terça-feira, 8 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2734: Guileje, colónia penal (1): Em 1897 havia um posto militar fronteiriço, português, em Sare Morsô (Nuno Rubim)

Mapa do Sul da Guiné no Final do Séc XIX, segundo Pélissier ( vd. René Pélissier - História da Guiné: Portugueses e Africanos na Senegâmbia, 1841-1936. 2ª ed. Lisboa: Editorial Estampa. 2001. 2 volumes).

Foto: Nuno Rubim (2008).


1. Texto do Nuno Rubim, Cor Art Ref, especialista em história militar, nosso prezado amigo e camarada:

Caro Luís

Aqui há tempos foi publicado no blogue um pequeno texto meu sobre a questão de Guileje ter sido considerado, de facto, uma espécie de "colónia penal" (1). Hoje trago à liça mais uns elementos que consubstanciam essa tese.

Porque vem de longe ... Pélissier, no 2º volume da sua obra sobre as guerras na Guiné, escreve, na página 191 (2):

"Em 1916, um dos tenentes de Abdul Injai, Alfa Modi Saidou, foi convidado a instalar-se em Guileje com 300 a 400 indígenas franceses provenientes dos bandos de Abdul Injai. As mulheres seriam exclusivamente prisioneiras feitas durante a campanha de 1915." (os sublinhados são meus).

Ora isto sucede numa altura em que já tinham terminado as negociações entre Portugal e França que tinham [definido] as fronteiras na região (1906). (Vd. Mapa, acima).

Cabe aqui abrir um parêntese. Toda a região a Leste de uma diagonal traçada no eixo do rio Cacine, para NE até perto do Rio Balana, pertencia à Guinée, colónia francesa [, hoje Guiné-Conacri]. Por isso aparecem no mapa supra as designações de Poste Français [, posto francês,] em Caconda e Cacine. Aquando da delimitação de fronteiras, essa região passou para o domínio português, por troca com a zona do Casamansa no Senegal.

Pormenor do mapa (ou carta) de Guileje (escala 1:50000): no quadro das Convenções, pode ler-se que há um símbolo que representa as aldeias abandonadas, como é o caso de Sare Morsô... Só um estudioso como o Nuno Rubim é capaz de ter olho clínico para estes detalhes que escapam à vista desarmada do leigo... (LG).

Mas a anterior linha fronteiriça era praticamente inexistente, não se sabendo realmente as áreas que pertenciam a cada país. Ora constatei, com surpresa, que, segundo Pélissier / vol. II, pp 60- 69, os portugueses instalaram em Sare Morsô, em 1897, um posto militar, a que deram o nome de Posto de D. Maria Pia (como era uso na altura, em quase todas as colónias portuguesas, nomes de rainhas ou princesas ) e que só foi desguarnecido cerca de 1901.

Surge essa designação, como tabanca abandonada, na carta 1:50000 da Guiné. Quando agora passei pelo chamado cruzamento do corredor [da morte ou de Guileje] ainda tive esperanças de lá poder dar uma saltada (cerca de 2,5 km do cruzamento ), mas infelizmente não tive tempo.


Segundo algumas informações o PAIGC teria ali instalado uma base durante a guerra.

(A continuar )

Um abraço

Nuno Rubim

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Notas de L.G.:

(1) Vd. poste de 10 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1830: Guileje, uma espécie de colónia penal militar até finais de 1969... (Nuno Rubim)

(...) "Durante anos, após a minha permanência lá, ouvi referências sobre o facto de serem enviados para Guileje militares punidos ou indesejados de outras unidades do CTIG [Comando Territorial Independente da Guiné].

Apesar de ter tido uma experiência pessoal que parece ter confirmado este facto, só agora descobri, no AHM [Arquivo Histórico Militar], um documento oficial que esclarece totalmente a questão !

Mensagem Com-Chefe, Guiné, Dezembro 1969.

Retransmitido pelo Batalhão de Artilharia 2865, reponsável pelo Sector S3 (nessa altura em Catió), que englobava o sub-sector de Guileje. (AHM )

Por determinação superior “…

Considerada a situação de Guileje, cancelamento de mais transferências por motivos disciplinares para aquela guarnição” !!! (...)

(2) Vd. poste de 7 de Julho de 2006 > Guiné 63/74 - P944: Historiografia das guerras de África: colaboradores, precisam-se (Nuno Rubim)

Sobre o historiador René Pélissier, ver ainda os seguintes postes:

27 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2586: A História de Portugal em África vista pelo Prof. René Pélissier (I). (Virgínio Briote)

14 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2266: Quem conhece o Inácio Maria Góis, autor de O meu diário, CCAÇ 674 (Fajonquito, 1964/66) ? (René Pélissier)

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2733: O Nosso Livro de Visitas (11): José Quintas, ex-1.º Cabo da 38.ª CCmds (Guiné 1972/74)

Guiné > Zona Leste > COP7 > Margem esquerda do RCorubal > Gampará > 1972 > Monumento da CART 3417 (Magalas de Gampará), "assinalando a passagem da minha Companhia" por Gampará (AM). Vê-se que por ali também passaram, ao servlço do COP (Bafatá), vários DFE - Destacamentos de Fuzileiros Especiais (4, 8, 13, 21, 22), a CCP 121/BCP 12, a 2ª CCA - Companhia de Comandos Africanos, o Pel Art 29 e o Pel Mil 331.

Foto e legenda: © Amilcar Mendes (2007). Direitos reservados.


1. Em 4 de Abril passado, recebemos uma mensagem do nosso camarada José Quintas

Camarada Luis Graça,
Apresenta-se o 1.º Cabo Comando, da 38.ª Companhia de Comandos José Quintas.

Gostaria que me informasses se possível, como fazer parte desta magnífica tertúlia de ex-Combatentes e como posso participar na mesma, pois acho formidável a maneira como são abordados estes temas da guerra em que participámos e, não há duvida que é preciso fazer trabalhos como estes para a posteridade.

Fico desde já a aguardar, enviando um caloroso abraço a todos os ex-Combatentes.
José Quintas

2. Em 7 de Abril foi dada resposta a este nosso camarada

Caro José Quintas

Estou a receber-te em nome do Comandante Luís Graça.

Para fazeres parte da nossa Tabanca Grande, começarás por enviar uma foto tua do tempo da guerra e outra actual, tipo passe de preferência.

Na nossa página, do lado direito, poderás verificar quais são as 10 condições essenciais a cumprir no nosso Blogue, onde o respeito pela opinião dos outros é fundamental. Neste assunto da Guerra Colonial há diversos pontos de vista e alguns recalcamentos remanescentes em relação ao nosso inimigo de então, têm de ser abolidos definitivamente. A Guiné-Bissau de hoje é um país irmão que necessita da nossa ajuda.

Entre nós não existem apenas ex-combatentes, mas também guineenses, e portugueses que têm alguma ligação com aquele país.

Entre nós usamos o tratamento por tu, como já reparaste.

Podes contar-nos as tuas estórias e enviar fotos para as ilustrar.

Deves saber que já temos entre nós um teu camarada, o Amílcar Mendes que certamente conhecerás.

Ficamos à espera de notícias tuas para te apresentarmos formalmente aos restantes camaradas e amigos da Guiné-Bissau.

Para ti um fraterno abraço de,
Carlos Vinhal

Guiné 63/74 - P2732: Em busca de... (23): Camaradas da CCS/BCAÇ 600 (Guiné 1965/68) (Fernando Dourado)

1. Em 4 de Abril de 2008, recebemos uma mensagem de Fernando Dourado, ex-Alf Mil da CCS/BCAÇ 600.

Fui Alferes miliciano no Batalhão de Caçadores 600 que esteve na Guiné nos anos de 1965(Out) a 1968(Out).

Estivemos primeiramente em Bissau num quartel junto ao QG e depois finalizámos em Buba.

Nunca consegui estabelecer contacto com ninguém da CCS do Batalhão. Lembro-me bem do Capitão de Operações Teodósio, do Ten Cor Fernandes e do Tesoureiro Alf Biscaia Pereira (Advogado).

Não sei quais são as possibilidades, mas ao saber da existência do v/blogue pensei que poderia ser uma maneira de encontrar alguém.

Moro em Faro e neste momento sou secretário da Junta de Freguesia da Sé Faro.

O meu e-mail pessoal é ferdalmeidagmail.com

Com o meu obrigado

2. Em 7 de Abril era mandada uma mensagem à Tertúlia nos seguintes modos:

Caros Camaradas e amigos Tertulianos

Chegou-nos esta mensagem com um apelo do nosso camarada Fernando Dourado que quer encontrar camaradas da CCS do célebre 600 (BCAÇ 600).

Como na Página do camarada Jorge Santos não encontrei nenhum pedido de contacto, recorro à tertúlia e aos menos novos neste caso, na esperança de que o possamos ajudar.

O nosso muito obrigado a quem puder colaborar.
Um abraço para todos
Carlos Vinhal

3. Entretanto um dos nossos investigadores de serviço, neste caso, o camarada Santos Oliveira já encetou diligências no sentido de ajudar o Fernando Dourado.
Um dia destes daremos notícia dos resultados obtidos.

Guiné 63/74 - P2731: Cantanhez, Acampamento Osvaldo Vieira: Coordenadas GPS (Nuno Rubim)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Sector de Bedanda > Cantanhez > Antigo Acampamento Osvaldo Vieira> Posição vista de satélite (Fonte: Google).

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Cantanhez > Acampamento Osvaldo Vieira > 2 de Março de 2008 > Antigos guerrilheiros do PAIGC.
Fotos: Nuno Rubim (2008).

1. Mensagem do Nuno Rubim:
Amigo Luís

Conforme o prometido: Vista de satélite do antigo acampamento de Osvaldo Máximo Vieira, Catanhez (1).

As coordenadas GPS que eu tirei no centro da clareira (quadrado amarelo), onde decorreu a cerimónia, correspondem a: 11º 12' 46" N - 15º 03' 10" W

No mapa estão marcados a amarelo os itinerários a partir da estrada e o caminho que conduzia ao tarrafe. A laranja [estão os] itinerários alternativos (estimados) a partir das indicações que me forneceu um dos antigos combatentes do PAIGC.

Realmente referenciei duas saídas, uma para Norte, outra para Sul mas, mais uma vez, por falta de tempo, não tive oportunidade de tentar seguir as pistas.

Notar-se-á que a altura estimada da vista aérea é de 438 m, sensivelmente a que era utilizada pelos aviões portugueses nas missões de reconhecimento (500 m), mas isto antes do aparecimento dos Strella ...

Um abraço

Nuno Rubim

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Nota de L.G.:

(1) Vd. postes de:


Guiné 63/74 - P2730: PAIGC - Instrução, táctica e logística (10): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (X Parte): Organização defensiva (A. Marques Lopes)

Continuação do Supintrep, nº 32, de Junho de 1971, documento classificado, de que nos foi enviada uma cópia, em 18 de Setembro de 2007 pelo nosso camarada A. Marques Lopes, Cor DFA, na situação de reforma (1.

PAIGC - Instrução, táctica e logística (10): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (Parte X) >

(I) ELEMENTOS SOBRE ORGANIZAÇÃO DEFENSIVA


(1) Tipos de abrigos utilizados pelo IN

Nas zonas em que a nossa aviação efectua bombardeamentos, o IN e a população sob o seu controle constroem abrigos a fim de se protegerem dos efeitos das bombas.

Os abrigos são do tipo variável havendo que destacar os construídos com terra e cibes bem como os que, segundo notícias, são construídos em cimento. Seguidamente são apresentados alguns tipos de abrigos utilizados:

(a) Tipo de casa encontrada na op CLEOPATRA, no acampamento de CANTUNCO


Legenda: Nível do terreno, Mosquiteiro, Cama...



(b) Abrigo encontrado no acampamento de CAFINE (1510.11.10 I2.53)

Legenda: Terra Batida, Túnel Inclinado, Paus, Corpos de (?)


(c) Barraca-abrigo detectada em CABOIANA


- Foi detectada na CABOIANA a construção de barracas-abrigos com as seguintes características: sobre uma cova de cerca de 2 metros de diâmetro e 70 cm de profundidade erguia-se um tecto cónico de folhagem e apoiado em 4 estacas implantadas na periferia da cova, deixando apenas uma fresta circular ao nível do terreno.

Admite-se a possibilidade destes abrigos poderem ser utilizados com a seguinte finalidade:

- habitação;
- abrigo contra bombardeamento e artilharia;
- abrigo defensivo para atirador em caso de ataque ao acampamento por força de assalto.

Nota: poderá também transformar-se em espaldão para morteiro


(d) Abrigo utilizado na Ilha de COMO (declaração de um capturado)



Legenda: Terra, Cibes, 170 cm...


Declarações do capturado SOINA MANCHALÉ referem que na Ilha de COMO, dentro do mato, o IN tem abrigos, o mesmo sucedendo nas tabancas da população bem como naquelas que ficam na orla da mata e perto das bolanhas. Os abrigos são cavados até uma profundidade de mais ou menos 1,70 m e cobertos com cibes de palmeira, levando por cima uma camada grande de terra.

O aspecto dos abrigos, junto à orla da mata, é a indicada no esquema seguinte:






(2) Posição defensiva de um grupo de infantaria




COMENTÁRIO: O esquema aoresentado representa um grupo de infantaria ocupando uma posição numa extensão de 500 metros.

Vêem-se três trincheiras de combate na periferia da posição, com itinerários para a rectaguarda, os quais convergem no ponto em que se encontra o comando. Este local é defendido por trincheiras de combate. Entre as trincheiras que guarnecem a frente da posição para o CAN/SR e para a metralhadora pesada. Para a rectaguarda da posição vêem-se duas trincheiras provavelmente para instalação de uma segurança à rectaguarda e ainda dois pontos de observação. A frente da posição está minada, como o referem as indicações do croquis.

(3) Organização defensiva duma base IN





COMENTÁRIO: O esquema representa uma organização defensiva periférica de uma base IN.

Verifica-se a existência de postos de observação e posições fora da periferia da base, assinalando-se também a existência de duas patrulhas de reconhecimento.

No centro da base está instalado o comando junto do posto de rádio, estando também assinaladas posições para as armas pesadas.


(3) Outras características defensivas, segundo declarações de BIEM SAMBÉ:

Croquis da base de INJASSANE (1500 1140 B3-93)




Legenda: Escola, Enfermaria, Casa de Mário Sousa Delgado, Casa, (...), Canhão s/r,

Croquis da Base de GÃ FORMOSO (1515 1150 A4-23)



Legenda: Abrigo colectivo à prova, Abrigo colectivo a céu aberto, Caminho, Casa do Comandante da Base, Sentinela, Palhota, Canhão s/r, Enfermaria, (...)
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Nota de L.G.:

(1) Vd. postde 13 de Fevereiro de 2008 Guiné 63/74 - P2535: PAIGC - Instrução, táctica e logística (9): Supintrep nº 32, Junho de 1971 (IX Parte): Defesa anti-aérea (A. Marques Lopes)

Guiné 63/74 - P2729: Estórias de Guileje (10): os trânsfugas de Guileje, humilhados e ofendidos (Victor Tavares, CCP 121/BCP 12, 1972/74)

1. Extracto de um poste do Victor Tavares, natural de Águeda, onde é presidente de junta da freguesia de Recardães, sua terra natal. Foi 1º cabo pára-quedista, da CCP 121 /BCP 12 (Guiné, 1972/74).

Justifica-se a reprodução deste excerto: o Victor dá-nos aqui o retrato do abandono e da humilhação, a que foram sujeitos, em Cacine, os militares que, sob as ordens do Comandante do COP 5, major Coutinho e Lima, abandondaram Guileje, em 22 de Maio de 1973, chegando a Gadamael, também fortemente atacada pelo PAIGC, a seguir a Guileje, e salva pelos pára-quedistas e a Marinha -, refugiando-se depois em Cacine. (LG)


Estórias de Guilele (10): Gadamel Porto, o outro inferno a sul

por Victor Tavares

Depois de regressada do inferno de Guidaje (2), a Companhia de Caçadores Pára-quedista (CCP) 121 encontrava-se estacionada em Bissalanca [, na Base Aérea nº 12], gozando um curto período de descanso, após a desgastante acção que tivera no norte da província.

Daí o Comando Chefe entender que os 4 a 5 dias de descanso concedidos já eram demais e ser necessário o reforço das nossas tropas aquarteladas em Gadamael por se encontrarem em grandes dificuldades. Acaba, por isso, por dar ordens para rumarmos a Gadamael, para onde partimos a 12 de Junho de 1973.

Partindo de Bissau em LDG [Lancha de Desembarque Grande] com destino a Cacine, onde chegámos a meio da tarde deste mesmo dia. Como a lancha que nos transportava, não conseguia atracar ao cais por falta de fundo, fomos fazendo o transbordo por várias vezes em LDM [Lanchas de Desembarque Médias] para aquela localidade.

Foi então, logo na primeira abordagem da lancha, que me apercebi que na mesma estava um indivíduo que pela cara me pareceu familiar. No entanto, como o mesmo se encontrava vestido à civil calções, camisa aos quadradinhos toda colorida e sandálias de plástico transparente - pensei ser porventura algum civil que andaria por ali no meio da tropa, o que seria natural e podia eu estar errado.

Depois de toda a tropa estar desembarcada, indicaram-nos o local onde iríamos ficar, num terreno frente ao quartel de Cacine. Instalámo-nos e de seguida fomos dar uma volta pelas redondezas, até que no regresso deparo com a mesma criatura, sentada no cais com ar triste e pensativo, típico da pessoa a quem a vida não corre bem. Eu vinha acompanhado do paraquedista Vela, meu conterrâneo – e hoje meu compadre. Perguntei-lhe:
- Ouve lá, aquele tipo ali não é nosso conterrâneo?
Responde ele:
- Sei lá, pá, isto é só homens.


"Gadamael ?!...Vocês vão lá morrer todos!"

Por ali estivemos na conversa mais algum tempo, até que tomei a iniciativa de me dirigir ao fulano uma vez que ele continuava no mesmo sítio. Acercando-me dele, perguntei-lhe:
-Diz-me lá, camarada, por acaso tu não és de Águeda ?
Responde-me ele:
- Sou.
E pergunta-me de seguida:
- E você, não é de Recardães?

Digo-lhe que sim, cumprimentamo-nos e vai daí perguntei-lhe o que é que ele estava ali a fazer, porque de militar não tinha nada. Respondeu-me que não sabia o que estava ali a fazer, de uma forma triste e ao mesmo tempo em tom desesperado e desanimado.

Entretanto com o desenrolar da conversa, ele perguntou o que estávamos ali a fazer, eu respondi que na madrugada seguinte íamos para Gadamael Porto... Qual não é o meu espanto quando ele põe as mãos à cabeça, desesperado e desorientado, e me diz:
- Não vão, porque vocês morrem lá todos!

Tentei acalmá-lo, dizendo-lhe para estar descansado que nada de grave ia acontecer, pedi-lhe para me contar o que se passava, vai daí, começa ele a relatar o que tinha passado em Guileje e Gadamael até chegar a Cacine. Na verdade depois de o ouvir, não me restaram dúvidas que ele tinha mais do que sobejas razões para estar no estado psicológico aterrador em que se encontrava .

Os militares portugueses que abandonaram Guileje, foram tratados como desertores e traidores à Pátria

Entretanto, informa-me da sua situação militar daquele momento tal como a de outros camaradas que abandonaram Guileje. Neste grupo estava também outro meu conterrâneo, que o primeiro foi chamar, vindo este a confirmar tudo.

O que mais me chocou foi a forma desumana como estes militares foram tratados, depois da sua chegada a Cacine, sendo considerados como desertores e cobardes, quando, em meu entender, se alguém tinha que assumir a responsabilidade dessa situação, seriam os seus superiores e nunca por nunca os soldados.

Estes homens foram humilhados por muitos dos nossos superiores - que eram uns grandes heróis de secretária! -, foram proibidos de entrar no aquartelamento, não lhes davam alimentação, o que comiam era nas Tabancas junto com a população. As primeiras refeições quentes que já há longos dias não tomavam, foram feitas por estes dois homens juntamente com os pára-quedistas, porque o solicitei junto do meu Comandante de Companhia, Capitão Pára-quedista Almeida Martins – hoje tenente general na reserva - ao qual apresentei os dois camaradas do exército que lhe contaram tudo por que passaram.


Os dois desgraçados de Guileje eram meu conterrâneos: o Carlos e o Victor Correia

Solicitei ao meu comandante para eles fazerem as refeições junto com o nosso pessoal, prontificando-me eu a pagar as suas diárias, se fosse necessário. Ele autorizou os mesmos a fazerem as refeições connosco enquanto não tivessem a sua situação resolvida e a nossa cozinha que dava apoio ao Bigrupo que estava de reserva, ali se mantivesse.

O meu comandante expôs o problema destes homens ao comandante do aquartelamento do exército, solicitando que o mesmo fosse resolvido com o máximo de brevidade uma vez que a situação não era nada dignificante para a instituição militar.

É de salientar que estes dois homens já não escreviam aos seus familiares há mais de um mês, porque não tinham nada com que o fazer. Fui eu que lhes dei aerogramas para o fazerem e os obriguei a escrever, porque o seu moral estava de rastos e a vida daqueles militares já não fazia sentido. Dormiam debaixo dos avançados das Tabancas enrolados em mantas de cor verde, não tendo mais nada para vestir a não ser o camuflado.

Estes meus dois conterrâneos que atrás refiro eram o Carlos (que infelizmente já faleceu, natural do lugar de Perrães, Oliveira do Bairro) e o Victor Correia (de Aguada de Baixo, Águeda, e que hoje sofre imenso de stresse pós-traumático de guerra)(3).
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Notas dos editores:

(1) Vd. poste de 19 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1613: Com as CCP 121, 122 e 123 em Gadamael, em Junho/Julho de 1973: o outro inferno a sul (Victor Tavares, ex-1º cabo paraquedista)

(2) Vd. postes de:


25 de Outubro de 2006 > Guiné 63/74 - P1212: Guidaje, de má memória para os paraquedistas (Victor Tavares, CCP 121) (1): A morte do Lourenço, do Victoriano e do Peixoto


9 de Novembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1260: Guidaje, de má memória para os paraquedistas (Victor Tavares, CCP 121) (2): o dia mais triste da minha vida

(3) Estes camaradas devem ter pertencido à CCAV 8350 (ou a sub-unidades adidas, como o Pel Art, do Alf Mil Pinto dos Santos). Os Piratas de Guileje foram os últimos deixar Guileje, por ordem do comandante do COP 5, o então major Coutinho e Lima (4). A esta unidade pertencia o nosso querido amigo e camarada, o ex-Fur Mil Op Esp José Casimiro Carvalho, membro da nossa tertúlia:

Vd. post de 2 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCXXVIII: No corredor da morte (CCAV 8350, Guileje e Gadamael, 1972/73) (Magalhães Ribeiro).

Recorde-se que, de 18 a 22 de Maio de 1973, o aquartelamento de Guileje foi cercado pelas forças do PAIGC (Op Amílcar Cabral), obrigando as NT (CCAV 8350, 1972/73 e outras), a abandoná-lo, juntamente com cerca de 600 civis (3)
A Companhia Independente de Cavalaria 8350/72 foi a unidade de quadrícula de Guileje entre Outubro de 1972 e Maio de 1973. Viu morrer em combate nove dos seus homens, entre algumas dezenas de feridos.

Foi seu Comandante o Cap Mil Abel dos Santos Quelhas Quintas, o qual escreveu numa carta dirigida ao Senhor Chefe do Estado Maior do Exército, sobre o Furriel Miliciano de Operações Especiais José Casimiro Pereira Carvalho, com o seguinte teor (data omissa ou desconhecida):

"Exmo Senhor Chefe do Estado Maior do Exército:

"Por, quando Comandante da Companhia Independente da Cavalaria 8350, em serviço na Guiné entre 1972 e 1973, sedeada em Guileje, ter sido ferido em Gadamael, nunca me foi possível propor uma homenagem pública ao Furriel de Operações Especiais Casimiro Carvalho.

(...)"Quando fui ferido, foi este homem que me ajudou a deslocar para junto do Rio Cacine, pois eu mal me podia movimentar, deslocando-se em seguida debaixo de intenso fogo de morteiros e outra armas que, neste momento, não sei especificar, para conseguir um depósito de gasolina de forma a poder fazer movimentar a embarcação em que me evacuou para Cacine, como também outros militares que nesse momento já se encontravam junto ao pequeno cais.

"Nas reuniões anuais da nossa Companhia muitos falam dos actos de bravura deste furriel, desde, debaixo de fogo, conduzindo uma Berliet se deslocar aos paióis para municiar não só as bocas de fogo de artilharia, como para os morteiros, fazer ainda parte duma patrulha onde morreram vários militares ficando ele e outro a aguentar a situação, até serem socorridos, e ter sido ferido, evacuado para Cacine, o que não invalidou que passados poucos dias se tenha oferecido para voltar para junto dos camaradas no verdadeiro inferno em Gadamael" (...).
Vd. ainda os seguintes postes:

18 de Junho de 2007 > Guiné 63/74 - P1856: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (5): Gadamael, Junho de 1973: 'Now we have peace'

24 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1784: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (4): Queridos pais, é difícil de acreditar, mas Guileje foi abandonada !!!

14 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1759: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (3): Miniférias em Cacine e tanques russos na fronteira

13 de Maio de 2007 > Guiné 63/74 - P1727: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (2): Abril de 1973: Sinais de isolamento

25 de Abril de 2007 > Guiné 63/74 - P1699: Guileje, SPM 2728: Cartas do corredor da morte (J. Casimiro Carvalho) (1): Abatido o primeiro Fiat G91

25 de Março de 2007 > Guiné 63/74 - P1625: José Casimiro Carvalho, dos Piratas de Guileje (CCAV 8350) aos Lacraus de Paunca (CCAÇ 11)

27 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2483: Estórias de Guileje (3): Devo a vida a um milícia que me salvou no Rio Cacine, quando fugia de Gandembel (ex-Fur Mil Art Paiva)

(4) O major de artilharia Alexandre da Costa Coutinho e Lima era então, desde 21 de Janeiro de 1973, o comandante do COP 5, tendo sido ele a tomar a decisão da retirada de Guileje, em 22 de Maio de 1973, cercado por três corpos do exército do PAIGC (três baterias de artilharia: uma de canhões sem recuo; outra de morteiros; e outra de foguetões 122 mm, ou graad, também conhecidos como jactos do povo).

Vd. postes de:
27 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2137: Antologia (62): Guileje, 22 de Maio de 1973: Coutinho e Lima, herói ou traidor ? (Eduardo Dâmaso / Luís Graça)

3 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2502: Guiledje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (14): Enquadramento histórico (II): o significado da queda de Guileje

23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2673: Uma semana memorável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (10): Guiledje: Homenagem ao Coronel Coutinho e Lima

23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2677: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Coutinho e Lima (1): Comandante do COP 5, com 3 comissões no CTIG

23 de Março de 2008 >Guiné 63/74 - P2678: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Coutinho e Lima (2): A dolorosa decisão da retirada de Guileje

(...) "A Operação de retirada foi organizada da seguinte maneira: em primeiro escalão, saiu o Sr. Comandante da CCAÇ 4743 (GADAMAEL) com os seus dois grupos de combate, seguidos de parte da população; em segundo escalão, o Sr. Comandante da CCAV 8350 (GUILEJE), com a sua Companhia, milícia e restante população; em último lugar, o pessoal militar sobrante, incluindo os elementos do Comando do COP 5, tendo sido eu o último a sair do quartel" (...).

Segundo informação (oral) do Coronel de Artilharia, na reforma, Coutinho e Lima, agora prezado membro da nossa Tabanca Grande, a coluna militar que deixou Guileje, era constituída por: (i) 2 grupos de combate da CCAÇ 4743 (unidade de quadrícula de Gadamael); (ii) CCAV 8350, (unidade de quadrícula de Guileje); (iii) Pelotão de Artilharia, comandado pelo Al Mil Pinto dos Santos (já falecido); (iv) Pel Cav Reconhecimento Fox (reduzido, havendo apenas duas Fox), além do (v) pelotão de milícias local...

Ele disse-me que não havia nenhum Pel Mort, sendo o Mort 10.7 e os 2 Mort 81, operados por pessoal dos Piratas de Guileje. Esta unidade (a CCAV 8350) era constituída sobretudo por "pessoal do Norte" e esteve depois em Bissau, em recuperação. Em Abril de 1974 estava afecta ao sector de Quebo (Aldeia Formosa), em dois destacamentos: Cumbijã e Colibuía.

Guiné 63/74 - P2728: Convívios (48): CCAÇ 3, 10 de Maio de 2008 em Macedo de Cavaleiros (A. Marques Lopes)

1. No dia 3 de Abril de 2008, recebemos uma mensagem do nosso camarada Marques Lopes, dando notícia do Convívio da sua CCAÇ 3 e dando-nos nas orelhas pelo silêncio que fizemos a uma sua mensagem, de 4 de Março passado, sobre o mesmo assunto.

Pela minha parte vou tendo a coragem de ir pedindo desculpa.
CV

2. Caros camaradas

Já no princípio de Março (parece-me...) vos enviei notícia sobre o próximo encontro da CCAÇ3. Depois disso, outros convívios já foram publicados no blogue, mas este não. Penso que também merece...


CCAÇ3 (Companhia de Caçadores N.º 3), da Guiné. Esteve em Barro, Binta e Guidage.

Almoço-convívio da CCAÇ3

Convívio no próximo dia 10 de Maio no Convento de Balsamão, em Chacim, próximo de Macedo de Cavaleiros.



Inscrições até ao próximo dia 10 de Abril para o Artur Fernandes: telef. 278536324, telem. 968792106, ou ajsfernandes@sapo.pt

A. Marques Lopes

domingo, 6 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2727: Convívios (47): CCS, CCAÇ 2367 e CCAÇ 2366 do BCAÇ 2845, Ofir e Mealhada, Maio de 2008 (Albino Silva)

1. Em 1 de Abril de 2008 recebemos uma mensagem do nosso camarada Albino Silva, dando-nos conta dos diversos convívios do seu Batalhão

Caro Camarada Carlos Vinhal:

Como estamos de novo na época de convívios, cá estou eu com este apelo que é relacionado com o meu Batalhão, ou seja, o BCAÇ 2845, que prestou serviço na Guiné de 1968 a 1970. em Teixeira Pinto.

Como sou o organizador de três convívios, queria que, através da Tabanca Grande, eles fossem divulgados.

CCS do BCAç 2845 - "Armados para a Paz"

2. CCS/BCAÇ 2845

O Convívio desta Companhia é no dia 3 de Maio de 2008 em Ofir, Esposende. A concentração far-se-á em Esposende, junto às Piscinas do Cávado, às 10 horas da manhã.

Organização de Albino Silva


BCAÇ 2845 - "Sempre Excelentes e Valorosos

3. CCAÇ 2367/BCAÇ 2845´

O Convívio desta Companhia é no dia 24 de Maio na Mealhada. Concentração a partir das 10 horas da manhã na Quinta dos Três Pinheiros, na Mealhada, onde será servido o almoço pelas 13 horas.

Este encontro, a nível de Companhia, já não se realiza há 7 anos e por isso apelo à união da mesma para comemorar os 40 Anos da nossa ida para a Guiné.

Organização de Albino Silva e Antero Simões

4. CCAÇ 2366/BCAÇ 2845

O Convívio deste ano é realizado no dia 31 de Maio de 2008, no mesmo local do ano passado, na Quinta dos Três Pinheiros, na Mealhada, com concentração nos jardins da mesma pelas 10 horas da manhã.

O almoço será servido às 13 horas.

Organizaçao de Albino Silva e Jorge Costa

Agradecemos que todos me confirmem até às datas que foram marcadas para o efeito, não deixando tudo para o próprio dia.

Contactos : Albino Silva - Rua 25 de Abril, 17 -Gandra 4740-472 - Esposende
Telemóvel : 963 297 804

Abraços para toda a Tabanca Grande

Guiné 63/74 - P2726: Fórum Guileje (13): Não foram as Forças Armadas Portuguesas que perderam a guerra (Paulo Santiago)


Mensagem do Paulo Santiago, de 25/03/2008


Após a leitura do P2679, escrito pelo camarada Mexia Alves, existem algumas questões que importa esclarecer. Comecemos pela frase A guerra da Guiné estava perdida.



Vou socorrer-me do livro Contra-Insurreição em África, de John P.Cann, oficial-aviador da Marinha norte-americana.
Cito da pág 255 do livro referido.

Numa análise final, enquanto Portugal lutava numa campanha imaginativa a fim de conservar as suas colónias numa época anti-colonial, não havia fibra militar que conseguisse superar o problema político da legitimidade de Portugal em África.

Devido a esta circunstância, Portugal perdeu a guerra e finalmente as suas colónias, apesar dos enormes sacrifícios feitos (…)

Em 1970, o General Spínola refreara o ímpeto do PAIGC e originara um impasse através de uma liderança enérgica e do seu progama social 'Uma Guiné Melhor'.

Este impasse começou a desaparecer em 1973, à medida que o exército compreendia que a solução política necessária não estava à vista (…) as forças militares não poderiam pôr fim à guerra.

Nenhuma espécie de campanha imaginativa conseguiria fazê-lo. O general Spínola e todas as forças armadas portuguesas estavam cientes deste facto. Contudo, os líderes políticos de Portugal permaneceram sem visão e afastados da realidade.

No post anunciado acima vem também a frase A política fez a guerra, a política acabou a guerra, e esta é a verdade.

Concordo com a primeira parte, foram de facto os políticos, a partir do Terreiro do Paço, que 'fizeram' a guerra, mas não foram eles que a acabaram, e volto ao livro referido, pág.256:




Administrou (o exército) habilmente a utilização das vidas e dos bens. Quando os políticos não conseguiram providenciar o necessário apoio complementar, foi o exército que interveio a 25 de Abril de 1974 e ofereceu a solução política que não só libertou as colónias mas libertou também Portugal e tornou possível a transição para a democracia.

Penso que não está a haver um endeusamento do PAIGC e um apoucamento das Forças Armadas Portuguesas, estas com os poucos meios disponiveis bateram-se arduamente sempre à espera da solução política que nunca apareceu.

Para terminar, façam o julgamento, pondo de um lado o Cor Coutinho e Lima que retirou de Guiledje, levando 800 pessoas, militares e civis, do outro o Cor Castro Lemos e o Lourenço que mandaram para o matadouro (Paulo Malu dixit) do Quirafo os militares, milícias e civis que nós sabemos.

Abraço
Paulo Santiago


_________


Fixação de texto da responsabilidades de vb.


Artigos relacionados em:



5 de Abril de 2008 >
Guiné 63/74 - P2722: Fórum Guileje (12): Bombas de napalm e outras curiosidades da nossa visita ao Cantanhez (Nuno Rubim)


4 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2718: Fórum Guileje (11): Relembrando a velha Guileje do Zé Neto e do Eurico Corvacho, onde perdi 2 soldados em combate (Idálio Reis)


25 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2679: Fórum Guileje (10): Não ao endeusamento do PAIGC e ao apoucamento das Forças Armadas Portugueses (Joaquim Mexia Alves)


19 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2666: Fórum Guileje (9): O Simpósio foi uma festa, uma grande festa! (Carlos Silva)


18 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2662: Fórum Guileje (8): O nosso património histórico comum (Leopoldo Amado)

16 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2649: Fórum Guileje (7): A importância do Caminho do Povo (Paulo Santiago)


15 de Março de 2008 >Guiné 63/74 - P2645: Fórum Guileje (6): Antes que se esgote... Gandembel (Jorge Félix, ex-Alf Mil Pil Av Al III, BA12, Bissalanca, 1968/70)


15 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2642: Fórum Guileje (5): Que sentido dar a esta vaga de fundo ? Da guinefobia à guinefilia (Hélder de Sousa / Luís Graça)


14 de Março de 2008 >Guiné 63/74 - P2638: Fórum Guileje (4): Minas aquáticas em Bedanda (Ayala Botto)


13 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2629: Fórum Guileje (3): A Marinha esteve como peixe dentro de água no CTIG, e teve um papel logístico fundamental (Pedro Lauret)




12 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2626: Fórum Guileje (1): E Cameconde ? Cabedu ? E a nossa Marinha ? (Manuel Lema Santos / Jorge Teixeira / Virgínio Briote)

Guiné 63/74 - P2725: O nosso Livro de Visitas (10): Albano M. Matos, o último Militar Português a abandonar a Guiné.

Albano Mendes de Matos, 2º Sargento Artª em Angola (1961/63 e 1965/68)

__________

Mensagem de Albano Mendes de Matos:

Camaradas,


Vi o vosso blogue. É interessante a ideia. Sou Ten Coronel reformado. Tenho estado em alguns encontros de combatentes na Guiné.

Estive só em Bissau, de Dezembro de 1972 a 14 de Outubro de 1974... Fui o último a sair da antiga colónia. Além do serviço próprio, dediquei-me a actividades culturais.

Criei, há dias, o blogue
cenasdeguerra.blogspot.com, em que vou publicar coisas de Angola e da Guiné. Já tem dois escritos de Angola.

Seguem duas poesias da Guiné.
Um abraço

Albano Mendes de Matos
_________


PARTE UM PESO

Parte um peso,
Patrão!

Peso ou delírio
dinheiro e vida!
Mágoa sentida
da menina negra
a sorrir magia!

Ela se deu toda
na pureza sublime
da inocência!

Peso carícia
dívida esmola
no tempo dinheiro!

Esmorece o luar
na tabanca
e a menina negra
soluça!

Parte um peso,
patrão!

A moeda sorriu
na palma branca
da menina negra!
Nos olhos submissos
uma lágrima correu!

PÁSSARO TECELÃO

O sol rompe na atmosfera estufa e cintila

no espaço sagrado do poilão

- os pássaros amarelos
desfiam as palmas
em fios apressados

Os pássaros amarelos tecem a liberdade
os pássaros amarelos rasgam as folhas das palmeiras
e tecem de ternura os ninhos no instinto perene dos filhos

- o sol incendeia o tecto africano
e queima o vigor das horas mortas

São de amor os bicos dos pássaros amarelos
que modelam os ninhos ao poilão sagrado:
os fios roubados nas franjas das palmeiras
as penas surripiadas nas ondas do vento

Depois
as brisas murmuram e embalam os passarinhos
na ternura dos ninhos urdidos de palmas e de penas

- e os pássaros amarelos
cantam alegrias no poilão sagrado!

__________

Nota do co-editor vb:

Albano Mendes de Matos:

Comissões de Serviço:

ANGOLA: Grupo Art 157/BArt 147 - Ucua, Pedra Verde, Quicabo, Quibaxe, Pango Aluquém, Piri, Luanda Luso, Portugália, Tentativa, Caxito, etc., 1961/63

ANGOLA: BArt 1469/CArt 1469 - Piri, Quelo, Santo António do Zaire, 1965/68

GUINÉ: GA 7 e QG/CTIG - Secção de Milicias e Chefe de Contabilidade, 1972/74 albanomatos83@sapo.pt

Pequeno resumo do trajecto profissional:

Cabo Miliciano em 1953, obrigado a prestar mais um ano de serviço, devido aos acontecimentos em Goa, Damão e Diu, então sob administração portuguesa. Não foi mobilizado, por ser o mais classificado da especialidade.
Nesse período suplementar de serviço, concorreu ao Q. P..
Disponibilidade em 1954. Furriel em 1955.

Nas comissões militares em Angola, 1961/63 e 1965/68, dedicou-se ao estudo dos povos de Angola, especialmente os Quiocos, com publicação de contos, poesias e ligeiros artigos, em jornais e revistas.

Na comissão militar na Guiné-Bissau, foi colocado no Grupo de Artilharia 7, em diligência no Quartel-General e no Conselho Administrativo do CTIG.

Na Guiné, a par das tarefas militares, tomou arte na organização de festivais de poesia e representações teatrais, junto da UDIB, Banco Ultramarino e Associação Comercial.

Organizou os Cadernos de Poesias POILÃO, com autores guineenses e portugueses, do qual só saiu o primeiro número, nas proximidades do 25 de Abril de 1974, referido na História das Literaturas Africanas e no Dicionário Cronológico de Autores Portugueses.

Publicou, em 1973, em Angola, o caderno de contos africanos Jangadeiro, dos quais foram apreendidos 300 exemplares pela Direcção Geral de Segurança (PIDE), na alfândega da Guiné, tendo sido um elemento do PAIGC que o avisou da apreensão.

No dia 12 de Outubro de 1974, alguns elementos do PAIGC/UDIB (União Desportiva Internacional de Bissau) homenagearam-no com um jantar de despedida, no Hotel SOLMAR.

Regressou a Portugal, em 14 de Outubro de 1974, no último avião militar vindo da Guiné.

Já perto da reforma, licenciou-se em Antropologia Cultural e Social e fez o Mestrado em Ciências Antropológicas.

Foi professor na Universidade Moderna. Aqui fica uma poema, referente à noite de Natal de 1973, na Guiné:

NATAL

O teu filho anda na guerra, Mãe!
E Cristo vai nascer à Meia-Noite,
para o cravarem ironicamente na cruz!

Cristo, hoje, vai nascer!
E o teu filho anda na guerra,
mascarado de soldado
e sonha em cada delírio uma rajada de versos!

Esta noite é longa, Mãe,
e Cristo vai nascer na memória dos homens.
As armas são círios de Presépios,
nos segredos das matas e no inferno das bolanhas!

Há cânticos
de dor e de esperança nos gritos dos soldados,
no sono dos mártires a caminho da eternidade,
na alma dos mutilados embebidas de raiva!

O som da metralha é melodia infernal!
E Cristo vai nascer nesta noite sem luz,
talvez vestido de soldado ou de vagabundo,
para estar vivo, mais perto dos homens!

Faz uma prece, Mãe!
Cristo vai nascer entre cânticos celestiais
e o teu filho rasteja nos lodos febris da guerra!
Na guerra real, onde as picadas são trágicas e letais,
e a vida parece irreal, num delirante e último sonho, Mãe!

Guiné 63/74 - P2724: Dando a mão à palmatóría (7): O obus 11.4, da Primeira Guerra Mundial, mais conhecido pelo Bonifácio (Luís Graça / Nuno Rubim)

1. Comentário do editor, L.G.:

Erradamente legendámos esta imagem, nestes termos (1): Guiné > Região de Tombali > Guileje > 22 de Maio de 1973 > Uma das fotografias-ícones da batalha de Guileje: a expressão de preocupação estampada no rosto do Major Coutinho e Lima, por detrás de uma viatura blindada ou de uma peça de artilharia... O comandante do COP5 terá, de motu proprio, decidido abandonar Guileje para salvar 600 vidas. Decisão que os seus superiores hierárquicos nunca lhe terão perdoado. Recorde-se que ele esteve preso preventivamente em Bissau, de 22 de Maio de 1973 até 12 de Maio de 1974. O auto de corpo de delito que lhe foi levantado, por despacho do General António de Spínola, de 22 de Maio de 1973, tinha a seguinte justificação: (i) Ordenou a retirada das forças sob o seu comando do quartel de Guileje para Gadamael, sem que para tal estivesse autorizado; (ii) Mandou destruir edifícios e inutilizar obras de defesa do referido quartel, bem como material de guerra e munições; (iii) não cumpriu a missão que lhe foi atribuída.

Além disso, havia também um erro na atribuição de autoria da fotografia:

Estas fotos, originalmente publicadas no 'Público', devem ser da autoria do Fur Mil Carlos Santos, da CCAV 8350 (1972/74), segundo informação do seu e nosso camarada e amigo José Casimiro Carvalho, também ele da mesma unidade (Os Piaratas de Guileje) mas que nesse dia estava em Cacine . Gostaríamos de confirmar esta informação junto do próprio Carlos Santos, cujo paradeiro desconhecemos. Talvez o Casimiro Carvalho nos possa ajudar nesta diligência.

Do convívio com o Cor Art Res Coutinho e Lima, na Guiné-Bissau, de 29 de Fevereiro a 7 de Março de 2008, por ocasião da nossa participação no Simpósio Internacional de Guileje, passei a conhecê-lo melhor e cheguei à conclusão que a supracitada foto foi tirada, não em Guileje, mas sim na Academia Militar, na Amadora, junto a um velha peça de artilharia... A fotografia é possivelmente de 2004, sendo o autor o fotógrafo do Público (2), e não o Fur Mil Carlos Santos, da última unidade de quadrícula de Guileje, a CCAV 8350, como eu supunha, erradamente, a partir de um palpite do J. Casimiro Carvalho.

Em nota que me enviou, e que reproduzo a seguir, o Nuno Rubim (que é o nosso assessor-mor para as questões de artilharia e de história de artilharia, uma grande honra e privilégio, para mim e para o nosso blogue) vem dizer-me que a peça, acima reproduzida, é afinal uma peça de museu... Este homem tem cá um olho clínico, não deixa passar nada!...

As minhas desculpas a todo o mundo. Aqui fica a correcção. Como noutras situações, o nosso blogue (ou melhor, o editor e a sua equipa) dá a mão à palmatória (3). O meu Oscar Bravo (Obrigado) ao Nuno... LG


Vendas Novas > Escola Prática de Artilharia > Museu > s/d > Obus 11,4 cm TR m/917, mais conhecido como o Bonifácio...

Foto: © Nuno Rubim, (2008)


2. Mensagem do Nuno Rubim:

Caro Luís

O material que surge na fotografia do Cor Coutinho e Lima é o Obus 11.4cm T.R. m/ 917, mais conhecido na gíria dos antigos artilheiros pelo Bonifácio. Trata-se de um tipo de b.f. cedido pelos ingleses aquando da 1ª Guerra Mundial, tendo servido na Flandres, nunca tendo sido distribuído, ao meu conhecimento, às unidades de artilharia de África. Foi justamente substituído pela parelha 11,4/14 cm no início da 2ª Guerra Mundial.

A foto que te envio é de um exemplar pertencente ao Museu da EPA [- Escola Prática de Artilharia, de Vendas Novas].

Um abraço

Nuno Rubim


_________


Nota de L.G.:

(1) Vd. poste de 3 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2502: Guiledje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (14): Enquadramento histórico (II): o significado da queda de Guileje

(2) Título do Público: "Coronel Coutinho e Lima: Salvou 600 vidas mas foi castigado por Spínola", PÚBLICO, Domingo, 16 de Maio de 2004, por Eduardo Dâmaso.
Artigo reproduzido, com correcções, no poste de 27 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2137: Antologia (62): Guileje, 22 de Maio de 1973: Coutinho e Lima, herói ou traidor ? (Eduardo Dâmaso / Luís Graça)

(3) Vd. último poste desta série: 17 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2658: Dando a mão à palmatória (6): Desabafo do Mário Dias (José Teixeira)

sábado, 5 de abril de 2008

Guiné 63/74 - P2723: Poemário do José Manuel (6): Napalm, que pões branca a negra pele, quem te inventou ?


Uma das célebres fotos de Bara István, o fotógrafo húngaro que esteve embebed com forças do PAIGC, no mato, em 1969/70. Nesta imagem, da sua fotogaleria, mostram-se os efeitos do napalm... Presume-se que seja uma vítima dos nossos bombardeamentos. Não se diz exactamente onde foi tirada. A legenda (em húngaro) é a seguinte: Bara István: Napalm áldozata.Guinea-Bissau, 1969. Julgamos tratar-se de uma imagem copyleft... De qualquer modo, reproduzimo-la com a devida vénia e agradecimento ao autor e citando a sua página (comercial).

Foto: Foto Bara (com a devida vénia...)


Napalm
que pões branca
a negra pele
quem te inventou?
que queimas árvores centenárias
que fazes em sal
a terra arável
quem te soltou?
tu...
de quem nasce
a luz que cega
e o som que ensurdece
e causas dor
sem saber a quem
se ao homem que guerreia
se à criança que brinca
ou à mulher que semeia
quem te apaga a luz?
e não te deixe voar
quem te vai silenciar?


Salancaur 1974

josema (2)
___________

Notas de L.G.:

(1) Vd. poste de 28 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2694: Poemário do José Manuel (5): Não é o Douro, nem o Tejo, é o Corubal... Nem tudo é mau afinal.... Há o Carvalho, há o Rosa...

(2) José Manuel Lopes, o José Manuel, muito simplesmente... Foi Fur Mil, Op Esp, CART 6250 (Mampatá, 1972/74), e sobretudo é um grande poeta, além de produtor de excelentes néctares... na sua Quinta da Graça, no Douro.

Este poema que ele acaba de me mandar, há quatro horas atrás, vem justamente a propósito do último poste do Nuno Rubim, e por isso o publico de imediato, preterindo os anteriores, que serão oportunamente divulgados (recordam-se que ele prometeu, e tem cumprido, mandar-me todos os dias um poema da Guiné, escrito na Guiné).

Vd. poste do Nuno Rubim: 5 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2722: Fórum Guileje (12): Bombas de napalm e outras curiosidades da nossa visita ao Cantanhez (Nuno Rubim)

Guiné 63/74 - P2722: Fórum Guileje (12): Bombas de napalm e outras curiosidades da nossa visita ao Cantanhez (Nuno Rubim)

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez , algures no sector de Bendanda, no triângulo Iemberém, Cadique e Cananime, na margem direita do Rio Cacine > Simpósio Internacional de Guiledje > Domingo, de manhã, 2 de Março de 2008 > Visita ao Acampamento Osvaldo Vieira (1)... O Nuno Rubim, com a esposa, Júlia, e um antigo guerrilheiro do PAIGC que lhe mostra umas fotos de aviões, de um velho recorte de um magazine...

Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.

O antigo guerrilheiro do PAIGC faz a sua prelecção sobre a organização militar no PAIGC, exibindo um artigo de um revista com fotos de alegados aviões da FAP...

Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.


Ó nosso homem... Segundo percebi, e se a memória me não falha, era mandinga, natural de Cacine... Estava em Conacri quando Cabral foi assassinado. Foi ferido em combate e terá estado na União Soviética....

Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.


Guiné-Bissau > Região de Tombali > Acampamento Osvaldo Vieira, 2 de Março de 2008 > Pretensos restos de bombas de napalm, expostos num baga-baga, largadas pelas NT no Cantanhez...

Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.


Foto do Nuno Rubim, mostrando em mais pormenor os restos de bombas (de napalm ?) da nossa Força Aérea.

Guiné-Bissau > Região de Tombali > Júlia e Nuno Rubim, excelentes companheiros desta maravilhosa jornada que eu e a Alice fizemos à Guiné e em especial à Região de Tombali, no âmbito do Simpósio Internacional de Guileje.... O casal fotografado por mim no Acampamento Osvaldo Silva.

Foto: © Luís Graça (2008). Direitos reservados.

1. Mensagem de ontem, do nosso amigo e camarada Nuno Rubim, Cor Art ref, com duas comissões na Guiné (1965/66; 1972/74):

Caro Luís:

Hoje, 4 Abril, fui ao blogue e encontrei uma curiosa foto que tu tiraste: um antigo guerrilheiro com vária documentação ma mão (1).

Ora minutos depois dessa cena pedi-lhe que me mostrasse esse material. Ao mesmo tempo que mo entregava ia-me explicando que uma das imagens se referia aos aviões portugueses que atacavam a zona.

Qual não é o meu espanto quando ele me mostra um recorte de jornal (?) com ... a publicidade a um modelo de plástico de construção ! (ver foto, ao lado, de Nuno Rubim). Tratava-se do P-51D Mustang, um caça americano da 2ª Guerra Mundial !!!

Ora este tipo de aparelho, que Portugal nunca recebeu, era um caça monomotor ( considerado um dos melhores) que nada tem a ver nem com o Fiat G-91, nem com o T-6 !


Foi-me impossível na altura destrinçar este mistério! Tenho pensado sobre este assunto sem ter chegado a qualquer conclusão ... Ter-se-ia perdido o original, que de facto mostraria um dos dois tipos acima referidos e posteriormente alguém tratou de arranjar um substituto?

Há outro mistério que ficou sem resposta. No meio da clareira do acampamento estavam os restos de duas bombas de Napalm. (ver foto). Podiam, naturalmente, ter sido trazidos de outro local, e colocados nos montes de baga-baga, mas eu procedi a uma pequena escavação e notei que parte delas estava parcialmente embebida no terreno. Mas ~isto também pode ser um sinal dos tempos, numa zona onde há grande precipitação.

O facto é que, se as bombas caíram lá (ou onde quer que fosse), os estragos teriam sido consideráveis.

Também não tive tempo de aclarar o assunto.

Muita coisa ficou-me por averiguar! Teria sido necessário lá ter estado o dobro
ou o triplo do tempo que aquele que se verificou. Paciência (2) ...

Um abraço

Nuno Rubim

__________

Notas de L.G.:

(1) Vd. poste de 5 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2721: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (13): Visita ao Acampamento Osvaldo Vieira (I)
(2) Vd último poste desta série Fórum Guileje: 4 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2718: Fórum Guileje (11): Relembrando a velha Guileje do Zé Neto e do Eurico Corvacho, onde perdi 2 soldados em combate (Idálio Reis)

Guiné 63/74 - P2721: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (13): Visita ao Acampamento Osvaldo Vieira (I)



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Mata do Cantanhez , algures no sector de Bendanda, no triângulo Iemberém, Cadique e Cananime, na margem direita do Rio Cacine > Simpósio Internacional de Guiledje > Domingo, de manhã, 2 de Março de 2008 > Visita guiada e animada por antigos guerrilheiros e população local, ao Acampamento (Baraca) Osvaldo Vieira, outro dos momentos altos da nossa viagem à pátria de Cabral (1)...

Vídeo (2' 50''): © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Alojado em: You Tube >Nhabijoes





O Pepito, nosso anfitrião, aqui servindo de tradutor (do crioulo para o português)... Concentraram-se, neste antigo acampamento do exército do PAIGC, algumas centenas de pessoas, entre comitiva (partctpantes do Simpósio Internacional de Guileje) e população local...


Um antigo comandante (2) faz de cicerone... Com um brilhozinho nos olhos, fala das 3 fases da organização político-militar do PAIGG... Insiste em afirmar, perante os convidados estrangeiros, que aqui nunca se lutou com o povo português, mas sim contra o colonialismo de Salazar e de Caetano...


Um grupo de jovens, rapazes e raparigas, que cantaram o Hino da Guiné-Bissau no início da cerimónia (1)...

À entrada para o acampamento Osvaldo Vieira, junto a poucos quilómetros de Imberém, a sul... Na foto, a Alice com o antigo guerrilheiro Dauda Cassamá, sob o olhar do catalão Josep Sánchez Cervelló, professor universitário em Tarragona, especialista em história sobre o 25 de Abril e a descolonização portuguesa...


Osvaldo Máximo Vieira (1938-1974): Lápida funerária, na Fortaleza da Amura onde repousam os seus restos mortais, bem como de Pansau Na Isna, Titina Silá e Domingos Ramos, entre outros dirigentes do PAIGC, mortos em combate, além de Amílcar Cabral cuja memória ainda aqui, no Cantanhez, é venerada...


Osvaldo Vieira, de origem cabo-verdiana. foi dos que morreu justamente na recta final, a um mês do fim das hostilidades... O aeroporto internacional de Bissau ostenta o seu nome... Os antigos guerrilheiros do Cantanhez também quiseram dar a esta barraca (acampamento temporário) o seu nome... Segundo me dirá o Manecas, outro lendário combatente do PAIGC, o Osvaldo nunca terá andado muito pelo sul... Fico na dúvida se o nosso homem esteve realmente aqui, neste sítio... Mas, para o caso, também não interessa. Os seus antigos camaradas tentaram, de maneira didáctica, simples, autêntica, reconstruir as condições em que se vivia e lutava durante os difíceis tempos da luta de libertação... Não sei se alguma vez foi identificado, atacado e destruído pelas NT... Sabe-se que, desde 1966 até finais de 1972/princípios de 1973, as NT não ousaram penetrar, a pé, no Cantanhez. No final do consulado de Spínola, vai haver uma grande contra-ofensiva contra este santuário do PAIGC.


Um dos antigos combatentes da liberdade da pátria explica, em crioulo (com tradução para português, feita pelo Pepito) como é que os guerrilheiros do PAIGC se apoiavam em (e articulavam com) a população local...

Um grupo de antigos guerrilheiros encenaram a sua actuação no tempo da guerra... Ei-los aqui vestidos de caqui e gorro, e empenhando imitações de madeira da famigerada Kalashnikov... Pertenciam ao Exército, já na 3ª fase da luta...

Nalguns casos recorreu-se mesmo a restos de armas que ficaram por ali, como por exemplo o cano do temível LGFog RGP-7....

O grande terror dos guerrilheiros e da população do Cantanhez não eram os pára-quedistas, ou o helicanhão, mas sim os Fiat, os aviões a jacto da Força Aérea Portuguesa... O aparecimento dos mísseis terra-ar Strella vieram dar outra confiança e ânimo aos homens do PAIGC...

As mulheres da população local tiveram um papel fundamental do apoio de retaguarda: eram elas que iam à pesca buscar o mafé para os homens da guerrilha; eram elas que recolhiam a malga de arroz com que cada família contribuía, diariamente, para a alimentação dos guerrilheiros; eram elas que espiavam os movimentos suspeitos da PIDE, dos seus agentes, dos colaboraccionistas, do exército, etc.

Um grupo de mulheres, camufladas com folhas de arbustos, mostrando como se deviam agachar e esconder quando no céu se ouvia o baralho de aeronaves...

Os tempos hoje são outros... As populações do Cantanhez, e nomeadamente as que apoiaram abertamente a luta de libertação (os nalus e os balantas), parecem assumir o seu passado, com orgulho, com dignidade, sem arrogância....

Um antigo comandante da guerrilha conduziu-nos, a mim, ao Nuno Rubim e a esposa, ao longo de uma das linhas de fuga que partiam do centro do acampamento, em plena floresta do Cantanhez, até ao tarrafe... Fortemente apoiados pelos nalus e pelos balantas, o PAIGC movia-se como peixe dentro de água nesta floresta-galeria, um emaralhado de lianas e vegetação perene, com árvores de alto porte, centenárias, uma amostra ainda riquíssima do que resta das florestas primárias do planeta...

Paisagem de tarrafe...na maré vazia.

(Continua)

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Notas de L.G.:


(1) Vd. os últimos postes desta série:

31 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2704: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (12): Que o Nhinte-Camatchol te proteja, Guiné-Bissau

29 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2695: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (11): Iemberém, uma luz ao fundo do túnel (I)


(2) Vd. poste de 24 de Janeiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2478: Guileje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (9): Inimigos de ontem, amigos de hoje