuel Lima Santos, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 3476 (Guiné, 1971/73)

sábado, 30 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20400: Os nossos seres, saberes e lazeres (366): A minha ilha é um cofre de Atlântidas (8) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 30 de Maio de 2019:

Queridos amigos,
É a despedida de mais uma ronda micaelense, centrada no Vale das Furnas e na Caldeira das Sete Cidades, a despedida, obrigatória, do Vale das Furnas começou com um banho ao amanhecer na piscina de água férrea, após limpo e amesendado o viandante peregrinou pelos jardins Terra Nostra, tomou o autocarro da carreira e lançou-se em alguns jardins de visita incontornável, desta vez a preferência foi pelo jardim António Borges.
São visitas que o deixam insaciado, quer voltar em breve, em qualquer estação do ano, esta é a sua ilha-morada, ainda lhe falta bater à porta da Graciosa, um dia acontecerá, rende-se incondicionalmente a toda esta bruma arquipelágica, a gentes tão hospitaleiras.

Um abraço do
Mário


A minha ilha é um cofre de Atlântidas (8)

Beja Santos

É fatal como o destino, não há despedida do Vale das Furnas sem a última peregrinação aos jardins do Parque Terra Nostra, o dia está perfeito, desceu a humidade, a luz incidente aveluda todo este mundo verde, passa-se o tanque de água termal onde o viandante esbracejou horas a fio, fizesse calor ou frio, durante alguns dias, esta água fervente é um consolo, o propósito da despedida é passar pela Alameda Ginkgo Biloba, contemplar o Jardim da Flora Endémica, ir à Coleção das Camélias e das Plantas Aquáticas, tornear a Coleção de Fetos e sentar-se num banco em frente do Jardim de Vireyas. É o que vai acontecer, e com bons resultados para a saúde emocional do viandante.



Já se cantaram todas as laudes sobre este Parque Terra Nostra, que tem mais de dois séculos de vida, parece estar tudo dito sobre estas árvores que vieram das Américas, das Austrálias, da China e da África do Sul. Ao longo de gerações, houve enlevo, apetência cultural e bom gosto para trabalhos de conservação dos caminhos e dos lagos, o embelezamento deles não para, constroem-se e renovam-se os jardins, as camélias têm fama nacional, quem gosta de botânica tem aqui um recanto sagrado para contemplar espécies comuns da região da Macaronésia (isto é, para além dos Açores, a Madeira, as Canárias e Cabo Verde). É impossível não ficar deslumbrado com a coleção de fetos, à beira do canal em que corre água férrea, são duas centenas de exemplares, desenvolvem-se em ambientes húmidos. E há depois os rododendros da Malásia, plantas de coloração intensa, de diferentes tons de branco, laranja, rosa, salmão ou vermelho. E obrigatoriamente, até porque estamos na estação propícia, os canteiros de azáleas, em toda a sua diversidade de tons, as cores mais tradicionais são o vermelho e o lilás – são as plantas emblemáticas de São Miguel.






Pouco há mais a dizer quando estas imagens superam as mil palavras, estas alamedas românticas, os caramanchões multicolores, a adaptação do antigo laranjal do Parque para receber as Cycadales, plantas em vias de extinção e que existem há milhões de anos. O viandante tudo vai registando no seu caderninho, está melancólico mas lampeiro, sai do hotel com armas e bagagens e vai para o terminal rodoviário.


Então, não é que no terminal rodoviário temos esta simulação de casa virada do avesso, não é que a imagem nos dá uma sugestão de ficção científica, há para ali uma pitada de sensação aterrorizante, como se encapelassem os céus e um vento desabrido revolvesse a Natureza em roldão. Pura imaginação, vertigem da despedida, este é o mundo cósmico açoriano, um polo magnético que atrai o viandante, por isso com tanta regularidade o visita. E parte-se para Ponta Delgada.


O viandante pousou armas e bagagens na sede da associação dos consumidores açorianos, busca jardins, Ponta Delgada tem três de nomeada: os jardins do antigo Palácio dos Marqueses de Jácome Correia, hoje residência oficial do Presidente do Governo Regional, primorosamente tratados, bem perto, os jardins de José do Canto, aquela figura notável que deixou obra na Lagoa das Furnas, está sepultado na Ermida de Nossa Senhora das Vitórias, ao lado da sua mulher a quem escreveu cartas de um erotismo desinsofrido, coisa rara ou impraticável em tempos vitorianos, jamais em tempo algum um cavalheiro diria a sua dama o que iriam fazer logo que ele chegasse da sua longa viagem… O viandante passa por ambos como gato pelas brasas, mete-se ao caminho para ir ao jardim de um rival de José do Canto, António Borges. Pelo caminho, deu-lhe para entrar num centro comercial de nome Parque Atlântico. Impossível não captar a imagem deste cetáceo que nos convida, entre muita água a escorripichar.


Este jardim era o jardim privado de António Borges da Câmara Medeiros, foi construído entre 1858 e 1861, este abastado senhor abriu os cordões à bolsa para nos deixar esta obra prodigiosa. Hoje faz parte do património autárquico, já no século XXI foi alvo de uma grande intervenção, rivaliza com o Palácio de Santana (a sede da Presidência do Governo dos Açores), mas convém que se saiba que há mais jardins em Ponta Delgada, se o leitor vier a esta cidade peça mais informações. O que aqui se vê não foge ao esplendor açoriano, de que o viandante não se cansa de fazer referência. Há uma explicação para esta imagem particular. O que o leitor vê no caminho chama-se bagacina, a palavra não vem nos dicionários. Estava o viandante a preparar um livro em que se dedicava um capítulo à sua estadia em São Miguel, entre 1967 e 1968, e intitulou-o “Na Terra da Bagacina”, termo inexistente nos dicionários mas existente e corrente na cultura açoriana, é este farelo de pedra vulcânica, parece um rosa velho ou vermelho tijolo, não se sabe qual é a palavra melhor adequada, há muitos caminhos assim, feitos com esta prestimosa bagacina, marca de água de um território genuinamente vulcânico.


E despedimo-nos, a viagem interrompe-se por uns momentos, enquanto o viandante tiver vida e saúde aqui voltará esfusiante, esta natureza colou-se-lhe à pele, e despede-se com duas imagens de árvores antigas, uma lembrança para os vindouros, aqui chegaram povoadores do século XV, encontraram esta ilha totalmente arborizada, foram séculos de trabalho titânico para criar condições para os bons pastos, mas há um dado cultural insular e intransmissível, o gosto pelos jardins, o diálogo sem tréguas com escarpas, pélagos, córregos, canadas, ventos que sopram furiosos, uivando sob os telhados, o marulhar oceânico, tantas vezes furioso e devorador da obra do homem, este mesmo homem que planta e ajardina a envolvência da sua vida.

Adeus, até ao regresso do viandante.


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Nota do editor

Último poste da série de 23 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20373: Os nossos seres, saberes e lazeres (365): A minha ilha é um cofre de Atlântidas (7) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20399: Historiografia da Presença Portuguesa em África (189): I Exposição Colonial, Porto, junho/setembro de 1934: fotogaleria do encerramento...









"Vários aspetos dessa memorável jornada de fé e vibração patrióticas: em cima, Irmãs Missionárias e Combatentes das campanhas das colónias; a seguir, D. João de Castro, conduzido sob o pálio e o carro da cidade do Porto; a frente do cortejo com figuração histórica; no disco, tocadores de marimbas; campinos do Ribatejo junto do sr. capitão Henrique Galvão, que concebeu, organizou e dirigiu o cortejo; o carro dedicado à província de Angola. Fotos ALVÃO.

Fonte: Ultramar - Órgão Oficial da I Exposição Colonial, (Porto),  nº 17, 1 de outubro de 1934, p. 8 (Diretor: Henrique Galvão). 

[Cortesia de Hemeroteca Digital, Câmara Municipal de Lisboa]



1. Temos já meia dúzia de referências no nosso blogue à Exposição Colonial do Porto (junho-setembro de 1934). Recorde-se aqui um excerto de um poste de um camarada nosso, portuense, o [ex-alf mil at inf, CCAÇ 3535 / BCAC 3880  (Zemba e Ponte de Rádi, 1972/74),  membro nº 780 da Tabanca Grande: 


(...) A grandiosa Exposição Colonial do Porto, ocorrida no Palácio de Cristal em 1934, deverá ter sido um ensaio geral para a (ainda mais grandiosa) Exposição do Mundo Português de 1940, em Lisboa. Ainda Salazar não tinha vergonha de chamar colónias às colónias.


Feita à imagem e semelhança de outras exposições coloniais realizadas em França, Inglaterra, Alemanha, etc., a Exposição Colonial do Porto de 1934 foi organizada por Henrique Galvão, esse mesmo, o do assalto ao paquete Santa Maria, que antes de ser um feroz opositor de Salazar tinha sido um seu fervoroso admirador.

A Exposição Colonial do Porto teve como finalidade, como facilmente se compreende, exaltar o orgulho imperial dos portugueses, supostamente portadores de um mandato divino de civilizar os povos primitivos sob seu domínio, e ao mesmo tempo consolidar o regime do Estado Novo, comandado pelo pulso de ferro de António de Oliveira Salazar. A exposição teve características idênticas às das exposições coloniais estrangeiras, a começar pela redução dos povos colonizados à condição de indígenas atrasados, cujo exotismo se procurava sublinhar. Para tanto, mostraram-se seres humanos trazidos das colónias ao público visitante, como se de animais do jardim zoológico se tratasse.

No caso da Exposição Colonial do Porto de 1934, a Guiné teve um papel de particular relevo, não necessariamente pelas melhores razões. Foi instalada uma "tabanca" de bijagós numa ilha de um pequeno lago existente nas imediações do Palácio de Cristal, onde pessoas seminuas eram exibidas ao público como se estivessem no seu ambiente natural. Ora o clima do Porto é consideravelmente mais frio do que o da Guiné. Nem quero pensar no frio que essas pessoas terão passado. (...) (*)


Portugal (continental, insular e ultramarino) tinha uma superfície superior a 2,168 milhões de km2, ultrapando o conjunto europeu formado pela Espanha (continental), a França, A Alemanha, a Inglaterra e a Itália (que não chegava aos 2,097 milhões de km2). Mapa organizado por Henrique Galvão (1895-1970) que, passadas duas décadas, começa a desiludir-se com o Estado Novo e entra em rota de colisão com Salazar. Ficaria mundialmente famoso pelo inédito assalto, em 21 de janeiro de 1961, ao paquete "Santa Maria". Terá sido o primeiro ou um dos primeiros atos de pirataria naval com motivação política, no séc. XX. Henrique Galvão e o seu comando renderam-se às autoridades brasileiras, no porto de Recife, em 2/2/1961, na véspera do início da guerra colonial em Angola.


Sobre a I Exposição Colonial Portuguesa, ver mais informação disponível na Hemeroteca Municipal de Lisboa (, dossiê digital organizado em 2014 para comemorar os 80 anos deste evento; destaque na introdução para o seguinte excerto:  

(...) "Discursando no Palácio da Bolsa (então Palácio das Colónias), [Henrique] Galvão terá afirmado: 'os homens da minha geração vieram ao Mundo dentro de um país pequeno. Felizmente vê-se que pretendem morrer dentro dum império'. 

"Esta ideia, de resto, serviu de mote ao famoso mapa 'Portugal não é um país pequeno', (ver aqui) concebido por Galvão no âmbito da Exposição e amplamente divulgado pelo Secretariado de Propaganda Nacional nos anos seguintes." (...)
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Notas do editor:

(*) Último poste da série > 27 de novembro de  2019 > Guiné 61/74 - P20389: Historiografia da presença portuguesa em África (188): A eterna polémica sobre o racismo no colonialismo português (4): "Portugueses e Espanhóis na Oceânia", por René Pélissier (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P20398: Álbum fotográfico de Domingos Robalo, ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7 (Bissau e Fulacunda, 1969/71) - Parte III


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  > Espaldão do obus 10.5 (1)


Guiné > Região de Quínara  > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  > Espaldão do obus 10.5 (2)


Guiné > Região de Quínara  > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  > DO 27: a chegada do correio


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  >  Eu e o furrel Jacinto


Guiné > Região de Quínara  > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  >  Criançada


 Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  >  População local


Guiné > Região de Quínara  > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  >   Operação com helicópteros AL III

 

Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  >  Uma passagem por Tite, sede do BCAV 2867 (Tite, 1969/70).


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  >  Diversão


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  >  Futebolada


Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  >  O Manuel e o Quibite



Guiné > Região de Quínara > Fulacunda > c. 1969/70 > 22º Pel Art e CCAV 2482  >  Mulheres


Fotos (e legendas): © Domingos Robalo  (2019). Todos os direitos reservados. [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]


1. Continuação da publicação do álbum fotográfico (*) de Domingos Robalo, ex-fur mil art, BAC 1 / GAC 7, Bissau, 1969/71; comandante do 22º Pel Art, em Fulacunda (1969/70); vive em Almada;  tem cerca de 20 referências no nosso blogue.


(...) "Ah…já sabia pelo Jacinto onde era Fulacunda, e quem estava por lá. Os Boininhas [CCAV  2482]. Mas o lugar não era dos mais pacíficos...

Cerca de cinco dias depois, não dois como estava previsto, preparamo-nos para embarcar em três LDM (Lancha de Desembarque Média), 3 obuses 10,5cm, 27 soldados, três cabos, dois furriéis e eu próprio como Comandante de Pelotão. Para além destes militares, íamos acompanhados das mulheres dos soldados e dos respetivos filhos. Cada soldado tinha em média duas ou três mulheres, filhos já não sei.


No dia da partida aportámos a Bolama, onde o pessoal pernoitou o melhor que pôde e eu fui também dormir a uma pensão, cheia de cabo verdianos que não se calaram durante toda a noite. " (...) (**)

A CCAV 2482, "Boinas Negras" era a subunidade que esteva em Fulacunda (entre 30 de junho de 1969 e 14 de dezembro de 1970, regressando nesta data a Bissau).  Foi mobilizada pelo RC 3, pertencia ao BCAV 2867 (Tite,1969/70); partida: 23/2/69; regresso: 23/12/70; antes de Fulacunda, esteve em Tite; comandante: cap cav Henrique de Carvalho Mais.ont




Guiné 61/74 - P20397: In Memoriam (357): Eduardo Jorge Pinto Ferreira (1952-2019): missa do 7º dia, na igreja do Vimeiro, Lourinhã, domingo, 1 de dezembro, às 11h00... Testemunhos do filho Rui Ferreira (Inglaterra) e dos amigos Rui Chamusco (Malcata, Sabugal; e Lourinhã) e João Crisóstomo (A-dos-Cunhados, Torres Vedras; e Nova Iorque)


Eduardo Jorge Pinto Ferreira (Vimeiro, 1952 - 
Torres Vedras, 2019):
foi nosso camarada na Guiné, ex-alf mil, Polícia Aérea, 
Bissalanca, BA 12, 1973/74.


1. Mensagem do Rui Ferreira (filho do Eduardo Jorge):

O teu momento chegou sem esperarmos. Não deu tempo para despedidas, últimos recados ou orientações, simplesmente partiste...


E partiste cedo demais! Tinhas tantos planos, projectos e batalhas para travar, tantos amigos para desfrutar e a família para amar e ser amado!~

No entanto, nesta hora tão penosa e difícil conseguimos encontrar conforto nos momentos intensos e sempre emotivos de quem de ti se veio despedir e só podemos sentirmo-nos felizes e agradecidos.
Felizes por termos tido o privilégio de ser a tua família e de termos recebido tanto. Agradecidos pelos inúmeros gestos, palavras ou, em alguns casos, sentidos silêncios, de todos aqueles que te prestaram homenagem.

Foi um momento especial, tão difícil quanto emotivo, que reflecte a dimensão da tua obra humana. Esta demonstração de profunda e genuína amizade, fraterna em muitos dos casos, tem-nos ajudado a suportar a nossa dor e, acima de tudo, tem nos dado muita força para seguirmos em frente e perpetuar o legado que nos deixaste!

A todos um grande Muito Obrigado!


P.S. Este domingo dia 1 Dezembro pelas 11.00 celebrar-se-á a Missa do 7º dia na Igreja do Vimeiro (Lourinhã).


Rui Camusco, Lourinhã (2016)

2. Mensagem de Rui Chamusco (colega e amigo do Eduardo Jorge, natural de Malcata /  Sabugal, a viver na Lourinhã, onde foi professor; o Eduardo Jorge apresentou-o ao João Crisóstomo e ao Luís Graça, há uns anos atrás)



A vida e a morte: À memória do amigo Eduardo Jorge


Há acontecimentos nas nossas vidas que nos interpelam e fazem pensar, fazendo perguntas sem resposta imediata (não estamos em condições de aceitar), tal é a dor que carregamos. A revolta, as lágrimas, os gritos que nos dilaceram o coração são a via mais comum para descarregarmos tanta pressão no corpo e na alma.

Quando a morte nos rouba alguém que muito amamos ficamos dilacerados, desfeitos, porque quando morre um nosso amigo alo de nós morre também.

A partida inesperada do grande amigo e irmão Eduardo Jorge deixou-nos a todos estupefactos e a não querer acreditar que era verdade. E eu, cúmplice em tantos momentos das nossas vidas, com tanta proximidade sobretudo em que ele cuidou de mim neste dias de internamento hospitalar, não me conformo com a sua ausência física. Quando quis saber de como tinha decorrido a intervenção cirúrgica a que momentos antes tinha sido submetido, a voz do seu filho João soou que nem uma bomba que me esfrangalhou: “Rui, o meu pai já não está entre nós. Morreu...” Não consegui fazer mais nada senão gritar, chorar, dar murros em tudo o que encontrava, fazer perguntas sem resposta.

Eduardo, quero que saibas que a tua partida para o outro mundo nos está a fazer sofrer imenso: eu, a tua amada Sãozinha (é assim que tu a chamas, náo é?), os teus filhos João e Rui, os teus netos, os teus familiares, os teus amigos (tantos!...), tanta e tanta gente que usufruiu da tua generosidade na organização de eventos, de caminhadas, o Vimeiro, o Sobreiro Curvo, a Lourinhã, Fornos de Algodres, Almeida, Sabugal e, de um modo especial Malcata com todos os amigos que tanto te admiram e onde tu tanto gostavas de ir. 

Não. Não te livras de nós, porque todos te lembrarão para sempre. E se estás onde todos pensamos que estejas, com direito próprio por todo o bem que fizeste nesta terra, junto de Deus e de todos os seus santos gozando a vida em toda a plenitude, terás que interceder por todos nós e ser nosso protetor. Quando olhar para o céu em noites estreladas, vou procurar uma estrela que brilhe muito, porque sei que serás tu. Depois da tua partida, já me aconteceram coisas muito importantes que, tenho a certeza, são já fruto da tua intercessão nesse teu novo estado de vida.

Obrigado, Eduardo. Obrigado por tanta amizade e dedicação que me dispensaste ao longo dos 24 anos que passamos juntos, na escola de Ribamar, nas associações culturais e desportivas/recreativas do Vimeiro e de Malcata, no cuidado que tiveste com as minhas coisas enquanto estive ausente, nos almoços que frequentemente partilhamos ( o último foi sexta feira antes do sábado em que foste operado e te foste embora, foste tu que pagaste: estou a dever-te o próximo almoço, que não sei quando será nem em que forma).

Esta manhã fui a tua casa como tu sabes, e a São, os teus filhos Rui e João, o meu primo Carlos e eu fizemos a promessa de continuarmos as nossas vidas e relações como se tu estivesses também presente fisicamente.. Sabes bem o que foi dito e, mesmo sem ouvirmos a tua voz, sentimos que estavas ao nosso lado bem presente.

Caro amigo, sei que nunca te puseste em bicos de pé para seres admirado e louvado, mas não resisti a publicar tudo o que escrevi, porque tu bem o mereces. Talvez não escreva mais sobre a nossa relação e a nossa amizade. Doravante, falarei contigo sempre que me apeteça, na intimidade dos nossos corações. 

Um abraço grande para os amigos que conhecemos neste mundo e que jé estão desse lado contigo. Um abraço especial para o Carlos que partiu nesta ano, e para os nossos amigos e colegas Artur Mário e António Cação. Olhai por nós que recorremos a vós, ok?

Junto anexo o poema/canção que enviei quando o Carlos se foi. Não tive a coragem nem as forças físicas necessárias para o cantar e tocar durante a missa do teu corpo presente, como o amigo Luís Graça me pediu Por isso, está devidamente enquadrado e exposto na tua casa.

Abraço forte e grande deste teu amigo que te não pode esquecer, mesmo que a tua partida e ausência muito me façam sofrer. Um grande abraço também do amigo João Crisóstomo. Foste tu que nos deste a conhecer. Um abraço de todos os amigos que lamentam e choram a tua partida

Adeus. Eduardo!...

Rui Chamusco
Lourinhã, 27/11/2019
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EDUARDO JORGE FERREIRA

O Eduardo nasceu no dia 1 de Outubro, Dia Mundial da Música. Eis o meu preito...

Refrão: Ter um amigo é bom … Vê-lo partir faz sofrer ) bis


1. Encontrei no meu caminho… um rosto que me sorriu
E passei a ter saudades… quando esse bem me fugiu.

2. Fiquei olhando as estrelas… cada noite à luz do luar
Confiei-lhe a minha dor … e aprendi a esperar.

3. O meu amigo voltou … abri-lhe as minhas janelas
Quando procurei sorrir … só encontrei as estrelas.

4. Voltou a mim a saudade … foi-se embora o meu amigo
Mas eu fiquei a ter asas … só por o ter conhecido


AMIGOS PARA SEMPRE!...
Rui chamusco
João Crisóstomo.
Nova Iorque (2018)

3. Mensagem do João Crisóstomo (, que o Luís Graça apresentou ao Eduardo Jorge, há uns atrás)

Caro Luis Graça,

Esta é para ti e para todos os nossos bons camaradas, a quem este momento nos faz sentir ainda mais irmãos.


Graças ao Rui Chamusco que me deu os contactos que pedi, acabei agora de falar com a São e com o filho Rui. Eu sei bem o quanto significa uma palavra amiga nestes momentos e eu quis fazer-lhes sentir que também eu e a Vilma  - como vocês todos têm feito pelo que tenho acompanhado e lido no blogue e facebook etc)  - estamos com eles. E podem continuar a contar connosco. O Eduardo continua em todos nós: também em nós eles podem continuar a sentir a presença do Eduardo, da mesma maneira que neles nós vivemos e sentimos a sua continuada presença.

É uma grande idéia essa de lhe fazer  "uma pequena homenagem, a ele e à São, a mulher da sua vida".

Faço minhas também as palavras do Jorge Pinto que disse: "é uma forma muito bonita de o homenagearmos, valorizando todo o empenho, generosidade e alegria que ele depositava em iniciativas deste género que nós tanto admiramos". 

E por isso embora nós tivéssemos decidido não ir a Portugal este ano  [de 2020] pois que vamos passar dois meses na Eslovénia, regressando depois directamente a Nova Iorque, esta vossa feliz decisão fez-nos mudar de idéias imediatamente: Nós queremos estar e viver convosco (e com o Horácio e a Helena e muitos outros que com certeza vocês não deixarão de avisar também ) essa justa homenagem ao Eduardo, à São e filhos. Nós vamos a Portugal para estar com vocês nesse dia 12 de Outubro no próximo ano.

E a todos os que no Blogue, Facebook,  etc-,  têm dado o seu ombro aos que estando longe dele necessitavam, eu quero dizer o meu pessoal "muito obrigado". Este golpe, duro para todos, foi-me agravado por esta separação física, obrigado a aguentar sozinho a perca deste nosso irmão. … 

Obrigado especialmente ao Rui Chamusco que por telefone me dia dizendo onde se encontrava e assim, diminuindo distâncias, me possibilitava a minha presença: "Olha, João, estou na casa da São"..."Estamos agora na Igreja"..., "no cemitério"… Obrigado,  Rui, Obrigado, Luis Graça e a todos vocês.

Um abraço de coração,

João
Nova Iorque, 27/11/2019


sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Guiné 61/74 - P20396: (D)o outro lado do combate (53): Quando um comando das FARP, da Frente Nhacra / Morés, destruiu, em 6 de maio de 1972, o centro emissor regional de Nhacra...(Comunicado do PAIGC, em francês, assinado por Amílcar Cabral)... Afinal, a propaganda era uma arma, tão ou mais eficaz que as minas A/C, a Kalash, a "costureirinha", o morteiro 120 ou o RPG 7... Nesse aspeto, a "Maria Turra" ganhava ao "Pifas"...



Fotografia de Amílcar Cabral (1924-1973). Fonte:  "O Nosso Livro - 2ª Classe", manual escolar do PAIGC. O livro foi "elaborado e editado pelos Serviços de Instrução do PAIGC - Regiões Libertadas da Guiné" (sic). Tem o seguinte copyright: 1970 PAIGC - Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde. Sede: Bissau (sic)... A primeira edição teve uma tiragem de 25 mil exemplares (!). Foi, além disso, impresso em Uppsala, Suécia, em 1970, por Tofters/Wretmans Boktryckeri AB.

Citação:
(1972), "Comunicado do PAIGC sobre o ataque das FARP à estação emissora portuguesa de Nhacra", Fundação Mário Soares / DAC - Documentos Amílcar Cabral, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_42407 (2019-11-28)



1. Comunicado do PAIGC,  em francês, com data de 11 de maio de 1972, assinado pot Amílcar Cabral, Secretário Geral, dizendo o seguinte [Tradução: LG]:


"Pondo em prática uma decisão tomada recentemente pelo Conselho de Guerra do nosso Partido, uam unidade de comandos das Forças Armadas regulares da Frente Nhacra-Morés, atacou com sucesso, na noite de 6 de maio [de 1972], a nova estação emissora de 100 KW (ondas média e curta), instalada pelos colonialistas portugueses em Nhacra, a 25 km da capital, Bissau. A maior parte das instalações ficaram destruídas, não tendo os nossos combatentes sofrido nenhuma baixa.

Lembramos que esta potente estação emissora, oferta às autoridades coloniais do nosso país pelos colonos de Angola, estava em funcionamento deste janeiro último, tendo sido  e acabava de ser inaugurada pelo ministro português Silva e Cunha  na mesma altura em que a Missão Especial das Nações Unidas se encontrava de visita às regiões libertadas do Sul do nosso país". 

Fonte: Casa Comum (com a devida vénia...)
Pasta: 07197.160.011
Título: Comunicado do PAIGC sobre o ataque das FARP à estação emissora portuguesa de Nhacra
Assunto: Comunicado do PAIGC sobre o sucesso do ataque de uma unidade de comandos das FARP (Frente Nhacra-Morés) à estação emissora portuguesa de Nhacra.
Comunicado assinado por Amílcar Cabral.
Data: Quinta, 11 de Maio de 1972
Observações: Doc. incluído no dossier intitulado Documentos.
Fundo: DAC - Documentos Amílcar Cabral
Tipo Documental: Documentos


2. O PFA - Programa das Forças Armadas (, popularmente conhecido por PIFAS)  era emitido a partir de Nhacra, a 25/30 Km de Bissau, onde se situava o emissor regional da Guiné, que integrava a rede da Emissora Nacional de Radiodifusão (*).

Recorde-se que em 1969, no governo do Marcelo Caetano, e sendo ministro do Ultramar, Silva Cunha, foi integrada, na Emissora Nacional de Radiodifusão, a até então chamada Emissora Oficial da Guiné Portuguesa, pelo Decreto-Lei nº 49084, de 16 de junho de 1969.

Segundo o art. 1º daquele diploma legal, "é autorizada a Emissora Nacional de Radiodifusão a instalar um emissor regional na província da Guiné" (art. 1º). Por outro lado, passava a competir " à Emissora Nacional de Radiodifusão, através do Emissor Regional da Guiné, assegurar todo o serviço de radiodifusão indispensável à satisfação das necessidades da província e à salvaguarda e defesa dos interesses nacionais, substituindo, em matéria de radiodifusão, a actividade até agora exercida pela Emissora Oficial da Guiné Portuguesa, anteriormente designada por Emissora Provincial da Guiné Portuguesa" (art. 2º).

Em Abril de 1972, aquando da visita do ministro do Ultramar, Silva Cunha, foi inaugurado o novo centro emissor de Nhacra, capaz de fazer frente às "potentes emissoras de Dakar e Conakry, onde a propaganda do PAIGC ocupa lugar proeminente - em tempo de emissão" (...).


3. Nesse ano de 72, e segundo informação do nosso camarada Eduardo Campos (, ex-1º Cabo Trms da CCAÇ 4540, Cumeré, Bigene, Cadique, Cufar e Nhacra, 1972/74), Nhacra e o centro emissor terão sido flagelados duas vezes: 

"(...) Fomos informados que Nhacra e o Centro Emissor foram flagelados pelo IN duas vezes: a primeira ao tempo da CCAÇ 3326, em Maio de 1972, por um grupo equipado com armas automáticas e RPG-2 e 7, e a segunda em Agosto de 1972, utilizando também um canhão s/r. Em ambos os casos sem qualquer consequência material ou pessoal para as NT". (**)

Em 21 de janeiro de 1974, um ano e meio depois das flagelações acima referidas, um grupo de jornalistas de jornais diários de Lisboa (Diário de Lisboa, Diário de Notícias, Agência Lusitânia) e repórteres da RTP visitam, de noite,  o centro emissor de Nhacra, em Bissau... 

O vídeo (5' 29'') pode ser visto aqui, no sítio RTP Arquivos: sem som, é mudo, acrescente-se (e para licenciar o conteúdo, o Arquivo da RTP exige-me 15 euros...). A peça passou no "noticiário nacional" da televisão pública, em janeiro de 1974. Estranha-se que a visita  tenha sido feita à noite: em todo caso, o equipamento técnico parece estar em bom estado. Não sabemos se, depois das duas flagelações ao centro emissor em 1972,  houve mais alguma até ao final da guerra.

Não havendo fontes independentes, não podemos confirmar a existência de eventuais estragos no centro emissor de Nhacra, provocado pela flagelação do alegado comando das FARP da frente Nhacra-Morés, em 6 de maio de 1972. 

Em todo o caso, o comunicado do PAIGC afirma categoricamente que "a maior parte das instalações ficaram destruídas",  o que era, sabemo-lo hoje, uma mentira descarada.  Quem ia passear a Nhacra, e quem estava em Bissau, ou até no interior do territória e ouvia o PIFAS,  sabia que o centro emissor não fora afetado. 

Amílcar Cabral não costumava validar os "relatórios" da atividade da guerrilha, que lhe mandavam do interior para Conacri. Nem tinha meios para o fazer. Nem estava interessado em fazê-lo. Por seu turno, os comissários políticos e os comandantes da guerrilha, no interior, todos queriam "mostrar serviço"... A propaganda era um arma, tão ou mais eficaz que as minas A/C, a Kalash,  a "costureirinha", o morteiro 120 ou o RPG 7... E nesse aspeto, em matéria de propaganda, Amílcar Cabral e a "Maria Turra" (Rádio Libertação) ganhavam, de longe, ao Spínola, à Emissora Nacional e ao PIFAS. (**)...Todos mentíamos, mas o PAIGC mentia mais descaradamente...

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(**) Vd. poste de 30 de janeiro de 2010 > Guiné 63/74 – P5729: Histórias do Eduardo Campos (7): CCAÇ 4540, 1972/74 - Somos um caso sério (Parte 7): Nhacra 2

(***) Último poste da série > 25 de julho de  2019 > Guiné 61/74 - 20010: (D)o outro lado do combate (52): O T-6G FAP 1694 e o cap pilav João Rebelo Valente, desaparecido em 14/10/1963, na região do Óio- Morés (Jorge Araújo)

Guiné 61/74 - P20395: Notas de leitura (1241): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (34) (Mário Beja Santos)



1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil Inf, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 1 de Julho de 2019:

Queridos amigos,
Retoma-se o Diário de JERO e algumas das suas páginas mais emocionantes e sintetiza-se alguns dos títulos significativos da história do BCAV 490 na sua zona de ação, aspeto bem curioso não muito distante por onde começou a sua atividade operacional, antes de ser lançado na batalha do Como.
Recorda-se Amândio César e até de uma sua visita a Binta. Procura-se escavar este período da guerra da Guiné e dói a falta de documentação ou relatos fundamentados. A mágoa é tanto maior quanto se sabe que à volta desse "homem providencial" de nome António de Spínola tudo se procurou deixar publicado, desde as suas primeiras diretivas, as suas viagens ao mato, as suas entrevistas, as suas aparições mediáticas nos Congressos do Povo, e o mais que se sabe. Com Louro de Sousa e Schulz é bem o contrário, parece mesmo que se procurou construir a imagem de que foram líderes impreparados para o turbilhão da luta armada. E não deixa igualmente de ser curioso que quem anda a historiografar nunca cite as instruções mais importantes destes dois oficiais-generais que estão publicadas em diferentes volumes da Resenha Histórico-Militar das Campanhas de África.
Enfim, muito caminho há a percorrer para se chegar à verdade histórica e a uma justa cronologia de toda aquela guerra.

Um abraço do
Mário


Missão cumprida… e a que vamos cumprindo (34)

Beja Santos

“Tivemos 3 feridos
o Sousa cego ficou.
José dos Santos Pascoal
muito sangue derramou.

À tardinha trabalhando
para estarmos descansados
fazendo recuar os malvados
que nos cordéis vão tropeçando.
Vamos granadas armando
nos sítios mais escondidos
para ver se os bandidos
não nos vêm atacar,
mas um dia, com azar,
tivemos três feridos.

Um grande desastre se dava
ao espoletar uma armadilha:
o 407 afrouxou a cavilha
e nisso não reparava.
Ao Alferes Monteiro a entregava
e o percutor desarmou.
Neste momento rebentou
levando-lhe dois dedos de uma mão.
E nesta mesma ocasião
o Sousa cego ficou.

A 13 de Outubro se seguia
quando uma mina explodiu,
o António de Sousa se feriu,
às 16 horas do dia.
No helicóptero se metia,
directamente para o Hospital.
Com seus colegas, muito mal,
tudo foi evacuado
e com o corpo estilhaçado
José dos Santos Pascoal.

Neste mês aconteceu
outra coisa amargurada:
Emídio bom camarada
no dia 25 morreu.
Uma úlcera lhe apareceu
que a morte originou.
Essa nascença rebentou,
foi grande a infelicidade
até ir para a eternidade
muito sangue derramou.”

********************

O bardo continua a desfiar o seu rosário de desditas, volta-se àquela bela página contida no diário de JERO, o “Diário da CCAÇ 675”, onde se descreve a retirada do Capitão do Quadrado para o Hospital Militar 241, cercado pela ternura dos seus militares.
É um texto pleno de sinceridade e ternura:
“Embora necessariamente combalido, o nosso capitão enquanto caminhava tranquilizava os que o acompanhavam que se sentiam manifestamente impressionados pelo acontecimento.
Renovado o penso e depois de estancada a hemorragia que tinha voltado a surgir durante a caminhada até à coluna, pediu-se helicóptero para evacuação urgente já que não se podia avaliar da extensão do ferimento e da sua gravidade. O estilhaço tinha penetrado profundamente e poderia ter lesado algum órgão importante.
Organizada a coluna, voltaram-se as viaturas já com todo o pessoal montado, iniciando-se o regresso o mais depressa possível pois o estado do nosso Capitão inspirava sérios cuidados.
Recusando-se a tomar sedativos que lhe aliviariam as dores mas que o tornariam inconsciente, continuou a dar ordens que eram transmitidas pelo furriel-enfermeiro.
Apenas uma centena de metros tinham sido percorridos quando, no meio de uma mata fechadíssima, um inimigo emboscado atacou. Um tiro de pistola inicial e depois rajadas de pistola-metralhadora. As viaturas pararam imediatamente, os ocupantes ripostaram o fogo inimigo.
Por duas vezes o Alferes Santos, que deve ter sido referenciado pelo inimigo por ter dado ordens em voz alta, foi particularmente visado, passando uma rajada de pistola-metralhadora bem perto da sua cabeça.
De salientar no momento, a calma e sangue-frio do nosso Capitão que foi sempre transmitindo ordens, insistindo pelo afastamento da coluna o mais rapidamente possível da zona de morte da emboscada. Com frequência, soldados abeiravam-se do Unimog onde seguia o nosso Capitão perguntando pelo seu estado, não conseguindo ocultar uma lágrima teimosa que descia pelos seus rostos sujos de terra e suor.

Cerca do meio-dia, quando seguíamos na região de Sansancutoto, surgiu dos lados de Binta o helicóptero pedido para a evacuação do nosso Capitão que, já há cerca de duas horas ferido, começava a sentir-se enfraquecido e com dores que os solavancos da viatura tinham aumentado.
Montada a segurança em círculo, o helicóptero desceu em manobra perfeita numa clareira junto à estrada.
O momento que se seguiu não mais será esquecido por todos aqueles que o viveram.
Alguns daqueles homens de camuflado que poucos quilómetros atrás tinham zombado das balas inimigas, desprezando a morte com um sorriso altivo nos lábios, choravam agora como crianças despedindo-se do seu capitão.
Não menos comovido, este, deixava correr livremente pelo seu rosto marcado pelo sofrimento, lágrimas de que um homem não se envergonha.
Todos queriam pegar na maca para o transportar até ao helicóptero; um despia o casaco camuflado para lhe aconchegar melhor a cabeça na maca do helicóptero; outro dava-lhe o seu concentrado de frutos da ração de combate; outro ainda quase que o obrigava a beber a água do seu cantil. Todos lhe queriam tocar, apertar a mão, desejar-lhe as melhoras para que voltasse depressa.
Será difícil para um mortal comum cujas emoções fortes nunca passaram além da discussão com um polícia por causa do estacionamento do carro ou de um momento mais emotivo de um desafio de futebol ou de uma tourada, avaliar do que se sente num momento destes, quando se vê sofrer um homem, que além de um chefe de excepção, é um amigo a quem se quer como a um pai e pelo qual todos nós daríamos um pedaço da nossa vida, um pouco do nosso sangue.”

E de Binta e de um ferimento que felizmente não trouxe graves consequências ao Capitão do Quadrado retorna-se à história do BCAV 490. Se nos é lícito fazer uma síntese, recorde-se que partiram para a Guiné em julho de 1963, onde permaneceram cerca de dois anos. Haverá um número substancial de alterações nos Comandos no decurso da comissão, farão inicialmente um conjunto de operações na região do Oio, partem depois para a Operação Tridente, que durou 71 dias. Após um período de recuperação em Bissau, o BCAV 490 sedia-se em Farim, o seu campo de ação não será minimizável: Farim, Jumbembem, Cuntima, Binta, Bigene, Barro, Guidage, Canjambari, viu-se que a CCAÇ 675, em Binta, foi confrontada com o inimigo que praticamente se passeava pela sua zona, o PAIGC precisava de transportar gentes, armamento e munições, abastecimentos de toda a ordem, através de corredores que saíam do Senegal e que apontavam primordialmente para a região do Oio. A história da unidade detalha minuciosamente as diferentes operações, a partir de junho de 1964, recorde-se a operação realizada à região de Farincó-Mandinga, em 24 de setembro de 1964, de que resultou captura de material e foram destruídas cerca de 37 casas de mato. Igualmente aqui se fez referência ao grave acidente sofrido em 5 de janeiro de 1961 pelo Pelotão de Morteiros 980. Sucedem-se as operações em que se destroem algumas casas de mato e se captura material, emboscadas, nomadizações, como é timbre na guerra de guerrilhas, vai-se da falta de resultados a sucessos inesperados. Foi o caso da Operação Vouga, realizada pela CCAV 487, em 31 de maio de 1965, não longe de Farincó e Fambantã, entrou-se num acampamento, houve reação de fogo, o inimigo resistiu e depois retirou, apreendeu-se bastante material, e escreveu-se no relatório que o inimigo persistia em permanecer na área, mudando de lugar. Em junho desse ano, deu-se a rendição do BCAV 490, foram-se deslocando de Farim para Bissau e de Bula para Bissau, ficaram aquartelados em Brá até ao embarque para Portugal. A história da unidade elenca os efetivos, as baixas sofridas, condecorações e o resumo do material mais importante apreendido às forças do PAIGC.

É tempo de voltar ao escritor e jornalista Amândio César e ao seu livro “Guiné 1965: Contra-Ataque”, Editora Pax, 1965.
É o seu regresso à Guiné para fazer reportagens, fala de Bissau e da sua evolução, da variedade de etnias que se espalham pelo território, a natureza da guerra subversiva conduzida por Amílcar Cabral, elenca os progressos no sistema educativo, faz o balanço de um ano de governo do General Arnaldo Schulz, as batalhas vencidas na doença do sono, da lepra e da tuberculose, as belezas do artesanato, recorda com saudade o falecido Capitão Francisco Torres de Meireles, falecido na região do Xime em junho desse ano, visita o régulo de Pachisse Sené Sané, acredita piamente que Bolama recuperará o esplendor do passado, visita o Chão Felupe, onde assiste a uma luta livre ao lado do Rei do Caruai, comove-se com o Juramento de Bandeira em Nhacra e visita Binta, onde foi recebido pelo Capitão Tomé Pinto e os seus oficiais.
Dedica alguns parágrafos a Binta, elogiosos:
“Diga-se desde já que quando a tropa aqui chegou encontrou apenas 38 pessoas nas tabancas que constituem Binta. A recuperação vai-se verificando dia após dia. O Capitão Tomé Pinto apresenta-nos o professor de Binta. Binta tem para mim um estranho significado: aqui deixou a vida o filho de um velho amigo meu – o Furriel Vilhena de Mesquita – que, em seis meses de Guiné, fora duas vezes gravemente ferido e morreu ao deflagrar de uma mina na estrada de Binta a Bigene. Vi partir o Furriel Vilhena de Mesquita para a Guiné e depois acompanhei o seu pai – o jornalista Rebelo de Mesquita – quando os despojos do filho chegaram a Lisboa”.

É um relato eivado de propaganda, contudo fala-se prudentemente da guerra, mais do desenvolvimento, dedica-se alguma atenção à história da imprensa na Guiné, à indústria no Ilhéu do Rei, dedica todas as suas reportagens aos soldados da Guiné, pela sua coragem, pelo seu sacrifício. Como atrás se disse, Amândio César fará uma segunda visita à Guiné, não se cansará de elogiar o trabalho de Arnaldo Schulz, considera que a subversão está a ser detida e a generalidade da população mantém-se fiel à soberania portuguesa.
Veremos adiante numa diretiva de Schulz datada de 1 de dezembro de 1966 que ele tece previsões muito sombrias para o futuro da Guiné.

(continua)
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Notas do editor:

Poste anterior de 22 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20371: Notas de leitura (1238): Missão cumprida… e a que vamos cumprindo, história do BCAV 490 em verso, por Santos Andrade (33) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 25 de novembro de 2019 > Guiné 61/74 - P20381: Notas de leitura (1240): Mário Cláudio, nos cinquenta anos da sua obra literária (3): “Tiago Veiga”; Publicações Dom Quixote, 2011 (Mário Beja Santos)