domingo, 3 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14558: 11º aniversário do nosso blogue (2): o nosso primeiro poste, de 23/4/2004... Homenagem antes de mais à Mulher-Mãe (Mário Gaspar)

Mário Gaspar em Gadamael, já no final
da comissão, em 1968 
1. Comentário, ao poste P14507 (*), assinado pelo Mário Gaspar [ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68]:

(...) Trinta e cinco anos depois.
No 25 de Abril de 2004 presto a minha homenagem às mulheres portuguesas.
Que se vestiam de luto enquanto os maridos ou noivos andavam no ultramar.
Às que rastejavam no chão de Fátima, implorando à Virgem o regresso dos seus filhos, sãos e salvos.
Às que continuavam, silenciosas e inquietas, ao lado dos homens nos campos, nas fábricas e nos escritórios.
Às que ficavam em casa, rezando o terço à noite.
Às que aguardavam com angústia a hora matinal do correio.
Às que, poucas, subscreviam abaixo-assinados contra o regime e contra a guerra.
Às que, poucas, liam e divulgavam folhetos clandestinos ou sintonizavam altas horas da madrugada as vozes que vinham de longe e que falavam de resistência em tempo de solidão.
Às que, muitas, carinhosamente tiravam do fumeiro (e da barriga) as chouriças e os salpicões que iriam levar até junto dos seus filhos, no outro lado do mundo, um pouco do amor de mãe, das saudades da terra, dos sabores da comida e da alegria da festa.
E sobretudo às, muitas, e em geral adolescentes e jovens solteiras, que se correspondiam com os soldados mobilizados para a guerra colonial, na qualidade de madrinhas de guerra.

A maioria dos soldados correspondia-se, em média, com uma meia dúzia de madrinhas, para além dos seus familiares e amigos. Em treze anos de guerra, cerca de um milhão de soldados terá escrito mais de 500 milhões de cartas e aerogramas. E recebido outros tantos. Como este que aqui se reproduz. (...)

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Eu, Mário Vitorino Gaspar, estou inteiramente de acordo com o texto (**). 

No que diz respeito ao parágrafos que fala de Fátima, digo que discordo totalmente com a Igreja quando autoriza aquele rastejar. Enquanto em Fátima os pobres rastejam, não os critico, os ricos colocam nos mealheiros montes de dinheiro, possivelmente dinheiro sujo, e gozam os prazeres de uma estadia num Hotel de Fátima. Os pobres rastejam, brota sangue no alcatrão. Desde 1953 que assisti ao que acabo de dizer. A Igreja devia proibir que o povo se sacrifique daquela maneira. Costumo dizer "proibido proibir", neste caso proibia mesmo. É indigno, como outras questões em Fátima.

Decerto que estou de acordo com esse texto, mas acrescentaria talvez mais uns pós, isto em relação ao tema "Homenagem às Mulheres Portuguesas". Acrescentaria: ... Na Guerra Colonial, ficaria "Homenagem às Mulheres Portuguesas na Guerra Colonial"

Mulher-Mãe, minha primeira mulher; 
Mulher-Esposa; 
Mulher-Noiva; 
Mulher-Namorada; 
Mulher-Família... outras, 
e uma que considero ter muitos adeptos: 
Mulher-Prima. 
Muitos dos nossos camaradas namoravam primas e casaram-se.

A Guerra Colonial Portuguesa tem muito de comum com a Guerra do Vietname. Difere no que diz respeito às idades, os americanos eram mobilizados mais novos e não namoravam em comparação com os portugueses. 

Penso, penso eu... que no Vietname abundava a droga, e na Guiné vi a droga. As Praças "U" e os Caçadores Nativos, quando a encontravam.  ficavam doidos. Um dia vi-me atrapalhado para os segurar. Mas na zona onde estava, tenho a certeza absoluta: DROGA... NÃO!

Que droga maior que a Guerra? Anestesiados... anestesiados é o termo. O nosso interior é um enigma. Só na Guiné me apercebi das minhas capacidades e respostas para inúmeras questões. Podemos morrer, num cair e já está. Pode-se ser furado por montes de projecteis e não morrermos. Uma nativa em Ganturé, estava toda furada, intestinos nas mãos, pediu-me ajuda, e sem saber o que fazer, o Enfermeiro estava bem ocupado,  dei-lhe LM. Nunca cheguei a conclusões, mas o Furriel Enfermeiro, o meu Amigo Durães, disse-me que tinha feito bem.

Sucedeu-me, isto cá, aparecer um ex Comando junto de mim, pistola em punho, a dizer-me: "VOU MATAR-ME!"...  Respondi-lhe, logo sem pensar: "Então, mata-te". Não se matou, mas fiquei preocupado. Não o conhecia, tornei-me amigo do tipo.

QUERIA QUE OS NOSSOS CAMARADAS PARTICIPASSEM MAIS. SERIA VANTAJOSO QUE LESSEM, ACHO QUE GRANDE PARTE NADA LÊ.

Um abraço

 Mário Vitorino Gaspar

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(**) Vd.poste de 23 de abril de  2004 > Guiné 63/74 – P1: Saudosa(s) madrinha(s) de guerra (Luís Graça)

Guiné 63/74 - P14557: Parabéns a você (898): António Estácio, amigo Grã-Tabanqueiro, natural da Guiné e Delfim Rodrigues, ex-1.º Cabo Aux Enf da CCAV 3366 (Guiné, 1971/73)


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Nota do editor

sábado, 2 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14556: Blogoterapia (268): Vitórias (Juvenal Amado, ex-1.º Cabo CAR do BCAÇ 3872)

1. Mensagem do nosso camarada Juvenal Amado (ex-1.º Cabo Condutor Auto Rodas da CCS/BCAÇ 3872, Galomaro, 1971/74), com data de 28 de Abril de 2015:

A família junta o passado e o presente e perspectiva o futuro. 
Nesta foto estão os meus pais, irmãos, a minha mulher, a minha filha e sobrinhos, para além do Caramba. 
Três combateram na Guiné, um em Moçambique e o meu sobrinho prestou serviço durante o processo do referendo em Timor e mais tarde fez duas comissões no Iraque.
É a minha família mais chegada e quando estávamos todos era uma alegria. 

Um abraço a todos os camaradas
Juvenal Amado



VITÓRIAS

Sentado na enorme sala de espera das consultas externas do Hospital de Leiria, olho rostos, tento adivinhar o que se passa por detrás dos semblantes mais ao menos fechados...
Na sua maioria são gente para a minha idade e como o meu avô diria, eram rapazes do meu tempo.

Mas voltando aos “fregueses” da sala de espera, ponho-me a pensar que muitos dos homens foram combatentes, jovens, fortes, e hoje estão doentes, cansados das agruras da vida, saudosos daquele tempo em que afrontavam a vida como se nada lhes pudesse provocar beliscadura. Quantos estiveram na Guiné, Angola, Moçambique? Quantas esposas quanta madrinhas de guerra? Os progenitores são na esmagadora maioria uma recordação e uma saudade.
A saúde já não é a mesma e essa é que é a verdade indiscutível.

Há pouco tempo recebi a notícia de que o Silva dos Carvalhos estava a fazer hemodiálise e quando comentava o facto com outro camarada, fiquei a saber que o “Ermesinde” também está à espera de um transplante renal, o Narciso foi operado a tumor no cérebro, o Alfredo “estufa” teve um AVC e não sai da cama nem fala, também o “sacristão” esteve muito mal e isto para não falar nos que já nos deixaram.

Através dos semblantes dos utentes na sala de espera tento adivinhar o calvário que cada um está a passar por detrás do olhar absorto.
Quantos filhos e quantos netos terão? Quantas brigas, quantas derrotas e quantas vitórias, constarão na bagagem de cada um?
Os filhos e netos serão a sua vitória da vida sobre a morte?

Há dias assisti a um diálogo num filme que encerrava uma grande lição de vida.
Uma idosa judia, sobrevivente de um campo de morte nazi que ostentava a tatuagem de um número no braço e que estava muito doente, tinha ao redor da cama sete filhos, mais de uma dezena de netos e alguns bisnetos.
O médico disse – então tem aqui a sua família?
Ela respondeu, que sim e que aquela família, era a sua vingança sobre quem tentara aniquilá-la e através dela, toda a sua descendência. A prole tão numerosa era a sua vitória sobre os sofrimentos que lhe tinham infligido.

Fiquei a remoer nas suas palavras pois elas eram um grito de vitória, não em forma de batalha ou guerra ganha, mas sim em forma de sobrevivência e de prolongamento do seu nome, quando tudo tinham feito para lho apagar.

Em Monte Real também soube que alguns camaradas não estavam na sua melhor forma, mas mesmo assim ali estavam também a celebrar outros tempos, novas e velhas amizades. Alguns levaram esposas filhos e netos. Estarmos ali, foi celebrarmos uma vitória onde só a vida e a paz podem e devem ser vencedoras.

Juvenal Amado
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Nota do editor

Último poste da série de 2 de maio de 2015 > Guiné 63/74 - P14555: Blogoterapia (267): Num Ápice, fico Anestesiado, a Mente o Obriga (Mário Vitorino Gaspar)

Guiné 63/74 - P14555: Blogoterapia (267): Num Ápice, fico Anestesiado, a Mente o Obriga (Mário Vitorino Gaspar)

1. Em mensagem do dia 26 de Abril de 2015, o nosso camarada Mário Vitorino Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68), enviou-nos um texto de sua autoria como o título Num Ápice, fico Anestesiado, a Mente o Obriga.


“Eu me retiro com a consciência tranquila,
sentindo que cumpri meu dever,
de alguma forma,
com meu povo e meu país”.

Nelson Mandela


Foto: © Alexandre Miguel Marques Gaspar - Filho do Mário Gaspar


Num Ápice, fico Anestesiado, a Mente o Obriga
Mário Vitorino Gaspar

Comando… uma patrulha; segurança ou emboscada, os sentidos multiplicam-se.
Atento ao mínimo pormenor. A distância diminui. Pequena anã.
Os olhos ampliam as imagens. A pica beija o chão, meigamente bate. Se somos agressivos, rebenta. O coração cadenciado, melhor relógio do mundo. Depressa, não! A pica presa, como a vara do pastor.

Surge o inimigo, arde-me o fogo. O coração é mero sino manejado por um sacristão aprendiz. Num ápice, fico anestesiado? Mente… A mente desperta, som de trompete. Cerebral. Controlo!

Na mão enterro o medo. Invade a nudez do suco que morde o meu ser. Tem calma! Vislumbro, e logo de seguida… Oco o tempo sábio, trémulo de hora! Branco, tom pintado de nitidez. Carrego o corpo ser e saber. Crispa fogo… Coração, relógio solto de ponteiros das horas. Dentada no coração que chora.
Olho gigante cresce, visão global:
Mortos? Feridos? Evacuações, o radiotelegrafista tem de informar:
– Nenhum morto! Sete a evacuar!
– Disparo certeiro… E verdade verde pintada esperança.

Mas qual a memória, que matemática e fotografia? Os olhos munidos de lentes. Maquinetas fotográficas, certa memória…. Pausa… A liberdade só, regressa voando e mora dentro de mim.
Transformo-me em ave que voa na pauta.
Música nascida na pureza de musicais notas libertas:
Num Ápice, a anestesia morta, a mente sorri.

Evacuar. A morte espreita, numa nesga de entre o matagal.
– Não vejo! – Vomita o meu Soldado.

O helicóptero cai na terra perdida. A enfermeira florido sorriso:
– Espreite o céu que ri, rios de água nascente. Vê?

Olho sangue vermelho. Ferida espetada. De aço…Responde o herói Soldado:
– Tão linda que é! Flor… E branca neve algodão.
– Sete a evacuar…

O helicóptero esconde-se nas nuvens. Esvoaça… Esperança.

Mário Vitorino Gaspar
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Nota do editor

Último poste da série de 12 de março de 2015 > Guiné 63/74 - P14351: Blogoterapia (266): O Senhor M. Proust escreveu milhares de páginas "À la recherche du temps perdu"... Será que nós estamos escrevendo milhares de postes, à procura da juventude "perdida" na guerra? (Vasco Pires, ex-alf mil art. cmdt do 23º Pel Art. Gadamael, 1970/72)

Guiné 63/74 - P14554: Tabanca Grande (460): Nuno Nazareth Fernandes, que foi alf mil do BENG 447 e radialista em Bissau, 1972/74... Senta-se à sombra do nosso poilão, cabendo-lhe o lugar nº 684


Capa do livro "A engenharia militar na Guiné - O Batalhão de Engenharia" - Coord. Gabinete de Estudos Arqueológicos da Engenharia Militar. - Lisboa : Direcção de InfraEstruturas do Exército, 2014. - 166 p. : il. ; 23 cm. PT 378364/14  ISBN 978-972-99877-8-6. Cortesia de Nuno Nazareth Fernandes. Ìndice da obra: ver aqui.


 1. Mensagem do compositor (e nosso camarada da Guiné) Nuno Nazareth Fernandes, com data de ontem:


Meu Caro Luis Graça

Obrigado pela publicação (*). Agradeço me mantenha ao corrente desses encontros [da malta do blogue] pois farei circular a informação pelo pessoal do Beng 447. Aliás também nós nos reunimos uma vez por ano e os ex-oficiais em Lisboa ou no Porto ou a meio caminho e com mais frequência.

Já agora envio a foto da capa do que a Arma de Engenharia publicou o ano passado sobre a Obra que o Beng deixou para trás, por iniciativa do seu último Comandante, o então Ten Cor Alberto Maia e Costa.

Pode ser solicitado á Direcção da Arma de Engenharia no Campo de Santa Clara em Lisboa.
Também agradeço, caso insistam em pôr a minha foto (...) que a substituam pela que mando e que é mais actual.

Parabéns pelo blogue que me parece de muita importância. 

Lembro que talvez a malta se lembre de um programa que fazia na rádio, no Emissor Regional da Guiné, quando eventualmente não estava fora de Bissau e que se chamava "Integral". Era do agrado especialmente do pessoal que estava no mato, quer pela música quer pelas mensagens "subversivas" que deixava...

Um dia destes, com tempo vou ver se localizo algumas gravações e mando. Lembro-me uma vez em que fui chamado à DGS e me "pediram  muito delicadamente" (...) para ter mais cuidado pois eram obrigados a enviar as gravações para a António Maria Cardoso!

Nessa mesma tarde estava eu a fazer fogo com umas
armas apreendidas ao IN com o Chefe deles, o
Fragoso Allas, o que era normal sempre que havia armamento "novo" no "mercado" e ele disse-me : - Ó engenheiro,   então hoje foi lá ao "escritório"?! Não ligue, eles fazem só o que lhes mandam...

É claro que dizer aos microfones "Em Santiago reina a paz dos cemitérios" .. (estávamos em 1973 e Pinochet tinha iniciado a repressão no Chile).

Coisas que hoje são interessantes de recordar  e que nos fazem reflectir sobre o "conhecimento" e relações DGS/Exército no Ultramar mas isso são horas de conversa.

Um abraço amigo para todos
NNF

2. Comentário do editor:

Escreveu ontem, em comentário, o Belarmimo Sardinha, que é membro da nossa Tabanca Grande e amigo pessoal do Nuno Nazareth Fernandes:

Olá Luis,

(...) Várias vezes abordei já com o Nuno a sua entrada na Tabanca Grande, depende apenas dele, mas experimenta tu a convidá-lo, é sempre diferente. Ele é uma pessoa com muito espírito e piada na forma de contar as suas histórias e certamente terá algumas sobre a Guiné e até sobre a rádio da Guiné, onde esteve também. (...)

 Um abraço, BS.

Pois, meu caro Nuno, e meu caro BS: não precisamos de mais convites. O Nuno percebeu logo que estava entre camaradas da Guiné, de gente de boa fé, deu os patabéns pelo blogue, mandou-nos uma foto atual, mostrou-se interessado em saber dos nossos encontros e até nos contou uma história da sua passagem pelo  PFA, o programa de rádio das Forças Armadas, e da sua ida, um dia, ao "escritório" da DGS... Para mim, é a aceitação do convite que lhe fiz para integrar a nossa comunidade virtual de amigos e camaradas da Guiné.  

O Nuno já está, pois,  sentado, e bem sentado á sombra do poilão da Tabanca Grande, cabendo-lhe o lugar nº 684. (depois da entrada do José Sousa e das nossas amigas Graciela Santos e Lígia Guimarães, esposas de camaradas nossoas, totalistas dos dez encontros nacionais que já realizámos desde 2006). (**)

De resto, a malta do BENG 447 [de que temos vários camaradas formalmente registados na nossa Tabanca Grande, com destaque para o ex-cap mil Fernando Valente (Magro), de 1970/72] só pode ser recebida aqui de braços abertos. Já também aqui demos notícia do próximo 32º Encontro Nacional da malta do BENG 447, nas Caldas da  Raínha, no dia 9 do corrente.

Obrigado, Nuno, pela foto da capa da obra "A engenharia militar na Guiné", da qual vamos querer saber mais coisas... E o Nuno já sabe que na Tabanca Grande todos os camaradas se tratam por tu, do engenheiro ao corneteiro, do médico ao auxiliar de enfermagem, do comandanet operacional ao simples soldado atirador...

Como vai adiantada a hora, e estou fora de Lisboa, quero tão só dar as boas vindas ao Nuno e agradecer também ao Belarmino por ter levado a "carta a Garcia", neste caso ter dado a conhecer ao Nuno o nosso blogue. Ficaremos à espera de poder partilhar, uns com os outros, de mais histórias do BENG 447 e dos programas de rádio que se faziam em 1973 e qiue chegavam tanto aos ouvidos da malta no mato como aos agentes da DGS... Temos também vários camaradas que foram locutores do programa de rádio das forças armadas, a começar pelo Silvério Dias!... O Nuno, por certo, que se deve lembrar do Silvério Dias e vice-versa

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 30 de abril de  2015 >  Guiné 63/74 - P14549: (Ex)citações (273): A propósito de "O Vento Mudou".... No Festival RTP da Canção de 1967, o Eduardo Nascimento ganhou com o todo o mérito, porque era a melhor canção, e rompia com o chamado "nacional cançonetismo"... É falso que o Salazar tenha imposto o seu nome para ir ao festival da Eurovisão (Nuno Nazareth Fernandes, autor da música, e ex-alf mil, BENG 447, Bissau, 1972/74)

Guiné 63/74 - P14553: Agenda cultural (394): Apresentação do livro "Guerra na Bolanha - De Estudante, a Militar e Diplomata", de Francisco Henriques da Silva, dia 5 de Maio de 2015, pelas 18h00, no Palácio da Independência, Largo de São Domingos, Lisboa (Francisco Henriques da Silva)

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Henriques da Silva (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, , Mansabá e Olossato, 1968/70; ex-embaixador na Guiné-Bissau nos anos de 1997 a 1999), com data de 28 de Abril de 2015:

Meus caros,
A fim de ser eventualmente divulgado na vossa agenda cultural, junto remeto um convite para a apresentação da obra da minha autoria “Guerra na Bolanha”, na próxima terça-feira, dia 5 de Maio, pelas 18 horas, na Sociedade Histórica da Independência de Portugal em Lisboa.

Com abraço,
Francisco Henriques da Silva
(ex-Alferes miliciano de infantaria da C.Caç. 2402 e ex-embaixador de Portugal em Bissau 1997-1999)


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Nota do editor

Último poste da série de 28 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14538: Agenda cultural (393): Lançamento do livro "CARTAS DE MATO" - CORRESPONDÊNCIA PACÍFICA DE GUERRA", de Daniel Gouveia que terá lugar no próximo dia 5 de Maio de 2015, pelas 15 horas, na Livraria/Galeria Municipal Verney, em Oeiras

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Guiné 63/74 - P14552: Notas de leitura (708): "Cabra Cega - Do seminário para a guerra colonial", por João Gaspar Carrasqueira, Chiado Editora, 2015 (1) (Mário Beja Santos)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Beja Santos (ex-Alf Mil, CMDT do Pel Caç Nat 52, Missirá e Bambadinca, 1968/70), com data de 20 de Abril de 2015:

Queridos amigos,
Por intermédio do nosso confrade Marques Lopes, recebi esta "Cabra-Cega" que, segundo apurei, terá o seu lançamento em Junho.
A vários títulos, estamos perante uma obra invulgar, seguimos o itinerário de uma criança pobre educado no seminário até aos 20 anos, faz o 7.º ano enquanto estuda como ajudante de fiel armazém. Segue-se Mafra, e na Amadora vai formar batalhão.
Em impressiva água-forte, regressamos aos anos 1960, quatro aspirantes que foram convergidos à pressa para uma companhia dialogam entre a inocência e um certo fundamentalismo. O capitão Mendonça é uma figura antológica, verão. E depois a Guiné, algures, depois de um rio largo que depois se estreita. E um dia, aquele alferes descobre que está sozinho, a sua tropa debandou depois de um fogo intenso.
E há muito mais para vos dizer.

Um abraço do
Mário


Cabra-cega, por João Gaspar Carrasqueira (1)

Beja Santos

É um livro íntimo, com vários biombos, com a simulação de artifícios para dificultar a perceção da realidade. Será que João Gaspar Carrasqueira existe? E, a existir, foi conterrâneo de António Aiveca que deixou estes papéis para publicar e já está na terra da verdade?

Faltava-nos esta peça na literatura da guerra da Guiné, uma autobiografia camuflada, da infância até ao termo da comissão. Um menino nascido em Lisboa e logo transferido para Penedo Gordo, não muito longe de Beja. E regressado depois a Lisboa, vivia numa pobreza extrema, fez a instrução primária num colégio de padres e daqui seguiu para o seminário. Aos vinte anos, entra em discordância, é tempo de acabar com a comédia da vocação, e sai do seminário. Regressa a Lisboa, para sobreviver, trabalha como ajudante de fiel de armazém e estuda. É assim que recebe uma convocatória para se apresentar em Mafra, temo-lo como atirador de infantaria. Segue para a Guiné, é logo lançado no mato, o relato não indica nem o tempo nem o lugar como se buscasse a universalidade de todas as guerras. O capitão, comandante de companhia, é gizado como um valdevinos, um frequentador de cabarés lisboetas; e o retrato que o autor nos dá dos quatro alferes da companhia é singular, atrevo-me a dizer único, aquelas quatro pessoas poderão ter existido na inocência, no fanatismo, na pesporrência, na indiferença acompanhada de ignorância, quanto ao modo de participar na guerra. O alegado António Aiveca ao fim de quatro meses é ferido em combate, evacuado para o Hospital Militar Principal, transforma-se numa reencarnação no comandante companhia, morto na improvidência de um levantamento de mina. São tempos de estúrdia, somos envolvidos naquele terrível compasso de espera de alguém que tem os tímpanos feridos e que escancara as portas ao inferno dos estropiados que jazem num dos anexos do hospital. E dá-se o regresso à Guiné, vai passar mais uns meses numa companhia de recrutamento local, sai-lhe um portão de Balantas na rifa. E depois o regresso, numa atmosfera de espessamento e de desencantos. Todos mudaram, ele não ficou para trás, viveu a morte em vários espelhos coloridos e jogou à cabra-cega. Foi demasiado, se o seminário o desencantou, as idas e vindas com a Guiné ao fundo deixaram-no agrilhoado ao somatório das perdas.

Vale a pena abrir a mão de todo este longo itinerário que se atribui a António Aiveca, segundo o presumível imaginário de João Gaspar Carrasqueira.

Primeiro, o Alentejo, as raízes da família, mãe ceifeira e o pai tratorista nos campos dos latifundiários, rasgando-os com aivecas, daí o nome que ficou para a família. Passou a infância numa parte de casa em Campo de Ourique. E depois temos um colégio de padres, um caseirão enorme, estamos então no seminário, reza ao terço todos os dias antes do jantar, acompanha o diretor na visita às famílias ricas da terra. Passados cinco anos, é transferido para um seminário maior, noviciado em Filosofia, temos aqui descrições primorosas, há frases que ficaram gravadas ao ex-seminarista para todo o sempre: “Quem não fizer penitência morrerá” ou “Na missa, quando no altar se imola Jesus, não nos devemos julgar na terra, mas no céu entre os espíritos celestes”. Pobreza e castidade, e obediência. O controlo é absoluto, mal se põe a conversar mais longamente com alguém é logo advertido que não é bom fazer amizades, há inconveniência nos afetos duradouros. Pede para sair, entregam-lhe o papel da dispensa dos votos, vai viver com os pais em Lisboa, na Calçada da Patriarcal, trabalha, estuda, descobre o cinema. Tem o 12.º ano, é hora de partir para Mafra. O autor dá-nos algumas águas-fortes para preparação militar, dado transversal da obra são os diálogos das pessoas, conversas sincopadas, ali à volta, nas fendas e interstícios é-nos permitido conhecer os estados de alma, mas tudo com comedimento. Já é aspirante, é colocado numa unidade e redige jornais de parede. Ainda foi a Lamego, a sua prestação não agradou, é recambiado para o RI 1, Amadora, é aqui que vai integrar uma companhia, em breve todos saberão que o seu destino é a Guiné. Temos aqui um dos momentos culminantes do livro, as conversas entre os aspirantes Aprígio, Castro, Zé Pedro e Aiveca, é um bom registo de mentalidades. E somos inseridos na vida noturna de Lisboa graças ao capitão Mendonça que tem garrafas com o seu nome em diferentes bares.

Deliberadamente, não sabemos a data de partida no Ana Mafalda para a Guiné, presume-se que estamos em 1967. Uma LDM leva-os através de um rio para perto do destino. Sabemos que é um rio largo, que depois vai estreitar, condensa floresta nas margens, com curvas e contracurvas, havia muita tensão, mas nada aconteceu. E depois vão em coluna, após uma noite horrível, não se sabe bem por onde nem para onde, e chegam ao destacamento, sabe-se que têm a sede do batalhão a 30 quilómetros, há vários quartéis isolados. Correm rumores de que os rebeldes se aproximam da região, fazem-se patrulhamentos, Aiveca aprende os horrores daquele sol abrasador, vê horrorizado os soldados a mijar nos cantis. Mendonça, que dava a imagem da pândega na vida noturna de Lisboa, revela-se um traste, em positivo, trabalha para a folha de serviços. Sabemos que há áreas onde se deslocam sem perigo, as Panhard seguem à frente. Nomadizações, patrulhamentos, emboscadas. E a imagem de tabancas abandonadas, o testemunho daquele momento da guerrilha em que se separaram as águas, uns partiram para o mato profundo, outros aproximaram-se da tropa, ficaram em quartéis ou em autodefesa. As relações entre Aiveca e Mendonça degradam-se. E chegou a hora das grandes operações, entram em acampamentos, deitam fogo às habitações. E a guerrilha apresenta-se, há fogo intenso, é preciso apoio aéreo. Mendonça determina que vai referenciar um objetivo. É um dos momentos da obra dignos de referência. Aiveca vai ficar sozinho depois de uns tiroteios, o seu grupo debanda, vai descobrir que está sozinho. Tudo começa assim:
“Foi rastejando e, a certa altura, ouviu um silvo agudo no ar, levantou a cabeça e numa fração de segundos viu uma granada de morteiro em direção a si. Nem pensou, deu três voltas para o lado a rebolar. Ela enfiou-se na terra mole no sítio onde tinha estado, viu de esguelha o seu rebentamento, sentiu a terra que levantara cair-lhe no camuflado e ouviu o zumbido dos estilhaços. Cabeça entre os braços, ficou agarrado ao chão. Nunca imaginara que isso fosse possível, mesmo quando vira nos filmes não acreditara”.

E os guerrilheiros vão-se aproximando.

(Continua)
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Nota do eitor

Último poste da série de 27 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14532: Notas de leitura (707): Abdulai Silá, o grande prosador guineense (3): "Mistida" (Mário Beja Santos)

Guiné 63/74 - P14551: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (30): «Projecto - Marcas de Guerra - Livro de Textos e Fotografias sobre as Tatuagens" (Pedro Nunes)

1. Mensagem do nosso leitor Pedro Nunes [m, foto atual, à esquerda, cortesia de PPL  Crowdfunding Portugal


Data: 29 de abril de 2015 às 11:36

Assunto: «Projecto - "Marcas de Guerra" - Livro de Textos e Fotografias sobre as Tatuagens


Boa tarde,

O meu nome é Pedro Nunes, e juntamente com mais dois escritores estamos a desenvolver um projeto para o qual pedimos a vossa ajuda/colaboração. Agradeço o vosso tempo assim como qualquer informação que nos possam enviar. 

Detalhes:

«Projecto - "Marcas de Guerra" - Livro de Textos e Fotografias sobre as Tatuagens
feitas no período da Guerra do Ultramar.

Pretendemos com este projecto fotografar pessoas que tenham tatuagens feitas durante o período da Guerra do Ultramar. Gostaríamos ainda de elaborar textos a contextualizar o simbolismo e os motivos associados a cada tatuagem.

Contamos para isso com a colaboração de ex-combatentes que se disponibilizem para uma conversa informal e posterior registo fotográfico.

Valorizaremos o tratamento de toda a informação de forma ética e profissional, sempre sob o consentimento de todos os envolvidos.

Acreditamos que este trabalho pode trazer um olhar diferente sobre todos aqueles que viveram um dos períodos mais marcantes da nossa História e que deve ser sempre lembrado.

Autores - Pedro Nunes, Helena Nogueira, José Noras - Escritores com obras publicadas, incluindo o livro de contos sobre o 25 de Abril, "Abril Depois de Abril"

Cumprimentos,
Pedro Nunes

2. Comentário do editores:

Caro amigo, obrigado pelo contacto. Vamos colaborar dentro das nossas limitadas possibilidades. A tatuagem não era o nosso forte. O tema já foi aqui abordado (*). com fraca resposta, Mas fica o seu repto e o seu convite. Os combatentes da guerra colonial / guerra do ultramar são portugueses generosos. E, mais concretamente, os membros da nossa Tabanca Grande  gostam de colaborar com quem procura o nosso blogue como valiosa fonte de informação e conhecimento. (**) 

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Notas do editor

(*) Vd poste de 22 de julho de 2014 > Guiné 63/74 - P13429: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (20): Imagens de braços tatuados, do tempo da guerra colonial, precisam-se para trabalho jornalístico sobre a história da tatuagem em Portugal...

(**) Último poste da série > 17 de março 2015 > Guiné 63/74 - P14377: O nosso blogue como fonte de informação e conhecimento (29): A Ilha das Galinhas que eu conheci e a nostalgia da "prisão" com que o Zé Carlos Schwarz ou Zé Cabalo (, no meu tempo de liceu), nos surpreende, na letra e música de "Djiu di Galinha" (Manuel Amante da Rosa)

Guiné 63/74 - P14550: Parabéns a você (897): José Carlos Neves, ex-Soldado TRMS do STM (Guiné, 1974) e Manuel Luís Lomba, ex-Fur Mil Cav da CCAV 703 (Guiné, 1964/66)


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Nota do editor

Último poste da série de 29 de Abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14539: Parabéns a você (896): Giselda Pessoa, ex-Sargento Enfermeira Paraquedista da BA 12 (Guiné, 1972/74)

quinta-feira, 30 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14549: (Ex)citações (273): A propósito de "O Vento Mudou".... No Festival RTP da Canção de 1967, o Eduardo Nascimento ganhou com o todo o mérito, porque era a melhor canção, e rompia com o chamado "nacional cançonetismo"... É falso que o Salazar tenha imposto o seu nome para ir ao festival da Eurovisão (Nuno Nazareth Fernandes, autor da música, e ex-alf mil, BENG 447, Bissau, 1972/74)

Nuno Nazareth Fernandes
(n. 1944)
Cortesia de
www.snipview.com
1. Mensagem, com data de ontem,  do compositor Nuno Nazareth Fernandes, autor da música da canção "O Vento Mudou" (*):

Assunto: O Vento Mudou

Boa tarde ,

Fui alertado, por um ex-combatente e amigo, para uma referência no vosso blogue em que se afirma, a propósito de "O Vento Mudou" ter sido o Eduardo Nascimento o escolhido para representar Portugal na Eurovisão em 1967 por imposição de Salazar! (*)...

Ora isto é rigorosamente falso!

O Eduardo foi escolhido pelos autores da canção, eu, na música, e o João Magalhães Pereira, na letra, únicos responsáveis por isso. E ganhou... porque era a melhor canção, que rompia com o chamado "nacional cançonetismo" e com um cantor moderno e cheio de ritmo! Nem o Doutor Salazar nem as suas botas tiveram algo a ver com o assunto, antes pelo contrário!

Mas, já agora, posso contar algo que já narrei públicamanet na Televisão e que mostra como o "diz-se diz-se" deste país em nada mudou... Acontece que essa estória me foi afirmada, pessoalmente, quinze dias depois de termos ganho o Festival:

Eu comecei a usar barba quando concorremos, eu e o João estavamos então no IST  [Instituto Superior Técnico.] , e eu sempre gostei de manter um certo "low profile". Finda a euforia festivaleira,  cortei a barba e duas semanas depois fui a um barbeiro...

Barbeiros e taxistas eram na época a "vox populi" oficiais. Hoje também, embora os barbeiros tenham sido substituidos pelos "cabeleireiros" e pelos jornais "cõr de rosa" ficando assim tudo muito mais alegre ou seja "mais gay"... Acontece que o barbeiro em questão logo me informou, e eu incógnito, que tinha sido o Salazar que tinha orquestrado tudo e que os dois "energúmenos autores", sabia-o de" fonte segura", eram da...Mocidade Portuguesa!...

Mas, como sou curioso e na altura tinha muito cabelo, fui a outro "Figaro" alfacinha e puxei a conversa:
- Pois fique sabendo, meu caro senhor, que aqueles dois rapazes são comunistas e que foi o PCP que lhes deu ordem para escolher um negro só para provocar um incidente internacional quando o Regime o recusasse!

Fiquei pois perfeitamente esclarecido sobre a nossa escolha! 

Na dúvida, e como prémio, o dito Regime ofereceu-me 24 meses de Guiné (72/74) como alferes de Engenharia, o que achei perfeitamente normal ...e pelo caminho vinguei-me e conspirei forte e feio e lá chegou o 25 de Abril. Depois deve ter sido o PCP que não gostou e tive que "acontecer" outra vez e foi o 25 de Novembro! Enfim sou a chamada "vítima colateral " ... do Vento Mudou!

Qualquer dia acho que vou compôr uma coisa chamada "Furacão, procura-se", que é mais adequado aos dias de hoje, e peço ao Eduardo [Nascimento] para a lançar, pois continua a ter as qualidades que, na altura, justificaram a sua escolha: Cantar e muito bem!

Talvez alguma coisa mude...

E que se lixem as "Botas do Salazar" e as " teias de aranha do Lenine"!

Adeus e... até ao meu regresso, camaradas!

Nuno Nazareth Fernandes


2. Diz a Wikipédia sobre o Nuno Nazareth Fernandes (Excerto reproduzido com a devida vénia):

(...) Nuno Nazareth Fernandes (Lisboa, 24 de Junho de 1942) é um compositor, letrista, cartoonista, fotógrafo, poeta e guionista português.

Nasceu em Lisboa, filho de Alice da Nazareth Fernandes e Luis Cerqueira Teixeira, e neto de Agostinho Fernandes, industrial de conservas e mecenas do século XX.

Compositor, letrista, cartoonista, fotógrafo, poeta e guionista, é sobretudo conhecido pelas suas participações nos Festivais RTP da Canção (que venceu por três vezes, com as canções O Vento Mudou, Desfolhada Portuguesa e Menina), pelos sketches dos programas televisisvos Eu Show Nico e EuroNico e como autor de texto e música de inúmeras Revistas, num percurso de mais de quatro décadas entre os mundos do Disco, da Rádio, da Televisão e do Teatro.

Em todos esses campos trabalhou com os mais variados autores e poetas, com destaque para José Carlos Ary dos Santos com o qual escreveu, entre muitas, aquela que é considerada uma das mais belas canções da música portuguesa: Canção de Madrugar. 

Cumpriu serviço militar, como oficial do Serviço de Material, primeiro na Fábrica Militar de Braço de Prata, e, depois, no Comando Territorial [Independente] da Guiné, hoje República da Guiné-Bissau, no Batalhão de Engenharia (BENG-447), que se localizava em Bissau, entre os Comandos e os Adidos. Nessa ocasião existia no Batalhão de Engenharia um agrupamento musical designado por BENG-447 que actuou em diversos palcos, tanto militares como civis.

Fez parte da Direcção e Administração da Sociedade Portuguesa de Autores ao longo de sete anos. Considera-se um "estudioso compulsivo" de História, principalmente no que diz respeito à de Portugal e da Ordem do Templo. Enviuvou por duas vezes, tem três filhos e um neto. Vive em Lisboa.

"Chamam ao Telefone o Senhor Doutor Afonso Henriques" (ed. Zéfiro, 2008), não sendo o seu primeiro livro, é, contudo, o seu primeiro romance.
(...) É licenciado em Engenharia Mecânica (Aeronáutica) pelo Instituto Superior Técnico. É adepto do Sporting Clube de Portugal.

Ligações Externas (...)
3. Comentário do editor L.G.:

Nuno, obrigado pelo esclarecimento que nos mandou sobre a canção "O vendo mudou"...

Vamos publicar, obviamente... Por respeito à verdade e à boa imagem a que os camaradas da Guiné da Guiné têm direito... Como de resto qualquer outro português...

Em boa verdade, nem tudo o que luz é ouro, e nem tudo o que se lê na Net (e na Wikipédia, em particular) é verdade... De resto, tivemos o cuidado de manter essa ressalva... O que vem na entrada da Wikipédia, sobre o Eduardo Nascimento, é no mínimo uma insinuação torpe... No entanto, caímos na ratoeira de a reproduzir, embora com algumas cautelas;

(...) "Já o Eduardo Nascimento, um pouco mais velho (, nascido em Angola, em 1944) era um pacato rapaz lusitano, tal como o Eusébio... Tem hoje direito a entrada na Wikipédia, onde se diz que terá ido ao Festival Europeia da Canção por vontade expressa de Salazar, quando um "pretinho" dava jeito à máquina de propaganda do Estado Novo." (...) (*)

Fica, pois,  definitivamente esclarecido, em primeira mão, que a canção "O Vento Mudou" ganhou o concurso do Festival RTP da Canção, em 1967, pelo triplo mérito da letra, da música e da interpretação...

Camarada, este blogue também é seu... Costumamos dizer que o Mundo é Pequeno e a Nossa Tabanca... é Grande... Nesta "caserna" tratamo-nos por tu, como bons camaradas que fomos e somos... Falamos da Guiné e da guerra, claro, falamos da nossa geração, também das canções que nos marcaram, dos nossos (des)amores, dos nossos sonhos e dos nossos pesadelos...

Somos sportinguistas, portistas, benfiquistas, crentes e ateus, de esquerda e de direita... Falamos de quase tudo, menos de religião, política e futebol... Camarada, a nossa Tabanca Grande não tem portas nem janelas... Isto é um convite para o camarada do BENG 447 entrar, se lhe der na real gana... 

Somos quase 700 (, os formalmente registados, incluindo os 40 que da leia da morte já se libertaram,.,,). E blogamos há 11 anos.  E encontramo-nos, fisicamente, todos os anos... Nos últimos anos em Monte Real, mas temos tabancas por todo o lado, fora e dentro do país (de Cascais a Monte real, de Matosinhos a Gondomar, e até à Lapónia sueca)... Infantes, artilheiros, engenheiros, médicos, comandos, rangers, paraquedistas, enfermeiras paraquedistas, pilotos, soldados,   marinheiros, pretos e brancos... Só não temos refractários nem desertores, por uma razão simples: somos um blogue de combatentes... E o  nosso único propósito é partilhar memórias (e afetos), contar histórias, as nossas histórias... O resto é para os senhores doutores historiadores que escrevem a História de Portugal... Só não queremos é que sejam os outros a contar a nossa história por nós, como o Nuno também não gosta...   Até breve! (**)

Um alfabravo (ABraço), camarada.

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Guiné 63/74 - P14548: Bibliografia de uma guerra (72): Do meu livro “O Corredor da Morte”, rebentamento de uma mina PMD 6 (Mário Vitorino Gaspar)

1. Mensagem do nosso camarada Mário Vitorino Gaspar (ex-Fur Mil At Art e Minas e Armadilhas da CART 1659, Gadamael e Ganturé, 1967/68), com data de 30 de Abril:

Cara Camarada Gigelda e todas as Enfermeiras Paraquedistas:
Tive sempre enorme admiração pelas nossas Enfermeiras Paraquedistas. Como costumo dizer as Mulheres de “M”, Mulher-Mãe; Mulher-Esposa; Mulher-Noiva; Mulher-Namorada; Mulher-Irmã; Mulher-Madrinha de Guerra e Mulher-Enfermeira. 
Penso que a Mulher-Enfermeira deveria ter uma outra atenção por parte do poder político. 

Aproveito a oportunidade e presto a minha humilde HOMENAGEM À NOSSA CAMARADA GISELDA PESSOA E A TODAS AS NOSSAS AMIGAS ENFERMEIRA PARAQUEDISTAS.
Mário Vitorino Gaspar


No Capítulo 15 do Meu Livro “O Corredor da Morte”, consta a determinado momento:

“Dia 15 de Janeiro de 1968 (…), tinha sido chamado na véspera ao capitão que considerou a utilidade de irmos buscar o correio a Sangonhá, assim patrulharíamos a zona. (…).

As tabancas alinhavam-se à direita. Aproximavam -se os Soldados Nativos e as Praças “U”.
Dei um nó no lenço que colocara ao pescoço. Um lenço de seda que me dera a minha namorada quando estivera de licença em Portugal. Era também “ronco”, como lhe chamavam os nativos.
O cabelo estava demasiado comprido. Gostava assim. Além disso, a barba. Há quantos dias que não a fazia.
O camuflado, uma miséria, parecia que velhice o engolia aos poucos. Tinha que me confundir com os negros no mato. Assemelhava-me, talvez.

Com o pessoal todo preparado, encaminhámos os nossos passos para a “porta de armas”, se é que poderíamos chamar àquilo tal nome. Seriam duas secções e os Caçadores Nativos e as Praças “U”. O total seria de uns quarenta homens. Não ia qualquer Oficial, seria eu a comandar.

Logo que passada a porta de armas, ficámos automaticamente com as distâncias controladas. Nunca íamos a monte, nem sequer era necessário dizer-se. As picas avançavam ao solo, massacrando-o com ato delicioso. Os arames rompiam pela terra. O trilho estava seco. A pica chocava no terreno, procurando um objecto que impedisse a perfuração. Eram as “carícias” daqueles arames de ferro, instrumentos improvisados. Eram sem dúvida nenhuma os melhores detectores de engenhos explosivos.

À frente ia o guia, logo a seguir, a uma distância de sete ou oito metros, um soldado. Separava-nos por volta dos sete metros da frente para trás. À esquerda e à direita. Todos a picar. Eu seguia o guia, Praça “U”, que picava, com uma certa minúcia. Tinha notado, já há algum tempo, que dois soldados que iam à minha frente depois de eu recuar, mais parecia quererem brincadeira. Algo de estranho se passava entre os dois. Saltei para a berma direita, colocando-me entre os dois fiz sinal para terem cuidado. Mudei-me logo para de trás dos dois soldados e continuei a picar.

No meio daquele silêncio profundo, senti um frio percorrer-me o corpo. O cérebro, a espaços, estagnara oco. Nem o vento, as folhas ou viva força da natureza.
- Vamos a ter cuidado - disse-lhe em voz baixa - é picar como deve ser.

Olharam-me, quase como envergonhados, sorrindo de seguida. Transportava, como todos, a G3 sobre o ombro esquerdo, enquanto a mão direita segurava a pica. As Praças “U” e os Caçadores Nativos batiam com a pica na terra que parecia ser acarinhada pelo arame. Continuei a avisar os dois soldados que me antecediam. Afastei-me para a berma contrária. O silêncio preocupava-me.
Olhei para trás. Estavam algo eufóricos. Desconhecia o motivo de tal. Seria a correspondência? Não sabia explicar. A verdade é que a alegria é contagiante. Estávamos na guerra, ali não havia espaço nem tempo para a nostalgia daquelas paragens sufocantes e doentias. O meu lenço de seda estava encharcado em suor. Coloquei o nó mais à frente. Notava a anormalidade de comportamento nos dois soldados da minha secção, colocados na berma do lado direito.

A uns vinte metros à frente, do mesmo lado, o guia parou por instantes, enquanto picava. Os dois soldados seguiam-no, ouvindo aquilo que a Praça “U”, transmitira baixo. O soldado que vai à minha frente espeta a pica, com raiva. Um estoiro. Um rebentamento forte. O guia foge para a frente. Apontei-lhe a G3, não sabendo explicar tal acto.
- Alto! – Gritei-lhe – Para aqui já!

O militar negro parou e aproximou-se de nós. Num ápice todos se lançaram para a berma. Era o conhecimento prático, os ensinamentos daquela guerra de guerrilha. O guia estava entre nós.
- Mina! – Gritou o soldado que vinha na minha retaguarda, respirando fundo.

Eu era o único que continuava de pé. Rebentando mina, armadilho ou fornilho, acontecia haver uma forte probabilidade de emboscada. De pé e o coração rompia do peito martelando-o, mas como sempre, mais lúcido, uma lucidez difícil de explicar. Numa fracção de segundo. Mais calmo que anteriormente. Também não entendo. A serenidade fazia parte integrante do “eu”. Era talvez como se tivesse ingerido um calmante. O cérebro respondia na íntegra. Deixei de tremer. Transformara-me como por milagre, num ser diferente.

Ouvi gritos que penetravam não só nos ouvidos, mas também no corpo e no espírito. Excluindo eu e o guia todos tinham sido atingidos pela mina. A minha experiência como especialista de explosivos, minas e armadilhas dizia-me que era, mais uma vez, uma PMD 6, vulgarmente conhecida por “saboneteira”. Uma antipessoal, que possuía mais o efeito psicológico. O que parecia estar pior era o soldado que ia à minha frente, com o rosto menino, coberto de sangue. Fechava os olhos. O camuflado estava repleto de estilhaços e também de sangue que haviam atingido também o rosto, na zona da vista. Sofria. Aquele sangue do corpo jovem molhava o trapo.
O outro que o seguia era quase o vivo espelho do primeiro, com mais estilhaços talvez. Continuava a não entender porque teria picado com tanta violência. Quereria matar a mina? Gritei para o radiotelegrafista, depois de pedir a um soldado que o chamasse:
- Aqui já! - Fiz sinal ao condutor para virar a viatura.
- Informe Gadamael Porto que temos evacuações para fazer, umas seis ou sete.

Disse ao radiotelegrafista com calma: - Não é grave!

A GMC tinha já dado a volta. Havia que evacuar os feridos. O soldado que tinha sido atingido no rosto, desabafou, com dores:
- Estou cego, cego..., não vejo nada, merda. Estes filhos de uma puta nem nos deixam ir buscar o correio!

Não via as lágrimas, elas agarravam-se ao sangue que continuava a correr do seu rosto.

- Calma rapaz, vamos para Gadamael, não fazemos aqui nada, as evacuações não podem ser feitas daqui! – Disse eu.

Aproximei-me dos feridos. Um gemia em tom demasiado baixo:
- É pá como vai isso? – Perguntei-lhe sorridente, pretendo incutir-lhe a calma e fé que necessitava, enquanto pedia ao telegrafista que pedisse as evacuações.

- Sinto picadas nas pernas. São os mosquitos todos da Guiné que me chupam o sangue – respondeu.

O sangue manchava os camuflados. Julgava serem os três únicos que necessitavam de evacuação, muito embora outros tivessem sido atingidos. A mina era de fraca potência. Feita de madeira, com algum arame. Disse para o condutor:
- É a abrir sempre até Gadamael, não é necessário picar... – Disse-lhe em altos berros.

Logo que arrumados na caixa da GMC, a mesma arrancou, com sete feridos e mais quatros homens. Uma secção de Ganturé, chegava com três viaturas. Subimos todos e com alguma velocidade, chegámos ao cruzamento. A secção de Ganturé saiu e continuámos até Gadamael Porto. Não era necessário picar. Gadamael estava à vista. Já se viam os militares da nossa companhia de calções e tronco nu. A GMC estava junto daquilo a que chamavam pista. Todos aqueles a evacuar estavam deitados em macas.

O furriel enfermeiro e o auxiliar enfermeiro encontravam-se junto dando o apoio, limpando os ferimentos e retirando os camuflados. O primeiro soldado atingido, e o que estava em situação mais grave, estava mais sereno. Aproximei-me, eram cinco corpos.
Um murmúrio aqui, outro acolá, nasciam das gargantas daqueles jovens, mas homens de verdade. Homens com um “H” grande.
Ouvia-se o roncar dos helicópteros. Eram dois.

O meu cabelo comprido foi sacudido pelo ar em movimento. Vento.
O capitão estava junto do primeiro helicóptero. Desceu a enfermeira paraquedista de calça camuflada e camisola de um branco lavado. Sobressaíam uns seios rígidos. A enfermeira era de cor branca. A única branca naquele local afastado da civilização. Uma mulher branca, era impensável. Bem torneada!
Aproximou-se das macas, balanceando as ancas.
- Como está? – Perguntou ao soldado que tinha sido atingido na vista.
- Está bem?
- É muito boa! – Respondeu rapidamente o soldado.

Via-se um sorriso naquele homem. Já havia ganho esse estatuto há algum tempo. O capitão, referiu:
- Não ligue, ele não sabe aquilo que diz!
- Já estou habituada! – Respondeu a enfermeira com um sorriso.

Os helicópteros levantaram dos torrões da pista e desapareceram no horizonte”.
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Nota do editor

Último poste da série de 30de Abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14545: Bibliografia de uma guerra (71): E agora? O que é que vou fazer?, do livro "Guerra na Bolanha", de Francisco Henriques da Silva, Âncora Editora, Lisboa, Março de 2015

Guiné 63/74 - P14547: Convívios (671): CCAÇ 1439 (Enxalé, Missirá e Portogole, 1965/67) + Pel Caç Nat 52 e 54... Caldas da Raínha, dia 9 de maio de 2015... Inscrições até este fim de semana... (Maria Helena Carvalho, filha do Pereira do Enxalé / Henrique Matos, ex-alf mil, cmdt, Pel Caç Nat 52, 1966/68)



Crachá da CCAÇ 1439, "Bravos, avante" (Enxalé, Missirá e Portogole, 1965/67)


1. Da nossa amiga Maria Helena Carvalho, filha do Pereira do  Enxalé, localidade onde nasceu e da qual guarda recordações muito fortes da infância, recebemos a seguinte mensagem:


Assunto - 24º encontro anual da CCAÇ 1439 + Pel Caç Nat 52 e  54 + Pelotão de Morteiros 81 + Convidados

Caros amigos,

Como informei há já algum tempo, vai realizar-se este ano o almoço convívio da CCAÇ 1439 [Enxalé, Missirá e Portogole, 1965/67, nas Caldas da Raínha, no dia 9 de maio de 2015.

Ficarei extremamente grata com a presença de todos, bem como de familiares e amigos.

O local do encontro será, pelas 11h30,  no "Restaurante A Lareira", situado no Alto Nobre, na estrada antinga das Caldas da Raínha para a Foz do Arelho. O almoço será por voltad as 13h00.

Agradeço a confirmação da vossa presença, até ao dia 2 de maio. Contactos:

(i) Maria Helena Carvalho [, Caldas da Rainha]: telem 917 434 442. Email: m.helenapereiracarvalho@gmail.com

(ii) José Pimentel [, Coruche]: telem 912 256 339. Email: domoseguro@mail.telepac.pt

(iii) Henrique Matos [, Olhão]: telem 963 334 811

(iv) Luís Cunha; telem 934 779 181 / telef 243  679 199

Com amizade,
Lena Carvalho


2. Recorde-se alguns dos camaradas que pertenceram a estas unidades e são nossos grã-tabanqueiros (, lista que é meramente exemplificativa, correndo nós o risco de esquecer alguém) :

José António Viegas (ex-Fur Mil do Pel Caç Nat 54, Guiné, 1966/68)

Composição do Pel Caç Nat 54: Alf mil Carlos Alberto de Almeida Marchã; furriéis mil Arlindo Alves da Costa (ferido em Combate), Álvaro Valentim Antunes (morto em combate) e José Antonio Viegas; 1ºs Cabos: Coelho (ferido em combate), Manuel (ferido em Ccombate) e João Simão - Telegrafista.  A restante composição era feita por Fulas, Mandingas, Papel e Olof.

Henrique Matos (alf mil, cmdt do Pel Caç Nat 52, Enxalé, 1966/68) [, foto de época, à direita]:

Foi o primeiro comandante do Pel Caç Nat 52, que seri mais tarde comandado pelo Mário Beja Santos (1968/70)

João Crisóstomo, ex_alf mil, CCAÇ 1439 (Enxalé, Missrá e Portogole, 1965/67) (vive em Nova Iorque desde 1975)

Júlio Martins Pereira, ex-sold trms, CCAÇ 1439 (1965/67)

O Jorge Rosales, veteraníssimo alf mil da 1ª CCaç Indígena (Porto Gole, 1964/66), "régulo" da Tabanca da Linha,  também costuma aparecer neste convívio que reune pessoal do Enxalé, Portogole e Missirá (margem direita do Rio Geba)...

O ex-1º cabo Abel Rei, que é da Marinha  Grande, e pertenceu à CART 1661 (Fá, Enxalé, Porto Gole, 1967/68) também já apareceu um vez nestes encontros. O Abel de Jesus Carreira Rei é autor do livro "Entre o Paraíso e o Inferno: De Fá a Bissá: Memórias da Guiné, 1967/1968" ( Prefácio do Ten Gen Júlio Faria de Oliveira. Edição de autor. 2002. 171 pp. Execução gráfica: Tipografia Lousanense, Lousã. 2002).

Fazemos questão de convidar, desde já, a Maria Helena Carvalho para integrar a nossa Tabanca Grande. Já falámos com ela ao telefone várias vezes. Só precisamos que nos mande uma ou duas fotos para a sua formal e condigna apresentação aos restantes grã-tabanqueiros. Desejamos-lhe a ela e aos nossos camaradas uma magnifica jornada de convívio, no próximo dia 9, nas Caldas da Rainha.


Coruche > 19º Encontro Nacional da CCAÇ 1439 (Enxalé, Porto Gole e Missirá, 1965/67), mais os Pel Caç Nat 52 e 54 > 6 de Março de 2010 >

Fotografia de grupo num encontro (histórico!) em que foi possível juntar os antigos Alf Mil João Crisóstomo (que vive nos EUA), o Antonino Freitas, o Mário Beja Santos e o Jorge Rosales. A foto veio sem legenda: reconhecemos o Jorge Rosales (o primeiro da 1ª fila, do lado esquerdo), o Beja Santos (o segundo da 2ª fila, a contar do lado direito, sendo o 1º o João Crisóstomo); e o Henrique Matos (o segundo da 3ª fila, a contar do lado direito). A Maria Helena Carvalho também esteve presente neste enconro e, em 2015, é a principal organizadora da 24ª edição do encontro.

Foto: © Henrique Matos (2010). Todos os direitos reservados

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Nota do editor:

Último poste da série > 29 de abril de  2015 > Guiné 63/74 - P14541: Convívios (670): Almoço Convívio do BCAÇ 2851, dia 6 de Junho (António Pimentel)

Guiné 63/74 - P14546: Estórias avulsas (81): Em cuecas debaixo de fogo (Carlos Alberto Cruz)

1. No seguimento de uma troca de mensagens, recebemos, no dia 24 de Abril de 2015, esta pequena estória do nosso camarada Carlos Alberto Cruz (ex-Fur Mil da CCAÇ 617/BCAÇ 619, Catió e Cachil, 1964/66):

Meu caríssimo Carlos Vinhal, 
Uma vez que me foi concedida licença para narrar a estória que intitulei de "EM CUECAS DEBAIXO DE FOGO" então aí vai ela:

Talvez tenha sido na primeira vez que saí para o mato comandando os homens da minha secção (já não me recordo bem)... mas se não foi na primeira foi numa das primeiras.

Saímos do aquartelamento de Catió na direcção de Cufar, pela estrada de terra batida que ligava as duas localidades.
Depois de passarmos a tabanca dos fulas (onde pontificava o nosso João Bacar Djaló), seguimos estrada fora quando fomos emboscados pelos homens do PAIGC que, instalados no cimo das palmeiras nos metralhavam de cima para baixo.

Como facilmente se adivinha tratámos de nos atirar para o chão e eu, concretamente para um pequeno morro de baga-baga que apanhei à minha direita.
Tratei de orientar os meus soldados para se protegerem o melhor possível e julguei vislumbrar um vulto no cimo de uma palmeira. Depois de me certificar que o meu pessoal estava bem protegido fiz o que mais gostava de fazer naquela situação: encostei a G3 ao tronco de uma palmeira e fiz pontaria ao vulto que me parecia disparar sobre nós com a temível PPSH (a "costureirinha" como lhe chamávamos - 75 tiros de uma assentada).

Entretanto comecei por ir sentindo uma comichão danada na zona do pescoço e quando passava os dedos no mesmo para me coçar só trazia cabeças de formigas agarradas aos dedos. Só então me dei conta de estar literalmente inundado de formigas que me ferravam forte e feio.(*)
Não tive outra alternativa que não fosse despir-me, começando pelo casaco camuflado e acabando por ficar em cuecas, perante a risota incontida dos homens da minha secção que viam o seu comandante pela primeira vez em trajes menores.

Um bagabaga nas imediações de Bambadinca. No topo vê-se o Humberto Reis (ex-Fur Mil Op Esp da CCAÇ 12
Foto: © Humberto Reis (2006). Direitos reservados.
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Notas do editor

(*) Vd. poste de 26 de Novembro de 2010 > Guiné 63/74 - P7342: Doenças e outros problemas de saúde que nos afectavam (3): Formiga baga-baga (Rui Silva)

Último poste da série de 5 de outubro de 2014 > Guiné 63/74 - P13695: Estórias avulsas (80): Hojé, há pássaros! (João Rebola)

Guiné 63/74 - P14545: Bibliografia de uma guerra (71): E agora? O que é que vou fazer?, do livro "Guerra na Bolanha", de Francisco Henriques da Silva, Âncora Editora, Lisboa, Março de 2015

1. Mensagem do nosso camarada Francisco Henriques da Silva (ex-Alf Mil da CCAÇ 2402/BCAÇ 2851, , Mansabá e Olossato, 1968/70; ex-embaixador na Guiné-Bissau nos anos de 1997 a 1999), com data de 18 de Abril de 2015:

Meus caros Luís Graça, Carlos Vinhal e todos os camaradas e amigos desta tertúlia,
Na sequência da minha anterior correspondência é com o maior prazer que vos envio mais um excerto da minha obra “Guerra na Bolanha - de estudante, a militar e diplomata” (Âncora Editora, Lisboa, Março de 2015).
Desta feita, reporto-me a um tema pouco abordado - o regresso de África e a correspondente reinserção na sociedade portuguesa de então, a que dediquei toda a 3.ª parte do livro e de que aqui fica apenas, digamos um pequeno “aperitivo”.
Trata-se, obviamente, de uma perspectiva muito pessoal. O que aqui refiro consta das páginas 228 a 230 da obra.
A foto fui-a buscar à Net e é apenas ilustrativa de um embarque ou desembarque de tropas no cais de Alcântara.
Permito-me relembrar que o lançamento oficial foi efectuado em 17 de Março em Oeiras, mas está prevista uma sessão de apresentação em Lisboa, na Sociedade Histórica da Independência de Portugal em 5 de Maio, pelas 18 horas, para a qual está todos convidados e de que oportunamente enviarei para estas mesmas páginas um lembrete.

Saudações amigas
Francisco Henriques da Silva
(ex-Alferes miliciano de infantaria da C.Caç. 2402 e ex-embaixador em Bissau 1997-1999)


E agora? O que é que vou fazer?

Finalmente livre da monotonia verde azeitona das fardas militares, olhei para o espelho e vi-me, tal como era: vinte e poucos anos, sem curso, sem emprego, sem namorada e, principalmente, sem saber como organizar a minha vida no imediato. Tinha de encontrar saídas e dar resposta à magna questão: que fazer? Tinha de encontrar solução para todos estes problemas, uns pequenos, outros grandes, mas que se inscreviam na pergunta soberana que pairava sempre no ar e que prevalecia sobre tudo o mais: que fazer?

Tinham-me roubado a minha juventude, preciosos anos de vida quando estava na sua plenitude, o curso que queria terminar, uma carreira profissional que queria encetar. Sentia um vazio muito grande, mas não desesperei, não havia lugar para choro, nem ranger de dentes. Não podia verter lágrimas sobre o azeite derramado, nem à boa maneira lusitana culpabilizar a situação, as circunstâncias, o Outro ou os outros ou seja, lá quem for e o que for. Sim, porque, nos parâmetros da mentalidade tuga, no mau sentido da palavra, a culpa nunca era nossa. Tinha, pois, de reagir. Tinha de avançar. Tinha de ser eu a dar a resposta certa.

E assim o fiz, talvez com hesitações, desvios, opções duvidosas, caminhos ínvios, reflexões sem rumo definido, mas bem no íntimo sentia que podia seguir em frente e que tudo dependia de mim. Tinha de fazer. Tinha de assumir uma atitude pró-activa.

Em primeiro lugar, estava firmemente disposto a completar a universidade. Com a célebre “reforma Veiga Simão,” assim chamada em nome do Ministro da Educação da época (que em várias reencarnações acabou por servir diversos regimes políticos), o meu curso havia sido reestruturado e tinha ficado com cadeiras dispersas por todos os anos e nenhum completo ou próximo disso. Podia, agora, se quisesse, chegar a bacharel, ou seja, fazendo cadeiras por atacado, como aluno-militar. O bacharelato, na altura, constituía uma novidade, uma hipótese simpática que abria as portas a uma carreira no ensino, sobretudo para quem frequentasse cursos das faculdades de Letras e de Ciências. Era uma questão de tempo, de vontade e de algum sacrifício. Mas o meu grande objectivo final consistia em ingressar na carreira diplomática, um sonho que acalentava desde miúdo. Todavia, tratava-se de um alvo de difícil alcance e demoraria anos a lá chegar. Antes do mais, teria de completar o curso e de me sujeitar a um concurso de entrada no MNE, que não era propriamente “canja”, diziam. Mas retomando o fio à meada, que diabo, já estava nos vinte e tais, não podia viver das magras economias feitas, cujas limitações eram conhecidas, nem das sopas paternas ou, melhor, maternas. Tinha de fazer alguma coisa e, como atrás, referia aproveitar o estatuto de aluno-militar que me permitia dar saltos de canguru na faculdade.

Em segundo lugar, queria encontrar um emprego, em tempo inteiro ou em “part time”, para me poder sustentar, para as minhas fantasias e, enfim, para poder juntar os tostões com que se compram os melões. Esta era uma segunda prioridade, mas que se situava quase ao nível da primeira, pois não podia andar à boa vida.

Em terceiro lugar, depois dos namoros, pseudo-namoros, ou meros “flirts” tinha de arranjar, de algum modo, uma companhia feminina certa e não andar de candeia acesa à procura da bela adormecida no bosque ou feito lobo predador a emboscar a menina do capuchinho vermelho e todas as demais, na perspectiva de que tudo o que vem à rede é peixe, como alegadamente fazia ou, pelo menos, alardeava a maioria dos jovens machos lusitanos. A sexualidade tinha de ter os seus escapes, mas eu procurava sobretudo a estabilidade - apesar dos devaneios, sentia que era monógamo por natureza.

Em quarto lugar, tinha de descansar, viajar, passear, recarregar baterias, reavivar velhas amizades, satisfazer alguns sonhos do passado até aqui incumpridos. Em suma, viver e sentir que estava vivo, bem vivo e com vontade de pontapear. Havia uma certa urgência nisto, na medida em que, apesar de jovem, o tempo ia passando e, como rezava uma velha canção da época, não voltava para trás, apesar de querermos à viva força mudar-lhe o rumo.

Finalmente, via-me coagido a esquecer o passado próximo, as memórias que o tempo afinal não apaga e ultrapassar, se é que os tinha, alguns traumas de guerra. Porém as imagens não me abandonavam, via claramente e numa base diária, as tabancas, a mata, as bolanhas, as fardas, os corpos semi-nús dos soldados, as armas; ouvia distintamente os rebentamentos dos morteiros e dos “rockets”, o matraquear das costureirinhas, o guinchar dos macacos, o grasnar de certas aves tropicais, as falas de fulas, mandingas e balantas; sentia os cheiros fétidos de algumas bolanhas, o odor das plantas estranhas que a humidade fazia sobressair, a comida do “rancho” – ou do que pomposamente se chamava messe - pouco variada e insípida, o cheiro do capim e do mato queimado na estação seca; na boca, sentia o uísque que se bebia ao fim do dia, ou a cerveja morna; o gosto da manga verde roída devagar atrás do poilão, a enjoativa ração de combate e por aí fora. Enfim, imagens, sons, aromas e paladares que não me abandonavam, mas, planando por cima de tudo, aquela impressão durável, mas indefinível, quando se pressentia que íamos entrar em combate dentro de instantes: o nó na garganta, o gosto esquisito na boca, os suores quentes e frios, as borboletas no estômago. Como esquecer, então, se ainda hoje me lembro como se fosse ontem?

Cais da Rocha Conde de Óbidos - Lisboa
Foto: © Fernando Chapouto (2006). Todos os direitos reservados.
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Nota do editor

Vd. poste anterior de 28 de Abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14536: Bibliografia de uma guerra (70): A Mina, do livro "Guerra na Bolanha", de Francisco Henriques da Silva, Âncora Editora, Lisboa, Março de 2015

quarta-feira, 29 de abril de 2015

Guiné 63/74 - P14544: O Mundo é Pequeno e a nossa Tabanca... é Grande (98): 42 anos depois, recordo-me bem de ti, José Carlos Mussá Biai... Eras o único menino no Xime com nome cristão, e eu dormia no mesmo quarto do teu professor, o fur enf Osório (António Duarte, ex-fur mil, CCAÇ 12, Xime, 1973/74)



Guiné > Zona leste > Setor L1 (Bambadinca) > Subsetor do Xime > Xime > Posto Escolar Militar nº 8 > 1972 > "Alunos participando na cerimónia do içar da Bandeira Nacional em  10 de junho de 1972 (,s egundo creio).  Ao centro o professor da Escola de Mansambo [?], presente a convite do camarada Carvalhido da Ponte". [Um dos miúdos era o José Carlso Mussá Bai, hoje engenheiro silvicultor a trabalhar e a viver em Lisboa] (*)

Foto ( legenda): © Jorge Araújo (2014). Todos os direitos reservados. (Edição: M.R.)


1. Mensagem de António Duarte, com data de 28 do corrente, enviada ao José Carlos Mussá Biai (**),  com conhecimento aos editores: 


[foto à esquerda: António Duarte, ex-fur mil da CART 3493/BART 3873, Mansambo, Fá Mandinga, Cobumba e Bissau, 1972-1974; foi transferido para a CCAC 12 (em novembro de 1972; economista, bancário reformado, formador, com larga experiência em Angola]

Boa tarde,  José Carlos.

Andava para te escrever, mas tenho adiado.

Agora a propósito desta discussão levantada pelo Luís Graça (***), vejo referência ao teu nome, pelo que opto por te escrever este email.

Quero dizer-te que estive na CCaç 12, em 1973,  no Xime,  e como dormia no mesmo quarto do teu professor, o Furriel  Enfermeiro da CCaç 12,  de nome Osório, recordo-me bem de ti, ainda pequenito ires espreitar à janela para o chamares.

O curioso era o facto de tu seres o único menino no Xime que tinha nome cristão, razão pela qual é fácil recordar-me, apesar dos já 42 anos de distância e dos meus 64 longos anos de idade.

Fico extremamente feliz por constatar que hoje és um homem de vida organizada e de bem com o mundo.

Abraço de fraternidade e tudo de bom para ti e para os teus. (****)

António Duarte

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Notas do editor:

(*) Vd. poste de 27 de outubro de  2014 > Guiné 63/734 - P13812: Memória dos lugares (277): Os meninos do Xime do tempo da CART 3494 - O caso de José Carlos Mussá Biai (Jorge Araújo)

(**) Vd. poste de 10 de maio de 2005 > Guiné 63/74 - P16: No Xime também havia crianças felizes (2) (Luís Graça)

(...) Acabei de falar com o José Carlos Mussá Biai: nasceu em 1963, no Xime, e era menino no tempo em que por lá passaram a CART 2715 e a CART 3494. Era menino no tempo em que eu estive no Setor L1 da Zona leste, correspondente ao triângulo Xime-Bambadinca-Xitole [julho de 1969/março de 1971].

Sei que, até ao fim da guerra, ele, a família e os vizinhos da sua tabanca sofreram muitos ataques. Uma família inteira, perto da sua morança, morreu [, em 1/12/1973]. A sua infância não foi fácil. A vida também não foi fácil para a população civil, de etnia mandinga, que ficou no Xime.

(...) Em contrapartida, também houve algumas coisas boas. Por exemplo, o furriel miliciano enfermeiro José Luís Carvalhido da Ponte, natural de Viana do Castelo, foi alguém especial na sua vida e na vida dos outros meninos do Xime. Foi seu professor primário na única escola que lá havia, o PEM (Posto Escolar Militar) nº 14. O Mussá Biai também teve como professor, depois da CART 3494 ter ido para Mansambo [, em novembro de 1972], o furriel Osório, da CCAÇ 12, que dava aulas no Posto Escolar Militar nº 14, juntamente com a esposa. (...)

(***) Vd. poste de 28 de abril de 2015 > Guiné 63/74 - P14535: História do BART 3873 (Bambadinca, 1972/74) (António Duarte): Parte XXIII: dezembro de 1973: flagelação do Xime, com foguetões 122 mm: sete mortos civis

Guiné 63/74 - P14543: Cartas de amor e guerra (Manuel Joaquim, ex-fur mil, arm pes inf, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67) (19): Sem nada para dizer

1. Mensagem do nosso camarada Manuel Joaquim (ex-Fur Mil de Armas Pesadas da CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67), com data de 15 de Abril de 2015:

Meus caros editores:
Anexo mais um item da minha série "Cartas ...".
Ando a atrasar-me muito mas isto não está fácil embora o faça com todo o gosto e empenho. Não tenho tido é tempo para ser mais rápido. O Luís convenceu-me a continuar por mais uns tempos e umas cartas, fazendo-me acreditar um pouco mais no interesse desta tarefa.
Brevemente irá o item n.º 20.

Agradecido pelo vosso trabalho e atenção, até sábado em M. Real.
Um grande abraço
Manuel Joaquim


Cartas de Amor e Guerra

19. Sem nada para dizer

Foto 1 > Em Mansabá > “Apetece-me gritar que me deixem, todos!”
© Manuel Joaquim

Mansabá, 11/DEZ./66

Estou mesmo sem saber o que te dizer, como hei-de entrar em contacto contigo. A atmosfera um bocadinho irritante, talvez mesmo com certa dose de despeito, estúpido ou fundamentado, que tem há uns tempos rodeado as nossas relações, está na base deste empastamento de vazio, deste momento cheio de nada ter para te dizer.
E talvez fosse a melhor maneira de contactar contigo, gritar-te que nada tenho para te dizer. Porque, agora, é esta a verdade. Daqui a bocado poderá ser que não. Agora é.
Não sei porquê mas sinto-me cá dentro como que empastado, dorido, sazonado, crestado, indiferentismo doentio a bailar, plenamente consciente de que estou cheio de não vale a pena, de não te rales, de deixa correr. É um estado de espírito esquisito, algo fora do normal. Pois se até as horas que vão correndo, os dias, me não cansam na espera! Indiferente, ao ponto … (cala-te que é melhor, Manel, porque pode doer-te muito).
Escrever-te porque estás aflita sem notícias minhas, escrever-te porque te vejo aflita com o caminho que levam as nossas relações, será só isto o porquê de pegar nestas folhas, enchê-las e enviar-tas? Não, não é. Amo-te, penso eu. Está com certeza aqui a razão por que te escrevo. No “penso eu” vai o tal indiferentismo que me rodeia. Este indiferentismo crítico que me leva a julgar que se chegasse à conclusão de que te não amava ou de que me não amavas, levaria tudo com o mesmo à vontade, a mesma inconsciência com que pego num cigarro e o acendo.
Talvez te esteja a fazer sofrer com estas minhas palavras. A criar em ti a dúvida quanto aos sentimentos que te dedico. Esta vida é toda tão chata, tão pateta, tão fedorenta, tão nada! Isto é tudo tão nada, tão nada, tão nada! Quem sabe se nós não seremos mesmo nada?!?

Foto 2. © Manuel Joaquim > Mansabá, Dezembro/1966 > “ Esta vida é toda tão chata, tão pateta, tão fedorenta, tão nada!”

Apetece-me gritar que me deixem, todos! Apetece-me clamar que desejo viver sozinho, picar-me, doer-me, rir, brincar, chorar, cantar sem que incomode os outros, acamaradando com a natureza, com a inconsciência dos seres não humanos.
O meu estado psíquico não é de molde a dar-te alegria. Pelo que disse atrás tirarás a conclusão. Apesar de querer alegrar-te. Apesar de eu querer estar contigo, apesar de eu querer possuir-te, apesar de eu te querer, apesar de eu te amar.
E é mesmo, minha querida. Não vou dizer mais nada. Porque estou mesmo sem saber o que te hei-de dizer.
Calo-me e calo-te (?) com muitos e muitos beijos.
Amorosamente, sou o teu M.
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Nota do editor

Último poste da série de 28 de janeiro de 2015 > Guiné 63/74 - P14199: Cartas de amor e guerra (Manuel Joaquim, ex-fur mil, arm pes inf, CCAÇ 1419, Bissau, Bissorã e Mansabá, 1965/67) (18): Férias