domingo, 7 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13582: Blogoterapia (262): Algo de estranho e sinistro (Amado Juvenal, ex-1.º Cabo Cond Auto do BCAÇ 3872)

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 4 de Setembro de 2014:

Amigos
Não sei até que ponto este será uma assunto para o blogue.
Fica à vossa consideração certos que entenderei perfeitamente a sua não publicação.

Um abraçoJuvenal Amado


ALGO DE NEGRO E SINISTRO

Quando era jovem, pensava que os males da sociedade desapareceriam juntamente com as gerações onde o preconceito, o racismo e a xenofobia tinha sido prática comum. Aprendendo com os erros seria a evolução natural emendá-los.
Mais justiça e melhor distribuição dos rendimentos, fariam com certeza um Mundo melhor mas com o decorrer dos anos vi, que uns males, dão lugar a outros se não iguais, muitas a vezes piores.

A ambição pelos novos bens consumíveis, deram lugar a guerras territoriais mascaradas de disputas religiosas, quando na verdade o verdadeiro problema começa pela disputa entre ricos e pobres, sabiamente aproveitadas por potências, que são os grandes beneficiários desses conflitos regionais mas as populações pobres e espoliadas ficam numa situação de reféns, são usadas como escudos humanos e os jovens, são facilmente engajados para causas que os radicalizam, tornando-os em escravos de outro tipo, mesmo assim não menos joguetes de outros interesses muito menos básicos que julgam. São escravos do irracional, do terror e do falso poder que pensam ter adquirido.

Assim milhões de seres estão sujeitos a prepotências de toda espécie. Sem liberdade de culto, sem liberdade politica, são expulsos ou forçados a abandonar as suas terras, tentado assim salvar as suas vidas e dos seus filhos.
Eu sou defensor da liberdade religiosa e assim sendo, também defendo a liberdade de não praticar religião nenhuma.

Binta, a bajuda mais bonita de Galomaro
Foto ©: Juvenal Amado

Na Guiné vivi entre os Fulas fortemente islamizados, com uma hierarquia centrada nos costumes e nos homens grandes que decidiam praticamente tudo nas suas comunidades. Nós convivemos com esses homens, normalmente altos, magros, de longas vestes brancas e mitra bordada na cabeça. Entendíamo-nos no essencial e só a minha pouca idade foi responsável por não ter aproveitado mais do convívio, conversar sobre as suas aspirações, como as peregrinações a Meca, onde purificados acreditavam beber da fonte da santidade, elevando-os acima dos outros homens da comunidade.

Dizia-se que para falar com eles depois se tinha de oferecer animais ou objetos ou dinheiro. A ser assim, também se tornava a peregrinação um investimento a ter em conta. De qualquer modo, embora eu me sentasse a apreciá-los num daqueles banquinhos que nos faziam ficar com os joelhos ao pé do nariz, escapava-me toda aquela devoção e encantamento que os fazia rezar virados para Meca cinco vezes ao dia, mas de forma alguma era observado algum tipo de fanatismo e tanto as mulheres como as crianças, convivam connosco embora observassem as interdições próprias da sua religião como o álcool e a carne porco.

As mulheres variavam entre cor escura do ébano, o dourado do bronze e não raras vezes nos deparávamos com povoados onde eram cor de café com leite. Altas com perfis majestosos que não raras vezes vimos hoje nas passerelles dos eventos de moda como sendo da Somália ou Etiópia.
Todas belas, todas diferentes. Os meses que com elas convivemos de perto durante as nossas comissões, levou-nos a as apreciar ultrapassando conceitos estéticos com os quais fomos criados e educados. Era um prazer vê-las com os seus panos coloridos enrolados, com trouxas com os seus haveres, pequenos lenços nas cabeças, mais que tapar realçavam os penteados elaborados mais os seus “roncos” e mezinhas para lhes dar sorte, tudo fazia parte e realçava a beleza com que elas exibiam o corpo de forma natural, sem vergonha, apesar dos nossos olhares cobiçosos.



Mulheres da Guiné-Bissau
Fotos da Missão Dulombi, com a devida vénia

Entretanto os ventos de mudança estão a chegar à Guiné-Bissau, agora vê-se a todo o passo mulheres vestidas de preto, onde só o olhos mostram, a fazerem lembrar usos e costumes impostos noutras regiões por fanáticos religiosos, que tendem a cortar cerce todas as liberdades nos territórios que vão ocupando.
Também são vistas nas nossas cidades e à nossa tolerância, respondem eles com a intolerância de quem se julga dono da verdade.

Assistimos espantados à radicalização de jovens nascidos nas nossas cidades, que apostam na destruição da forma de vida em que foram criados e na sua tentativa de criar sociedades das quais os seus pais fugiram, em busca de um futuro melhor para as suas famílias.
Talvez a culpa seja de uma forma de exclusão, dos altos índices de desemprego, mas dai à implantação de estados medievais em nome de uma prática sanguinária, onde só as armas são modernas, é profundamente irracional. Nasceram mal com o Mundo.

Em resposta, aparecem movimentos seitas militarizadas, que defendem supremacia da raça branca, com nacionalismos perigosos, discursos racistas que facilmente atingem alvos na grande massa de desempregados, que são uma constante na nossa Europa, cada vez menos solidária.
Autos de fé, atentados e mesmo matanças, fazem sentir insegurança nas escolas e em todos o lugares que se frequentam, quer profissionalmente quer para o prazer do convívio.
Quanto a mim nada é mais triste do que ser atacado, não em resultado das minhas acções, mas pelo que penso, ou pela cor da minha pele, ou religião que eventualmente professe.

Na Guiné a questão da guerra religiosa nunca se pôs, a Deus quanto muito, pedíamos a protecção para voltarmos para a nossa terra e nunca me foi exigido que combatesse em Seu nome. Era uma situação mais clara e mais fácil porque se acreditava na liberdade e no homem como centro do bem-estar universal, não num conjunto de leis castradoras, que cada um interpreta à sua maneira, que está a fazer os países retrocederem nos direitos adquiridos e a causar sofrimento com a destruição de infraestruturas a que não podemos ficar alheios. Mais parece um confronto civilizacional do que pela melhoria de vida das populações.

Os meus pensamentos saltam de tema em tema, avançam e recuam de uma forma tal que temo perder a objectividade daquilo que quis escrever, mas a verdade é que não me sai da cabeça aquele mal-estar que costumo ter quando alguma coisa não vai bem, é que longe de parecer folclore, as mulheres de preto da cabeça aos pés, indicam que algo de muito negro e sinistro cresce no nosso seio, paira sobre os povos e as suas respectivas nações, só porque há pessoas que vivem em função do ódio e a quem retiraram a capacidade de sonhar com o que é belo.

Mulheres árabes
Foto retirada da internete

Um abraço
Juvenal Amado
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Nota do editor

Último poste da série de 30 de Agosto de 2014 Guiné 63/74 - P13546: Blogoterapia (261): Esses sons de heli que ainda mexem connosco... (Luís Graça, en férias na Tabanca de Candoz)

Guiné 63/74 - P13581: Convívios (622): I Encontro de paraquedistas do Oeste... Lourinhã, 6 de setembro de 2014... Parte I: As primeiras imagens


Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 6 de setembro de 2014 > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste >  Aspeto parcial da cerimónia de homenagem aos combatentes, e em especial ao aold paraquedista Carlos Alberto Ferreira Martins, (1950-1971) natural de Toledo. freguesia de Vimeiro, que pertenceu à CCP 123 / BCP 12, morto na região Canjadude, região de Gabu, no leste da Guiné, em 15/4/1971. É um dos vinte lourinhanenses mortos na guerra colonial (seis dos quais na Guiné).



Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 6 de setembro de 2014 > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste  > Aspeto parcial da cerimónia de homenagem aos combatentes. No uso da palavra, o António Basto, vicepresidente da AVECO.


Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 6 de setembro de 2014 > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste  > Alguns dos antigos paraquedistas  devidamente perfilados, e envergando a sua boina verde. Cantara, no fim, com garra e galhardia, o "Hino dos Boinas Verdes" . O grupo pertence à Associação dos Pára-quedistas Tejo Norte, com sede em Oeiras.


Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 6 de setembro de 2014 > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste >   O nosso camarada Jaime Bonifácio Marques da Silva, que teve a iniciativa deste encontro, organizada pela AVECO - Associação dos Veteranos do Oeste. com o apoio da Câmara Municipal da Lourinhã e da União de Freguesias da Lourinhã e Atalaia. Usaram da palavra, além do Jaime Silva,  o major general paraquedista reformado Avelar de Sousa (que comandava a CCP 123 em 1970 quando morreu o Cralos Martins, o presiente da edilidade local, João Duarte,  e o presidente da direcção da AVECO, Fernando Castro.



Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatenets do Ultramar > 6 de setembro de 2014 > I Encontro dos Parquedistas do Oeste > Coroa de flores, oferta da autarquia local, que foi depositada na base do monumento. À esquerda, o presidente da Câmara Municipal da Lourinhã, engº João Duarte que teve três irmãos na guerra colonial.


Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 6 de setembro de 2014 > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste > Coroa de flores depositada junto ao monumento.



Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 6 de setembro de 2014 > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste > Aspeto parcial do monumento, inaugurado há 9 anos.



Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 6 de setembro de 2014 > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste > Estandarte da Associação de Pára-quedistas Tejo Norte, com sede em Oeiras, e cujo lema é "Icarus Ultra Mortem" (Ícaro para sempre, ou para além da morte, traduzindo à letra).



Lourinhã > Largo António Granjo > Monumento aos Combatentes do Ultramar > 6 de setembro de 2014 > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste > Estandarte da AVECO


Lourinhã > > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste > 6 de setembro de 2014  > Estádio municipal da Lourinhã > Aguardando os saltos de paraquedas. Aspeto (parcial) da assistência. Foi pena que o espetáculo não tenha sido do conhecimento da população local.


Lourinhã > > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste > 6 de setembro de 2014  > Estádio municipal da Lourinhã > Aguardando os saltos de paraquedas. Um ave de rapina de grande porte (ou Ícaro, disfarçado de ave de rapina...) quis associar-se a este espetáculo  que alguns, como eu, viram pela primeira vez ao vivo... Para os antigos paraquedistas presentes foi um reavivar de emoções...


Lourinhã > I Encontro dos Paraquedistas do Oeste > 6 de setembro de 2014  > Estádio municipal da Lourinhã >  Um dos três jovens paraquedistas que saltaram ao fim da manhã: dois rapazes e uma rapariga. Três saltos perfeitos, e em segurança.


1. Foi um primeiro encontro e uma bonita jornada de confraternização dos ex-paraquedistas do Oeste que serviram nos teatros de operações de Angola, Guiné e Moçambique durante a guerra colonial.

A iniciativa partiu do nosso grã-tabanqueiro Jaime Bonifácio Marques da Silva, ex-alf mil, 1ª CCP/BCP 21 (Angola, 1970/72) e de outros paraquedistas sócios da AVECO - Associação dos Veteranos Combatentes do Oeste, com sede na Lourinhã.

O ncontro contou com a presença de mais de uma centena de antigos combatentes, com destaque para antigos praças, sargentos e oficiais paraquedistas (incluindo 2 oficiais generais), oriundos da região do Oeste (Estremadura).

O encontro começou por volta das 9h30 com a concentração e recepção dos convidados junto ao monumento dos combatentes, na Lourinhã.  Meia hora depois, celebtrou-se una missa de acção de graças na igreja de Santo António, a 50 metros do monumento. Às 11h00 teve início a cerimónia de homenagem aos veteranos falecidos bem como a comemoração do 9º aniversário do monumento. Os participantes  seguiram depois para o estádio municipal local onde se realizou uma prova de saltos de paraquedas.

O convívio  prosseguiu durante a tarde com um almoço  no restaurante “O Braga”, no Vimeiro (e que teve 114 inscrições, segundo a organização)

Temos alguns vídeos que apresentaremos num próximo poste, a par de excertos do discurso do Jaime Bonifácio Marques da Silva. Encontrei alguns camaradas da CCP 121 e CCP 123 / BC 12, que serviram na Guiné, alguns do meu tempo (1969/71). (LG)

Fotos (e legendas): © Luís Graça (2014). Todos os direitos reservados.

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Nota do editor:

Último poste da série > 3 de setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13565: Convívios (621): Encontro do pessoal da CART 6250, realizado no dia 24 de Agosto de 2014 em Leiria (Luís Marcelino)

sábado, 6 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13580: Bom ou mau tempo na bolanha (65): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (5) (Tony Borié)

Sexagésimo quarto episódio da série Bom ou mau tempo na bolanha, do nosso camarada Tony Borié, ex-1.º Cabo Operador Cripto do CMD AGRU 16, Mansoa, 1964/66.





Resumo do quinto dia de viagem


Já lá vai quase meio século, uns dias depois de regressar à nossa aldeia natal, vindos do que se dizia na altura “cumprimento do dever nacional, na então província da Guiné”, num qualquer momento em que a “menina Teresa”, nos deixava livres, fomos lá cima à montanha, à serra do Caramulo, visitar um companheiro que infelizmente regressou mais cedo, estava lá esperando os seus últimos dias, em tratamento, num daqueles Sanatórios que naquele tempo por lá havia, pois devido “aos bons tratamentos” que recebeu durante a sua estadia em cenário de guerra, contraiu a doença da tuberculose, que naquela altura matava como qualquer bala disparada por uma qualquer arma inimiga. Já há algum tempo vos contei a sua triste história, que em muitos momentos me vem ao pensamento e me vai acompanhar também pelo resto dos meus dias.

Nesses verdes anos éramos jovens, toda aquela paisagem de montanha nos parecia bonita, e hoje, passado tantos anos, faz-nos lembrar o cenário que neste dia presenciámos. Era parecido, mas em muito menores proporções, da montanha alguma neve, rebanhos de animais, floresta e um grande lago entre pedras de granito.


Pois nós, depois de sairmos da cidade de Conrad, onde dormimos, já perto do Canadá, fizemos um desvio seguindo pela estrada número 2, depois pela estrada número 89, estávamos no “Glacier National Park”, que se situa no estado de Montana, ao longo da fronteira com as províncias canadianas de Alberta e British Columbia.

Neste parque podem encontrar-se duas cadeias montanhosas, mais de 130 lagos, mais de mil espécies de plantas e centenas de espécies de animais. Trata-se de uma zona de ecossistema praticamente virgem que se estende por 4101 km². Faz fronteira com o Parque Nacional Lagos Waterton e os dois parques constituem o “Parque Internacional da Paz Waterton-Glacier”, o primeiro parque internacional criado em 1932. Ambos os parques foram designados reservas da biosfera em 1976 e foram considerados Património da Humanidade no ano de 1995. Dizem que alguns glaciares foram formados há 170 milhões de anos e, por volta de 1910, muitos hotéis e chalés foram construídos em alguns lugares estratégicos do interior do parque, assim com algumas estradas, proporcionando acesso a veículos automóveis, o que podemos comprovar com muitos animais, ainda um pouco selvagens a esconderem-se nas matas quando circulávamos pelas estradas do interior, tais como, cabras de montanha, ursos pretos ou castanhos, veados, lobos e algumas manadas de bisons, estes atravessando a estrada, na maior das calmas.



Pela tarde atravessámos a fronteira para o Canadá, onde se acredita que a origem do nome Canadá venha da palavra iroquesa kanata, que significa aldeia ou povoado. Por volta do ano de 1535, nativos americanos vivendo na região, utilizaram a palavra para explicar ao explorador francês Jacques Cartier, o caminho para a aldeia de Stadacona, local onde se pensa que se encontra atualmente a cidade de Quebec. Cartier utilizou a palavra não somente em referência a Stadacona, mas como a toda região sujeita ao domínio de Donnacona, então cacique de Stadacona. Por volta de 1547, mapas europeus passaram a nomear esta região, acrescida das áreas que a cercavam, pelo nome Canada. A partir do século XVII, aquela parte da Nova França, situada ao longo do rio São Lourenço e das margens norte dos Grandes Lagos, era conhecida como Canadá. A colonização europeia começou efetivamente no século XVI, quando os britânicos, e principalmente os franceses, se estabeleceram pelo Canadá. Os britânicos não tiveram uma forte presença no antigo Canadá, instalando-se originalmente na Terra de Rupert, uma gigantesca área que posteriormente daria origem aos territórios do Noroeste, Manitoba, Saskatchewan e Alberta, província esta por onde nós atravessámos a fronteira, sendo recebidos com muita atenção e gentileza. Todavia, a região que actualmente compõe as atuais províncias de Nova Escócia e Nova Brunswick, estavam todas nas mãos dos franceses. A Nova França (Nouvelle-France) continuava a expandir-se, mas essa expansão não foi bem aceite pelos britânicos e muitos colonos, desencadeando uma série de batalhas que culminou, em 1763, no Tratado de Paris, no qual os franceses cederam seus territórios da Nova França e outras áreas aos britânicos.



Com o “Canada Act”, de 1982, o nome oficial do país passou a ser simplesmente Canadá, assim escrito nos dois idiomas oficiais do país, o inglês e o francês, o que podemos comprovar, pois todos os letreiros oficiais ao longo das estradas são escritos nas duas línguas.

Já chega de história, continuando, entrámos pela província de Alberta, seguindo por algum tempo para norte, sempre encostados à cordilheira de montanhas que vêm do estado de Montana, nos USA, desviando-nos para a cidade de Calgary, onde parámos para ver o Parque Olimpico, entre outras coisas, continuando rumo ao norte, agora na auto estrada número 2, que nos haveria de levar à cidade hospitaleira de Red Deer, onde dormimos.

Neste dia percorremos 525 milhas, com o preço da gasolina entre $1,17 e $1,52 (dólar canadiano) o litro.

Também gostávamos de vos dizer que no Canadá, a velocidade se mede, tal como em Portugal, em quilómetros e a gasolina se vende em litros.

Tony Borie, Agosto de 2014
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Nota do editor

Último poste da série de 30 de Agosto de 2014 > Guiné 63/74 - P13549: Bom ou mau tempo na bolanha (63): Da Florida ao Alaska, num Jeep, em caravana (4)

Guiné 63/74 - P13579: Blogpoesia (390): Poema de um ataque na guerra da Guiné (Armando Fonseca)

1. Mensagem do nosso camarada Armando Fonseca (ex-Soldado Condutor do Pel Rec Fox 42, Guileje e Aldeia Formosa, 1962/64), com data de 2 de Setembro de 2014:

Caros camaradas
Embora visite com frequência o blogue, há muito que não envio nenhuma mensagem mas, como encontrei agora nos meus escritos um pequeno poema escrito no principio do ano e do qual já não me recordava, resolvi enviá-lo para se assim o entenderem ser publicado.

Com os meus cumprimentos para todos os camarigos em especial para os editores que com todo o seu esforço e boa vontade nos vão dando informações.

Com um grande abraço:
Armando Fonseca (O Alenquer)


POEMA DE UM ATAQUE NA GUERRA DA GUINÉ


Esta arma que aqui vedes
Não era dos portugueses
Foi caçada numa noite
A guerrilheiros guineenses

Com esta ficaram outras
Que aqui não estão a aparecer
Estão decerto no Museu
Para o país não esquecer

Foi uma noite infernal
Que ainda não esqueceu
Eles ficaram lá todos
Mas de nós nenhum morreu

Foi numa pequena aldeia
Acabada de ocupar
Eles teceram uma teia
E vieram atacar

Como esta haviam mais duas
Faziam fogo infernal
Nós com armas como as suas
Defendíamos Portugal

Os que foram mais ousados
E do arame se aproximaram
Eram sete mas coitados
Todos eles lá ficaram

A nossa metralhadora
Manobrava o Vitorino
Mas também ele mais tarde
Sofreu o mesmo destino

Ficou-me bem na memória
A ocupação de Sangonhá
Era junto ao Senegal
E a guerra vinha de lá

Passados cinquenta anos
Estes versos estou escrevendo
Estou lembrando sem enganos
Parece que ainda estou vendo

E agora vou terminar
Mas não vou tentar esquecer
É sempre bom recordar
Pois recordar é viver

Armando Fonseca
Janeiro de 2014
(Direitos de Publicação reservados a autorização do autor)
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Nota do editor

Último poste da série de 1 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13557: Blogpoesia (389): Da minha janela... (J. L. Mendes Gomes)

Guiné 63/74 - P13578: Recordações de um "Zorba" (Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68) (14): Os Mortos da CART 1659 – “ZORBA”

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vitorino Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68), com data de 29 de Agosto de 2014:

Caros Camaradas e Amigos
Envio um texto de algo que estava já escrito a que acrescentei informações que recolhi entretanto.

Trata-se de uma situação que me tem preocupado, e que vive comigo diariamente. O Vítor José Correia Pestana, que também me influenciou a escrever o meu livro - e não só ele, porque tive em atenção todos que combateram principalmente na Guiné, isto porque foi lá que cumpri a Comissão de Serviço - como dizia o Pestana era um grande amigo, não querendo melindrar ninguém. Mas estive com ele em períodos das nossas vidas em que não tínhamos dinheiro nem para cantar um fado. O que era dele era meu. Com o tempo que tínhamos de serviço militar cheguei a pensar que não éramos mobilizados. Em Penafiel ao darmos a Especialidade ao pessoal da nossa Companhia chegámos a alugar um quarto. Como descrevo no texto pode-se ver os quartéis que percorremos. Nos princípios de 1966 prestámos provas para os Comandos.

Mas Camaradas, foi complicado escrever este texto, e tive o cuidado de colocar os nomes das pessoas. O Major que chamo de "Gordo", porque ele era mesmo gordo acho que apanhou uma "porrada" do Spínola. Se considerarem que não pretendem publicar agradeço que mo devolvam.

Trabalhei muito para o fazer. Parte conhecem já do primeiro texto que enviei para o Blogue, mas desta vez vão os nomes das pessoas. E arrependido estou de não ser mais eu quando escrevi o livro. Desta vez punha "boca no trombone".

A Guerra Colonial para mim não é uma novidade. Estive desde 1994 a 2005 na APOIAR, falei com muitos combatentes, digo combatentes porque nós somos combatentes. Aí o General Chito Rodrigues tem toda a razão.Conheço muita gente, tenho amigos, e foram eles que adquiriram o livro. Que apoios tive? A edição é minha e não tenho nem quero distribuidor. Enviei mais de 200 e-mails, mas foi com o telemóvel que cheguei às pessoas.

No dia 28 de Outubro vou fazer uma Apresentação do Livro na ADFA pelas 15H30. Esta vai publicitar a Apresentação no Jornal ELO; nas Delegações e Núcleos, por Cartazes e a própria ADFA vai enviar mensagens aos Associados que moram perto de Lisboa. Para a Mesa espero somente a presença de 2 convidados meus. Falei com o José Arruda já e pessoalmente e convidei já a Professora que fez a Apresentação no Lançamento. Vou fazer mais uma na Academia de Seniores de Lisboa e fui convidado para fazer uma Apresentação em Alhandra com o apoio da Junta de Freguesia e faço ainda uma outra na APOIAR. Excluindo o de Alhandra penso fazer todas as outras até fins de Novembro.

Se vender todos os livros - que não é muito provável - vou tentar fazer uma outra edição, revista e sem o capítulo da APOIAR. Aí vou poder introduzir novos textos que já escrevi, acrescentar mais umas fotos e entregar a uma Editora. Como já reúno as condições exigidas pela FNAC coloco-o à venda em todo o país. Estou em condições já de pôr a FNAC no assunto, mas o preço do livro é elevado, e tinha de ser vendido por um valor entre 26/27 euros o que é muito.

Aguardo uma resposta sobre este texto. Se vai para o Blogue digam, e se não vai digam na mesma.

A venda do livro em Monte Real prometia, mas às horas que iniciei os autógrafos é impensável. Devia ter começado mais cedo e os livros que levei nem chegavam. Muitos desistiram. A culpa é minha porque escrevi lá autênticos testamentos. E a fila de 20 pessoas transformava-se na venda de 3/4 livros. Na ADFA vou vender os livros antes da Apresentação.

Um abraço do Camarada da Tabanca Grande
Mário Vitorino Gaspar
A questão é que foi mais complicado escrever sobre o meu grande amigo Pestana do que escrever o livro.

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Os Mortos da CART 1659 – “ZORBA”

Mário Vitorino Gaspar

A Guerra que Aflige com seus Esquadrões

“Mas a guerra inflige a morte.
E a morte é o desprezo do Universo por nós.
Tendo por consequência a morte, a guerra prova que é falsa.
Sendo falsa, prova que é falso todo o querer alterar.”

Alberto Caeiro, in “Poemas Inconjuntos”


Dia 12/13 de JAN67 na Messe de Sargentos - No topo da mesa, de óculos escuros, o Furriel Miliciano Pestana que morreria a 12 OUT67

Fins de Outubro. Eu e o Furriel Miliciano Manuel Ferreira Jorge íamos de avião rumo a Bissau. As nuvens alvas não se desviavam e multiplicavam-se. Atreviam-se a desafiar o azul mais carregado das águas do mar, lá bem no fundo. Construções de castelos aqui e acolá. Mais à frente, montes enormíssimos de algodão branco sem forma. Umas outras, borradas de cinzento levíssimo, marchavam para o infinito do horizonte. Se não fosse o azul do céu mais límpido que inundava o avião, dir-se-ia ser a imagem de um pisa papéis, onde só destoava o avião. Um daqueles objectos, não só ornamento de escritório, com borboletas, flores, executados pelas mãos do homem. O Belo pincelado de arte poética. Acarinhemos os seus dons.

Deixáramos o aeroporto da Portela há pouco. Os trinta e cinco dias de licença, haviam terminado. Contabilizara-os, segundo a segundo. A guerra e seu espectro estacionavam lá em baixo. Avistava Bissau. Calado. A simetria arquitectónica das ruas e avenidas, davam um ar de arrumação, correspondia à assimetria de tudo o que se passava no meu interior.

Naquela terra morava a guerra. Ela estava lá, sentia-a novamente. A guerra borrou-me a mente e apossou-se de mim. Senti a tristeza inundar-me. Arrepiei-me. Queria chorar. As lágrimas escorriam por dentro. Senti ter os olhos vermelhos de choro engolido, tendo a angústia feito estremecer os pés, as mãos e todo o meu ser.
Fui atingido no coração que palpitava como o trote do cavalo na espera de touros em Vila Franca de Xira, ou como o matraquear da “costureirinha”. Rebentava-me o peito. Era um poço de lágrimas. Sentia ter deixado a vida para ir a caminho da morte.

A força de viver, aquela ânsia de viver jazia derrotada prostrada entre ruínas. Ia até às profundezas do oceano a meus pés, porque ora passava pela cidade ora pelo mar.
Embora estivesse o Jorge ao meu lado, senti-me só. Só. A dor era eu. Senti que se apropriava de mim sem pré-aviso. Comia-me. Mastigava-me e engolia-me. Saboreava-me trincando-me e eu devia ter o sabor de morte.
Bissau magoava-me e jazia a meus pés. Morri. O Boeing aterrou. Pensei, mas mal, que o desassossego ficasse encerrado no avião. Mas não. Transportei-o. O Jorge, ao contrário do que seria de esperar mantinha o silêncio.

Não sei por onde passámos, só recordo o Quartel-General, onde me apresentei, tendo de seguida me dirigido ao Hotel Portugal. Normalmente na esplanada existia sempre pessoal da minha Companhia que havia sido evacuado para o Hospital Militar, ferido ou doente. As mesas estavam cheias, como era hábito. Ouvi alguém em altos berros gritar:
– Meus Furriéis, ó meus furriéis!

Olhei encantado. Havia alguém para dar notícias de Gadamael Porto e Ganturé. Não vislumbrei ninguém, continuando a olhar em todos os sentidos. Olhos de combatente, atentos a tudo.
Vi então de onde partia aquela voz que não sabia de quem era. Era para mim, muito embora só tivesse ouvido “meu furriel”. Havia mais que um militar da minha Companhia.

- O Furriel Pestana e o Soldado Costa morreram! – Escutei da boca de não sei bem quem.

O Pestana era um grande e grande amigo. Um verdadeiro amigo. Partilhámos desde JAN66 o mesmo percurso. Fiquei parado. Estagnei. Hipnotizado. Junto à mesa de cervejas vazias. Senti a boca seca, passando a língua queda e seca pelos lábios. Não sabia o que dizer. Os meus camaradas estavam calados, olhando-me como que compreendendo aquela minha paragem no tempo. As lágrimas não saíam, entravam. Parecia mais um ente sobre a terra fabricado de pedra. Uma estátua de pedra...

Morte de Vítor Correia Pestana
12 OUT67

Morte de António Lopes da Costa
12 OUT67

Ao verem-me, pensariam decerto não ter sentimentos.
Seria possível. O Costa e o Pestana? - Pensei, olhando-os com ar espavorido. O Costa conhecia-o desde Penafiel, mas o Pestana, já há mais tempo, desde Janeiro de 66 na Escola Prática de Artilharia em Vendas Novas.

Fizera o mesmíssimo percurso militar que eu: Vendas Novas na EPA; RI 14 em Viseu; Rangeres, em Lamego no CIOE; Curso de Explosivos, Minas e Armadilhas na EPE em Tancos; Escola de Quadros no GACA 2, em Torres Novas; RAL 5 em Penafiel e RAC em Oeiras.

Começaram a falar:
– Meu furriel foram mortes estúpidas.

Tínhamos os dois primeiros mortos da Companhia. Os outros dez que haviam tombado, no dia 4 de Julho num rebentamento, todos civis, e que eu assistira.

- Mas como foi? - Perguntei, quebrando o silêncio...
- A malta da Companhia, destacada em Ganturé foi fazer aquela patrulha que é habitual, até à fronteira da Ex-Guiné Francesa, e faz o regresso pelo outro lado. Sabem o percurso. O Furriel Pestana recebeu ordens para armadilhar a zona e montou umas armadilhas. O Alferes Luís Alberto Alves de Gouveia decidiu que o regresso seria pelo mesmo percurso. O croqui foi feito só na ida, e não no sentido contrário. No regresso o furriel Pestana não queria vir por aquele percurso, expondo os seus argumentos, mas o alferes insistiu. O Costa ofereceu-se para acompanhar o nosso Furriel.
- Nunca tal se faz, é um princípio primário em Minas e Armadilhas. - Disse eu.

Senti repulsa. Entendi a amargura que me assaltara no avião. Era como tivesse sido alvejado. Não ia perdoar a asneira do Alferes Gouveia. Uma dor. Era importante que chorasse. Naquele momento era um nada. Uma escumalha repugnante. Um simples ser sem fado.
O Pestana e o Costa deveriam estar vivos.

Escrevi numa carta que bem exemplifica o que sentia: - “Estou farto de estar em Bissau, aqui só se fala em guerra”.

Partimos de imediato numa avioneta fretada porque queria conhecer a verdade. Chegámos a Gadamael Porto. Notava-se uma tristeza naqueles meus camaradas de armas. Mas a vida não parava e as operações não cessavam.
Havíamos de sair dali vivos, nem que para tal tivéssemos que matar. Matar sempre. Aguardei a visita do Alferes Gouveia, depois de me informarem que o Vítor José Correia Pestana e o António Lopes da Costa tinham morrido no dia 12 de Outubro de 1967.

Avistei finalmente o Alferes Gouveia, o único culpado. Estava com um ar triste. Fez-me um sinal com a mão. Olhei-o nos olhos, e sem raiva disse-lhe, sem sequer o cumprimentar:
- Matou o Pestana e o Costa. Você é o culpado da morte deles...

Não me respondeu.


 Morte de Manuel Ferreira da Silvanum ataque a Ganturé
26MAR68

Em 26 de Março de Março de 68 morreu num ataque a Ganturé o Soldado Manuel Ferreira da Silva, sendo atingido com estilhaço na cabeça encontrando-se dentro de um abrigo.
Vim de licença em 1968 – por altura do Carnaval – e fui levar a Abitureiras, Santarém sua terra natal, alguns haveres dele à família. Um dia para esquecer porque toda a família conhecia os laços de amizade que nos unia. Fui por momentos, o filho, primo ou outro ente querido. As suas lágrimas verteram-se sobre o meu rosto. Regressei com urgência depois de ser chamado ao Quartel-General, e fui transportado numa avioneta das NT.

Em Bissau falava-se de uma grande operação na zona de Guileje. Era a Guerra do Raúl Solnado. Quem comandou essa operação foi o Capitão Cadete, que conheci no CISMI em Tavira como Alferes. Esta operação foi “escondida a 7 chaves”.
Inicialmente a CART 1659 – como estava no final da Comissão – foi montar segurança a Mejo, após alguns dias e devido às evacuações e muitas insolações tivemos de avançar. A Artilharia e a Força Aérea estiveram uns dias a bombardear o objectivo. Existia a informação que o PAIGC se tinha reforçado, e segundo me disse o Capitão Cadete tinham 20 canhões sem recuo apontados para a bolanha.

O Exército era a primeira força a avançar, e a minha Secção – também reforçada estaria na frente – Paraquedistas, Comandos e Fuzileiros entrariam no objectivo. Uma avioneta andava sobre as nossas cabeças, e o Capitão Cadete não gostou e informou qual o estado de espírito das NT. O Major gordo (tenho ideias do seu nome mas não arrisco) aterrou com um camuflado acabado de sair do Casão e verificou que não tínhamos comida nem água. Deu ordens para abandonarmos a operação. Segundo dizem o Spínola não gostou.

Entretanto em Gadamael sempre que encontrava o Alferes Gouveia – e era quase diariamente – repetia que ele matara o Pestana e o Costa. Nunca me respondia. Vi que sofria. Falei com todos para saber pormenores sobre o sucedido, e todos se calavam, talvez por saberem que o Pestana era um amigo de peito. Terminada a Comissão tentei saber o que se passara. Pior ainda. Após o 25 de Abril de 74 voltei à carga.

Como a CART 1659 não realiza almoços convívios foi sempre complicado falar com alguém que tenha assistido ao sucedido. Enviei um e-mail a Joaquim Ferreira Alves, mas não obtive resposta e, um dia estava no Hospital dos Lusíadas e falei com ele. Calou-se, mas depois de insistir disse-me que tinha participado nessa patrulha e contou-me com emoção que tinham regressado da fronteira pela mesma via da ida. Nunca tal se fizera. O Pestana após se opor porque o croqui estava feito com referências da ida para a fronteira acabou por avançar. O Costa ofereceu-se para o ajudar a encontrarem as armadilhas.

Tudo isto já eu sabia. Quanto à sua morte, o Pestana quando vê a granada armadilhada já é tarde. Para tentar salvar a vida dos camaradas mais próximos, lança-se sobre a granada. O Costa é atingido e fica sentado – julgo que encostado a uma árvore – e quando todos o julgam vivo, verificam que morrera, sem notarem sinais de ter sido atingido. O Pestana praticamente sem braços e pernas e com um buraco na barriga, não morrera. Pedem evacuação e um Médico que por mero acaso estava na zona ainda o apoiou. O Pestana pedia aos seus camaradas para lhe darem um tiro na cabeça. Morreu com o Costa a 12 de Outubro de 1967, curiosamente no dia que eu fui dado como morto e abatido ao Serviço por falecimento.

Na História da Unidade consta: Morto por Acidente (os dois casos). No Arquivo Histórico-Militar – no Tomo “Mortos em Combate” pode-se ler:
- Causa da Morte: Acidente com arma de fogo
- Observações: Na instalação de uma armadilha.

Isto em ambos os casos. Julgo que escrevem para estúpidos. Foi um Acidente com uma arma de fogo, na instalação de uma armadilha? Como pode ser? O Pestana não instalava uma armadilha, ela estava lá instalada e por ele, e quem manuseia explosivos não está com a arma de fogo.
Depois o Costa que não montava nem desmontava – isto porque na CART 1659 só quem manuseava minas e armadilhas eram os Especialistas – come pela mesma medida.

Na minha opinião Morreram em Combate – e é por tal que luto – e que seja reposta a verdade.
Quanto ao Alferes Miliciano Gouveia a informação que possuo é que se suicidou na Madeira.
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Nota do editor

Último poste da série de 6 de Junho de 2014 > Guiné 63/74 - P13248: Recordações de um "Zorba" (Mário Gaspar, ex-Fur Mil At Art, MA, CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68) (13): T/T Uíge: ementa dos sargentos no dia 2 de novembro de 1968, e o filme "Negócio à italiana" com o Alberto Sordi

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13577: Os nossos capelães (3): O capelão do BCAÇ 619 ia, de Catió, ao Cachil dizer missa... Creio que era Pinho de apelido, e tinha a patente de capitão (José Colaço, ex-sold trms, CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65)


Guiné > Região de Tombali > Cachil > CCAÇ 557 (,Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) >  O José Colaço operando o seu rádio.


Guiné > Região de Tombali > Cachil > CCAÇ 557 (,Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65) >  Visita do comandante de batalhão e do capelão.

Fotos: © José Colaço (2014). Todos os direitos reservados.


1. Texto do  José Colaço (ex-sold trms, CCAÇ 557, Cachil, Bissau e Bafatá, 1963/65)

Pouco ou nada  posso adicionar ao tema capelães que eu conheci (*)... 

Um que conheci e que já comentei foi o capelão de Catió que ia rezar a missa ao Cachil. Após a missa era normal ter a visita no posto rádio do padre com os seus argumentos para que eu na próxima missa não faltasse e eu,  como sempre,  respondia-lhe com as desculpas esfarrapadas de estar em escuta  permanente ou catalogar serviço de mensagens urgentes e confidenciais.

Era um homem simpático,  para ele não não havia patente militar,  eram todos militares e irmãos, admitia até certas controvérsias sobre a religião,  tais como a vida para além da morte que defendia convictamente.

A foto que junto, documenta a visita ao ao quartel do Cachil do tenente coronel  Narcélio Fernandes
Matias. Este capelão de que falo,  creio que com a patente militar de capitão e de nome Pinho,  é o primeiro  da foto que está com camisa clara, calça camuflada e quico;  a seguir de camuflado, quico e óculos escuros, está o tenente coronel  Narcélio Fernandes  Matias,  comandante do BCAÇ 619 de Catió; mais alto de frente e em tronco nu o capitão Ares,  comandante da  CCAÇ 557... Todos os outros militares em tronco nu (uniforme autorizado no Cachil inclusive barba e cabelo...)  eram de certeza elementos da 557.

Um abraço
Colaço

Guiné 63/74 - P13576: Os nossos capelães (2): Convivi com o ten mil Gama, de alcunha, "pardal espantado"... Muitas vezes era incompreendido, até indesejado por alguns, pois tinha coragem para denunciar os abusos, quando os presenciava (Domingos Gonçalves, ex-allf mil, CCAÇ 1546 / BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68)

1. Texto, com data de ontem, de Domingos Gonçalves, ex-Alf Mil da CCAÇ 1546/BCAÇ 1887, Nova Lamego, Fá Mandinga e Binta, 1966/68)


Assunto - Capelães militares


Convivi com o capelão do batalhão de infantaria, a que pertenci, o padre Gama. O primeiro nome já não o recordo. Tinha, na altura, o posto de tenente, o que me leva a pensar que terá pertencido,
anteriormente, a outras unidades.

Era um homem bom. Chamavam-lhe pardal espantado. A alcunha vinha-lhe do facto de passar os seu dias a correr de um lado para o outro, de destacamento para destacamento, de companhia para companhia, movido pelo desejo de a todos ajudar um pouco.

Muitas vezes era incompreendido, até indesejado por alguns, pois tinha coragem para denunciar
os abusos, quando os presenciava.

Era um homem desprendido dos bens materiais, e levava uma vida humilde.

Um abraço amigo,

Domingos Gonçalves
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Nota do editor:

Último poste da série > 5 de setembro de  2014 > Guiné 63/74 - P13575: Os nossos capelães (1): Conheci em Bedanda o ten mil Pacheco Pinho... Ia visitar-nos uma vez por mês para dizer missa... E 'pirava-se' logo que podia (Rui Santos, ex-alf mil, 4.ª CCAÇ, Bedanda, 1963/65)

Guiné 63/74 - P13575: Os nossos capelães (1): Conheci em Bedanda o ten mil Pinho... Ia visitar-nos uma vez por mês para dizer missa... E 'pirava-se' logo que podia (Rui Santos, ex-alf mil, 4.ª CCAÇ, Bedanda, 1963/65)

1. Texto de Rui Santos, com data de ontem, e em resposta a um pedido dos editores para se evocar aqui as nossas impressões e recordações dos nossos camaradas capelães:


Amigo Luís Graça:

Conheci um, em Bedanda, o padre Pinho, tenente capelão,  que cada vez que ía a Bedanda estava sempre pronto a "pirar-se" tal o receio que tinha dos sistemáticos ataques dos nossos vizinhos.

Excelente homem, amigo de todos os fiéis, ficou um pouco zangado comigo porque atrasou a Missa do dia 8 de Dezembro de 1963, por causa de mim, pois eu tinha vindo de uma patrulha donde vinha estafado, depois de percorrer duas dezenas de quilómetros e ter mergulhado num rio para salvar uns "marotos" de uns soldados do meu pelotão de se afogarem e ter recuperado diverso material de guerra que eles deixaram afundar-se.

É claro que, com este dia, a missa, prevista para as 21h00.  só foi começada ás 22h00... E mesmo assim penso que ainda adormeci,  agarrado a um pilar do varandim onde a celebração litúrgica  teve lugar.

Todos nós sem excepção gostávamos do padre Pinho, e até lhe achávamos piada, com a velocidade em ele agarrava a pequena mala dos seus pertences, quando se ouvia o avião...

Não me fez mal a guerra que levei na desportiva, por vezes arriscando mais a vida do que o necessário mas... Eram os meus 22 anos de vida, fui criado numa quinta, e aquilo para mim ... era campo.

O nosso padreco Pinho ía-nos visitar uma vez por mês, dava missa ... se possível não dormiria em Bedanda estando sempre de ouvido á escuta a tentar ouvir a chegada do avião.

Já em Bolama, não conheci senão o padre da igreja da cidade, e era um quartel que albergava entre guarnição normal, recrutas e grupos de passagem cerca de 600/700 homens.

Gostaria de o ver mas ... deve ser tarde, penso.

Se quiseres mais algo diz, quanto ás outras questões [da sondagem]  (*), abstenho-me de dar a minha opinião.

Abraço

Guiné 63/74 - P13574: Notas de leitura (629): "Quebo, Nos confins da Guiné", por Rui Alexandrino Ferreira (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 25 de Agosto de 2014:

Queridos amigos,
O confrade Rui Alexandrino Ferreira é um sanguíneo, gosta de emoções fortes, arrebata-se, indigna-se, põe tudo na narrativa em que desorienta o leitor que procura em vão a cronologia da comissão, há sempre interferências, há sempre amigos a ser convocados, uma história a ser contada, de quando em vez há uma pontinha de azedume e não esconde que se considera mal tratado no campo das condecorações.
O livro recai sobre si como uma homenagem, é também uma convocatória de amigos. O general Pezarat Correia que com ele acamaradou em Aldeia Formosa dirá mesmo que o autor “aliava ao seu entusiamo contagiante uma notável dose de bom-senso, o que lhe permitiu aplicar a sua coragem, o seu sentido de disciplina, o seu gosto pela decisão, na medida e no sentido convenientes”.

Um abraço do
Mário


"Quebo, nos confins da Guiné", Rui Alexandrino Ferreira

Beja Santos

"Rumo a Fulacunda", de Rui Alexandrino Ferreira, Palimage 2000, é a história de um alferes miliciano natural de Angola que veio combater no Sul da Guiné e deixou um depoimento por sinal bem controverso, a sua recensão está publicada no nosso blogue(*).

Surge agora "Quebo", também editado pela Palimage, são reflexões e divagações de Rui Alexandrino Ferreira enquanto capitão miliciano, de novo na Guiné, desta feita à frente da CCAÇ 18. A obra inclui diferentes depoimentos e talvez valha a pena fazer recurso do que o general Pezarat Correia escreve sobre a região da Aldeia Formosa ou Quebo. Pezarat Correia vem com o BCAÇ 2892, a partir de Novembro de 1969 é aqui oficial de operações. 

Chama-se o sector S-2, este batalhão que se derrama por Nhala, Aldeia Formosa e Buba, estava reforçado com mais três companhias operacionais no setor sob comando do COP 4, disseminadas por Empada, Mampatá, Chamarra e Pate Embaló. É uma força militar de grande significado, a que se juntam um destacamento de fuzileiros especiais, duas companhias de milícias e um grupo de caçadores furtivos. A tarefa prioritária é a contrapenetração dos efetivos do PAIGC provenientes da República Guiné Conacri, estes efetivos usavam os chamados corredores de Missirã, Guileje e Buba para atingirem os seus santuários no Sul e até à região Centro-Leste, designadamente a área do Xitole. 

O general Pezarat Correia sintetiza do seguinte modo:

  “No Sul da Guiné as zonas mais férteis para a agricultura estavam todas nas mãos do PAIGC. Os seus grupos circulavam aí com algum à vontade e tinham bases de apoio aos guerrilheiros, tornando muito mais curtos e menos vulneráveis os troços dos corredores de abastecimento suscetíveis de serem intercetados pela contrapenetração”

Pois é neste ambiente geográfico que em Janeiro de 1971 se integrou a CCAÇ 18 comandada por Rui Alexandrino Ferreira e tece vibrante elogio ao desempenho deste oficial, trata-o como um combatente de eleição, realça o seu relacionamento com oficiais sargentos e praças feito de camaradagem e sem qualquer perda de ascendente para as suas funções de comando.

Rui Alexandrino Ferreira foi comandante de um grupo de combate da CCAÇ 1420 entre 1965 e 1967. Não se ambientou à sua vida numa repartição da fazenda em Sá da Bandeira, aceitou frequentar o curso de oficiais para capitães, temo-lo de novo na Guiné em Agosto de 1970. 

Colocado à chegada na CCAÇ 2586 dela transitou para a CCAÇ 18. Terminará esta segunda comissão em Setembro de 1972. Começou por ir para Pelundo onde fez boas amizades. Feito o IAO em Bolama, rumaram para Buba. Vê-se que é um bom conversador e contador de histórias, é delirante a confrontação entre a mulher de um major e um oficial médico, a senhora resolver ir armada com a pistola do marido para a messe de oficiais intimidando o médico a retirar-se, caso não o fizesse abria fogo.

É pena que o autor tenha entendido dar libre curso aos seus sentimentos relegando para segundo plano o historial da CCAÇ 18 no Quebo, vai divagando e pondo antigos camaradas a depor sobre as suas vivências de tal sorte que se entrecruzam comissões com o 25 de Abril, histórias pessoais com operações, a narrativa de amizades como a que a Rui Alexandrino Ferreira manteve com outro capitão operacional de nome Horácio Malheiro, e assim chegámos a uma noite de atribulada de Natal em que elementos da CCAÇ 18 se envolveram em confronto mortal com militares do BCAÇ 3852. 

Segue-se uma nova leva de depoimentos avulsos, todos rendem homenagem ao capitão Rui, há mesmo quem conte a história da sua vida, depois o autor aproveita para contar histórias mais ou menos pícaras que escaparam ao livro anterior, Rumo a Fulacunda, increpa-se contra a guerra colonial, sem deixar de elogiar a adaptação do militar português, como escreve: 

“E se tivermos em linha de conta que ao longo de treze anos arrastados e uma guerra penosa e dura lutaram os filhos de um povo desamparado e simples, sozinhos contra tudo e contra todos, batendo-se em manifesta inferioridade técnica de meios, dada a rápida evolução que o armamento da guerrilha vinha sofrendo, deixando com o seu valor, o seu imenso poder de adaptação que o seu sentido de desenrascanço, a sua grandeza de alma, incrédulo e estupefato, o mundo inteiro, naquela que terá sido a maior epopeia em África, da era moderna da história de Portugal, que longe de nos envergonhar nos deve encher de orgulho”.


Viseu - RI 14 - 21 de Junho de 2014 -  Lançamento do livro "Quebo, Nos confins da Guiné", de Rui A. Ferreira. O Major-General Pezarat Correia durante a sua intervenção

E ao terminar, um pouco antes de manifestar a sua indignação por não ter sido condecorado com a Torre e Espada, o autor pretende ser esclarecido sobre várias situações e acontecimentos, como enuncia: 

“1 – Estaria a Guiné em condições de se tornar independente? Em caso negativo, porque não se prepararam primeiro os quadros? 2 – Estava a guerra perdida pelos portugueses? 3 – Quem mandou matar Amílcar Cabral? 4 – Foi um êxito ou um desastre a operação Mar Verde? 5 – Quem traiu os majores na chamada “Chacina do chão Manjaco”? 6 – Foi apurado em auto, ou não, a responsabilidade de alguém sobre a tragédia do Corubal onde morreram afogados 47 militares? 7 – Porque não se realizou, relativamente ao abandono de Guileje, o julgamento de Coutinho e Lima? Quais os motivos para uma amnistia tão rápida? Porque não perseguiu o julgamento todo o caminho que lhe faltava? Quem tinha medo que a verdade não correspondesse à sua?”.
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Notas do editor

(*) Vd. poste de 22 de Maio de 2010 > Guiné 63/74 - P6448: Notas de leitura (111): Rumo a Fulacunda, de Rui Alexandrino Ferreira (Mário Beja Santos)

Último poste da série de 1 de Setembro de 2014 > Guiné 63/74 - P13556: Notas de leitura (628): A Tricontinental: Quando Amílcar Cabral se tornou num teórico mundial da revolução (2) (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P13573: Parabéns a você (784): José Marcelino Martins, ex-Fur Mil TRMS da CCAÇ 5 (Guiné, 1968/70)

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Nota do editor

Último poste da série > 4 de setembro de  2014 > Guiné 63/74 - P13569: Parabéns a você (783): Armor Pires Mota, ex-Alf Mil da CCAV 488 (Guiné, 1963/65); José Câmara, ex-Fur Mil da CCAÇ 3327 (Guiné, 1971/73) e Torcato Mendonça, ex-Alf Mil da CCAÇ 2339 (Guiné, 1968/69)

quinta-feira, 4 de setembro de 2014

Guiné 63/74 - P13572: Agenda cultural (334): Noites de Verão no Museu do Chiado, com Kimi Djabaté, o grande artista lusoguineense, oriundo de Tabatô, lídimo representante da tradição da música afromandinga, sexta-feira, 5 de setembro de 2014, 19h30... Entrada livre.



Com a devida vénia ao sítio oficial do Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado, Lisboa



Local: Noites de Verão no Museu do Chiado

Data: 5 de Setembro

Horário: 19:30

Entrada: LIVRE

MNAC - Museu do Chiado

Sinopse:

“KIMI DJABATÉ

Escritor de canções, vocalista, balafonista, guitarrista e crucial embaixador da cultura mandinga e guineense em Portugal e no mundo, Kimi Djabaté - é pacífico dizê-lo - é hoje um dos grandes artistas de palco a residir no nosso país, que também se tornou o seu, já há mais de uma década.

Trata as suas canções com profunda noção de ofício, trabalhando-as com a precisão e o critério dos sérios e serenos. É filho de uma família secular de músicos, que se filiou na Guiné Bissau há mais de dois séculos, e é seu assunto vivencial, social e cultural tratar na forma de música as questões e resoluções de sempre e de hoje; a observação do mundo através da oralidade da música, algo que não tem como evitar tornar contemporâneo, sempre devidamente enriquecido por tanta tradição de o fazer.

Contos sobre moral, ética, cidadania, honestidade, amor, família e as grandes questões existenciais. E mesmo que as palavras que lhe saiam da boca soem a ouvidos brancos como código, a transparência humana e emocional fala a língua de todos nós. Numa altura em que se dão os últimos toques para a edição do seu próximo álbum, podemos esperar várias canções dos seus anteriores 'Terike' e 'Karam', o último dos quais o seu primeiro álbum com boa distribuição a nível mundial, que lhe rendeu rasgadíssimos elogios da imprensa internacional, e uma constantemente preenchida agenda em palcos na Europa, América e Ásia.

É com enorme prazer que o voltamos a receber no Jardim das Esculturas do MNAC, onde já nos ofereceu uma das grandes atuações que tivemos o privilégio de produzir ao longo dos anos para este ciclo.”

Vd. também Bandcamp -http://kimidjabate.bandcamp.com"

O nosso blogue apoia os artistas guineenses. O Kimi Djabté tem já 9 referências no nosso blogue.

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Nota do editor:

Último psote da série > 18 de julho de  2014 > Guiné 63/74 - P13413: Agenda cultural (333); Exposição de pintura de Joana Graça (n. Lisboa, 1978), no "Wine Up Lisboa", bar de vinhos e clube social, Rua do Alecrim, n.º 49, Lisboa... Hoje, às 18h00. Apareçam.


Guiné 63/74 - P13571: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (28): Guileje?!... Outra vez?!... (António Martins de Matos, TGen Pilav )

1. Mensagem do nosso camarada António Martins de Matos, TGen Pilav Ref (ex-Tenente Pilav, BA 12, Bissalanca, 1972/74), com data de 2 de Setembro de 2014:


Guileje, outra vez!

Após alguns eventuais estudos de EM, as Altas Chefias tinham chegado à conclusão que a melhor maneira de prepararem os jovens militares acabados de sair da Academia para uma vida de “futuras comissões no Ultramar” era dar-lhes uma primeira “experiência ao vivo” por terras da Guiné.
E qual o melhor local para “sentirem a coisa”? Guileje!!!

Não sei quantos Aspirantes eram, mais de 4 e menos de 8, alguém os terá levado até ao Guileje, visita e pernoita no quartel, devem ter aguentado uma manga de briefings, mosquitos, pius e … blá blá….
Até arrisco a dizer (especulação, alguém pode vir a confirmar ou negar tal pensamento) que terão visto e ouvido uns tiros de obus.
Depois havia que os trazer de novo à civilização, a missão da FAP consistia em ir recolhe-los e transportá-los de novo para Bissau.

20 Junho 72, já tinha um mês de Guiné e 11 horas de DO-27, completado o treino operacional (aterrar em Bula, Binar e Biambe), feito a minha primeira missão e, para além das do treino operacional já conhecia outras duas pistas, Tite e Fulacunda.
Coube-me ser o n.º 2 de uma formação de dois DO-27, o meu era o 3329, o piloto que liderava a operação parece que era daqueles que já tinha barbas, eu ainda era um imberbe periquito, nada de importante, não fazia a mínima ideia onde era o Guileje mas também não era importante, bastava-me seguir o chefe, havia de chegar ao destino.
Como ultimo conselho alguém amigo tinha-me dito para ter atenção à travagem já que a pista acabava na porta do quartel (que era de cimento).

 Posições relativas de Bula, Binar e Biambe

Posições relativas de Tite e Fulacunda

Ao fim da tarde lá descolámos de Bissau rumo Sul, apontados a Guileje, só que….

Época das chuvas, trovoadas, cumulo-nimbos, dilúvios à frente, ao lado, por detrás, nunca tinha visto chover tão grosso e por tanto tempo, lá me fui aguentando sem perder de vista o outro avião, mas com aquela sensação estranha de, em vez de avançarmos para o destino, andarmos às voltas.
Uma hora depois deste bailado vi algo que me fez disparar a adrenalina, um raio passou perto de mim a acertou lá em baixo no capim que, apesar de tanta chuva, logo começou a arder.
Devo ter dito algo pelo radio do tipo “Ó Janeca, olha lá o pingo da solda” de modo que o vetusto chefe da missão resolveu deixar-se de voltas e voltinhas e aterrar na pista mais próxima, esperando que aquele mau tempo acabasse por passar.
Depois de mais umas voltas finalmente lá encontrámos uma pista e aterrámos, só então me apercebi que, apesar de estarmos a voar há mais de uma hora, ainda só estávamos em … Bolama.
Os aviões apenas estacionados na placa, ao olharmos para Sul ia-me dando uma “travadinha”, vimos uma enorme mancha de “borrasca”, ali mesmo ao pé e a avançar para nós.
“Vamos embora JÁ”… e o grande chefe abalou.

 Localização de Bolama

Vide Carta da Provícia da Guiné 1:500.000

Sozinho, triste e abandonado, 40 dias de Guiné, lá me tentei desenvencilhar o mais rápido que podia e sabia, uma coisa era certa, tinha de descolar antes daquele mau tempo chegar, se ficasse no chão de certo que o vento me partia o avião.
Procedimentos a correr e muito atabalhoados, o inicio da descolagem acabou por coincidir com a ventania a chegar à pista, durante algum tempo ainda consegui manter o avião direito, depois as rajadas de vento tornaram o controlo da direcção difícil, o avião ficou tipo cata-vento, vi-me apontado a um dos embondeiros que ladeavam a pista.
Abortar a descolagem era má opção, continuei com o motor aos copos, em direcção à árvore.
Aqui um parêntesis, era periquito e com poucas horas no DO-27 mas tinha tido um grande instrutor.

Ao chegar perto do obstáculo… manche à barriga e flaps (todos) , o DO-27 parecia um elevador, logo passei por cima do embondeiro, como os pilotos costumam dizer… “na cagadinha”.

O regresso a Bissau demorou uns 15 minutos, os Aspirantes acabaram por ficar mais uma noite no Guileje, eu conheci mais uma pista (Bolama) e, com a ajuda do “Joãozinho Caminhante” … dormi que nem um justo!

Amigo José Almeida Brito [, foto de jornal, à direita], tenho saudades tuas, obrigado pelos teus ensinamentos, onde estiveres, este texto é para ti.
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Nota do editor

Último poste da série de 19 de Julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13415: Gloriosos Malucos das Máquinas Voadoras (27): De visita, com o seu neto, ao Museu do Ar, em Sintra, o Vitor Oliveira reencontra o T6, nº 1737, no qual voou no CTIG