Diário de Lisboa, 20 de março de 1963.
Citação:
(1963), "Diário de Lisboa", nº 14462, Ano 42, Quarta, 20 de Março de 1963, CasaComum.org, Disponível HTTP: http://hdl.handle.net/11002/fms_dc_15229 (2018-12-2)
Fonte: Portal Casa Comum > Fundação Mário Soares > Pasta: 06548.086.18229 > Título: Diário de Lisboa. Número: 14462 > Ano: 42 > Data: Quarta, 20 de Março de 1963 > Directores: Director: Norberto Lopes; Director Adjunto: Mário Neves > Edição: 1ª edição > Fundo: DRR - Documentos Ruella RamosTipo Documental: IMPRENSA > Direitos: A publicação, total ou parcial, deste documento exige prévia autorização da entidade detentora. > Diário de Lisboa/Ruella Ramos > 1963. (Reproduzido com a devida vénia...)
O ten gen inf J. S. Carreto Curto, natural de Castelo Branco, morreu em 30/11/2018. Foi cmdt da CCÇ 153 (Fulacunda, 1961/63) (*) |
O capitão Curto a sua CCAÇ 153 foram inimigos mortais do PAIGC. O comandante Vitorino Costa foi morto em meados de 1962 (talvez julho ou junho) pelos homens do Capitão Curto, em Darsalame, e a sua cabeça terá sido trazida para Tite, sede do BCAÇ 237. Tratava-se de um "grande ronco" para as autoridades portuguesas em luta contra "o início da subversão", e foi seguramente um grande revés para o PAIGC (**) que, oficialmente, só vai começar a luta armada em 23/1/1963, com o primeiro ataque ao aquartelamento de Tite.
Falámos ao telefone, em tempos, em 2010, com dois camaradas contemporâneos dos acontecimentos: o fur mil Octávio do Couto Sousa, da CCAÇ 153, e o José Pinto Ferreira, ex-1.º cabo radiotelegrafista, CCS/BCAÇ 237 (Tite, 1961/63). Infelizmente nenhum deles integra ainda a nossa Tabanca Grande, apesar do nosso convite, e de já termos publicados postes com o seu nome (***).
Seria importante o seu testemunho mais detalhado sobre estes acontecimentos do início (mal conhecido) da guerra. Um e outro reforçaram a ideia de que o Capitão Curto, pese embora a lenda a que está associada o seu nome na Guiné, foi um militar destemido, corajoso e competente. Não conhecemos outros detalhes biográficos. Sabemos que nasceu em Castelo Branco, frequentou o respetivo liceu no início dos anos 50. E em 1989 deixou o cargo de comandante da 1.ª Brigada Mista Independente (Decreto nº 40/89 publicado no D.R. nº 140 - I Série de 1989). Era então Brigadeiro. Entre outras condecorações, recebeu a Grã-Cruz da Medalha de Mérito Militar (21 de julho de 1993), atribuída pelo então presidente da República Mário Soares. (****)
Sobre a CCAÇ 153, escreveu o nosso camarada Octávio do Couto Sousa [Mafra, 1959, Tavira em 1959/60; Furriel Miliciano em 1960/61; Sargento Miliciano em 1962/63], em comentário ao blogue Rumo a Fulacunda, em 2/10/2008:
O nosso Comandante de Companhia foi o Capitão, hoje General, José dos Santos Carreto Curto.
Fomos a única companhia em todo o Sul da Guiné em 1961, com um pelotão em Buba e uma secção em Aldeia Formosa. Tivemos depois um pelotão em Cacine. Estivemos também aquartelados em Cufar numa fábrica de arroz, assim como em Catió, até que tudo se agudizou em termos operacionais. Para Buba chegou uma companhia, a 154, outra para Cacine e por muitas outras localidades foram chegando mais unidades consoante a guerra se intensificava.
As fotos mostram o quartel de Tite onde se instalou o primeiro Batalhão, o 237, ao qual passámos a pertencer como tropa operacional e por questões de organização.
Acompanhámos o primeiro ataque a Tite [, em 23 de Janeiro de 1963,], de Fulacunda saíram reforços nos quais estivemos integrados, visto que o Batalhão, como sede, não estava ainda operacional.
A nossa companhia, a 153, acabou por ficar toda junta e em várias missões percorremos todo Sul na busca e destruição das casas de mato que o PAIGC proliferava por tudo quanto eram zonas mais ou menos isoladas. (...)
______________
Notas do editor:
(*) Vd. poste de 30 de novembr0 de 2018 > Guiné 61/74 - P19247: In Memoriam (331): O Tenente-General de Infantaria José dos Santos Carreto Curto, ex-Comandante da CCAÇ 153 (Fulacunda, 1961/63), faleceu hoje, 30 de Novembro de 2018, no Hospital das Forças Armadas de Lisboa
(**) Vd. poste de 25 de janeiro de 2013 > Guiné 63/74 - P11005: Efemérides (119): A morte do comandante Vitorino Costa, um revés para o partido de Amílcar Cabral, em 1962, ainda antes do início oficial da guerra
(***) Vd. postes de:
18 de agosto de 2010 > Guiné 63/74 - P6866: O Nosso Livro de Visitas (97): José Pinto Ferreira, ex-1º Cabo Radiotelegrafista, CCS/BCAÇ 237 (Tite, Julho de 1961 / Outubro de 1963): Evocando o lendário Cap Curto (CCAÇ 153, Fulacunda, 1961/63)
(...) Fui militar, classe de 1959. Pertenci à Arma de Engenharia, Batalhão de Transmissões , tendo sido telegrafista no RE 2,e posteriormente no Centro de Transmissões do Quartel General da 1.ª RM, nos anos 60/61. Neste Centro de Transmissões fui escravo da especialidade que tinha, trabalhando de noite e dia, com prevenções sucessivas como quando do assalto ao Santa Maria.
Em Julho de 61 fui para a Guiné integrado no Comando do BCAÇ 237, aquartelado em Tite até Outubro de 63.
Depois do que acima fica dito, quero dizer-lhes que a Guerra da Guiné merece ser contada sem paixões nem vaidades. Quase diariamente corro a persiana e espreito a janela do Vosso Blogue, o que me permite dizer ter a opinião de alguma crítica ao que é dito nos Postes referenciados.
Fui telegrafista muito activo ao serviço do Comando do BCAÇ 237, o que me permitiu assimilar algumas verdades nunca desmentidas. Dito isto, peço que aceitem e reflictam no que se diz nos Postes acima referidos:
(i) O Comandante da CCAÇ 153 foi o Capitão José dos Santos Carreto Curto, aquartelado em Fulacunda. Era um oficial corajoso, visto como inimigo fidalgal pela Rádio Conakry. Nunca terá cortado cabeças a ninguém, mas tão só sido acusado injustamente de um acto menos digno que terá sido praticado por um seu subordinado no IN, morto quando fugia para o Rio. Actos repelentes, sem confirmação, não devem ser credibilizados. (...)
(...) Comentário de L.G.:
Já em tempos, mais exactamente em 23 de Abril deste ano, fui contactado, por telefone, pelo José Pinto Ferreira, natural de (e residente em) Marco de Canaveses, concelho com o qual de resto tenho afinidades, pelo casamento e pela amizade. No essencial, o José Pinto quis dar-me alguns esclarecimentos sobre o Cap Inf José Curto, Comandante da CCAÇ 153/BCAÇ 237, subunidade que estava sediada em Fulacunda, aquando do ataque a Tite em 23 de janeiro de 1963, data tradicionalmente tida como a do início da guerra na Guiné.
Sobre a lenda do então Cap Inf José Curto (de que eu próprio me dei conta na visita que fiz ao Cantanhez, no início de março de 2008, aquando realização do Simpósio Internacional de Guiledje, Bissau, 1-7 de março de 2008), o ex-1.º cabo radiotelegrafista contou-me o que sabia, nestes termos: houve um guerrilheiro que foi morto, já lá para as bandas do Cantanhez, num ataque de surpresa a uma das barracas do PAIGC. Ao que parece, era um tipo importante da guerrilha, que estava no início da sua organização, e que foi reconhecido pelo guia ou por um cipaio. Estávamos no início da guerra, com todo o sul já polvorosa. Um militar da companhia terá, à revelia, do seu comandante, decepado o cadáver, para trazer, para Fulacunda, uma prova da sua eliminação física.
Este terá sido o princípio da lenda... O Capitão passou a ser o diabo, o terror do sul da Guiné, segundo a Rádio Conacry. Para o José Pinto, o Capitão José Curto era um militar corajoso que foi apanhado pelo eclodir da guerra de guerrilha no sul (Regiões de Quínara e Tombali), e para a qual as NT estavam muito pouco ou nada preparadas, em termos humanos, psicológicos e militares... O raio de acção da sua companhia ia de Fulacunda a Cacine (onde tinha um Grupo de Combate!).
Atenção: ele, José Pinto, não presenciou este acto, "ouviu contar" à malta da companhia (que pertencia ao mesmo batalhão, o BCAÇ 237)... Fiquei de voltar a falar com ele, desta vez pessoalmente, em Ariz, o que até agora ainda não se proporcionou... Recebo agora este mail em que ele volta a reabilitar a memória do Cap José Curto (hoje General reformado, ao que ele me diz).
(...) Ao nosso blogue interessa apenas a verdade dos factos. Como é nossa norma, não fazemos juízos de valor sobre o comportamento, individual, de nenhum combatente da guerra colonial na Guiné, muito menos dos nossos camaradas operacionais (de soldado a capitão).
Sobre o episódio acima narrado, tenho uma outra versão, mais consistente e válida, de um graduado da própria CCAÇ 153, e que estava com o seu comandante, o Cap Inf José Curto, nesse dia e local, e que portanto é uma testemunha privilegiada. Sei que, depois do regresso à metrópole, em meados de 1963, o pessoal da CCAÇ 153 nunca conseguiu reunir-se e muito menos com o seu Comandante, sobre o qual de resto esse graduado confirma a opinião do José Pinto de ser um "oficial corajoso".
(...) Este camarada poderá (...) vir a integrar a nossa Tabanca Grande, no caso de aceitar o meu convite. Até à data só tínhamos notícia do João Baptista, fur mil da CCAÇ 153, e açoriano, autor do blogue Fulacunda, mas infelizmente já falecido há um ou dois anos. (...)
10 de setembro de 2010 > Guiné 63/74 - P6965: In Memoriam (50): João Baptista (1938-2010), um camarada, um amigo, um irmão (Octávio do Couto Sousa)
(****) Último poste da série > 2 de novembro de 2018 >Guiné 61/74 - P19160: Recortes de imprensa (98): In Memoriam - Professor Doutor Carlos Cordeiro - Homenagem no Jornal Correio dos Açores (3) - Biografia por Carlos E. Pacheco Amaral