segunda-feira, 30 de junho de 2008

Guiné 63/74 - P3006: Ser solidário (12): Método cubano de alfabetização... em português



Guiné-Bissau > Região de Tombali > Sector de Bedanda > Iemberém > AD - Acção para o Desenvolvimento > Foto da Semana > 22 de Junho de 2008 > Uma ternura de imagem !... E ao mesmo tempo uma imagem que me deixa cheio de raiva e de furor. Não tanto por serem os cubanos a fazer a alfabetização, em português, do povo gentil de Iemberém, nalu, que eu tive o pirvilégio de conhecer, em 1, 2 e 3 de Março de 2008, mas por em 2008, em pleno Séc XXI, a Mariama Galissa e tantas outras Marianas da Guiné-Bissau, e de toda a África, não dominarem ainda uma tecnologia que é tão importante para o desenvolvimento pessoal, intelectual, cultural e sócio-económico e para o exercício da cidadania como é a língua oficial, escrita e falada, do seu país...

Não me interessa se é o português, o espanhol, o francês ou o inglês, não me interesssam os méritos e os desméritos do método ALFA-TV: o que importa é que as mulheres africanas (mas também os homens...) possam dominar um dos principais idiomas do mundo globalizado, e com isso marcar pontos no seu duro processo de emancipação, de conquista da autonomia, de afirmação da sua singularidade e da sua dignidade como pessoas, como cidadãs, como mulheres, como africanas... ... Eu sei que não basta apenas saber ler, escrever e contar...Eu sei que é apenas um passo, mas é decididamente um passo de gigante. Uma mulher alfabetizada, em África, tenderá a ser mais saudável, mais activa, mais produtiva, mais empreendedora, mais participativa, mais empenhada, mais reivindicativa, mais consciente dos seus direitos e deveres, mais promotora da paz, mais apta para agarrar novas oportunidades de aprendizagem e de desenvolvimento, mais competente para ajudar a família, a comunidade e o país a sair do círculo vicioso da pobreza... (LG)

Lgenda da foto: "Concluiu-se agora em Iemberém, no sul do país, o primeiro módulo de alfabetização pelo método cubano conhecido por ALFA-TV e que tão bons resultados tem obtido.

Usando um sistema de 36 aulas através de vídeo-cassetes emitidas por televisão, consegue-se que os alfabetizandos aprendam em 5 meses a escrever e a falar rudimentarmente o português.

Mariama Galissa é uma das 72 mulheres que aprenderam a escrever e que manifesta o seu entusiasmo às suas amigas e companheiras que mantêm algumas reservas em iniciarem-se nesta aprendizagem".



Foto: © AD- Acção para o Desemvolvimento > Foto da semana > 22 de Junho de 2008

Guiné 63/74 - P3005: Minitertúlia de Lisboa, sábado, 5 de Julho, às 23h, no Cabaret Maxime (1) (L. Graça / H. Reis / Pepito /T. Mendonça / J. Machado)

Fonte: Cortesia de Melech Mechaya (2008)


1.Mensagem enviado, ontem, por Luís Graça a todo o pessoal da Tabanca Grande, de A a Z:


Amigos e camaradas:

Devemos atingir esta semana a cifra das 700 mil páginas visionadas. Estávamos em 400 mil em finais de Outubro de 2007. Antingimos as 600 mil em 12 de Abril. Estamos portanto com um média de visitas diárias de 1250/1300, em números redondos... E mais de 250 camaradas e amigos da Guiné inscritos na nossa Tabanca Grande.

Uma maneira de comemorar este pequeno feito, é: (i) continuarmos a alimentar o nosso blogue, com textos e fotografias inéditas; (ii) começarmos a defender, contra a pirataria na Net, os nossos direitos de autor, através do registo do nosso blogue e dos nossos produtos na Sociedade Portuguesa de Autores (mas isso custa dinheiro...); (iii) reunirmo-nos um dia destes, para conviver, beber um copo, ouvir boa música...

Permitam-me que faça duas sugestões:

(a) Vamos pegar na série inaugurada pelo Virgínio Briote, "Os Nossos Regressos", e toca a escrever sobre as nossas memórias desses dias: a despedida de Bissau, a viagem de retorno nos "navios negreiros" (Niassa, Uíge, Alfredo da Silva...) ou nos TAM (Transportes Aéreos Militares); a chegada a Lisboa, a recepção em casa, os primeiros tempos (duros) da vida de paisano...

(b) Vamos encontrar-nos (a malta de Lisboa e arredores...) no velho "cabaret das putas", o Maxime, o Cabaret Maxime, ali na Praça da Alegria, no 58 (Lembram-se ? Ainda lá tive uma garrafa de uísque marado,supremo luxo de um "apanhado do clima", nos primeiros tempos após o meu regresso, em Março de 1971)...

Pois, no próximo sábado, dia 5, as 23 h / 11h da noite, vai lá tocar o meu puto, o João Graça, com a banda dele... Eles chamam-se os Melech Mechaya... Já editaram um CD (ou melhor, um EP, que de resto vão lançar oficialmente nessa noite) e têm actuado um pouco por todo o lado, de Norte a Sul, incluindo o Porto, a Galiza...O preço de ingresso é razoável: € 8 euros... A música é gira, festiva, divertida... Cinco instrumentos: violino, contra-baixo, clarinete, viola, percussão...

Consultem o site dos putos (que têm todos formação musical, a nível do Conservatório): http://www.myspace.com/melechmechaya

A sala tem espaço para 400 pessoas... Eu estarei lá, e pago um copo ao primeiro que aparecer... Quem está disposto a sair das suas tamanquinhas, do velho sofá em frente ao televisor ?

Um (e)terno abraço do Luís

PS - Entendam esta dica ou sugestão apenas como tal... Não é publicidade comercial, muito menos enganosa. Eu vou lá estar. Quem lá aparecer, será benvindo/a, sozinho/a ou acompanhado/a!

2. Resposta imediata do Humberto Reis (Alfragide, Amadora), de ontem:

Luís: Tinha que ser nesse dia. A essa hora estarei “a banhos” no Algarve. De qualquer maneira bebe um copo por mim. A última vez que entrei no Maxime foi com a Teresa em 1972, com o empresário Sérgio de Azevedo e esposa. Tínhamos jantado em nossa casa os 4 e ele começou a desafiar para ir beber um copo e foi toda a noite (Maxime, Convés e acabámos nos fados na Cesária). Agora não posso repetir a façanha. De qualquer maneira uma “BOA NOITE”.

Aquele abraço

Humberto

PS (não é partido p0lítico): para quando a inserção no blogue das restantes cartas topográficas? Para quando eu saber alguma coisa do ex-cap mil Augusto Penteado de Mansambo?

3. Mensagem do Pepito (AD, Bissau):Luís

Parabéns. É a cara do pai. Quando aí chegar, faço questão de lhes comprar um disco, mas com assinaturas!!!!

abraço
pepito


4. Comentário do Torcato Mendonça (Fundão):

Que maldade… que maldade… Eu morei ali pertinho, era o “sítio” mais lindo de Lisboa -by night- e no Maxime cantava o Verde Gaio… As meninas, bem as meninas!...

Parabéns, meu caro Luís, pelos 700 mil e 3 mil… mais ainda pelo teor e o que este blog representa. Sem vaidades.

Abraços do TM

5. Mensagem do Jaime Machado (Matosinhos):

Caro Luís

Estás de parabéns pelo sucesso do teu blogue! Estamos todos de parabéns porque ele também é um pouco nosso! É, como dizes, de todos quantos gostam e são amigos da “nossa” Guiné.

Tenho pena de não poder compartilhar, pessoalmente, convosco no próximo sábado, dia 5.A distância é um pouco grande e não me dá muito jeito. Mas para todos os que possam estar contigo nessa noite e naturalmente para ti vai o meu forte e sincero abraço de boa amizade.

Para o teu filho e “sus muchachos” o voto do maior sucesso.

Um abraço

Jaime

Guiné 63/74 - P3004: PAIGC: Op Amílcar Cabral: A batalha de Guileje, 18-25 de Maio de 1973 (Osvaldo Lopes da Silva / Nelson Herbert)

Guiné > PAIGC > Manual escolar, O Nosso Livro - 2ª Classe, editado em 1970 (Upsala, Suécia). Exemplar cedido pelo Paulo Santiago, Águeda (ex-Alf Mil, comandante do Pel Caç Nat 53, Saltinho , 1970/72) > Fotografia do "Camarada Amílcar Cabral, Secretário Geral do Partido", pág. 107.



Foto: © Luís Graça & Camaradas da Guiné (2007). Direitos reservados.



Guiledje 35 Anos Depois
Por Nelson Herbert

16/03/2008

Voz da América / Voice of America

Entrevista a Osvaldo Lopes da Silva (Ficheiro áudio: 13' 11''. É preciso instalares no teu PC o programa RealPlayer)


Osvaldo Lopes da Silva, um antigo comandante de artilharia da guerrilha do PAIGC, na Guiné-Bissau aborda, 35 anos depois e em exclusivo à VOA [Voice of America / Voz da América], aspectos operacionais da pressão militar montada por aquela guerrilha independentista contra o destacamento militar de Guiledje, que culminaria, em 1973, no seu abandono pela então tropa portuguesa (2).


2. Comentário de L.G.:


O Nelson Herbert é jornalista, membro da nossa Tabanca Grande desde Março de 2008. Nasceu em Bissau, a 16 de Setembro de 1962, sendo filho de mãe guineense e pai cabo-verdiano. Como ele nos disse, no mail de apresentação, pertence à " mesma geração do historiador Leopoldo Amado, um amigo e colega de infância e das lides académicas em Bissau e universitárias em Portugal".

A sua infância foi passada em Bissau: "Vivi e cresci defronte à messe dos sargentos da Força Aérea" em Bissau. Aí assitiu, nos anos 70, a um atentado bombista (falhado, que não felizmente não provocou vítimas), contra um autocarro da Força Aérea . "Um ataque atribuído às células clandestinas do PAIGC em Bissau, que conhecia a rotina da concentração de oficiais e militares defronte do edifício da messe, para as habituais sessões de cinema na base em Bissalanca".

Depois da infância e adolescência em Bissau, veio para Lisboa onde se licenciou em Comunicação Social, pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. Partiu, nos anos 90, para os Estados Unidos, para fazer continuar a sua formação académica e profissional. Acabou por lá ficar e adoptar a nacionalidade norte-amerciana.

Como editor e jornalista da VOA - Voice of America, cobriu a guerra civil em Angola, país que conhece bem. Foi também enviado especial da Voz da América ao conflito civil na Guiné-Bissau em 1998/99 e na região senegalesa de Casamance.

Confessa-se "um apaixonado pelo capítulo da guerra colonial ou de libertação, capítulo esse a que me tenho debruçado como jornalista, com vários artigos e reportagens. Anos antes, a convite do Governo de Cabo Verde saído das primeiras eleições democráticas no arquipélago, assumi num período em que tive que fixar residência em Cabo Verde, a direcção geral da Televisão Nacional de Cabo Verde".

É actualmente editor sénior da divisão para a África da Voz da América, Serviço em Português, com incidência para a África Ocidental, em particular para nossa Guiné (1).

Voltamos a inserir o link com a entrevista que o Nelson fez ao comandante Osvaldo Lopes da Silva, de nacionalidade cabo-verdiana, e residente em Cabo Verde. O Osvaldo Lopes da Silva também foi entrevistado para o filme de Diana Andringa e Flora Gomes, As Duas Faces da Guerra (Portugal, 2007). A sua presença também esteve originalmente prevista para o Simpósio Interncional de Guileje, Bissau, 1-7 de Março de 2008, o que não veio a acontecer por razões que desconheço. Sei que o seu depoimento sobre a batalha de Guileje também foi recolhido - creio que, pessoalmente, pelo Pepito ou por alguém da sua equipa - no âmbito da preparação d0 Simpósio.

É um importante depoimento sobre a batalha de Guileje, vista pelo lado dos guerrilheiros do PAIGC. É fundamental que se recolha, trate e divulgue este tipo de depoimentos. A grande maioria dos guerrilheiros do PAIGC nunca teve nem terá acesso à palavra (escrita, gravada)... Muitas das suas histórias de guerra e de vida morreram ou vão morrer com eles.

De destacar algumas afirmações no decorrer da entrevista:

"[A] Operação Amílcar Cabral, cuja preparação levou cerca de 3 meses e culminou com a queda, em Maio de 1973, do quartel de Guiledje" (NH)

"(...) Uma das mais importantes e emblemáticas fortificações militares do exército colonial de Portugal na Guiné" (NH)

" (...) Osvaldo Lopes da Silva, um antigo comandante da guerrilha, por sinal o homem a quem Amílcar Cabral confiou a atrefa de preparar as condiçõesa para um eventual ataque àquela fortificação militar colonial na expectativa de que a sua queda ditaria um novo rumo à luta de independência (...) (NH)

"Nós tivemos que fazer um levantamento topográfico de toda a zona. Foi um trabalho muito difícil (...). Era uma zona de floresta um bocado densa (...). Era uma zona muito minada (...). Tivemos algumas baixas (...),sempre por causa de minas (...)" (OLS).

" (...) O inimigo habituou-se a não contar com tiro de precisão. No momento exacto fizemos tiro sem corecção. Foi directamente. Concentração de fogo lá onde nós queríamos" (OLS).

"(...) Durante muito tempo seguimos o trajecto que a tropa fazia para ir buscar água. Deixámos fazer. Eles nunca se aperceberam que estavam a ser seguidos. Então, no momento exacto, quando íamos [,a infantaria,] para o ataque, ocupámos a água. E eles ficaram sem água" (OLS).

"(...) o exército colonial tinha perdido completamente o domínio aéreo. [Com os mísseis], perderam em pouco tempo vinte e tal aviões. Era muito para eles" (OLS).
[Esta informação não é factual, a FAP nunca perdeu esse número de aviões no CTIG].

" Outros quartéis caíram, mas o que foi mais espectacular foi justamente Guiledje. Contavámos que resistisse muito mais (...)" (OSL) [Não é claro a que quartéis o comandante OLS se está a referir: Kopá ou Copá ? Oficialmente o exército português nunca reconheceu a perda de mais nenhum aquartelamento, para além do de Guileje, ocupado em 25 de Maio de 1973 pelas tropas do PAIGC e depois por estas destruído ]

" (...) eu pessoalmente digo que fiquei aliviado que eles tivessem saído, foi melhor assim (...) (OSL)

" (...) deixaram a central eléctrica a funcionar... Pensávamos que tivessem ainda lá (...) nos abrigos (...)" (OLS)

" ... Com Cabral tudo estava previsto. Uma das medidas que adoptou, perante a instabiliddae que havia na Guiné-Conacri, foi enviar todas as munições para a Guiné-Bissau, ao longo da fronteira. (...) Dá-se a morte de Cabral, a ideia de Spínola seria uma grande ofensiva, mas não podia ser imediatamente, porque se podia (...) responsabilizá[-lo] pela morte de Cabral" (OSL)

"... Ele [,Spínola,] não contava com a reacção que de facto houve (...) Uma reacção de raiva em todos os diferentes quartéis, do sul da Guiné, mas também do Leste (...). Isso bloqueou toda a iniciativa do Spínola (...) (OSL).

" (...) Rendo homenagem a esse guerrilheiro anónimo [morto por uma mina, e que ia sempre à frente do seu comandante, OLS, tendo ficado enterrado junto ao arame farpado de Guileje]... Citaria [também] o nome de Seabra, Veríssimo Seabra (...). Foi um dos meus companheiros. E há muitos mais guineenses que foram combatentes exemplares, de grande coragem e espírito de sacrifício" (OSL).


_______

Nota de L.G.:

(1) Vd. postes de: 14 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2639: O Simpósio de Guiledge na Voz da América (Virgínio Briote)

16 de Março de 2008 >
Guiné 63/74 - P2652: Guineenses da diáspora (3): Nelson Herbert, o nosso Correspondente nos EUA (Virgínio Briote)

21 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2670: Fez-se História em Guileje (Nelson Herbert)

(2) Vd. também a versão do lado português:

27 de Setembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2137: Antologia (62): Guileje, 22 de Maio de 1973: Coutinho e Lima, herói ou traidor ? (Eduardo Dâmaso / Luís Graça)

3 de Fevereiro de 2008 > Guiné 63/74 - P2502: Guiledje: Simpósio Internacional (1 a 7 de Março de 2008) (14): Enquadramento histórico (II): o significado da queda de Guileje

23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2673: Uma semana memorável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (10): Guiledje: Homenagem ao Coronel Coutinho e Lima

23 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2677: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Coutinho e Lima (1): Comandante do COP 5, com 3 comissões no CTIG

23 de Março de 2008 >Guiné 63/74 - P2678: Simpósio Internacional de Guileje: Comunicação de Coutinho e Lima (2): A dolorosa decisão da retirada de Guileje

Guiné 63/74 - P3003: Blogoterapia (58): Que o País os beije antes de os deitar fora, e lhes peça desculpa (António Lobo Antunes / A. Graça de Abreu)


Reprodução da capa da edição do semanário Visão, de 27 de Setembro de 2007, em que o escritor António Lobo Antunes deu uma notável entrevista a Sara Bela Luís sobre "A Vida Depois do Cancro".

Fonte: Cortesia de Site Não Oficial sobre António Lobo Antunes (2008)

1. Mensagem do António Graça de Abreu, também escritor, tradutor e investigador, e nosso prezado amigo e camarada, com data de 20 de Junho:


Que o País os beije antes de os deitar fora, e lhes peça desculpa
por António Lobo Antunes/ António Graça de Abreu

Caríssimos tertulianos, camaradas e amigos:

António Lobo Antunes, enorme escritor, foi alferes médico no leste e centro de Angola, de 1971 a 1973 (1). Na sua crónica na revista Visão, ontem, quinta feira, a 19 de Junho de 2008, escreve:

(…) Todos os anos a minha companhia lá da guerra faz um almoço com os que sobejam da miséria em que andámos. Não neste último almoço, no penúltimo, o furriel Firmino Alves começou a anotar os telemóveis dos nossos camaradas para os contactos da refeição seguinte, até que chegou ao Pontinha. Pontinha é a alcunha do ordenança da messe de oficiais, que morava na Pontinha. Como a cabeça dele era grande (continua a ser grande), chamavam-lhe também Porta-aviões, porque dava para os aviões aterrarem.

O Pontinha, como muitos dos soldados, vive com dificuldades. Ao fim de semana engraxa sapatos para equilibrar o orçamento.
(…) Falar dos meus camaradas comove-me: a expressão irmãos de armas é tão verdade. Enquanto nos aguentamos por cá. Mesmo depois. Zé Jorge, continuamos irmãos de armas. Cabo Sota: admiro a tua coragem até ao fundo da alma. Sozinho com a Breda, uma metralhadorzeca, aguentou um ataque. E vive mal, percebem? Como se deixa viver mal um herói? Ao acompanhá-lo ao táxi em que voltava, doente, ao Alentejo, avisei o condutor:
- Você leva aí um grande homem, sabia, um dos maiores homens que conheço

e, como todos os grandes homens da guerra, de uma infinita modéstia, bondoso, sereno. Não lhe chego aos calcanhares. Cabo Sota, tu mereces a continência de um general. O Zé Luís, oficial de operações especiais que em matéria de coragem não necessitava de aprender com ninguém:
- Eram duros

expressão que constitui para nós o supremo elogio. Adiante. Contava eu que o furriel Firmino Alves anotava os telemóveis até que chegou ao Pontinha e como fizera com os outros perguntou:
- Tens um telemóvel, Pontinha?

E o Pontinha logo a mostrar serviço:
-Não, mas a minha mulher tem um microondas.


(…) Boaventura, Nini, Licínio, vocês todos, caramba, como a gente somos irmãos. Unamuno, que muito respeito, tem páginas admiráveis sobre a valentia dos portugueses. Tens razão, Zé Luís, eram duros. Ganas de explicar às mulheres deles, aos filhos deles, o orgulho que tenho em ser amigo dos pais, em que os pais sejam meus amigos. Não: irmãos de armas. Não: irmãos. E bons como o pão. Ao lado disto que maior elogio se pode fazer? Ao menos que o País o beije antes de os deitar fora e lhes peça desculpa. E há mais anjos para além dos padeiros, de arma nas unhas mata fora. Nenhum deles é banqueiro, claro. Nem administrador. Nenhum deles joga golfe. Jogaram golfe num campo de um só buraco onde não é a bola que cai. É um rapaz de vinte anos.

E acabo aqui, antes que seja tarde para marcar o número de um microondas.


Camaradas de Portugal e da Guiné, depois de ler este texto, duas grossas lágrimas correram-me pelo rosto. Que o nosso País nos “beije antes de nos deitar fora e nos peça desculpa”. Que a vossa Guiné-Bissau vos beije também, “antes de vos deitar fora e vos peça desculpa.”

Sem complexos nem traumas de colonialista, sem complexos, sem traumas de colonizado, vamos ler outra vez o texto do António Lobo Antunes.

Depois, vamos adormecer em paz.

Um abraço,
António Graça de Abreu
S. Miguel de Alcainça,

20 de Junho de 2008
Ano do Rato
______

Nota de L.G.:

(1) Vd. postes de:

6 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2161: Pensamento do dia (12): Camarada, uma palavra que só quem esteve na guerra entende por inteiro (António Lobo Antunes)

9 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2169: Antologia (63): Zé, meu camarada, eras um dos nossos e cada um de nós um dos teus (António Lobo Antunes, Visão, 4 Out 2007)

23 de Outubro de 2007 > Guiné 63/74 - P2205: Humor de caserna (1): A sopa nossa de cada dia nos dai hoje (Luís Graça / António Lobo Antunes)

Guiné 63/74 - P3002: A Guerra estava militarmente perdida? (23). Comentário do Cor Amaro Bernardo.

Guiné - Guerra e Descolonização…

Por Manuel Amaro Bernardo

(…) É sabido que estes três G (Guidage, Gadamael e Guilege) estão associados à escalada da guerra, que se seguiu ao assassinato de Amílcar Cabral (20-1-1973) e precedeu a declaração (unilateral) de independência da Guiné-Bissau em 24-9-1973. Maio, Junho e Julho de 1973 foram três meses terríveis para as NT, cercadas em Guidage, Guilege e Gadamael. (…)
Luís Graça, no seu site, em 4-6-2008

Este destaque faz um resumo interessante em relação ao sucedido na Guiné no último ano de guerra (1973-74) decorrente no território. Até pela analogia feita com os três D do publicitado objectivo do MFA, no pós-25 de Abril: Democratizar, Descolonizar e Desenvolver.
Curiosamente, em Portugal, a "democratização" apenas seria conseguida em Novembro de 1975, contra as forças comunistas e totalitárias.
A "descolonização" seria desencadeada sem ter em conta os interesses dos portugueses residentes naquelas paragens e o "desenvolvimento" terá ficado muito aquém do desejável; decorreu de tal modo que forças de direita ainda hoje culpam o 25 de Abril, apesar de "tanta água ter passado por debaixo das pontes".

Vou repescar o tema tratado no site de Luís Graça, com uma polémica entre dois combatentes: Beja Santos e Graça de Abreu, de modo a poder adiantar mais uma opinião sobre este controverso assunto. Claro que a minha posição em relação ao primeiro poderá ter sempre algum reflexo menos isento, face à desajustada crítica que ele fez publicar sobre o meu último livro "Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros; Guiné 1970-1980" e que motivou uma resposta minha, dois dias depois, no mesmo site.

Antes disso, e dado o seu grande período de permanência na Guiné, recordo as posições tomadas pelo Major General Hélio Felgas, falecido há dias em Lisboa (e com textos também bastante divulgados no site de Luís Graça, numa conferência feita aos cadetes da Academia Militar, em 10-4-1970, após o seu regresso ao continente português. Transcrevo alguns destaques do extenso texto publicado nesse ano, na Revista Militar:

(…) O PAIGC é um movimento revolucionário de tendências sócio-comunistas. A sua estrutura, imitada da do regime guineense de Sékou Touré, baseia-se no sistema soviético da preponderância do partido sobre o governo.
No capítulo sobre as Nossas Tropas, a certa altura refere:
(…) Convém salientar que as unidades metropolitanas de reforço não se limitam a combater. Elas contribuíram para a melhoria que, em todos os campos, se nota hoje na Guiné.
Após quatro anos de permanência na Guiné, sempre no mato, que é onde se conhecem melhor os nativos, sou levado a chegar à conclusão que a Guiné progrediu mais nestes últimos 8 ou 9 anos que nos anteriores cinco séculos. E empenho nesta afirmação um pouco do meu orgulho de militar, pois é exactamente à presença dos militares que a nossa Guiné deve o seu actual impulso. (…)
E mais à frente, com maior ou menor optimismo, apresenta o ponto da situação naquele ano de 1970:
(…) Por motivos vários, entre os quais avulta a deficiência de informação pública, a situação na Guiné é em geral mal avaliada na Metrópole, havendo tendência para a considerar muito pior do que na realidade está.
De facto, na maior parte da Guiné, as populações fazem a sua vida normal, não havendo sinais visíveis da guerra. É o que acontece em todas as ilhas atlânticas (incluindo a de Bissau), em grande parte do “chão” dos Manjacos e na quase totalidade e na quase totalidade da massa continental do Leste.
No resto do território, o inimigo faz as suas incursões de surpresa, mas regressa logo ou às bases que tem no Senegal e na República da Guiné, ou aos refúgios das matas mais espessas.(…)

Curiosamente, cerca de dez dias depois desta conferência, dar-se-ia um agravamento na situação em relação às NT, devido à morte dos três majores (20-4-1970) e à não integração de todo o "chão" manjaco, como estava previsto acontecer.

Perspectivas sobre a guerra da Guiné

E a terminar Hélio Felgas afirmaria, com alguns aspectos promenitórios:

(…) Em nossa opinião, o PAIGC já deve ter compreendido que, a não ser que empregue meios, forças e tácticas diferentes, jamais poderá ganhar militarmente esta guerra.
(…) Admitimos que o PAIGC esteja realizando ou vá realizar novos e mais profundos esforços no sentido de tornar insustentável a nossa posição na Província.
Estes novos esforços serão desenvolvidos em todos os campos desde o diplomático ao militar. O colapso repentino do Biafra não pode deixar de favorecer o PAIGC, em especial quanto ao armamento. Outro tanto sucederá se a guerra do Vietname acabar, pois os contactos entre o PAIGC e o Vietcong já se encontram estabelecidos, como dissemos.
No entanto, se por um lado temos obrigação de admitir o reforço da actividade geral do inimigo – tanto mais que sabemos ele estar apoiado pela OUA e por grande parte dos países membros da ONU -, por outro lado não podemos deixar de reconhecer as tremendas dificuldades com que o PAIGC vai continuar a deparar se insistir em cumprir o programa que se propôs.
De facto, em primeiro lugar, há que contar com a nossa determinação em defendermos o solo cinco vezes centenário da Guiné Portuguesa. Em segundo lugar, é natural que, a um esforço maior do inimigo, respondamos com outro esforço também maior. E em terceiro lugar, não vemos como, nos anos mais próximos, o PAIGC terá possibilidade de levar a Cabo Verde a guerra que nos move na Guiné, dadas as características para nós favoráveis que o arquipélago apresenta.

Tal como salienta Luís Graça, a situação apenas viria a agudizar-se seriamente com o assassinato de Amílcar Cabral. Até essa altura os soviéticos não tinham querido arriscar entregar os sofisticados mísseis terra-ar Strella aos guerrilheiros do PAIGC, apesar de já terem sido anteriormente requisitados por este movimento. Aquando das cerimónias fúnebres daquele líder é que tal terá sido decidido e comunicado pela delegação soviética presente, como, de facto, aconteceu.
De qualquer modo, essas armas apenas serviram para desestabilizar a Força Aérea da Guiné durante algumas semanas (com as consequências graves nas evacuações e no restante apoio aéreo), pois, como refere Graça de Abreu, em 29-5-2008, desde Junho de 1973 até Abril de 1974 não foi atingida qualquer aeronave dentro do território. Ou os homens de Manecas dos Santos (PAIGC) não foram bons alunos na instrução ministrada na União Soviética ou os pilotos portugueses souberam actuar com eficiência e de acordo com novas exigências anti-aéreas.

No entanto, em 1972 tinha surgido um factor muito importante, que poderia ter conduzido ao fim da guerra, ainda em posição de alguma vantagem das NT em relação ao PAIGC. Tal seria completamente desprezado por Marcello Caetano, com a oposição do Governador da Guiné, António de Spínola. Amílcar Cabral, acedendo aos bons ofícios do Presidente do Senegal, Leopold Senghor, estaria, de facto, disposto a negociar directamente o cessar-fogo com a promessa de independência futura, num prazo a definir. Percebe-se que os defensores da continuação da guerra (dum lado e do outro) tenham apostado na eliminação física de Amílcar Cabral…

Considero que Beja Santos, durante a polémica sobre se a guerra estava ou não perdida militarmente, divagou bastante através de citações de entidades em vários livros, mas mais no âmbito das intenções e possibilidades do que da realidade vivida no terreno.
A notícia sobre o possível fornecimento dos aviões Migs ao PAIGC é bastante elucidativa… Poder-se-á afirmar que após a saída do General António de Spínola da Guiné (meados de 1973), voltou a ser conseguido um equilíbrio no potencial militar das duas partes, após as operações agressivas do PAIGC em Guidage, Guilege e Gadamael, em Maio/Junho.
Guilege fora abandonada, mas em Guidage e Gadamael, a partir dos finais de Junho, a situação melhorara consideravelmente. (Declarações dos Coronéis “Comando” Raúl Folques, Manuel Ferreira da Silva e Marcelino da Mata, no meu livro acima citado).

Aquele equilíbrio, existente por altura do 25 de Abril de 1974, seria confirmado por Aristides Pereira numa entrevista a Leopoldo Amado, em "O Meu Testemunho; uma Luta; um Partido; dois Países". Lisboa, Ed Notícias, 2003, como igualmente destacou Graça de Abreu.

Também, como refiro nesse trabalho, acompanho a tese explanada pelo General Almeida Bruno e realçada por Graça de Abreu:
"(…) a Guiné não estava perdida militarmente. A Guiné estava perdida porque a solução não era militar mas política e nós já tínhamos perdido (a oportunidade) da solução política (em 1972)".

Solução política negociada, como julgo ter acontecido com a generalidade deste tipo de guerras subversivas e de guerrilhas, na segunda metade do século XX, acrescentaria eu.

Uma Descolonização “inevitável” e apressada…

Para complementar o que atrás foi referido, passo a comparar descolonização ocorrida no caso português com a realizada pelos franceses na Argélia. Nesse sentido, recordo as declarações (numa entrevista que me concedeu), do homem culto e com grande estatura militar, que foi o General Passos Esmeriz e que prestou serviços relevantes na GNR no pós-25 de Abril. Afirmava ele (“Memórias da Revolução, Portugal 1974-1975”, Lisboa Ed. Prefácio, 2004):
(…) O soldado, desde que soube ter sido feita uma revolução em Lisboa e se ia para a descolonização, não mais combateu, enquanto que, com De Gaulle, na Argélia, se combateu até ao fim. Ele mandou quantificar as acções de um lado e do outro e dizia: "Só inicio os acordos quando houver equilíbrio de iniciativas".
Os acordos de Evian apenas se iniciaram quando esse equilíbrio se verificou. Numa situação que nenhuma parte tinha mais força do que a outra. Mas o soldado, lá, combateu até ao final. Eles ainda estavam agarrados à ideia de que a Argélia não podia deixar de ser francesa…

No caso português, os nossos militares não tinham qualquer ligação com os locais onde se encontravam. Conto-lhe um episódio que considero lapidar. Eu era Comandante de um Batalhão na Guiné, em 1963/65 e tinha chegado uma companhia da Metrópole. Lá estive a fazer aquele papel de circunstância, de dizer umas palavras de boas vindas e de apelo a cumprirem a sua obrigação militar. Encontrava-se presente um rapaz baixo, a quem perguntei de onde era oriundo. Resposta dele: "Sou de Alcafache. E estou satisfeito por vir conhecer terras estrangeiras".

A descolonização pode ser muito condenada, mas naquela situação tão complexa, com os factores que a condicionaram, talvez não pudesse ser feita de outra maneira.
Pode dizer-se que foi uma entrega… Mas, se quiséssemos impor outro modelo de descolonização, acabaria numa derrota militar, o que seria muito pior.
Houve outros factores exógenos para que a desmotivação das tropas fosse incentivada, alargada e aumentada. Desde o Rosa Coutinho à actuação, em Portugal, do PCP; mas o factor principal foi a desmotivação nacional… (…).

Agradeço a publicação deste texto no vosso site. Também endereço os meus sentidos pesâmes aos familiares do General Hélio Felgas, assim como aos de outros combatentes cujos falecimentos vêm ocorrendo e têm sido ignorados, pelas mais variadas razões…

E quando algum combatente, como já aconteceu neste site, em relação aos negros fuzilados pelo PAIGC, pergunta sobre essa vingança feita contra os outros, que também combateram do nosso lado - fuzileiros especiais, militares na generalidade e milícias -, além dos "Comandos" (20 oficiais, 29 sargentos e 4 soldados), apenas tenho a referir que as outras associações de combatentes, incluindo a recém-constituída em Bissau, Associação de ex-Combatentes das Forças Especiais da Guiné (patrocinada pelo Comandante Alpoim Calvão) devem fazer as necessárias investigações e listagens do pessoal vítima dessas atrocidades, tal como foi feito pela Associação de Comandos. Julgo que todos têm o direito de ter o seu nome no Monumentos aos Combatentes do Ultramar, no Restelo (Lisboa), já que foram fuzilados "apenas" por terem combatido por Portugal. E já têm duas bases de partida para essas investigações: as listagens de fuzilados, feitas por João Parreira, em 2006, e constantes do site de Luís Graça, e as várias relações por mim publicadas no livro atrás referido - "Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros, (…)", 2007.


Cor. Manuel Amaro Bernardo
Junho de 2008
__________

Nota:

1.Os nossos agradecimentos ao Cor Manuel Amaro Bernardo pelo envio do texto.
2. Fixação e adaptação da responsabilidade de vb.
3. Artigos relacionados em

21 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2971: o 10 de Junho visto pelo Cor Manuel Amaro Bernardo.

14 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2760: Notas de leitura (8): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros... ou a guerra que não estava perdida (A.Graça de Abreu)

2 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2713: Notas de leitura (7): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros: Resposta a um Combatente (M. Amaro Bernardo)

2 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2711: Notas de leitura (6): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros, de M. Amaro Bernardo (Mário Fitas)

31 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2706: Notas de leitura (5): Guerra, Paz e Fuzilamentos dos Guerreiros, de Manuel Amaro Bernardo (Mário Beja Santos)

30 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2318: Notas de leitura (4): Na apresentação de Guerra, Paz e Fuzilamento dos Guerreiros: Guiné 1970/80 (Virgínio Briote)

28 de Novembro de 2007 > Guiné 63/74 - P2308: Notas de leitura (3): Guerra, Paz e Fuzilamento dos Guerreiros: Guiné, de Manuel Amaro Bernardo (Jorge Santos)

Guiné 63/74 - P3001: História da Cavalaria em Bambadinca (3): Pel Rec Daimler 2206 (1970/71) adido ao BART 2917 (Jaime Machado)


Jaime Machado,
ex-Alf Mil Cav,
Pel Rec Daimler 2046,
Bambadinca,
1968/70






RESUMO DOS FACTOS E FEITOS DO PELOTÃO DE RECONHECIMENTO DAIMLER N.º 2206


CAVALEIROS DE BAMBADINCA, como se intitulavam os militares do Pel Rec Daimler 2206


I - GENERALIDADES

O Pelotão Daimler 2206 tem como Unidade Mobilizadora o RC6 no Porto, e foi organizado em 17 de Novembro de 1969, destinado e reforçar a Guarnição Normal da Província da Guiné.

Após os exercícios de IAO, esta Subunidade embarcou no N/T UIGE no Cais da Rocha de Conde de Óbidos em 31 de Janeiro de 1970. Tendo a viagem decorrido normalmente, no dia 6 de Fevereiro de 1970 foi atingido o Porto de Bissau.
Depois de curta permanência nesta localidade, partiu por via Fluvial até ao Xime, e em coluna até Bambadinca.

II - CONSTITUIÇÃO DO PELOTÃO:



José Luís Vacas de Carvalho, Comandante do Pel Rec Daimler 2206, Bambadinca, 1970/71


Alteração:

Desde o dia 12 de Julho de 1970, ficou a fazer parte deste Pelotão por ter sido transferido do PEL DAIMLER 2144, por motivos disciplinares, o Soldado Condutor NM 06769468, Anastácio Ribeiro Gomes da Silva, tendo ficado além Q.O. Foi abatido ao efectivo em 19 de Agosto de 1971 por ter terminado a sua comissão de serviço nesta Província Ultramarina.


III - ACTIVIDADE OPERACIONAL

Da actividade operacional do PEL DAIMLER 2206, destaca-se:

- Participou, na construção dos Reordenamentos de NHABIJÔES.
- Tomou parte na escolta de inúmeras colunas de Reabastecimentos e outras de,
BAMBADINCA para XIME – MANSAMBO – XITOLE e BAFATÁ.
- Colaborou intensamente na segurança aos trabalhos de construção da estrada
BAMBADINCA-XIME.
- Após a conclusão desta estrada colaborou diariamente na segurança do tráfego da mesma
- Colaborou na defesa próxima e afastada de BAMBADINCA.
- Individualmente os elementos que constituem o PEL DAIMLER 2206, colaboraram nos mais variados serviços internos do BART 2917, ao qual estava adido.

Vacas de Carvalho, oficial de tiro do CIMIL, de boina com as armas de Cavalaria, na estrada Bambadinca-Xime com General Spínola.

IV - BAIXAS SOFRIDAS, PUNIÇÕES, PROMOÇÕES, LOUVORES E CONDECORAÇÕES

Baixas sofridas – Nada

Punições – Nada

Promoções

Foi promovido ao actual posto em 31 de Maio de 1971, o 2. º Sarg de Cav NM 32156559, José António Paulino.

Louvores

Louvado pelo Exm.º Comandante do CAOP2, o Sr. Alf Mil NM 13207568, José Luís Vacas de Carvalho

Louvados pelo Exm.º Comandante do BART 2917, os seguintes militares deste Pelotão:


Condecorações

Todos os militares que constituem o PEL DAIMLER 2206, foram agraciados com a Medalha Comemorativa das Campanhas da Guiné.

BATALHÃO DE ARTILHARIA 2917

Proposta de Louvor

Proponho que seja louvado o Alferes Miliciano de Cavalaria NM 13207568, José Luís Pais Vacas de Carvalho, Comandante do Pelotão de Reconhecimento Dailmler 2206, pela excelente maneira como comandou o seu Pelotão ao qual soube incutir destacado espírito de corpo e elevado moral, a par de uma marcada eficiência, disciplina e sentido das responsabilidades.

Oficial competente, muito dinâmico, desembaraçado, decidido, corajoso e leal, tomou parte voluntariamente, ao longo da sua comissão de serviço na Guiné, não só em diversas Operações e Acções, como também em colunas logísticas, demonstrando de forma inequívoca não temer situações de perigo.

Chamado a colaborar em tarefas estranhas ao seu Pelotão, nelas se houve com muito acerto, sendo em especial de assinalar a sua acção como Oficial de tiro do CIMIL de Bambadinca, onde se distinguiu pelo interesse, competência e resultados obtidos.

Muito estimado pelos seus subordinados, e apreciado pelos seus superiores o Alferes Vacas de Carvalho foi sempre também um excelente camarada, devendo ser considerado um Oficial de mérito que bem cumpriu a sua comissão.

Quartel em Bambadinca, 25 de Novembro de 1971

O Comandante
João Polidoro Monteiro
Ten Cor Inf


Fão, Esposende, 1994> Vacas de Carvalho (na foto, à direita) no 1.º Encontro de camaradas de Bambadinca

Montereal, Maio de 2008> Vacas de Carvalho, ex-Alf Mil de Cav (na foto, à esquerda), no III Encontro Nacional, agarrado à sua viola de sempre.
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Nota de CV

Vd postes da série de:

5 de Junho de 2008> Guiné 63/74 - P2918: História da Cavalaria em Bambadinca (1): Pel Rec Daimler 1133 (1966/68) adido ao BCAÇ 1888 e ao BART 1904 (Jaime Machado)

10 de Junho de 2008> Guiné 63/74 - P2927: História da Cavalaria em Bambadinca (2): Pel Rec Daimler 2046 (1968/70) adido ao BART 1904 e ao BCAÇ 2852 (Jaime Machado)

Guiné 63/74 - P3000: Bibliografia (28): Amílcar Cabral: nada mais prático do que uma boa teoria (Luís Graça)


CHABAL, Patrick - Amilcar Cabral: Revolutionary Leadership and People's War. 2 rev edition. London: C Hurst & Co Publishers Ltd; 2004. 278 p. £14.95

This text tells the story of Amilcar Cabral, who, as head of the PAIGC, Guinea-Bissau's nationalist movement, became one of Africa's foremost revolutionary leaders. He led Guinea-Bissau's nationalists to political and military success over a colonial power.

Source/ Fonte:
Hurst & Co (Publishers) (courtesy from / com a devida vénia...)



1. Ao chegarmos ao poste P3000, e às cerca de 700 mil páginas visitadas (cerca de 1300 por dia, nos últimos doze meses), deixem-me hoje, amigos e camaradas, publicar um dos meus textos, esquecidos no limbo dos meus papéis da Guiné... Criador e editor deste blogue, a publicar os papéis dos outros, não me resta tempo para escrever os meus...

É sobre a análise da estrutura social da Guiné feita por Amílcar Cabral e que é reveladora das qualidades de Cabral como pensador, como teórico, como analista social... O que ainda hoje me leva a respeitá-lo e a admirá-lo, é que, para além do grande político, do dirigente revolucionário combativo, do genial estratego militar e do tenaz organizador, há nele um homem culto e intelectualmente brilhante, seguramente um dos melhores da sua geração e de toda a África.

Ele sabia que a acção colectiva organizada, incluindo a luta armada de libertação, tem de ser guiada pela teoria. Cabral não se limitou a ler a cartilha dos pensadores (marxistas-leninistas) que, no seu tempo, influenciaram grande parte das elites e dos dirigentes africanos da época da descolonização. Uma influência desastrosa e desastrada, em muitos casos. Cabral, pelo contrário, era capaz de pensar pela sua própria cabeça e confrontar a teoria com a prática: o pensamento sempre guiou a sua acção; e foi capaz de reformular a teoria à luz dos ensinamentos da prática...

Passados trinta e cinco anos da sua morte, é pena não termos uma edição crítica das suas obras (1). Cabral está morto e esquecido. Tanto na sua terra como em Portugal, em África como no retso do mundo. Digo-o com pesar. A sua existência (física) faz-nos falta, a todos nós. E é sobretudo duro ver que ele não teve ninguém, com a sua estatura humana, intelectual e moral, para o substituir à frente dos destinos do PAIGC e da Guiné independente, um sonho que ele de resto já não chegou a viver. É confrangedor ver, por exemplo, a deriva teórico-ideológico do actual PAIGC, que ele criou e ajudou a crescer... A criatura não sobreviveu ao seu criador... Não é caso único na história...

De qualquer modo, estes apontamentos que escrevi em tempos, nos finais dos anos 70, e que revi agora, são também uma pequena homenagem ao intelectual guineense que eu já admirava, quando despertei para a política e para a problemática da guerra colonial, a partir de 1961, com os meus quatorze anos, e que, por ironia, fui obrigado a combater, de armas na mão, ao ser mobilizado para a Guiné, oito anos depois, em 1969...
Devo reconhecer que sou apenas um leitor de Amílcar Cabral, e não um especialista. Não conheço ainda, de resto, a biografia escrito pelo Patrick Chabal, considerado o seu melhor biógrafo e um especialista do seu pensamento e acção. Tive o privilégio de conhecer, por ocasião do Simpósio Internacional de Guileje, o investigador francês, que vive em Inglaterra, e que fala o português... Estes apontamentos que a seguir se publicam são apenas um resumo crítico de alguns textos do Amílcar Cabral sobre a estratificação social da Guiné ... (LG)
____________

Amílcar Cabral, analista social, por Luís Graça
(i) A distinção cidade/campo
Em 1964, Amílcar Cabral fez uma sumária análise da “estrutura social” da Guiné colonial. Era uma análise tipicamente marxista, ou melhor, que usava conceitos sociológicos de inspiração marxista. Socorro-me de um texto que condensa diversas intervenções orais feitas por Cabral, em francês, num seminário organizado pelo Centro Frantz Fanon de Milão, em Treviglio, de 1 a 3 de Maio de 1964.

Estava-se ainda no início da “luta de libertação” (oficialmente iniciada em 23 de Janeiro de 1963, com um ataque ao aquartelamento Tite), mas o PAIGC já detinha, desde a sua criação em 19 de Setembro de 1956, uma larga experiência de organização e de luta política na clandestinidade, apesar da repressão da PIDE. Tinha também um ano e tal de experiência de luta armada.

Recorde-se, que de Janeiro a Março de 1964, as NT tinham lançado uma contra-ofensiva na Ilha do Como, com a Op Tridente, a maior que se realizou no CTIG, em 11 anos de guerra. Por outro lado, entre 13 e 17 de Fevereiro desse ano, o PAIGC realizava o seu primeiro Congresso, em Cassaca, em pleno Cantanhez, região que reclama como sendo a primeira “região libertada”.

Depois da Batalha do Como (o primeiro grande embate do PAIGC contra um exército convencional, reforçado por importantes meios aéreos e anfíbios), o principal linha de infiltração de homens e material a partir da vizinha República da Guiné-Conacri passa para o célebre Corredor do Povo (ou corredor de Guileje). A Batalha do Como foi bem explorada em termos de propaganda, e contribui em muitos para criar um mito: João ‘Nino’ Vieira (que não participou directamente na batalha, ao que parece, por estar hospitalizado em Conacri).

Voltando ao texto de Amílcar Cabral, ele começa por fazer a clássica distinção entre o campo e a cidade. No campo, sinaliza dois grupos principais: (i) um, que ele chama semifeudal, representado pelos fulas; (ii) e outro, o dos balantas, que seria um grupo sem Estado, leia-se, sem poder político.

Entre estes dois grupos étnicos extremos haveria depois situações intermédias: por exemplo, (iii) mandingas e biafadas, de um lado; papéis e felupes, de outro (Os exemplos são meus).

Grosso modo, haveria uma coincidência entre o semifeudalismo e o islamismo, por um lado, e a ausência de organização estatal entre os animistas, por outro. O caso dos Manjacos, animistas, merece uma atenção à parte, uma vez que “à chegada dos portugueses mantinham já relações que se poderiam qualificar de feudais” (Cabral, 1976.24).

Quanto aos fulas, o fundador, dirigente e teórico do PAIGC fala deles em termos de uma forte “estratificação social”. Em primeiro lugar, temos (i) os chefes, os nobres e os dignatários religiosos (por ex., o Cherno Rachid de Aldeia Formosa); vêm depois, (ii) os artesãos e os jilas ou comerciantes ambulantes (que circulam pela Guiné, Senegal e Guiné-Conacri); finalmente, e na base da pirâmide social , (iii) os camponeses.

Sobre o grupo dirigente, Amílcar Cabral diz o seguinte:

“Os chefes e a sua comitiva têm ainda, a despeito da conservação de certas tradições relativas à colectividade das terras, privilégios muitos importantes no quadro da propriedade da terra e da exploração do trabalho de outrem. Os camponeses que dependem dos chefes são obrigados a trabalhar para eles um certo período do ano”.

Daí chamar aos fulas, aliados históricos dos portugueses, um grupo semi-feudal.

Os artesãos desempenham um papel importante na sociedade fula, constituindo um núcleo embrionário de uma indústria de transformação da matéria-prima: do ferreiro, na base da escala, até ao artesão do couro. Os comerciantes ambulantes (jilas) são os que têm, na prática, a possibilidade de acumular dinheiro. Por fim, os camponeses: em geral desprovidos de direitos, seriam os “verdadeiros explorados da sociedade fula”.

A estratificação da sociedade fula também pode ser vista a partir da família, extensa, que é a sua célula: a família de um homem grande é constituída pela morança; um conjunto de moranças formam uma tabanca; um conjunto de tabancas um regulado; e por fim, os regulados fulas estão associados ao chão fula (Leste da Guiné, compreendendo hoje as regiões de Bafatá e de Gabu), uma entidade territorial e simbólica, ligada à conquista.

Aqui a mulher não goza de quaisquer direitos sociais: participa na produção sem quaisquer contrapartidas; por outro lado, a prática da poligamia significa que ela é, em grande parte, propriedade do marido.

Estranha-se, não haver aqui uma referência ao fanado feminino e sobretudo ao profundo significado sócio-antropológico que tinha (e tem) a Mutilação Genital Feminina entre os Fulas (mas também entre os Mandingas e os Biafadas). Será que Cabral tinha consciência das terríveis implicações, para a mulher, desta prática ancestral, e também aceitava tacitamente em nome do relativismo cultural, tal como os antropólogos colonialistas ? Não conheço nenhum texto em que o ideólogo do PAIGC tenha tomada posição sobre este delicado problema.


(ii) Os balantas, sociedade horizontal
O outro exemplo extremo é o dos balantas, um sociedade sem estratificação. É o conselho dos anciãos da aldeia (ou de um conjunto de aldeias, em geral ribeirinhas e próximas) que tomam as decisões relativas à vida comunitária. A propriedade da terra é da aldeia. Cada família recebe uma parcela para trabalhar. Os instrumentos de produção, por sua vez, pertencem à família ou ao indivíduo.

O balanta é monógama, apesar de “fortes tendências para a poligamia” (sic). A mulher tem mais liberdade e estatuto na aldeia balanta do que entre os fulas. Cabral também não refere, na ocasião, os seus rituais de passagem, a cultura da virilidade, o uso e o abuso entre os balantas do consumo do “vinho de palma” e das suas eventuais consequências (v.g., saúde mental, violência doméstica, comportamentos antissociais).

Ainda no que refere ao campo, Cabral refere a existência de um grupo minoritário de pequenos proprietários africanos que se teria revelado “muito activo no quadro da luta de libertação nacional”. Dos europeus nos campos ele não fala porque praticamente não existiam. Mas
existiam caboverdianos, com as suas pontas (hortas)… Porquê omiti-los ?

Recorde-se que Cabral era de ascendência caboverdiana e originalmente casado com uma portuguesa. Sabe-se que parte da administração colonial, pelo menos ao nível de posto administrativo e de circunscrição administrativa, é preenchida funcionário portugueses de origem caboverdiana. Seria interessante termos estatísticas sobre isso.

Nas cidades, haveria dois grupos distintos: (i) os europeus; e (ii) os africanos. Ao nível mais elevado, entre os europeus, estão os altos funcionários da administração colonial, a começar pelo governador geral, mas também os directores das empresas (por ex., Casa Gouveia, pertencente ao Grupo CUF; a NOSOCO, ligada aos interesses franceses). É um grupo restrito que está isolado do resto dos escassos milhares brancos que existiriam no início da década de 1960 (dois a três mil). A um nível intermédio, pode-se referir os demais funcionários públicos, os pequenos comerciantes, os empregados de comércio, as profissões liberais. Por fim, teríamos os operários diferenciados.

A estratificação entre os africanos seria mais complexa: em primeiro lugar, temos os funcionários superiores e médios (da administração colonial e das empresas), as profissões liberais, os empregados de comércio com contrato de trabalho e os pequenos proprietários agrícolas; depois, vêm os assalariados propriamente ditos: os empregados de comércio sem contrato, os trabalhadores dos portos, dos barcos e dos transportes, os trabalhadores domésticos ou criados (em geral, homens), os operários de pequenas fábricas e oficinas de reparações. Cabral não os considera como fazendo parte do “proletariado” ou da “classe operária”.

Há por fim os “sem classe”, que Cabral divide em dois grupos: (i) o dos mendigos, desempregados, prostitutas, etc. (poderia ser o nosso "lumpen-proletariado” se na Guiné houvesse um proletariado com consciência de classe, o que não era o caso, na altura); (ii) um segundo grupo, "que se revelou muito importante na luta de libertação nacional, e que é constituído por um número muito elevado de jovens, vindos recentemente do campo, que conservam laços estreitos com este ao mesmo tempo que entraram em contacto com a vida dos Europeus”.

Seria interessante conhecer-se, com detalhe, a origem social dos principais dirigentes, políticos e militares, do PAIGC: sabe-.se que alguns, como Luís Cabral, Aristides Pereira, Turpin, eram empregados das casas comerciais europeias (a Casa Gouveia, a Nosoco, etc.) que poderíamos considerar como o “front office” do colonialismo.


(iii) A dificuldade de mobilização dos camponeses
Posteriormente, em 1969, num seminário de quadros (3), Cabral teve oportunidade de precisar melhor o seu pensamento sobre os camponeses da Guiné que ele não considerava uma “classe social”, mas antes como uma “camada especial”, pessoas que vivem no campo (“mato”), que vivem da agricultura, ou seja, dos produtos que a terra dá.

Contrariamente ao pensamento maoísta, Cabral não considera os “camponeses pobres” – os que, cultivando a terra, não saem do círculo da pobreza, são roubados no peso dos produtos, pagam impostos e taxas aos chefes tradicionais, trabalham uns tantos dias para estes dirigentes semi-feudais, aliados dos “tugas”… - como a classe mais importante da Guiné, do ponto de vista da luta de libertação. A amarga experiência de Cabral leva-o a falar das dificuldades de mobilização do campesinato guineense:

“Ainda hoje, quando alguma coisa não corre bem, fogem e põem-se do lado dos portugueses, mesmo sendo pobres e infelizes” (Cabral. 1976.111).

Lembra ainda as diferenças que, a nível do campo, existiam na época em Cabo Verde e na Guiné. No primeiro caso, havia a propriedade individual da terra, enquanto que no caso da Guiné a terra pertencia, teoricamente, à comunidade, à tabanca. Além disso, havia também a grande propriedade (nas Ilhas de Santiago e de Santo Antão) e a pequena propriedade (por ex., ilhas de S. Nicolau e Brava). Também existia a figura do rendeiro, do camponês sem terra. Em Cabo Verde faria sentido a palavra de ordem: “A terra a quem a trabalha”, mas não na Guiné. Aqui, além disso, há o factor étnico a ter em conta, e que vem complexificar a análise da estrutura social.

Cabo Verde e Guiné tinham em comum o facto de serem sociedades coloniais, ou seja, dominadas por um Estado estrangeiro, com as suas tropas, a sua polícia, a sua administração, os seus missionários, os seus antropólogos, etc. “Somos um povo sem autonomia” (Cabral. 1976. 114).

Que tipo de sociedade representam os Balantas, pergunta Cabral. Estão “talvez na fase de desagregação do comunismo primitivo, mas muito longe deste” (Canral. 1976. 115). Era uma sociedade que não conhecia o dinheiro, as relações mercantis, até aos finais do Séc. XIX. A moeda foi introduzida pelo colonialismo, o que modificou inevitalmente a sociedade balanta (e as outras, de outros povos animistas).

Já os fulas têm uma estrutura “feudal”, com chefes, com senhores, com gente que lhes está subordinada, os artesãos e os camponeses, ou seja, gente dos ofícios (“corporações”), e gente que trabalha a terra (e que na Europa do feudalismo se chamavam “servos”)… Mas seria inapropriado falar de feudalismo fula, porque a propriedade da terra não é individual, mas sim comunitária.

Usando a vulgata marxista, Cabral utiliza conceitos como “desenvolvimento das forças produtivas”, “infra-estrutura”, “super-estrutura”, “classe burguesa”, “classe operária”. etc. Mas, em geral, tem um discurso didáctico, em crioulo, procurando operacionalizar os conceitos e exemplificá-las. A sua linguagem procura fugir ao jargão, à langue du bois, tão típica dos anos 60, entre os movimentos e partidos marxistas ou de inspiração marxista.

Era o Cabral um marxista ? Teríamos que ter em linha de conta o seu pensamento, a sua escrita, os seus discursos, a sua prática… Há quem diga que ele nunca foi verdadeiramente um marxista, como é o caso do seu principal biógrafo, o francês Patrick Chabal, que escreve em inglês e vive no Reino Unido.

Onde Cabral revela o seu melhor é como pedagogo, como educador, em intervenções orais, em crioulo, como no seminário de quadros de 19 a 24 de Novembro de 1969 (“Os princípios do Partido e a prática política”). Usando uma linguagem simples, coloquial, recheada de imagens, é aí que Cabral se revela como o grande comunicador, o grande sedutor que é:

“Na Guiné, por exemplo: por um lado há gente da cidade, por outro, gente do mato, pelo menos. Na cidade o que é que há ? Na cidade há brancos e pretos. Entre os africanos há altos empregados e empregados médios, que têm a certeza de que no fim do mês ganha o seu dinheiro certo. Têm aquela ideia de comprar o seu carrinho, como eu, por exemplo, que tinha o meu próprio carro. Com geleira [frigorífico], boa raça de mulher, filhos que vão ao liceu de certeza e que mesmo, se estudarem muito, vão para Lisboa.

“Depois, há aqueles empregadinhos que fazem o seu Sábado, o seu tinto e o seu bacalhau, que podem comprar o seu rádio transistor, as suas coisas. Depois há os trabalhadores de cais, reparadores de carros, podemos meter aí também os chauffeurs e outros que vivem um bocado melhor. Trabalhadores assalariados em geral. E depois há aquela que tem nada que fazer, que vive de expedientes cada dia, por todo o lado, que nem mesmo sabem que fazer para arranjarem maneira de viver. Quer gente de vida fácil, como as prostitutas, quer pedintes, trapaceiros, ladrões, etc., gente que não tem nada que fazer. Isto é que é a sociedade das cidades” …

O que tem em comum esta gente da cidade, empregada, com um certo estatuto e um certo nível de vida ? Estão “todos agarrados aos tugas, fingindo ser portugueses o máximo que podem, até proíbem os filhos de falar outra língua em casa que não seja o português”…

Cabral está a falar para um auditório onde há gente (boa parte dos dirigentes e quadros do PAIGC) que veio desse meio relativamente privilegiado dos “empregados”, do universo (restrito) dos “assimilados”, o embrião de uma pequena burguesia africana. Conclui ele:

“Alguns de vocês, por exemplo, que eram empregados, mas que são nacionalistas, não é verdade ? Mas os interesses eram mais ou menos os mesmos, vivem sempre na mesma esfera, no mesmo grupo social” .

Tenho ideia que Cabral se movimentava (e pensava) melhor no campo do que na cidade, já que ele trabalhou como engenheiro agrónomo, na Guiné e depois em Angola, ao longo da década de 1950. Entre 1953 e 1956 fez o recenseamento agrícola da Guiné (…), e julgo que lhe veio daí a sua admiração pelos povos animistas, e em especial os balantas, os magníficos camponeses da Guiné, os grandes cultivadores de arroz.

Cabral utiliza o exemplo da sua própria origem social e da sua experiência pessoal, para melhor ilustrar os conceitos que usa na análise da estratificação social da população na Guiné e em Cabo Verde. Dá o exemplo dos trabalhadores portuários e dos transportes marítimos, que formam um outro grupo, distinto do primeiro:

“Vocês podem encontrar-se, conversar, mas sabem que não vão sentar-se juntos com eles à mesa para comer”.

O mesmo se passa no “grupo dos tugas, por exemplo, as famílias do governador, do director do banco, do director de Fazenda, etc., não vemos aí nunca a mulher do tuga operário ou de qualquer um que é batedor de chapas. Só se ele tiver alguma filha muito linda, que toda a gente admira, e que de vez em quando vai dançar com a gente da alta. Mas a mãe, que não sabe ler nem escrever, não vai. Acompanha a filha à porta e sai. Vocês lembram-se de casos desses em Bissau”. E Cabral está a pensar nos famosos bailes da UDIB – União Desportiva Internacional de Bissau onde a só “a fina flor” colonial podia entrar, pelo menos até ao início da guerra…

Falando das gentes do mato, Cabral dá uma lição sobre os balantas, grupo que ele não só conhece, como agricultores, como admira, enquanto povo, que foi historicamente um povo resistente. Chama-lhes uma “sociedade horizontal”, isto, é, “que não classes por cima umas das outras”. Entre eles não há hierarquias. Os chefes foram uma invenção dos tugas, que lhe impuseram régulos fulas ou mandingas, nalguns casos antigos cipaios, leais aos portugueses:

“Cada família, cada morança tem a sua autonomia e, se há algum problema, é o conselhos dos velhos que o resolve, mas não há um Estado, não há nenhuma autoridade que manda em toda gente”. A sociedade balanta seria uma sociedade tendencialmente igualitária, que Cabral descreve nestes termos singelos :

“A sociedade balanta é assim: Quanto mais terra tu lavras, mais rico tu és, mas a riqueza não é para guardar, é para gastar, porque um indivíduo não pode ser muito mais que o outro”… Explicitando melhor: “Quem levantar muito a cabeça já não presta, já quer virar branco, etc. Por exemplo, se lavrou muito arroz, é preciso fazer uma grande festa, para gastar”…

Já os fulas e os mandingas são sociedades verticais, estratificadas, têm os seus próprios chefes, que não foram impostos pelos tugas… Mas é bom que os camaradas saibam, acrescenta Cabral, que os fulas e os mandingas da Guiné não são verdadeiros fulas e mandingas…

Recuando no tempo, sabe-se que os mandingas vieram de fora e conquistaram o território do que é hoje a Guiné até à região de Mansoa… Os vencidos foram ‘mandinguisados’, assimilados, tornaram-se mandingas. “Os balantas recusaram-se e muita gente diz que a própria palavra balanta significa aqueles que recusam. O balanta é aquele que não se convence, que nega. Mas não recusou tanto, porque existe o balanta-mané e o mansoane. Sempre apareceram alguns que aceitaram e foram aumentando aos poucos”, islamizando-se…

E aqui põe-se uma questão interessante: por que é que os balantas foram a grande base de apoio do PAIGC ?

Em 1969, Cabral não tem dúvidas na resposta: não é por eles serem melhores do que os outros, mas por causa do seu tipo de sociedade, horizontal, rasa, igualitária, composta por homens livres que querem continuar a ser livres, sem a “opressão dos tugas":

“O balanta é e o tuga por cima dele, porque ele sabe que o chefe que lá está, o Mamadu, não é nada seu chefe, é uma criatura do tuga. Portanto, mais interesse tem ele em acabar com isso para ficar com a sua liberddae, absolutamente. E é por isso também que, quando qualquer elemento do Partido comete um erro com os balantas, eles não gostam e zangam-se depressa, mais depressa do que qualquer outro grupo” (Cabral, 1976. 125).

Luís Graça
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Nota de L.G.:

(1) Vd. Obras ecolhidas de Amílcar Cabral, de que foram publicados 2 volumes pela Seara Nova

CABRAL, A.- Unidade e luta (compil. Mário de Andrade). Lisboa : Seara Nova, 1976-1977 (Obras Escolhidas de Amílcar Cabral). 1º Volume: A arma da teoria, 249 pp. 2º volume: a prática revolucionária, 224 pp.

domingo, 29 de junho de 2008

Guiné 63/74 - P2999: Simpósio Internacional de Guileje: Fotos enviadas pelo Pepito

Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Azalai > Simpósio Internacional de Guileje > 29 de Fevereiro de 2008 > O vocalista do grupo musical Furkuntunda, ladeado à direita pelo António Maria de Almeida e Silva - se não me engano - e que é hoje empresário em Estarreja, fundador, em 1994, da Sibina - Fábrica de Vassouras - e à esquerda pelo António Pimentel, do Porto, e o Zé Teixeira, de Matosinhos.


Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Azalai > Simpósio Internacional de Guileje > 29 de Fevereiro de 2008 > Em primeiro, da direita para a esquerda: Abílio Delgado, Almeida e Silva, Alice Carneiro e o vocalista dos Furkuntunda, na recriação do Hino de Gandembel.


Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Azalai > Simpósio Internacional de Guileje > 29 de Fevereiro de 2008 > m primeiro plano, sentados, o Silvério Lobo e o Álvaro Basto... De pé, o Luís Graça rodeado pelos meninas e meninas, todos lindíssimos/as e cheios/as de talento, do Grupo de Teatro Os Fidalgos. No 5 de Março de 2008, assistimos, no Centro Cultural Francês de Bissau a uma série de skecthes espectaculares, apresentadas por este grupo e relacionados com a história da guerra colonial / luta de libertação, e de que ainda não falámos em detalhe.


Guiné-Bissau > Bissau > Hotel Azalai > Simpósio Internacional de Guileje > 29 de Fevereiro de 2008 > Actuação do grupo musical Furkuntunda que animou a nossa primeira noite em Bissau, na sequência do cocktail oferecido a todos os inscritos no Simpósio Internacional de Guiledje pela Ministra dos Combatentes da Liberdade da Pátria e Presidente do Comité Interministerial de Pilotagem das Comemorações do 35 Aniversário da Morte de Amílcar Cabral, Senhora Isabel Mendes Correia Buscardini. Foi a primeira de uma série de dias e noites memoráveis (1)... Na foto, da esquerda para a direita, o Paulo Santiago, o Luís Graça e o Zé Teixeira tentando aguentar a pedadalada do endiabrado e genial vocalista dos Furkuntunda.

Estas fotos foram agora enviados pelo Pepito no dia 27 de Junho corrente:

Luís: Estou a preparar a Assembleia Geral Anual da AD que se realiza amanhã. Será que tens estas fotos? abraço

pepito

Fotos: © AD - Acção para o Desenvolvimento (2008). Direitos reservados.

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Nota de L.G.:

(1) Vd. poste de 9 de Março de 2008 > Guiné 63/74 - P2620: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral: 29/2 a 7/3/2008 (Luís Graça) (2): O Hino de Gandembel, recriado pelos Furkuntunda

Guiné 63/74 - P2998: O caso do embaixador português em Bissau (3): A minha indignação (Jorge Picado, ex-Capitão Miliciano)

1. Mensagem de Jorge Picado, com data de 24 Junho de 2008 (Jorge Picado foi Cap Mil, CCAÇ 2589 e CART 2732, Guiné, 1970/72) (1):

Camaradas:

Na qualidade de ex-combatente da ex-colónia da Guiné e tertuliano da Tabanca Grande (1), mas acima de tudo como cidadão Português, sinto-me ultrajado por ter como Representante máximo do meu País na República da Guiné-Bissau, alguém que não manifesta ter sensibilidade para exercer cargos desta índole (2).

De facto, a atitude tomada para com os camaradas que se deslocaram ao Simpósio sobre Guiledje e depois para com a filha do Pepito - que não sabia ser o meu colega Carlos Schwarz ainda que de curso posterior ao meu mas que conhecia de nome - revela, digamos, falta de chá, para ser suave.

A indignação tem de facto de ser grande. Primeiro, porque mais uma vez quem, consciente ou inconscientemente, com maior ou menor mérito serviu a Pátria, se vê assim tratado por "carne para canhão" por quem lá fora representa a Nação. Segundo, em território nacional - pois que uma Embaixada isso representa - pessoas de mérito reconhecidas, incluíndo Portugueses, foram enxovalhados directamente pelo próprio Embaixador, no dia de celebração de Portugal.

É triste, mesmo muito triste, que pessoas deste nível ocupem cargos de tanta responsabilidade no meu País.

Um abraço
Jorge Picado

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Notas de L.G.:

(1) Vd. postes de:

28 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2992: História de vida (12): Como eu, Eng Agrónomo, me safei de uma eventual guerra química (Jorge Picado)

24 de Junho de 2008> Guiné 63/74 - P2983: Dando a mão à palmatória (14): O Régulo Iero não veio na coluna (Jorge Picado)

24 de Maio de 2008 > Guiné 63/74 - P2881: Estórias de Jorge Picado (2): Cutia, I Parte (Jorge Picado)

3 de Maio de 2008> Guiné 63/74 - P2807: Estórias de Jorge Picado (1): A emboscada do Infandre vivida pelo CMDT da CCAÇ 2589 (Jorge Picado)

9 de Abril de 2008 > Guiné 63/74 - P2736: Tabanca Grande (60): Apresenta-se o Jorge Picado, ilhavense, ex- Cap Mil, CCAÇ 2589, CART 2732 e CAOP 1 (1970/72)

(2) Vd. postes de:


29 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2997: O caso do embaixador português em Bissau (2): Vergonhoso dia 10 de Junho (Joaquim Pinheiro, Itanhaém, S. Paulo, Brasil)

23 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2977: Recortes de imprensa (6): a cidadã portuguesa, Cristina Silva, expulsa da Embaixada de Portugal em Bissau no 10 de Junho

19 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2967: O caso do embaixador português em Bissau (1): Protestos (Luís Dias)

18 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2958: E os nossos assobios e pateadas vão para... (1): Um embaixador que não honra Portugal... (Luís Graça / Pepito)

Guiné 63/74 - P2997: O caso do embaixador português em Bissau (2): Vergonhoso dia 10 de Junho (Joaquim Pinheiro, Itanhaém, S. Paulo, Brasil)



1. Mensagem do Joaquim Pinheiro, de 21 de Junho último, enviada à Embaixada de Portugal em Bissau, com conhecimento aos nossos editores (O Joaquim Pinheiro pertenceu à CCAÇ 3566, Os Metralhas, Empada/Catió, 1972/74, sendo portanto camarada dos nossos amigos Xico Alen e Antero Santos) (1):


VERGONHOSO DIA 10 DE JUNHO!!! (2)

Sr. Embaixador (dispenso por conta própria o Ilmo.)

Eu, como cidaão português, estou decepcionado com a sua conduta, ao expulsar de sua própria casa uma cidadã de igual nacionalidade. Sua própria casa, sim, pois uma embaixada é terreno do país que a mesma representa... A pessoa dessa nacionalidade está, pois, no que é seu.

Que ridículo esse seu ato!!!

O senhor é tão simplesmente um representante de Portugal na Guiné Bissau.... Não tem esse direito...

Me envergonho de ter pessoas com atos e ações tão descabidas, representando o MEU PAÍS....Meu e de TODOS os que lá nasceram.... Não é uma terra de um dono só...

Lembre-se, sr. Embaixador (espero que em breve seja Excia), da letra do célebre fado da nossa Amália:

Numa casa portuguesa fica bem
pão e vinho sobre a mesa.
Quando à porta humildemente bate alguém,
senta-se à mesa co'a gente.
Fica bem essa fraqueza, fica bem,
que o povo nunca a desmente.
A alegria da pobreza
está nesta grande riqueza
de dar, e ficar contente. (...)


Este é o verdadeiro e real espírito dos portugueses de verdade....

QUE VERGONHA QUE EU SINTO DE SABER QUE MEU PAÍS É REPRESENTADO POR PESSOAS COMO O SENHOR!!!

Joaquim Pinheiro da Silva
Itanhaém/São Paulo-BRASIL

Em tempo: Farei questão de relatar esse triste e vergonhoso fato a todos os meus comPATRIOTAS, com os quais me relaciono, quer seja em clubes, reuniões ou confraternizações da 'massa' portuguêsa e descendentes, aqui em terras brasileiras.

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Notas de L.G.:

(1) Vd. postes de:

16 de Dezembro de 2005 > Guiné 63/74 - CCCLXXVI: O Xico de Empada, grande amigo dos guinéus (Albano Costa)

15 de Maio de 2006 > Guiné 63/74 - DCCLIV: Que maravilha de trabalho (Joaquim Pinheiro, CCAÇ 3566, Empada/Catió, 1972/74)

19 de Setembro de 2006 > Guiné 63/74 - P1087: Rosa Gonçalves, o alentejano (CCAÇ 3566, Os Metralhas, Empada, 1972) (Quim Pinheiro)

18 de Abril de 2006 > Guiné 63/74 - DCCX: O Cherno Rachid da Aldeia Formosa (Antero Santos, CCAÇ 3566 e CCAÇ 18)


(2) Vd. postes de:

23 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2977: Recortes de imprensa (6): a cidadã portuguesa, Cristina Silva, expulsa da Embaixada de Portugal em Bissau no 10 de Junho

19 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2967: O caso do embaixador português em Bissau (1): Protestos (Luís Dias)

18 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2958: E os nossos assobios e pateadas vão para... (1): Um embaixador que não honra Portugal... (Luís Graça / Pepito)

Guiné 63/74 - P2996: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (18): Cacine, a voz dos abandonados (II)


Guiné-Bisssau > Região de Tombali > Sector de Cacine > Cacine, na margem esquerda do Rio Cacine > 2 de Março de 2008 > Simpósio Internacional de Guileje (1-7 de Março de 2008) > Visita dos participantes ao sul > Depoimento de Armando Abasse Camará, um antigo militar das NT (1966/74), natural de (e residente em) Cacine.

Com uma comissão em Angola em 1972, voltou para Cacine onde foi escolhido como elemento de contacto das NT com o PAIGC em 25 de Abril de 1974. Como muitos outros guineenses, depois de servir Portugal e os portugueses, foi abandonado por nós. Uma história que ainda hoje nos envergonha... Poderias ter escrito a história de outra maneira ? Poderíamos, ao menos, ter feito alguma justiça a estes e outros combatentes ?

Hoje estes antigos combatentes guineenses, que serviram Portugal, nem uma mísera pensão de vinte e poucos euros recebecem, o equivalente ao salário mínimo do país (!), o suficiente até há pouco tempo para se comprar um saco de arroz de 50 quilos e alimentar (mal) a família.
O saco estava até há pouco a 12500 francos CFA (cerca de 19 euros). Devido è escassez no mercado local do alimento base, que é o arroz, resultante da conjugação de múltiplos factores (subida exponencial do preço do petróleo, escassez de combustíveis, crise cerealífera local, regional e mundial, especulação, açambarcamento, corrupção, desastre da política agrícola do FMI que impõe a ditadura do cajú aos guineenses, abandono das bolanhas, etc.), o preço do arroz não pára de aumentar... No princípio de Junho, o arroz já estava a 15 mil francos CFA o saco de 50 quilos, até desaparecer do mercado e obrigar o Goberno a intervir no mercado.

Cito o portal Notícias Lusófonas, com notícias de 24 de Junho do corrente, sobre o recente aumento de preços na Guiné-Bissau:

"O peixe e o arroz foram os principais produtos alimentares que registaram aumentos na Guiné-Bissau após a revisão dos preços dos combustíveis anunciada sábado pelo governo, mas os transportes públicos devem subir as tarifas ainda esta semana.

"Os pescadores aumentaram e nós tivemos de aumentar também, afirmou hoje à Agência Lusa o peixeiro Issiaca Nanqui, com banca no mercado central de Bissau. Segundo Issiaca Nanqui, os aumentos do preço do quilograma de peixe variam entre 250 francos cfa (0,38 euros) e 500 francos cfa (0,76 euros), dependendo do peixe. Já no mercado do Bandim, o preço do saco de 50 quilogramas de arroz varia entre os 17.500 francos cfa (26,71 euros), fixado pelo governo sábado juntamente com o preço dos combustíveis, e os 21.000 francos cfa (32 euros).

"Questionada pela agência Lusa sobre as razões para a variação do preço do arroz, uma comerciante explicou que o saco de 17.500 francos cfa é de segunda qualidade e o mais caro de primeira qualidade. Sobre as reclamações dos consumidores, Márcio Santos Cá, um outro comerciante de arroz, afirmou que 'as pessoas queixam-se do preço, mas compram'...'Os que têm dinheiro compram e os que não têm compram de segunda qualidade', disse, sublinhando que as vendas não diminuíram. Os legumes, a fruta e o óleo, muito consumido pelos guineenses, não registaram aumentos, ao contrário da carne, que aumentou nas últimas duas semanas.

" 'A carne aumentou porque neste momento as vacas são difíceis (escassas) e o preço subiu, afirmou Roberto Mendes, vendedor de carne de vaca no mercado do Bandim. Enquanto os produtos base da alimentação dos guineenses, peixe e arroz, aumentaram imediatamente, os transportes públicos aguardam as directivas do governo para procederam à regularização das tabelas. 'Os aumentos devem ser esta semana, estamos à espera que o governo decida', afirmou Miguel Binhancarem, condutor de um toca-toca (transporte público). Para já, o preço de um bilhete custa 150 francos cfa (0,22 euros). Nos táxis, a corrida varia entre 250 francos cfa (0,38 euros) e 350 francos cfa (0,53 euros) e os aumentos são esperados ainda semana.
" 'Vamos aumentar porque a situação está difícil com a subida do preço do gasóleo', afirmou o taxista Bubacar Baldé. O executivo guineense decidiu sábado aumentar o litro do gasóleo para 729 francos cfa (1,11 euros), mais 25 cêntimos, enquanto a gasolina subiu para 801 francos cfa (1,22 euros), contra os 1,02 cobrados a semana passada.

"O aumento dos combustíveis ocorreu depois de duas semanas de um braço-de-ferro entre o governo e as distribuidoras do país, que deixaram de importar combustível por estarem a perder dinheiro já que o preço dos carburantes não acompanhava o estabelecido no mercado internacional. O aumento do preço do gasóleo tem consequências directas nas condições de vida dos guineenses, porque apesar de este combustível não ser utilizado pela maior parte da população, é garante do funcionamento do país. Um guineense ganha em média o equivalente a 45,80 euros por mês. O ordenado mínimo ronda os 22,90 euros mensais. Actualmente, um guineense que ganhe um ordenado mínimo não consegue comprar um saco de 50 quilogramas de arroz, base da sua alimentação" .

Vídeo (5' 26''): © Luís Graça (2008). Direitos reservados. Vídeo alojado em: You Tube >Nhabijoes
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Nota de L.G.:

(1) Vd. poste de 29 de Junho de 2008 > Guiné 63/74 - P2994: Uma semana inolvidável na pátria de Cabral (29/2 a 7/3/2008) (Luís Graça) (17): Cacine, a voz dos abandonados (I)

Guiné 63/74 - P2995: O Nosso Livro de Visitas (19): António Pádua (CCAÇ 2406, Olossato e Saltinho, 1968/70)

1. Em 1 de Junho de 2008 recebemos uma mensagem de António Pádua que só recentemente tomou conhecimento do nosso Blogue

Caro colega:

Hoje, no almoço da CCaç 2406, tive conhecimento da existência deste blog. Eu permaneci na Guiné desde 24 de Julho de 1968 até 17 de Junho de 1970. Estive no Olossato e no Saltinho.

Tenho algumas fotos destes dois locais, que gostaria de partilhar, dado serem um bom testemunho da nossa passagem por eles, tanto da população local como também da paisagem.

Como devo fazer?

Fico aguardando notícias, um grande abraço.
António Pádua


2. No mesmo dia foi enviada resposta a este nosso camarada

Caro António Pádua: Gratos pelo teu contacto, convidamos-te a aderir à nossa Tabanca Grande.
As formalidades são simples, basta enviares uma foto do teu tempo de tropa e outra actual, para que te possamos conhecer. Estas fotos irão um dia fazer parte da nossa fotogaleria que está em fase de remodelação.

De ti queremos saber o teu antigo posto miltar, o teu Batalhão 2852(?), locais por onde andaram, datas de ida e volta da Guiné, etc. Já agora diz em que região do país te encontras.

Poderás, quando entenderes, contares umas estórias da tua Companhia e coisas passadas contigo ou com os teus camaradas da CCAÇ 2406. Farás acompanhar isso das fotos que dizes ter.

Na nossa página, http://www.blogueforanadaevaotres.blogspot.com, poderás encontrar as nossas normas de conduta que se resumem ao respeito pela liberdade de expressão, desde que se respeite a opinião dos outros, respeito pela propriedade intelectual, respeito pela soberania da Guiné-Bissau, abstendo-nos de comentários que sugiram ingerência nas suas vidas social e política, etc.

Já sabes que, cá dentro, nos tratamos todos por tu, como verdadeiros camaradas que somos e nos sentimos ser.

Ficamos a aguardar a tua resposta.

Um abraço dos editores deste blogue

Luís Graça
Virgínio Briote
Carlos Vinhal