domingo, 16 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19020: O Cancioneiro da Nossa Guerra (10): O fado "Tudo isto é tropa" (recolha de Gabriel Gonçalves, ex-1º cabo cripto, CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71)

Gabriel Gonçalves
1. Mais uma letra de fado (parodiada...) a juntar ao Cancioneiro da Nossa Guerra. Foi-nos enviada pelo nosso grã-tabanqueiro Gabriel Gonçalves (ex-1.º cabo cripto, CCAÇ 2590 / CCAÇ 12, Contuboel e Bambadinca, 1969/71), com a seguinte mensagem, datada de 29/11/2011 (*):


(...) Já que estamos em maré de fados, junto um fadinho, de que não sei quem é o autor. Também não me lembro como o aprendi (...), mas é bastante giro, pois retrata bem a nossa triste vida, na tropa!

Já agora, dei-me ao luxo de alterar a última quadra; onde se lê "cuidado" [2º verso da IV quadra], substituí por "azar" e para rimar..."estás a lerpar"!... Achei que era mais giro.

De resto, acho que este fado é anterior ao nosso tempo [de Guiné,] porque fala em botas cardadas. No nosso tempo as botas já não tinham cardas! (...)

2. Renovo aqui o que em tempos escrevi sobre o "Arcanjo São Gabriel" ou "Guê-Guê":

Não sei por que te fizeram arcanjo e santo ... Talvez porque, simbolicamente, nos ajudaste,  a nós, operacionais da CCAÇ 12, a dar de beber à dor... e assim nos inunizaste e nos protegeste!

Sempre foste um grande senhor e um  camaradão... Com a tua viola e a tua bela voz, animaste muitas das nossas noites, quer no bar de sargentos de Bambadinca, quer também no nosso quarto (conhecido por quarto das 'putas'.  como a devida vénia ao Humberto Reis, o autor da expressão: não por elas terem autorização de lá entrar, mas por ser o quarto da rebaldaria, só habitado por anjos e arcanjos: eu, o Humberto Reis, o Tony Levezinho, o Joaquim Fernandes e o José Luís Sousa - o madeirense...). Não era o céu, era o que se podia arranjar mais próximo do céu, naquele cantinho do inferno...

Tenho eu, temos nós,  uma dívida de gratidão. para contigo, Guê-Guê!  E mais grato ainda te fico   por teres salvo e enviado esta letra de fado que tu cantavas, nós cantávamos, nesses tempos, juntamente com outras que já recuperámos e que já  fazem  (ou vão fazer) parte de O Cancioneiro da Nossa Guerra   (**)

É justo lembrar que tu eras, de todos nós, o que tinhas mais "cultura fadista", sendo alfacinha e rapaz vivido...A tua viola e a tua voz animarama muitas noitadas e tainadas em Bambadinca... Muitas ? Aquelas que conseguíamos roubar ao tempo da guerra, do teu serviço cripto e das nossas saídas para o mato, das nossas operações, etc. Não tenho sabido de ti. Dá notícias. 

3. Letra fado "Tudo isto é tropa"

Com música de "Tudo isto é fado" (Letra: Aníbal Nazaré; Música: Fernando Carvalho; criação de Amália Rodrigues).[Clicar no atalho para ver e ouvir vídeo no YouTube]


Tudo isto é tropa

I

Perguntaste-me outro dia
O que era a vida militar,
Eu disse que não sabia
Mas estava-te a enganar.

II

Sem saber o que dizia,
Menti-te naquela hora,
Eu disse que não sabia
Mas vou-te dizer agora.

Refrão


Botas cardadas, mal engraxadas, sempre a marchar.
Batendo a pala, como um magala, sem refilar.
Toda a semana, numa má cama, sem ter cachopa.
Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é tropa.


III

Se pensas tomar chuveiro,
E andar bem asseado,
Perde a esperança, companheiro,
Pois vais ser desenganado.

IV

Quando limpas a espingarda,
Quer tenhas ou não cuidado, [azar]
Vais sujar de massa a farda,
E depois ser castigado, [ estás a lerpar].



Refrão


Botas cardadas,  etc.,  etc.


[ Recolha: Gabriel Gonçalves, Lisboa, 2011. Revisão e fixação de texto: LG]

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Nota do editor:

(*) Vd. poste de 29 de novembro de 2011 > Guiné 63/74 - P9111: O nosso fad...ário (2): Fado Tudo isto é tropa (Gabriel Gonçalves, ex-1º Cabo Cripto, CCAÇ 12, Bambadinca, 1969/71)

(**) Último poste da série >  14 de agosto de 2018 >  Guiné 61/74 - P18921: O Cancioneiro da Nossa Guerra (9): Os bravos de Bambadinca

Guiné 61/74 - P19019: Blogpoesia (585): "Inspiração", "O farol solitário" e "De mãos dadas...", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

1. Do nosso camarada Joaquim Luís Mendes Gomes (ex-Alf Mil da CCAÇ 728, Cachil, Catió e Bissau, 1964/66) estes belíssimos poemas, da sua autoria, enviados entre outros, durante a semana, ao nosso blogue, que publicamos com prazer:


Inspiração

Deito achas na fogueira e sopro forte
para avivar a inspiração.
Está gelada.
Saltam chispas. Faúlhas vivas.
Labaredas não.
Minha alma sofre buscando um tema.
Eis senão quando a chama acende.
Se alarga o mundo.
Alcanço ao longe e respiro fundo.
Uma ideia vem.
Bruxuleando e rindo.
Me enterneço a vê-la.
Como sereia rodopia e baila.
Faz piruetas.
Brinca comigo ao esconde-esconde.
Depois, sossega.
Se entrega toda num amplexo ardente.
A chama é forte.
Quase derrete e funde.
Meus olhos brilham.
Minha boca seca.
É delirante.
A sensação é boa.
Deixa saudade...

Bar do Edeka em Berlim, 15 de Setembro de 2018
10h34m
Jlmg

********************

O farol solitário

Se ergue, alto e luminoso, entre a terra e o mar.
Dorme de dia e trabalha de noite.
Por preço igual.
Seu lema é rodar.
Estrela do norte,
Cruzeiro do sul.
Derrama nas águas um rasto de luz.
Quanto mais longe melhor.
Aponta o caminho.
Se contenta com pouco.
Não pede benesses.
Que o vejam os nautas perdidos
P'ra, seguros, voltarem.
Um guarda o cuida como se fosse o patrão.
Parceiros da sorte,
Inverno e Verão.

Bar dos "Motocas" arredores de Berlim, 14 de Setembro de 2018 
11h2m
O cuco cantou...
Jlmg

********************

De mãos dadas...

Sigamos de mãos dadas pelos caminhos deste mundo.
Se tropeçarmos, logo alguém nos deita a mão,
Será menor a dor e assim se alcançará o fim.
Com a união de todos tudo ficará mais perto.
Pedra a pedra, grão a grão,
Se conseguiu elevar a pirâmide de Gisé.
Se vasa a montanha com um túnel
Que nos abrevia o caminho.
E nos compensa em tempo.
Quem se afasta ficará sózinho.
Exposto a tudo que possa acontecer.
De bom ou não.
Só com todos a vida tem sentido.
Porque somos limitados.
Todos temos muito para dar.
E cada um tem seus condons.
Um quadro belo é a soma de pontos diferentes que geram a harmonia e a beleza...

Henrik Chaim Goldschmidt plays "Gabriel's Oboe"
Berlim, 13 de Setembro de 2018
8h27m
Jlmg
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Nota do editor

Último poste da série de 9 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18998: Blogpoesia (584): "Deixem as ondas rolar...", "Lá se foi o primeiro poema..." e "Nariz empinado", da autoria de J. L. Mendes Gomes, ex-Alf Mil da CCAÇ 728

sábado, 15 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19018: Os nossos capelães (7): o 1º curso de formação de capelães militares foi em 1967, na Academia Militar


Lisboa > Academia Militar > 23 de outubro de 2017 > Comemoração  dos 50 anos do 1º curso de formação de capelães militares. Foto: Agência ECCLESIA/HM (reditada pelo Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné, com a devida vénia...)






1º Curso de Formação de Capelães Militares, realizado na Academia Militar, de 23 de agosto a 17 de setembro de 1967. Lista  dos sacerdores, graduados em aspirante a oficial, que o frequentaram, por ramos das Forças Armadas (Marinha, Força Aérea e Exército).

Fonte: Ordinariato Castrense  (sítio da Diocese das Forças Armadas e das Forças de Segurança)


1. Entre os 58 participantes deste 1º curso de formação de capelães militares estão dois membros da nossa Tabanca Grande:

(i) Mário de Oliveira (ex-alf mil capelão, CCS/BCAÇ 1912, Mansoa, entre novembro de 1967 e em março 1968);

(ii) e Horácio Fernandes.(ex-alf mil capelão, BART 1913, Catió, 1967/69).

Outro dos participantes foi deste histórico curso foi padre Carlos Augusto  Leal Moita, entretanto já falecido, segundo informação do nosso camarada Virgílio Teixeira. Em 1988, tinha o posto de major capelão.

50 anos depois, em 2017, o Ordinariato Castrense celebrou este histórico curso de formação de capelães militares. Ver aqui vídeo da Agência Ecclesia. Ver também aqui a notícia escrita, de 23 de outubro de 2017.

Antes de 1967, já havia capelães militares no TO da Guiné, mas sem formação específica (que passou a ser prevista no art. 10º do decreto-lei nº 47188, de 8 de setembro de 1966)..

O nosso blogue tem 80 referências com o descritor capelães. Temos ainda a série Os Nossos Capelães, com 13 referências.

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Nota do editor:

Útimo poste da série > 25 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16638: Os nossos capelães (6): Libório [Jacinto Cunha] Tavares, o meu Capelini, capelão dos "Gatos Negros", açoriano de São Miguel, vive hoje, reformado, em Brampton, AM Toronto, província de Ontario, Canadá (José Martins, ex-fur mil trms, CCAÇ 5, Canjadude, 1968/70)

Vd. postes anteriores da série:

25 de outubro de 2016 > Guiné 63/74 - P16636: Os nossos capelães (5): Relação, até à sua independência, dos Capelães Militares que prestaram serviço no Comando Territorial Independente da Guiné desde 1961 até 1974 (Mário Beja Santos)

17 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13616: Os nossos capelães (4): O bispo de Madarsuma, capelão-mor das Forças Armadas, em Gandembel, no natal de 1968 (Idálio Reis, ex-alf mil, CCAÇ 2317, Gandembel / Balana, 1968/69)

5 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13577: Os nossos capelães (3): O capelão do BCAÇ 619 ia, de Catió, ao Cachil dizer missa... Creio que era Pinho de apelido, e tinha a patente de capitão (José Colaço, ex-sold trms, CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65)

5 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13576: Os nossos capelães (2): Convivi com o ten mil Gama, de alcunha, "pardal espantado"... Muitas vezes era incompreendido, até indesejado por alguns, pois tinha coragem para denunciar os abusos, quando os presenciava (Domingos Gonçalves, ex-allf mil, CCAÇ 1546 / BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68)

5 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13575: Os nossos capelães (1): Conheci em Bedanda o ten mil Pinho... Ia visitar-nos uma vez por mês para dizer missa... E 'pirava-se' logo que podia (Rui Santos, ex-alf mil, 4.ª CCAÇ, Bedanda, 1963/65)

Guiné 61/74 - P19017: Álbum fotográfico de Virgílio Teixeira, ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, 1967/69) - Parte XLIII: O alf mil capelão Carlos Augusto Leal Moita


Foto nº 7 > Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > CCS / BCAÇ 1933 (1967/69) > 1969 > O nosso Capelão, à civil, lendo a Bíblia [?].
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Foto nº 8 > Guiné > Região de Gabu > Nova Lamego > CCS / BCAÇ 1933 (1967/69) > Dezembro de 1967 > Cerimónia religiosa local, Natal 67.


Foto nº 4A > Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > CCS / BCAÇ 1933 (1967/69) > Noiute de Natal > 24 de dezembro de 1968. 9h e meia da noite. Noite. Em primeiro plano, o capelão Moita fumando. O Virgílio Teixeira, é p segundo, de óculos, na segunda fila, a contar da esquerda para a direita.


Foto nº 4A > Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > CCS / BCAÇ 1933 (1967/69) > Noiute de Natal > 24 de dezembro de 1968. 9h e meia da noite.


 Foto nº  5 > Guiné > Região do Cacheu > São Domingos > CCS / BCAÇ 1933 (1967/69) > Noite de Natal > 24 de dezembro de 1968 >  Outra foto da consoada. Fim de jantar.


Foto nº 1 > Guiné > Região de Gabu > Nova Lamego > CCS / BCAÇ 1933 (1967/69) > Numa coluna na estrada de Nova Lamego-Piche, Novembro 67. Eu sou o do meio do grupo, e do lado esquerdo o Capelão Moita, e à direita o Alferes Mesquita, responsável das Transmissões.


Foto nº 2 > Guiné > Região de Gabu > Nova Lamego > CCS / BCAÇ 1933 (1967/69) >Na coluna para Piche, em cima do mesmo Unimog, agora noutra perspectiva. Nov./67. O operador da Bazooka tinha de ser eu, para a foto, ao lado o Capelão Moita e outro pessoal
  

Foto nº  3 > Guiné > Região do Cacheu > Piche > CCS / BCAÇ 1933 (1967/69) > Novembro de 1967 > Já no Quartel de Piche, sendo a figura principal o Capelão Moita de costas. O médico Lema Santos, que ali está de óculos, ao meu lado.


Fotos (e legendas): © Virgílio Teixeira (2018). Todos os direitos reservados [Edição e legendagem complementar: Blogue Luís Graça & Camaradas da Guiné]



1. Mensagem do Virgílio Teixeira:

Data: 21/08/2018, 17:25
Assunto - Guerra e Paz, a Alma e o Espírito: o alferes capelão Moita

Caro amigo e camarada Luís Graça:

Vou procurando e encontro novos temas, mais pequenos, mais fáceis de digerir.

Acho que este é um tema que ainda não vi tratado aqui, e parece interessar a alguns praticantes e não só. A presença de um representante da Igreja no seio daquele conflito, era sempre bem vindo. Já morreu, Paz à sua alma.

Vai para o lote, espero que não cause problemas na tua organização. Obrigado e até muito breve.

Virgílio Teixeira


2. Continuação da publicação do álbum fotográfico do Virgílio Teixeira (*), ex-alf mil, SAM, CCS / BCAÇ 1933 (Nova Lamego e São Domingos, set 1967/ ago 69); natural do Porto, vive em Vila do Conde, sendo economista, reformado; tem já cerca de 80 referências no nosso blogue.

Guiné - Portugal 67/69 - Álbum de Temas:

T055 – O NOSSO CAPELÃO, ALFERES GRADUADO MOITA, QUE SE JUNTOU MAIS TARDE AO BCAÇ1933


I - Anotações e Introdução ao tema:

INTRODUÇÃO:

A nossa guerra não se fez só de armas, minas, emboscadas, flagelações, bebedeiras, mulheres e outras coisas mais, também o espirito precisava de alguma paz de alma, e para aqueles que nunca se esqueceram da fé, da religião, da missa, de um conforto, então cada Unidade – maior ou menor – tinha o seu Padre Capelão, normalmente Alferes Graduados, acho que era assim, mas não tenho a certeza disso.

O meu batalhão [, o BCAÇ 1933,] partiu sem Capelão, e ainda esteve um mês pelo menos sem ele, mas quando chegou foi bem-vindo, a passou a integrar na perfeição as tropas todas que já estavam no terreno, foi uma companhia muito interessante.

Ele tinha de se deslocar às várias unidades aquarteladas pelos Sector a que pertencia, e foi a todas, penso eu, até talvez a Madina do Boé, não garanto, se alguém souber da sua presença pode e deve vir contrariar este texto.

Eu tenho de confessar que não fui daqueles que mais ‘utilizou’ o seu trabalho, a sua missão. Estivemos juntos num ou noutro ‘velório’ e pouco mais, em termos religiosos, acho que nunca assisti a uma missa naquele tempo todo.

Aliás, e pensando bem, já nem me lembro bem onde ficavam as capelas, em Nova Lamego conheço, porque lá estive num velório, mas em São Domingos não me lembro mesmo nada.  Nem sei onde eram as suas instalações, ele devia ter alguma coisa só para ele.

Fomos amigos e camaradas, andamos em várias colunas, mas não tenho grandes reportagens disso, pois as saídas em coluna só em Nova Lamego, em São Domingos só de barco, e não me lembro de ele nos acompanhar nessas deslocações, nem interessa isso.

Ele fazia as suas refeições na messe de oficiais como era da praxe, mas muitas vezes estaria por fora, noutros aquartelamentos.

Foi um bom companheiro, além do culto religioso, era também brincalhão, quase não parecia um padre, mas um amigo.

Juntei alguns elementos, fotos, onde ele aparece, devo ter mais, mas estes chegam para nos lembrarmos da sua memória, pois já faleceu, segundo disseram num almoço convívio. Ele foi a alguns, mas eu nunca mais o encontrei, viajamos no Uíge e depois acabou.

Espero que os leitores gostem e apreciem também estes ex-combatentes, independentemente da sua religião, porque eles estavam lá, mas não tinham arma distribuída.

Paz à sua alma.

Alferes Miliciano Carlos Augusto Leal Moita, desconheço qual a sua localidade de origem.

[Nota do editor LG: 

Soubemos, por pesquisa na Net, que em 1988 continuava como capelão militar, com o posto de major... Em 1967, frequentou o 1º Curso de Formação de Capelães Militares , integrado num grupo de mais de 50. O curso realizou-se na Academia Militar, de 23 de agosto a 17 de setembro de 1967. Nele participaram, por exemplo, dois membros da nossa Tabanca Grande: Horácio Neto Fernandes, e Mário de Oliveira (mais tarde conhecido como Padre Mário da Lixa)]

II – As Legendas das fotos:

F1 – Numa coluna na estrada de Nova Lamego-Piche, Novembro 67. Eu sou o do meio do grupo, e do lado esquerdo o Capelão Moita, e à direita o Alferes Mesquita responsável das Transmissões.

F2 – Na coluna para Piche, em cima do mesmo Unimog, agora noutra perspectiva. Nov./67. O operador da Bazooka tinha de ser eu, para a foto, ao lado o Capelão Moita e outro pessoal, que leva a tiracolo uma máquina fotográfica e pela capa parece a minha, uma Konica, talvez seja apenas a capa pois a máquina tirava-se fora, e a foto é da minha máquina.

F3 – Já no Quartel de Piche, sendo a figura principal o Capelão Moita de costas. Piche, Nov./67. Esta foto já conhecida a quando do paradeiro do Médico Lema Santos, que ali está de óculos, ao meu lado, e mais longe o Capitão comandante da CCAÇ1662, e lamento não saber agora o nome dele. Está também o alferes Mesquita ao lado de outro que não sei quem é, e o respectivo ‘empregado de mesa’ a servir a malta.

F4 / F4A – O Capelão Moita, fumando a sua cigarrada, no fim do jantar. São Domingos, 1968. Também não sei a data desta foto, mas parece um jantar na messe de oficiais, com algum motivo especial, pois o nosso Tenente Bigodes está com uma garrafa de champanhe na mão. Ao lado esquerdo do capelão Moita, de costas, parece-me o alferes Almodôvar, ainda lá estava pelos vistos. Ao lado de olhar esgueiro o alferes Mesquita. Lá atrás, temos da esquerda para a direita, o Capitão Martins, o alferes Carneiro, o alferes Teixeira, o Tenente Bigodes, depois em pé um soldado condutor que servia na messe, muito educado e de boas maneiras, e sentado na ponta o alferes Machado, mais conhecido por ‘Machadão’ dado o seu enorme corpo e peso, era o Minas e Armadilhas. Era do Porto, encontrei-o algumas vezes, mais tarde soube que já tinha falecido, devido talvez ao coração, pois ficou ainda mais pesado do que era.

Não vejo a mesa do Comando, e esta disposição não era a usual, por isso me leva a pensar que já é posterior à evacuação do nosso comandante, Tenente Coronel Armando Saraiva, ocorrida em Novembro de 1968, por isso ou é a noite de Natal, ou a noite de Fim de Ano, por causa da garrafa de champanhe. E pelas roupas e pelo aparato da mesa, deve ser um destes eventos.

F5 – Outra foto mas o mesmo tema, o Capelão Moita. Fim de jantar em São Domingos, 24dez1968. Aqui além dos restantes indicados acima, pode ver-se em primeiro plano o nosso Capitão Cardoso, novo comandante da CCS/BCAÇ1933, e a sua jovem esposa ainda em plena Lua-de-mel. Acho que esta cabeça em frente é do Major Graciano Henriques, o nosso Comandante não estava mesmo lá.

F7 – O nosso Capelão, à civil, lendo a Bíblia. São Domingos, 1969.

F8 - Cerimónia religiosa local, Natal 67, Nova Lamego Dez 67

Em, 2018-08-21

Virgílio Teixeira

«Propriedade, Autoria, Reserva e Direitos, de Virgílio Teixeira, Ex-alferes Miliciano do SAM – Chefe do Conselho Administrativo do BATCAÇ1933/RI15/Tomar, Guiné 67/69, Nova Lamego, Bissau e São Domingos, de 21SET67 a 04AGO69».

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Nota do editor:

(*) Último poste da série > 10 de setembro de 2018 >Á Pistas e aeronaves (ii): Nova Lamego, 1º trimestre de 1968

Guiné 61/74 - P19016: Os nossos seres, saberes e lazeres (284): Primeiro, Toulouse, a cidade do tijolo, depois Albi (3) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70) com data de 3 de Julho de 2018:

Queridos amigos,
Não vale a pena chorar sobre leite derramado, não se supunha Albi capaz de interessar para maior estadia, foi erro que custou andar a puxar pelo corpinho septuagenário até ao fim do dia, não se podia perder o essencial do que a cidade episcopal oferece, e mesmo depois da refeição copiosa do museu Toulouse-Lautrec havia que conhecer o casco histórico, e quantas surpresas aguardavam o viandante! Tirou-se o ensinamento que estas viagens devem ser precedidas de mais consulta, a visita a Albi merecia melhor tratamento.
Claro está, ficou a vontade de regressar, haja saúde e o regresso impor-se-á pelas lembranças deixadas. E que lembranças!

Um abraço do
Mário


Primeiro, Toulouse, a cidade do tijolo, depois Albi (3)

Beja Santos

Bem tinham avisado o viandante que era um stress tamanho meter o Rossio na Betesga, só passar umas horas em Albi, a cidade episcopal tem muitíssimo para ver, com destaque para a Catedral de Santa Cecília (nave, coro e tesouro), o Palácio e os Jardins de la Berbie e o museu de Toulouse-Lautrec, a Colegial e o Claustro de Saint-Salvi, a Ponte Velha, também no casco histórico o Grande Teatro des Cordeliers, coberto pela sua malha de cobre dourado, os parques, as ruas… mas o roteiro já estava desenhado, era pegar ou largar. E após almoço, fez-se a visita à Colegial de Saint-Salvi e ao seu claustro, um belíssimo património construído entre os séculos X e XIII.



O campanário da Colegial contrapõe-se à Catedral de Santa Cecília, por onde o viandante começou de manhã e ainda quer regressar, é um campanário que define a paisagem urbana do centro histórico de Albi e lhe confere uma tonalidade medieval. Saint-Salvi tem uma arquitetura compósita de românico em pedra e gótico em tijolo, é uma diferença de materiais bem visível no campanário que tem uma base românica e um último nível de tijolo vermelho. A torre era a mais alta da cidade antes da conclusão do campanário da Catedral.


Veja-se a graciosidade deste claustro, terão ocorrido modificações difíceis de entender, talvez demolições que deram a circunstância de termos edifícios de arquitetura civil a cercar a paisagem. O jardim está muito bem tratado, tudo aprazível, vê-se que Albi aceitou este grande desafio de pôr os seus melhores edifícios dentro das exigências do Património Mundial da Humanidade.


À cautela, o viandante regressa à Catedral de Santa Cecília, ainda está sob os efeitos daquela grandiosidade, os frescos do final do século XV, o esplendor multicolorido, as dimensões, com uma volumetria tão acertada, e aquela impressão tão forte provocada pelo tijolo. Quando entrou pela primeira vez lembrou-se e rezou pelos mártires da intolerância, agora sente o coração mais neutro, deambulou no exterior a tomar o pulso a esta catedral com fisionomia de uma fortaleza. Entrou para contemplar com mais atenção a estatuária, e pôr-se de frente ao Julgamento Final.

 Imagem de grande devoção de Santa Cecília, no interior da catedral, antes e depois do restauro.




As abóbadas são um trabalho delicado e o restauro que antecedeu a consagração de Albi como Património Mundial em 2010 deu aso a intervenções que ressuscitaram a formosura das nervuras, como aqui se podem ver.


Veja-se a delicadeza desta entrada, não só as nervuras do teto como a estatuária que circunda o rendilhado da janela. Perfeito mais perfeito não há!


Chegou a hora de partir para o Museu de Toulouse-Lautrec, o relógio não perdoa, quem não pode ficar impressionado com a espessura, o quase canelado destas paredes, as suas gárgulas? E o acaso permitiu que passasse por ali, como se vê na segunda imagem, um turista de mochila às costas, vem no momento certo, dá o sentido da proporção da escala da igreja-fortaleza. E nada mais por ora acrescentar, o viandante vai embrenhar-se seguidamente no palácio de la Berbie, o Arcebispo queria mesmo sentir-se bem defendido, vivia como num castelo, lá dentro está a mais impressionante coleção dessa figura fascinante que foi Henri de Toulouse-Lautrec, o aristocrata deformado que eternizou o interior de bordéis e a vida dos cabarés, para pavor da família.



(Continua)
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Nota do editor

Último poste da série de 8 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18996: Os nossos seres, saberes e lazeres (283): Primeiro, Toulouse, a cidade do tijolo, depois Albi (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P19015: Parabéns a você (1499): Manuel José Ribeiro Agostinho, ex-Soldado Radiotelegrafista - CCS/QG/CTIG (Guiné, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série de 11 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P19004: Parabéns a você (1498): Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Guiné, 1970/72) e José Parente Dacosta, ex-1.º Cabo Op Cripto da CCAÇ 1477 (Guiné, 1965/67)

sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19014: Notas de leitura (1100): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (51) (Mário Beja Santos)

O hastear das bandeiras na filial de Bissau, nas comemorações do centenário do BNU, 1964.


1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 14 de Fevereiro de 2018:

Queridos amigos,
O Gerente Virgolino Pimenta é frontal nas suas exposições, não esconde o seu asco pelo Governador Carvalho Viegas e traça-nos nestes documentos, com absoluta crueza a situação da praça, a vida miserável dos indígenas, as práticas de exploração nos preços da mancarra e as operações ilegais que eram prática corrente da Casa de Gouveia, que não sai nada bem na fotografia. Acumulavam-se as provas, entretanto a Casa Gouveia dirige-se ao Ministro das Colónias, este está perfeitamente elucidado do que se passa. Virgolino Pimenta responde igualmente pelo património, leia-se o primor da carta que envia para Lisboa a queixar-se do estado desgraçado da mobília.

Um abraço do
Mário


Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (51)

Beja Santos

Embora com a data de 4 de janeiro de 1938, o Gerente Virgolino Pimenta expede para Lisboa um relatório exercício de 1936 onde na rubrica “Casas Fortes, Móveis e Utensílios” tece observações curiosíssimas:
“As medidas a adoptar para evitar a deterioração da mobília são muitas e caras mas não servem para nada. O mal está em se gastarem milhares de contos em prédios e deixar-lhes dentro mobílias minadas de baga-baga que, fatalmente, irá passar para os madeiramentos novos. Poupam-se assim quinze a vinte contos mas perdem-se muito mais em futuro curto.
A mobília de Bissau tem muitos anos. Os móveis da sala estavam já há muitos anos minados pela baga-baga e agora estão a desfazer-se. Há cómodas, debaixo das quais se tira, todos os dias, um punhado de madeira roída. O móvel principal da sala, canapé com alçado, já tem pés que nem chegam ao chão. As cadeiras vão-se deitando fora, como os tremós dos quais há só um que tem que estar encostado à parede, todo tombado, para fazer vista, senão fica uma sala enorme sem nada dentro.
As medidas para defender a mobília da baga-baga, nem no início serviriam para nada, pois ela marcharia sempre. O mal é entrar.
Agora nem pensar em se gastar dinheiro para impedir o estrago. Ele está quase no fim e não se impediria.
Aqui não há quem faça mobílias capazes. Poderia fazer-se uma para um remedeio, pesada, desgraciosa, imprópria e caríssima. Facilmente nos pediriam oito a dez contos para se não obter coisa de jeito.

A capital da colónia está a mudar e o governador pensa vir depressa para aqui. Ficará o Gerente Geral do Banco em situação de não poder recebê-lo ou a qualquer outra pessoa de categoria sem se arriscar a que uma das melhores cadeiras se desfaça e dê com o visitante em terra. Esta é a verdade.
Em nossa opinião, e dada a facilidade com que a baga-baga invade tudo e dada ainda a agravante de haver mais móveis com baga-baga que passará para os novos, a solução mais prática, se bem que possa parecer cara de início, é a aquisição de uma mobília decente formada por maples e sofás de metal cromado, grandes para dizerem com a sala, acrescentada com umas pequenas mesas e étageres que se poderão aqui fazer, sem grande despesa.
Poderá esta mobília custar oito ou dez contos que custaria uma ruína feita aqui? Talvez não. No entanto, a sua muita duração tornava-a própria para aqui e, portanto, barata mesmo que tal custasse.
Como já dissemos a V. Ex.ª, e tomamos a liberdade de repetir, poderia a esposa do gerente signatário, logo que saísse do Hospital de S. José, escolher a mobília de metal adequada à sala em questão e assim se compraria o que fosse próprio, dentro da mais absoluta economia”.

A 2 de Março, o mesmo Virgolino Pimenta dá notícias sobre a situação da praça:
“A campanha da mancarra abriu há cerca de um mês, oficialmente. Antes dessa data, já se faziam transacções encobertas, na fronteira.
A Casa Gouveia mantém-se num jogo um pouco diferente dos anos anteriores. Principiou a oferecer preços baixíssimos que alarmaram o indígena.
O Sr. Governador, para contrabater esta atitude, deu ordem para que as administrações não forçarem o indígena na cobrança do imposto. Assim, não sendo forçado a pagar, não era forçado a vender. Os preços melhoraram um pouco mas não atingem 50% do preço do ano anterior. O máximo que se paga pela mancarra posta em Bissau é de Esc. $45 por quilo. No interior, por vários preços que oscilam entre $30 a $40 por quilo.
A Gouveia retraiu-se para responder à atitude do Governador e o restante comércio tem andado perfeitamente atarantado por não conhecer as directrizes da Gouveia.
O preço baixíssimo da mancarra força o indígena das regiões fronteiriças a vendê-la para a colónia francesa que a paga bem melhor.
Dizem que a colheita deste ano chega às 30.000 toneladas, o que nos parece exagerado. Mas dando de barato que seja assim e deduzindo, por alto, umas 5000 toneladas que se escoam para terra francesa, restam 25.000 toneladas que, à cotação média de $40 dão 10.000 contos ao indígena. Ora, este tem que pagar uns 9000 contos de imposto. Restam-lhe 1000, o que não é nada para dar escoante às mercadorias em poder dos comerciantes, e que valem uns bons milhares de contos.

A Gouveia continua sem dinheiro e corre na praça que V. Exas. se negaram a dar dinheiro nas condições do ano anterior.
O gerente da Casa diz que não tem dinheiro e a alguns que lhe oferecem mancarra já diz que vão ao Banco oferecê-la em caução de empréstimos.
Não sabemos o que há, mas sabemos que a Gouveia tem batido a todas as portas que sabe terem dinheiro para o apanhar aqui, por transferências que faz. Assim, arranjou uns 500 contos nestas condições.
Enfim, faz tudo que pode para não nos pedir dinheiro, leva-nos o dinheiro que pode, dos depositantes e é natural que seja de lá que sai a atoarda de que não há dinheiro na praça, por culpa do Banco.
Ontem, tivemos uma informação de que pagava mancarra com francos do Senegal. Por todas estas razões, V. Ex.ª. verá a incerteza com que se está trabalhando, incerteza essa que nós estamos aproveitando ao máximo sempre que ficam absolutamente garantidos os interesses do Banco”.

Imagem retirada do livro “Uma Apoteose- duas visitas - uma despedida”, obra relacionada com a partida do governador Raimundo Serrão, 1953.

A 16 de março, nova correspondência para Lisboa, a Casa Gouveia continua na berlinda, o assunto é taxativo: “Transferências – António da Silva Gouveia, Ltdª.”, é este o teor da carta:
“Como V. Ex.ª., também pensámos que o assunto do formidável movimento de transferências que a Casa Gouveia faz, por vezes a taxas elevadíssimas, devia merecer a atenção muito e muito especial do Governo da Colónia, já porque é uma função ilegal e que faz da Casa Gouveia uma instituição bancária com uns lucros fabulosos, sem pagar as respectivas taxas ao Governo; já porque existe o Banco cujos interesses são prejudicados; já porque os comerciantes, sabendo de antemão que vão pagar taxas formidáveis à Gouveia, oneram os preços de venda de uma maneira tal que tornam a vida caríssima e insuportável a quem aqui vive.
E o Governo da Colónia sabe bem disto tudo mas não faz nada e, absorvendo para si no ano passado uns 40% das coberturas da colónia, contribui assim para avolumar o negócio das transferências ilícitas da Gouveia, que se aproveitou da situação para elevar taxas entre 10 e 12% que, com alcavalas de selos e outras, oneram bem os tomadores em 15% senão mais.
É o consumidor quem paga isto.
Assim, a Casa Gouveia fornece de dinheiro e ainda lhe pagam quantias fabulosas por isso. E, deste modo, também não pede crédito ao Banco nem lhe dá um real a ganhar e ainda por cima a gerência não perde a menor oportunidade de – embora grosseiramente – atacar o Banco e tudo que ao Banco esteja ligado.
Ainda no dia 11 do corrente o Sr. Governador recebeu a bordo do Guiné o gerente da Casa Gouveia para ouvir as suas costumadas e pouco inteligentes considerações sobre ‘O crime do Banco ter todas as culpas do que se está passando na Guiné, só por o Banco não querer dar dinheiro à Casa Gouveia’

Muito confidencialmente, constou-nos que o Sr. Governador falou em telegrafar a Sua Ex.ª. o Ministro, pedindo não sabemos que providências.
Em conversa com o Sr. Governador, fizemos-lhe perceber a sem razão da Casa Gouveia, fazendo-lhe compreender que o Banco não é uma casa de caridade para fornecer dinheiro de graça, de mais sabendo ele a guerra que Gouveia faz ao Banco. E qualquer intervenção junto do Sr. Ministro para se considerar o Banco criminoso por onerar as transferências da Gouveia, da Sede para aqui – como eles afirmam –, a intervenção de Sua Ex.ª. devia inclinar-se para o facto da Gouveia – ilegalmente – cobrar os tais 10 e 12% mas em dinheiro que lhe davam e em 90 dias, quando não em 30.
Sua Ex.ª. limitou-se a sorrir mas não telegrafou, ao que supomos.

A Casa Gouveia tem a Guiné por tabanca sua e tem razão para isso, porque ninguém – absolutamente ninguém – a impede de fazer o que quer, em matéria de transferências, que outra não nos interessa.
Dizem que não se pode provar que fazem transferências porque, nas respectivas cartas de ordem, dizem que se trata de ‘Valor de produtos coloniais comprados’. Mas numa averiguação era fácil ver-se e provar-se que a maior parte das pessoas não tinha géneros a vender. E pelo volume da exportação da Casa se chegaria à conclusão de que, afinal, não se sabia do destino de uma boa parte desses géneros.
Para nós, tudo o que se passa é apenas devido à cobardia moral que há em não se fazer respeitar a lei a quem anda fora dela.
Os rigores são todos para o Banco que não demarca as propriedades; que tem que fazer um muro onde gastará bons contos num terreno que não vale quase nada, etc., etc. O resto não tem importância!
Como V. Ex.ª. bem diz, o desrespeito pela lei não é admissível. Mas aqui é.”

Mulher Balanta, imagem constante do livro “No Governo da Guiné”, volume III, por Luís Carvalho Viegas, 1936.

Esta situação litigiosa irá prolongar-se, as queixas sobre a Casa Gouveia chegam de outras proveniências, caso da Sociedade Comercial Ultramarina, Bissau envia para Lisboa informações prestadas por um seu responsável, Monteiro Lopes, em 24 de março desse ano:
“Ignoramos quantas toneladas exportou a Casa Gouveia (Alfredo da Silva) em 1937, mas sabemos que uma parte muito apreciável não foi por ela directamente adquirida ao indígena, mas sim a casas concorrentes exportadoras, às quais, em 1937, conveio vender as suas mancarras à Casa Gouveia em vez de exportarem como nos anos anteriores. Isto não significa, porém, que as coisas venham a passar-se sempre assim de futuro, tanto que na campanha decorrente já a situação é diferente.
Diz-se que a Casa Gouveia se desinteressou a princípio do negócio. Diz-se mais que luta com falta de numerário, chegando a fazer ofertas para compra da mancarra com pagamento em Lisboa, no que não teria sido bem-sucedida. Equivale isto a dizer que a Gouveia faria assim transferências sob a Metrópole, em manifesta concorrência com o BNU, o que lhe é vedado.

O perigo das compras pelas casas francesas a ‘preços irrisórios’ não existe porque a mancarra, nesta altura, está virtualmente vendida a preços aliás bem superiores aos da paridade da Europa. Estes preços desconexos são devidos, ao que se diz também, à concorrência das casas francesas e da própria Gouveia.
Independentemente desta concorrência, que todos os anos existe, o Governo da Colónia é quem regula os preços da campanha, não consentindo que se paguem preços muito baixos.
Os intuitos da Gouveia ao apresentar a sua reclamação, devem, como de costume, ser inteiramente diferentes dos alegados, devendo figurar entre elas a sua velha ambição de ficar sozinha na colónia para, mais à vontade, desenvolver os seus planos que não podem deixar de envolver ataques aos interesses do BNU pelas transferências que obteria”.

É um interminável folhetim, a Casa Gouveia vai protestar junto do Ministro das Colónias, o gerente de Bissau está atento e contrapõe. Como iremos ver adiante.

(Continua)
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Notas do editor

Poste anterior de 7 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18992: Notas de leitura (1098): Os Cronistas Desconhecidos do Canal do Geba: O BNU da Guiné (50) (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 10 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P19002: Notas de leitura (1099): Relendo uma obra soberba - "Vindimas no Capim", por José Brás; Publicações Europa-América (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 61/74 - P19013: Facebook...ando (48): os poemas amargos do 'alfero' Cabral


O Jorge Cabral, professor de direito penal... "A querida Alma Paula Torgal, mandou-me esta foto, com a legenda 'Almoço no Mitelo' [, sede do Instituto Superior de Serviço Social de Lisboa]. Muito Obrigado"...

Foto (e legenda) da página do Facebook do Jorge Almeida Cabral [, reproduzida aqui, com a devida vénia...]


1. Tem andado muito calado, o "alfero" Cabral... Pelo menos, na Tabanca Grande... Fomos espreitar a sua página do Facebook...onde tem 4530 amigos (230 em comum)...  (Há muita solidão no Facebook, mesmo quando temos multidões de amigos virtuais, tão solitários como nós... Há o risco de morrermos de solidão na "world wide web"... É um palco demasiado grande para um homem só. Ou uma mulher só. )

Tomei boa nota do seu lamento, do passado dia 11:

 "Às vezes arrependo-me de ter passado tantos anos no Ensino. Mal pago, com aulas de manhã, à tarde e à noite... Mas com tantas manifestações de Amizade, Carinho e Gratidão, logo me arrependo de me ter arrependido. Sim, valeu a pena!"... 

E logo a seguir, deparo com alguns curtos poemas que ele tem vindo a publicar, e que terão sido escritos na Guiné, em 1969, 1970 e 1971, entre Fá Fandinga, Missirá e Bambadinca...  Entre eles "O Aniversário" (... que "é de quando fiz 25 anos")...
Apeteceu-me, de imediato, reproduzi-los aqui,  mesmo correndo o risco de ele ficar zangado comigo ( "é um problema meu, mas nunca me zanguei com o 'alfero' Cabral"). 

Modji Daaba

Modji Daaba, Modji Daaba no meu lençol.
Fecha o seu corpo
Como Flor,
Que teme o Sol.
Com pena e dó,
Não dá. Empresta.
E, desta noite,
Nada me resta.
Estou só.

9/9/2018


Sala de Operações

Néscio, burro, o Major aponta
Na Carta, a linha de água
(Que é um largo rio).  
Faço de conta
E, gozando, mascaro a minha mágoa.
Claro que sim, meu Major,
Golpe de pé, golpe de mão,
De Badora ao Cuor,
E penso (que cabrão!...)
O Major planeia a promoção.
Eu nada planeio. Adio a Vida
Até poder dizer que não,
Quando não for, a Esperança proibida.

8/9/2018



Aniversário

Vinte e cinco ou mil, conto pelos dedos,
Os anos que vivi, eu não sonhei
Este tempo de angústia e de medos
Que soletro e nunca sei
Que Guerra é esta , onde não estou. 

Que rio aquele? Não cheira a Tejo.
Que combate? Combato, mas não sou
E quando olho o espelho, não me vejo,
Aqui em Missirá, escravo e senhor,
Invento-me. E guarda-prisioneiro.
Bebo, fingindo em Alegria, a Dor.
Hoje faço anos... e continuo inteiro.

7/9/2018


Mina

Uma Mina em Sancorlá.
Segundos? Um minuto?
O Tempo desta Morte,
Meio corpo evaporado,
Só resiste o olhar.
Quem a terá pisado?
Fui eu que tive sorte
Ou ele que teve azar?
Depois chorar
E para sempre o Luto.


7/9/2018


Histórias de Amor e Desamor

Há amores que duram vidas, outros meses, outros anos...
Este durou 3 minutos..
Foi em Maio, no Rossio,
eu vi levitar uma rapariga de cabelo azul
e fiquei apaixonado.
Nunca mais a vi, mas fui à Esquadra,
participar o seu desaparecimento.
Durante anos frequentei a Esquadra,
à espera de notícias e nada..
Tornei-me amigo dos Polícias, principalmente do Panças...
Um dia disseram-me que o Panças estava no Hospital muito mal.
Fui visitá-lo, estava a morrer, já não falava.
Mas escreveu num papel:
"Eu também vi a rapariga de cabelo azul a levitar no Rossio"...

7/9/2018

[Seleção, revisão, fixação de texto: LG]
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Nota do editor:

Guiné 61/74 - P19012: Convívios (874): João e Vilma Crisóstomo convidam-nos para a sua festa de família, domingo, dia 16, às 15h00, em Paradas, A-dos-Cunhados, Torres Vedras... Porque a amizade não tem pátria nem exige passaporte!







Vilma e João Crisóstomo, ela, eslovena, enfermeira, reformada, ele nosso camarada da diáspora, ex-alf mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67), luso-americano, mordomo reformado,  ativista de causas sociais e humanitárias.

O casal vive em Queens, Nova Iorque. O João nasceu em 22 de junho de 1944, em Paradas, Torres Vedras. Depois da Guiné, emigrou para  o Brasil e, em 1975, para os EUA. Tem um curso superior em gestão hoteleira, Em Nova Iorque fez parte d: a elite portuguesa dos mordomos que serviam a elite nova-iorquina. Principais causas humanitárias e sociais pelas quais ele se tem batido: defesa das gravuras de Foz Côa, autodeterminação de Timor Leste, e reabilitação da memória de Aristides Sousa Mendes...


João Crisóstomo (com a a esposa Vilma Kracun, 4º e 5º lugares,  respetivamente, a contar da esquerda, de pé), com a nova família eslovena...

Foto de cronologia do Facebook do João Crisóstomo. Foto de Vlasta Knapic, amiga do casal, sobre o qual escreveu (em esloveno): "Prelepa ljubezenska zgodba, ki je obšla svet, se srečno nadaljuje. Vilma Kracun in Joao Crisostomo iskrene čestitke"... Em português quer dizer mais menos isto: "Uma linda história de amor que deu a volta ao mundo, e  que continua, felizmente. Vilma Kracun e João Crisóstomo, os meus  sinceros parabéns"...


1. Recordo um dos convívios destas famílias Crispim e Crisóstomo, no mesmo local, em 15 de outubro de 2013... 

Além da família e amigos do João e a Vilma, "just married", recém-casados, estiveram presentes diversos camaradas nossos, gente da Tabanca de Porto Dinheiro (representada pelo régulo Eduardo Jorge Ferreira e  sua esposa, São, pelo Jaime Bonifácio Marques da Slva e a Dina, pelo Joaquim Pinto Carvalho e a Maria do Céu, e ainda pelo Luís Graça e a Alice Carneiro).

Esteve também presente um camarada de armas do João Crisóstomo, que veio do Norte (, Recarei. Paredes, distrito do Porto), com a esposa, expressamente para lhe dar um abraço de parabéns e conhecer a noiva... Há quase 50 anos que não se viam... Estamos a falar do Júlio Martins Pereira, soldado de transmissões da CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67),  e nosso grã-tabanqueiro desde então. (Infelizmente, não passa bem de saúde, segundo informação do João Crisóstomo.)

Desta vez, em 2018, vão falhar o casal Pinto Carvalho, os "duques do Cadaval", O nosso Joaquim está hospitalizado, em Lisboa, mas felizmente em franca recuperação. A família e os amigos não ganharam, todavia,  para o susto. Daqui vai um grande alfabravo para ele e ela, os "duques do Cadaval", que este ano falharam alguns momentos importantes da vida social da Tabanca de Porto Dinheiro, como as festas da Atalaia e do Seixal... da Lourinhã.

2. Na ocasião, e em nome dos "amigos do Oeste", o nosso editor disse uns versinhos ao casal Crisóstomo, de que se recordam aqui algumas quadras (, bem ao gosto popular):

(,,,) 

É o João um senhor,
Que faz o culto da amizade,
E amanhã comendador
Da Ordem da Liberdade.

Mordomo de profissão,
Portugal nunca esquece,
No verde e rubro coração
Onde a Pátria não esmorece.

Fez a guerra, coisa má,
Lá nas terras da Guiné,
Finete e Missirá,
Porto Gole e Enxalé,

Animador libertário,
Foi de causas defensor,
Do Cônsul Humanitário [, Aristides Sousa Mendes, ]
A Foz Côa e a Timor.

P’ra um casal, lindo como este,
P’rá Vilma e p’ró João,
Dos amigos do Oeste
Vai um grande… xicoração! (...)

Estes convívios das famílias Crispim e Crisóstomo, alargadas aos "amigos e camaradas da Guiné", são organizados pelo João, desde há mais de duas décadas... As últimas foram em 2009,  2013, e  2015.  Cinco anos depois, iremos de novo participar, com o gosto,  neste saudável convívio. Lá estaremos no próximo domingo, na Associação para o Desenvolvimento de Paradas. E esperamos lá encontrar mais algumas caras novas da Tabanca Grande, e os demais amigos  e familiares do João e da Vilma.

Relembra-se aqui que, para os "amigos camaradas da Guiné" (e de Timor), não é preciso... nem convite nem "farda nº 1"...  O João e a Vilma ficarão muito felizes com a vossa/nossa presença!

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Nota do editor:

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Guiné 61/74 - P19011: Álbum fotográfico de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72) - Parte IV




1. Parte IV, e última, da publicação do álbum fotográfico do nosso camarada Adolfo Cruz (ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796, Gadamael e Quinhamel, 1970-1972) com as fotos enviadas em mensagem do dia 21 de Julho de 2018, que retratam alguns dos momentos mais significativos da sua passagem por terras da Guiné.





Foto 25

Foto 26

Foto 27

Foto 28

Foto 29

Foto 30

Foto 31

Foto 32

Foto 33

Foto 34

Fotos 25 a 34 - População local, especialmente balantas


Em Setembro de 1972 deixámos os destacamentos, rumo a Bissau – COMBIS, para aguardarmos o prometido voo da TAP, rumo a Lisboa, o que aconteceu, apenas, em 5 de Outubro de 1972.
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Nota do editor

Vd. postes de:

30 DE AGOSTO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18964: Álbum fotográfico de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72) - Parte I

6 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P18991: Álbum fotográfico de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72) - Parte II
e
11 DE SETEMBRO DE 2018 > Guiné 61/74 - P19005: Álbum fotográfico de Adolfo Cruz, ex-Fur Mil Inf da CCAÇ 2796 (Gadamael e Quinhamel, 1970/72) - Parte III