Lisboa > Semanário "Expresso" >Edição de 15 de dezembro de 1973 >O capitão cubano Peralta no Tribunal Militar de 1º instância. Uma foto que a censura não deixou publicar. |
Caro: Ao passar hoje pelo blogue, de imediato me chamou a atenção a foto do heli aterrado no HM 2141, Bissau, contida no teu poste
E como a ti, também ela me suscitou um tal corropio de lembranças, que, acredita-me, quase me atordoam. Tentando alinhar ideias:
Como mecânico dos helis, foi exactamente
Bissau > 1969 > O Heliporto do HM 241. Foto de Jorge Teixeira (Portojo) (2010) |
Mas outra lembrança conseguiste, com o teu poste, desenterrar do fundo do meu subconsciente, a da evacuação do Capitão Peralta, a qual passo a transmitir, a quente, tal como a memória me debita.
Antes porém e à falta de outros registos, resolvi ir ao Google e digitar: Capitão Peralta.
Resultados:
(i) Ferido e capturado em 18 de novembro de 1969 durante a operação Jove, realizada pelos Páras [BCP 12] entre os dias 16 e 19, no corredor de Guileje;
(ii) A base dessa operação, a partir de onde os Paras foram heli-transportados, foi Aldeia Formosa.
Vamos agora à minha memória, que espero não me esteja a atraiçoar, sequer a iludir, e na qual (apesar da evidente redução de neurónios) quero ainda confiar.
Coloco os resultados dessa pesquisa em dois planos: das quase certeza (ou com menor grau de falibilidade) e o das incertezas associadas, que evidencio entre parêntesis.
Assim:
(1) Eu só não estava no voo em que viste o Capitão Peralta aterrar no HM 241, pelas condições extraordimárias em que decorreu essa evacuação, cujos contornos passo a descrever.
(2) Em operações como esta, em que, independemente da Tropa participante, a base se situava num aquatalamentos longe de Bissau, para aí se deslocavam normalmente: 5 helis + 1 helicanhão, transportando uma equipa de manutenção e uma enfermeira paraquedista.
Dali partiam, então, fazendo as viagens necessárias para, transportando 5 ou 6 militares por heli, os colocar, protegidos pelo canhão, na ZOPS..
Se a operação se resumia a um dia, permaneciam os helis nessa base em alerta, para: evacuações, eventuais transportes das Tropas para outras posições na mesma ZOPS e finalmente para a sua recuperação no final da Operação.
Nos casos em que a Operação fosse por mais de um dia, ficaria em todos os dias em que esse decorresse e na base da mesma, no minimo um heli de alerta (com Piloto, Mecânico e Enfermeira) para eventuais evacuações e o helicanhão para protecção destas e para intervenções de tiro, se solicitadas.
(3) Nesta operação em particular, a Op Jove, é seguro que estive presente, desde logo porque recordo perfeitamente o objectivo apontado para a mesma (nos helis e durante os voos, mesmo que não quiséssemos, ouvíamos muita informação dita classificada): captura do 'Nino'Vieira. .
(4) No dia 18 de novembro de 1969 (Precisei a data na citada consulta na Net), portanto no 3º dia da Operaçãp, voei (seguramemte de Aldeia Formosa) para essa ZOPS onde aterrei [, no corredor de Guileje], no helicóptero que fez a evacuação do Capitão Peralta, não continuando no voo para o HM de Bissau,
Porquê?
(5) Os Alouette III têm capacidade para transportar 6 passageiros, para além do piloto (este e mais dois à frente) e até 4 no banco traseiro.
Em evacuações com feridos em maca, essa capacidade ficava reduzida, pois para além dos 3 lugares à frente, normalmente ocupados pela tripulação (Piloto, Mecânico e Enfermeira, na maioria dos casos), apenas é possivel alojar 1 ou 2 macas na rectaguarda, que, por transportadas transversalemente, impedem (ou dificultam, algumas vezes me tocou vir meio sentado meio em pé, nas abas da maca) utilizar os lugares traseiros.
No caso desta evacuação (Cap Peralta), tendo sido determinado, no terreno, que o capturado devia ser acompanhado no voo por escolta armada, foi necessário ocupar, por quem a fez, um dos lugares destinados à tripulação.
Para resolver o problema e - repito - se a memória não me atraiçoa, registou-se um caso que me lembre único:
(6) O helicanhão, que fazia a protecção à evacuação, aterrou na ZOPS, nele tendo embarcado o mecânico (eu próprio) e voado (junto ao apontador) para Aldeia Formosa, donde posteriormente regressei a Bissau (outra nebulosa, é que não me recordo como - noutro heli ? de DO 27 ? ), pois no helicanhão não foi concerteza.
Como remate a estes factos, este voo no helicanhão foi para mim perturbante, pois que uns meses antes (Julho de 1969. o eu 3º mès de Guiné) estive também para voar (nesse caso por experiência passiva que, para sorte minha, não concretizei) no retorno duma outra Operação em Galomaro, voo esse com um fim trágico, traduzido no despenhmento do heli (a que assisti) ocorrido em Bafatá, com a morte do meu comandante, o maj pilav Rodrigues e dum camarada de todos os dias, o Machadinho - como lhe chamávamos - , Mecânico de Armamento/Apontador.
Um dia destes tentarei fazer o relato que me for possivel desta outra dramática ocorrência.
Voltando ao poste e à tua solicitação ao Jorge Félix (tantos Jorges), quase seguramente ele ainda estava nessa data na Guiné.
Como atrás referi, não me lembro se terá sido inclusive participante nos factos, em qualquer caso terá certamente presente memórias relacionadas e, quem sabe, como tem a sorte (que a FAP me coartou) de ter os seus registos de voo, pode buscar nos mesmos confirmações.
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Notas do editor:
(**) Vd. poste de 1 de Fevereiro de 2010 > Guiné 63/74 - P5741: Blogoterapia (142): Aquela janela virada para o heliporto (Jorge Teixeira/Portojo)
Mas a conclusão é: Será que o Jorge Félix [, ex-alf mil pil, BA 12, Bissalanca, 1968/70] se recorda ou até terá dado a sua colaboração a esta operação?
Por casualidade, o José Manuel Cancela também estava hospedado, na mesma altura, no mesmo Hotel Militar de Bissau. Mas no terceiro apartamento. Só o soubemos há dias quando entreguei esta foto - entre outras - para o Carmelita digitalizar e ele viu. Estórias de vida." (...)
(***) Vd. postes de:
15 ede março de 2021 > Guiné 61/74 - P22008: Notas de leitura (1346): Paparratos e João Pekoff: as criaturas e o criador, J. Pardete Ferreira - Parte III: Rui Angel, aliás, Pedro Rodriguez Peralta, capitão do exército cubano, o mais famoso prisioneiro da guerra colonial... Aqui tratado com humor desconcertante (e humanidade) (Luís Graça)
Apesar de toda a dor e angústia sentidas, uma grande alegria: ele estava vivo. Os sonhos continuavam adiados, mas não jogados fora. Uma nova etapa nas nossas vidas havia começado! (...)
26 de março de 2006 > Guiné 63/74 - P634: Uma mina na estrada de São Domingos para Susana (Manuela Gonçalves)
(...) O flagelo das minas continua e não sei mesmo se muitas delas não serão ainda daquelas que foram colocadas na guerra colonial. A coincidência transportou-me até [13 de] Novembro de 69.
Foi naquela mesmo estrada - de São Domingos para Susana - numa operação de reconhecimento da via, que o Unimog em que o maridão seguia, pisou uma mina anti-carro. No Unimog, uma outra mina anti-carro, levantada cerca de 300 metros antes, era transportada atrás e, por mero acaso, não rebentou, o que teria sido catastrófico para todo o pelotão!
A mina tinha sido accionada pelo pneu do lado direito, pelo que o maridão foi atirado para fora, em estado crítico, não tendo o condutor sofrido senão pequenos ferimentos, apesar da força do embate!
Um helicópetro transportou-o para Bissau, tendo acordado uns dias mais tarde numa cama no Hospital Militar, sem uma perna e tendo por companheiro de quarto o capitão Peralta, cubano, cuja captura tão noticiada era nos media de então. (...)
(*****) Sobre o Pel Caç Nat 60 e a mina que vitimou o alf mil Nelson Gonçalves: Vd. postse:
(i) Foi formado a 7 de Maio de 1968, em S. Domingos;
(vii) o primeiro comandante foi o ex-alf mil Luís Almeida, rendido pelo ex-alf mil Nélson Gonçalves (, ao tempo do BCAV 2876, São Domibgos, 1969/71);